INCIDENTES DA INSTÂNCIA
CAUÇÃO
HIPOTECA
REGISTO PROVISÓRIO
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
Sumário

I - Na prestação incidental espontânea de caução, quando por meio de hipoteca se proponha prestar caução, é exigível que o obrigado à prestação da mesma – requerente do incidente – apresente certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem que pretende hipotecar para caucionar a dívida.
II - No incidente de prestação espontânea de caução, caso o requerente ofereça caução por meio de hipoteca e omita a apresentação, com o requerimento inicial, da certidão do respectivo registo provisório, deve o tribunal convidá-lo a apresentar tal documento.
III - Só no caso de ter sido proferido despacho de convite à junção de tal documento e do mesmo não ser acatado pelo requerente é que se justifica o indeferimento do respectivo incidente.

Texto Integral

       I – Relatório

       A deduziu este incidente de prestação espontânea de caução para pedir que se admita a prestação de caução através de hipoteca sobre o imóvel com a matrícula n.º , registado no Registro de Imóveis  Zona da Comarca de Natal RN, que é unidade de hospedagem n.º , no º pavimento, tipo standart B, parte integrante do prédio de uso não residencial flat, denominado de "B", sito na Rua , esquina com a Rua , n.º , no bairro de , Zona suburbana, Sul, Natal, Brasil, e que se decrete a suspensão da execução.
       Os requeridos na oposição, embora aceitem a prestação de caução por meio de hipoteca sobre o imóvel, condicionaram a aceitação da caução às condições seguintes: que a escritura pública de hipoteca seja outorgada no prazo de 30 dias a contar da decisão do incidente; suportar a executada a totalidade dos custos inerentes à constituição da hipoteca; informar a executada prévia e devidamente os exequentes da data de outorga da escritura pública de hipoteca; caso não sejam prestadas garantias adicionais, que da escritura de hipoteca conste expressamente que a executada, não obstante a pendência do protesto contra a alienação de bens, reconheça que a hipoteca não afecta a validade deste protesto pendente sobre outros bens; concessão de prazo adicional de 15 dias para procederem à avaliação do imóvel; caso se venha a confirmar que o valor do imóvel dado em hipoteca fica aquém da quantia exequenda, que a executada venha prestar garantias adicionais para ressarcimento da quantia exequenda, concretamente mediante prestação de caução através de hipotecas a constituir sobre os demais bens identificados e sobre os quais incide o protesto contra a alienação de bens.
       A requerente pronunciou-se para, quanto ao prazo para outorga da escritura de hipoteca e dado tratar-se de formalização de acto no Brasil, requerer a fixação de prazo não inferior a 45 dias e para, quanto avaliação do imóvel que os requeridos pretendem efectuar a expensas suas, declarar nada ter a opor, requerendo, no entanto, que a instância executiva seja suspensa até à decisão deste apenso.
       Os requeridos juntaram relatório de avaliação do imóvel, requerendo dever este ser avaliado por montante não superior a € 40.000,00.
       A instância esteve suspensa, a pedido dos advogados das partes, para possibilitar acordo sobre o litígio, e finda a suspensão, sem alcançar aquele seu propósito, foi proferida decisão que julgou o incidente improcedente.
       Para tanto entendeu-se que, embora actualmente não exista preceito que imponha expressamente a apresentação do registo provisório da hipoteca no que respeita à prestação espontânea de caução, contrariamente ao que antes acontecia, a apresentação desse registo continua a constituir requisito essencial para que se admita a prestação espontânea de caução através de hipoteca. 
       A requerente interpôs recurso de agravo apresentando as suas alegações com as conclusões seguintes:
1ª- Na sentença ora recorrida o douto Tribunal a quo pronuncia-se sobre questão que não foi antes, oficiosamente ou por iniciativa de qualquer das partes, suscitada nos autos, nem sobre esta lhes foi consentida prévia discussão. Pelo contrário, esta questão surge nos autos somente vertida em fundamento da douta sentença ora recorrida;
2ª- Trata-se, portanto, de decisão surpresa, ilegal por violar o princípio do contraditório, como consagrado no artigo 3º, n.º 3, do CPC;
3ª- A lei expressamente prevê a necessidade de registo provisório de hipoteca como pressuposto do incidente de prestação de caução provocada quando seja essa a modalidade de caução cuja prestação se requer;
4ª- Porém, desde a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, da letra da lei – como, aliás, reconhece a sentença recorrida –, não resulta semelhante obrigação na regulação que faz do incidente de prestação de caução espontânea;
5ª- O douto tribunal a quo, ao entender na decisão recorrida, contrariamente a lei expressa, que a apresentação de tal registo provisório constitui condição essencial da prestação de caução espontânea postula a interpretação correctiva do preceituado nos artigos 982º, n.º 3 do Código de Processo Civil e 988º do Código de Processo Civil, modalidade interpretativa ilegal, por não admitida na ordem jurídica portuguesa;
6ª- Com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, o legislador, intencionalmente, deixa de exigir a necessidade de registo prévio de hipoteca em sede de prestação de caução espontânea quando seja essa a modalidade de caução oferecida;
7ª- Se assim não fosse, expressamente a lei exigiria tal registo prévio, quanto mais não fosse por meio de mera remissão para as regras da prestação de caução provocada. Ora, assim não acontece;
8ª- A referida alteração legislativa não resulta de esquecimento ou desatenção legística, pois que logo foi publicado o Decreto-Lei nº 180/96 que, visando aperfeiçoar a redacção de vários preceitos alterados pelo Decreto-Lei 329-A/9, prevenindo dúvidas interpretativas, deixou inalteradas as disposições que regulam o incidente de prestação de caução, reiterando assim a opção legislativa postulada com a redacção introduzida por força da reforma que aprimorava;
9ª- Assim, em 95 o legislador deixa de sujeitar a prestação de caução espontânea a registo prévio de hipoteca quando é essa a modalidade por que se oferece. Em 96, reitera-o;
10ª- Para mais, o Código de Processo Civil sofreu desde então mais de duas dezenas de alterações e nenhuma delas veio introduzir no texto legal a obrigação de registo provisório de hipoteca sobre prédio espontaneamente assim oferecido em caução;
11ª- Assim, desde 1995, o legislador deixa a claro que só à prestação de caução provocada exige tal registo prévio;
12ª- A caução constitui substantivamente uma das modalidades de garantia especial das obrigações e, nas palavras de Antunes Varela, num sentido mais amplo, «é sinónimo de segurança…», pelo que o Código de Processo Civil, ao definir por que forma processualmente se presta caução, o faz tendo em vista a posição ou direito que a caução pretende, justamente, garantir ou assegurar e por que formalismo o poderá alcançar;
13ª- Na prestação de caução, a posição que a lei há-de procurar proteger é a do beneficiário requerente em qualquer das modalidades do incidente de prestação de caução;
14ª- Porém, na caução provocada o beneficiário é sempre pessoa diversa do seu prestador, ao passo que na caução espontânea, quem a presta é, simultaneamente, seu beneficiário;
15ª- Pelo que, no caso de caução provocada a prestação constitui para o prestador um verdadeiro dever – e correlativo direito do requerente/beneficiário –, mas em sede de caução espontânea a sua prestação mais não é que ónus do prestador, simultaneamente beneficiário da caução;
16ª- É essa a razão para que só em caso de caução provocada existir necessidade de garantir ou assegurar a posição ou direito do requerente por via do registo provisório de hipoteca;
17ª- Nesta lógica, entendeu o legislador que só no procedimento de constituição da caução provocada há fundamento para exigir o registo provisório de hipoteca caso seja esta a modalidade de caução que se pretenda, mas já as razões de garantismo ou segurança não subsistirão quando se trate de prestação de caução espontânea;
18ª- Mais, a exigência de registo provisório da hipoteca que o próprio requerente da caução se propõe prestar constituiria acto inútil, e por isso proibido (artigo 137º Código de Processo Civil), pois que se trata de mecanismo que visa melhor permitir executar a decisão que imponha a prestação da caução no caso do prestador a não cumprir voluntariamente, mecanismo esse que não é compatível com a prestação de caução espontânea;
19ª- É que, caso não seja prestada a caução que espontaneamente se oferece, para os autos somente resulta a frustração do benefício que o requerente e prestador pretendia com esta obter, não estando o Tribunal habilitado a forçar a realização da caução uma vez que esta não constitui um dever do requerente, mas mero ónus;
20ª- É precisamente o que acontece nestes autos. A recorrente, que é executada nos autos principais, busca com o incidente de prestação de caução espontânea, a suspensão dos autos. Caso houvesse o incidente sido deferido e a recorrente não viesse a concretizar a prestação da caução, ter-se-ia como única consequência para os autos a normal prossecução dos seus termos, vendo-se frustrada a suspensão dos autos;
21ª- Com a não prestação da caução, os recorridos, exequentes nos autos principais, em nada se veriam diminuídos ou beliscados. A sua posição processual não sofreria qualquer abalo. Estão, para mais, garantidos por penhoras;
22ª- De tudo isto teve o legislador consciência quando, em 95, deixou de exigir o registo prévio de hipoteca em situações com a dos autos, e de tudo isto está o legislador ainda consciente ao manter aqui, e desde então até hoje, a desnecessidade do registo provisório da hipoteca;
23ª- Mais ainda, razões de economia processual e de adequação de procedimentos confirmam o entendimento da desnecessidade do prévio registo de hipoteca provisória como condição de prestação de caução, pois que o incidente está sujeito a contraditório, podendo a contraparte (justamente) discutir a aceitação do bem oferecido em caução e a forma jurídica de concretização desta, fazendo pouco sentido que se impusesse à parte o encargo (e o custo) de onerar previamente o bem com um registo provisório quando a contraparte e o tribunal podem rejeitar a garantia oferecida, incorrendo-se por essa via em custos desnecessários.
       Termos em que pretende a revogação da sentença recorrida.
       Não foram apresentadas contra-alegações.
       Foi proferido despacho que sustentou a decisão recorrida.
       Como resulta do disposto nos artigos 684º, n.º 3, e 690º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.
       Perante as conclusões da alegação do recorrente a questão em recurso consiste em apreciar se é de exigir a certidão do registo provisório da hipoteca quando seja essa a modalidade de caução oferecida pelo requerente no incidente de prestação espontânea de caução e, em caso afirmativo, se a omissão de apresentação desse documento justificava a prolação da decisão recorrida.

       II- Fundamentação
       Na decisão considerou-se assente a seguinte factualidade:
1- Os requeridos instauraram a acção executiva, de que estes autos são apenso, contra a requerente, dando à execução o escrito de fls. 23 a 35 dos autos principais, cujo teor se dá aqui por reproduzido, e peticionando o pagamento coercivo da quantia de € 96.300,59, acrescida de juros de mora vincendos;
2- A requerente deduziu oposição à execução, que foi liminarmente admitida;
3- A requerente veio deduzir o presente incidente de prestação espontânea de caução, oferecendo a prestação de caução através de hipoteca sobre o imóvel com a matrícula n.º , registado no Registro de Imóveis  Zona da Comarca de Natal RN, que é unidade de hospedagem n.º , no º pavimento, tipo standart B, parte integrante do Prédio de uso Não Residencial Flat, denominado de "B", sito na Rua , esquina com a Rua , n.º , no bairro de , Zona suburbana/sul, Natal, Brasil.
       Acrescentamos, como resulta dos autos, ainda o seguinte desenvolvimento processual:
1- O requerimento inicial foi seguido de despacho que admitiu liminarmente  o incidente de prestação espontânea de caução e ordenou a notificação dos exequentes para, em quinze dias, impugnar o valor ou a idoneidade da caução;
2- Estes deduziram oposição;
3- Foi proferido despacho a ordenar a notificação da requerente para se pronunciar sobre questões levantas na oposição;
4- A requerente pronunciou-se;
5-Foi proferido despacho a ordenar a notificação dos exequentes para apresentarem relatório de avaliação do imóvel em causa;
6- Apresentado o relatório as partes e seus advogados foram convocados para prestarem esclarecimentos;
7- Seguidamente a instância esteve suspensa, a pedido dos advogados das partes, para possibilitar acordo sobre o litígio, e finda a suspensão foi proferida decisão recorrida.
       A requerente na execução em que figura como executada deduziu oposição à execução, que foi liminarmente admitida, e pretende prestar caução para obter a suspensão na execução.
       Sendo assim, visto o disposto nos artigos 818º, n.º 1, e 990º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a instância em causa é de prestação incidental espontânea de caução, de prestação de caução por apenso à execução como processo para o executado, que obteve despacho de recebimento da execução, alcançar a suspensão da execução.
         De acordo com o artigo 990º, n.º 1, do Código de Processo Civil, nesta instância é aplicável o disposto nos artigos anteriores e assim é aplicável o disposto no artigo 988º do Código de Processo Civil que, sob a epígrafe «prestação espontânea de caução», nos seus números 1 a 4 estabelece o seguintes
1- sendo a caução oferecida por aquele que tem obrigação de a prestar, deve o autor indicar na petição inicial, além do motivo por que a oferece e do valor a caucionar, o modo por que a quer prestar;
2- a pessoa a favor de quem deve ser prestada a caução é citada para, no prazo de 15 dias, impugnar o valor ou a idoneidade da garantia;
3- se o citado não deduzir oposição, devendo a revelia considerar-se operante, é logo julgada idónea a caução oferecida; no caso contrário, aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 983º e 984º;
4- quando a caução for oferecida em substituição de hipoteca legal, o devedor, além de indicar o valor dela e o modo de a prestar, formulará e justificará na petição inicial o pedido de substituição e o credor será citado para impugnar também este pedido, observando-se, quanto à impugnação dele, o disposto no número anterior relativamente à impugnação do valor e da idoneidade da caução.
       Nos termos dos artigos 981º e 982º, n.º 3, do Código de Processo Civil, quando a prestação de caução seja exigida pelo credor da obrigação a caucionar, o requerido, aquele que tem a obrigação de prestar caução a favor do autor, deve apresentar logo certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem quando, depois de citado, se apresente a oferecer a prestação de caução por meio de hipoteca.
       Neste caso, no processo especial de prestação provocada de caução, ou seja no processo intentado por aquele que pretende exigir a prestação de caução, exige-se do obrigado à prestação caução a apresentação certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem que pretende hipotecar para caucionar a divida.
       A apresentação desta certidão «destina-se a evitar que, depois do oferecimento da hipoteca sobre prédios determinados, estes sejam hipotecados à segurança de outras obrigações, com prejuízo daquela que pela caução se pretende garantir.»[1].
       Portanto a lei para protecção do credor faz uso dessa certidão para demonstração e apreciação da idoneidade da garantia e para aplicação do disposto no artigo 6º, n.º 3, do Código do Registo Predial: o registo convertido em definitivo conserva a prioridade que tinha como provisório.
       Com efeito, visto o disposto no artigo 986º do Código de Processo Civil, oportunamente a caução deve ser julgada prestada depois de averbado como definitivo o registo da hipoteca.
       É certo que no artigo 988º do Código de Processo Civil não consta exigência de que aquele que tem a obrigação de prestar caução, o requerente, apresente logo, ou seja na petição inicial, certidão do registo provisório da hipoteca quando, por esse modo, se proponha prestar caução e nele não se faz qualquer remissão para o artigo 982º do Código de Processo Civil.
       Todavia cumpre averiguar se dessas circunstâncias, omissão dessa exigência e omissão dessa remissão, se pode concluir que na prestação incidental espontânea de caução não é exigível que o obrigado à prestação caução, o requerente, apresente a certidão do registo provisório da hipoteca quando, por esse modo, se proponha prestar caução.
       Estabelece-se no artigo 988º, n.ºs 2 e 3, 2ª parte, do Código de Processo Civil, que aquele a favor de quem o requerente pretende prestar caução é citado para impugnar o valor ou a idoneidade da garantia indicadas na petição inicial e que se o citado deduzir oposição se aplicam, com as necessárias adaptações, os artigos 983º e 984º do mesmo diploma.
       Pode-se concluir que a remissão se destina estabelecer o procedimento a observar em caso de contestação, mas a remissão não significa necessariamente que na prestação incidental espontânea de caução não devam ser observadas outras regras da secção em que se insere.
       Por outro lado a omissão daquela exigência no artigo 988º do Código de Processo Civil não significa necessariamente que na prestação incidental espontânea de caução não seja exigível do requerente a apresentação da certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem que pretende hipotecar para caucionar a divida quando, por meio de hipoteca, se proponha prestar caução.
       Desde logo cumpre ter em consideração que a norma que estabelece o incidente não é a do artigo 988º do Código de Processo Civil, a norma que estabelece incidente acha-se no artigo 990º, n.º 1, do Código de Processo Civil, e esta não exclui a aplicação de alguma outra regra da secção em que se insere para obter a cabal e adequada regulamentação do incidente, antes nela se determina que o «disposto nos artigos anteriores é também aplicável quando numa causa pendente haja fundamento para uma das partes prestar caução a favor da outra».
       Sendo assim nada obsta e tudo aconselha à aplicação do disposto no artigo 986º do Código de Processo Civil no incidente.
       Efectivamente não há duvida que oportunamente no incidente, tal como na acção, a caução deve ser julgada prestada e, sendo assim, logicamente também só se deve julgar prestada depois de efectuado o depósito ou a entrega de bens, ou averbado como definitivo o registo da hipoteca ou consignação de rendimentos, ou após constituída a fiança.  
       Assim, porque no incidente a caução deve ser julgada prestada depois de averbado como definitivo o registo da hipoteca, se evidencia que na prestação incidental espontânea de caução é exigível que o obrigado à prestação caução, o requerente, apresente a certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem que pretende hipotecar para caucionar a divida quando, por meio de hipoteca, se proponha prestar caução.
       Por outro lado a apresentação da certidão no incidente igualmente cumpre a exigência legal de protecção do credor: a certidão é não só útil para a demonstração e apreciação da idoneidade da garantia, como também é útil para que o registo da hipoteca convertido em definitivo conserve a prioridade que tinha como provisório.
       Certamente, por isso, sempre foi exigida a sua apresentação no incidente em causa, o requerente «se oferecer caução por meio de hipoteca, há-de juntar certificado do registo provisório»[2], aliás já se entendeu[3] que com o Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12 de Dezembro, não se pretendeu fazer qualquer alteração neste campo.
       Deste modo, ao contrário do pretendido pela recorrente, a exigência da apresentação dessa certidão não deriva de qualquer interpretação correctiva, mas antes de interpretação meramente declarativa.
       Assim, nos termos dos artigos 990º, n.º 1, 988º, n.º 1, 982º, n.º 3, 986º do Código de Processo Civil, conclui-se que no incidente de prestação espontânea de caução, caso o requerente ofereça caução por meio de hipoteca, é indispensável a apresentação, com o requerimento inicial, da certidão do respectivo registo provisório e dos encargos inscritos sobre o bem a que respeita a hipoteca.
       No regime processual anterior à reforma introduzida pelo referido Decreto-Lei entendia-se que a falta de documentos que deviam acompanhar a petição, por força da lei ou por serem indispensáveis à prova de um pressuposto essencial da acção, determinava, nos termos do então disposto no artigo 477º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a prolação de despacho convidando a parte a apresentar o documento[4].
       Actualmente para essa situação estabelece-se, no artigo 508º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que o tribunal deve convidar a parte a apresentar documentos essenciais e nestes compreendem-se, pelo menos, aqueles que a lei expressamente exige que acompanhem o articulado[5].
       Sendo assim conclui-se que no incidente de prestação espontânea de caução, o requerente, caso ofereça caução por meio de hipoteca e omita a apresentação, com o requerimento inicial, da certidão do respectivo registo provisório e dos encargos inscritos sobre o bem a que respeita a hipoteca, deve ser convidado a apresentar tal documento.
       Nos autos a recorrente apresentou-se a oferecer a prestação de caução por meio de hipoteca sobre o identificado imóvel, mas não apresentou certidão do respectivo registo provisório e dos encargos inscritos sobre o bem, seguiu-se, após a produção da contestação, a decisão recorrida, exclusivamente fundada naquela omissão, sem que antes a questão tivesse sido suscitada oficiosamente ou por iniciativa das partes.
       Contudo esta decisão não incorre em infracção ao disposto no artigo 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil, pois que decorre da omissão do cumprimento da expressa exigência legal da apresentação da certidão em apreço.
      Sucede simplesmente que se omitiu o despacho a convidar a recorrente a apresentar a certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem a que respeita a hipoteca e que deveria ter sido proferido, de acordo com o princípio decorrente dos artigos 463º, n.º 1, e 508º, n.º 2, do Código de Processo Civil, antes da decisão recorrida.  
       E tal despacho ainda mais se justifica quando se pondere que a decisão recorrida foi exclusivamente fundada na falta de apresentação da certidão, que essa falta nem foi apercebida pelos requeridos para impugnarem o requerimento inicial, que os requeridos nos artigos 3º e 4º da oposição referem que tanto quanto puderam apurar o imóvel em questão é propriedade da executada e que sobre o mesmo não incidem ónus ou encargos, pelo que aceitam a prestação de caução por meio de hipoteca sobre o imóvel, e que a presentação da certidão poderá ainda estar em tempo para satisfazer os interesses dos exequentes e executada, respectivamente credores e titular da obrigação a caucionar.
       Não acedendo a recorrente ao convite, então se justificará o indeferimento.
       Resumindo, no incidente de prestação espontânea de caução o requerente, caso ofereça caução por meio de hipoteca, deve apresentar, com o requerimento inicial, a certidão do respectivo registo provisório e dos encargos inscritos sobre o bem a que respeita a hipoteca e caso omita essa apresentação deve ser convidado a apresentar tal documento.

       III- Decisão
       Pelo exposto, dando provimento ao recurso, revoga-se a decisão recorrida para que se profira despacho a convidar a requerente do incidente a apresentar, no prazo que for marcado, a certidão do registo provisório da hipoteca e dos encargos inscritos sobre o bem a que respeita a hipoteca com prosseguimento da subsequente legal tramitação.
       Sem custas: artigo 2º, n.º 1, al. g), do Código das Custas Judiciais.  
       Processado em computador.

Lisboa, 15 de Dezembro de 2009

José Augusto Ramos
João Aveiro Pereira
Manuel Marques
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[1] Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume II, 3ª edição, pg. 145.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume II, 3ª edição, pg. 167.
[3] Vd. Ac. R.P., de 14/2/2006, processo n.º 0620384, www.dgs.pt.
[4] Vd. Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 1984, pg. 251.
[5] Vd. Lebre de Freitas, Montalvão Machado, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pg. 351.