JUSTO IMPEDIMENTO
Sumário

I - Em sintonia com a jurisprudência entendemos que, embora o actual art. 146º nº 1 do C.P.Civil o não diga expressamente, à semelhança do que aí se estatuía na anterior redacção, para que ocorra justo impedimento é necessário que, em consequência do obstáculo, o acto não possa ser praticado por mandatário. Tratando-se de não entrega de motivação de recurso, por não ter sido tempestivamente feita, terá de alegar-se e provar-se que não pudera ser feita por outro advogado.
II - Assim, não se verificará justo impedimento se, apesar de um acontecimento, normalmente imprevisível, houver possibilidades, usando a diligência normal, de o acto ser praticado pela parte ou pelo mandatário. O mesmo é dizer, se puder ser praticado por outro advogado, no qual possa substabelecer o mandatário impedido ou que a parte possa entretanto mandatar para o efeito.
III - Não colhe a alegação da mandatária de que não contactou outro colega porque convinha ser ela própria a praticar o acto, pois era ela que melhor conhecia o processo, defendendo de forma mais eficaz os interesses das suas constituintes. Ninguém é insubstituível, nem a lei permite a derrogação de qualquer prazo peremptório à espera que um mandatário da parte se restabeleça para que o processo prossiga os seus termos. O acto é da parte, o advogado é apenas representante desta. Quando o advogado escolhido não está em condições de exercer o mandato, a parte tem de diligenciar pela escolha de outro que o esteja, caso aquele não tome a iniciativa de substabelecer noutro colega de profissão. O processo não pode ficar indefinidamente parado à espera que o mandatário impedido, por doença, se restabeleça, o que poderia demorar meses ou mesmo anos, com manifesto prejuízo para a justiça e os interesses dos cidadãos envolvidos no respectivo processo e, consequentemente, para a segurança da ordem jurídica globalmente considerada, protelando indefinidamente o trânsito em julgado das decisões proferidas ou ressuscitando causas pressupostamente há muito transitadas em julgado.

Texto Integral

Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO:
1. Pelo 3.º Juízo Criminal de Oeiras e após julgamento perante tribunal singular, foi proferida sentença em 9 de Julho de 2008, na qual, com relevância para o presente recurso, foi decidido:
“ …
III - condenar a arguida F… P… pela prática, em autoria material, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, previstos e punidos pelo disposto no artigo 143°, n.° 1, do Código Penal. nas penas de 150 (cento e cinquenta) e 90 (noventa) dias de multa, ambas à taxa diária de € 15,00 (quinze euros);
Como pena única resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares atrás referidas, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de € 15,00 (quinze euros);
IV - condenar a arguida no pagamento das custas do processo crime, cuja taxa de justiça se fixa em 5 UCs, bem como no pagamento acrescido de 1% nos termos do art. 13°, n°3 do Decreto Lei n.° 423/91, de 30 de Outubro, de procuradoria que se fixa no mínimo;

VI - Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante S… A… contra a arguida/demandada F… P… e, em conformidade, condená-la no pagamento da quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais causados, absolvendo-a do restante peticionado;
VII - Julgar improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante M… E… contra a arguida/demandada F… P… e, em conformidade, absolvê-la do peticionado;
VIII — Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil formulado pelo Hospital S… contra a arguida F… P… e, em conformidade, condenar a arguida no pagamento de € 56,53, absolvendo-a do restante peticionado;
IX - Condenar demandantes e demandadas civis nas custas dos pedidos cíveis formulados, na proporção dos respectivos decaimentos — cfr. artigo 446° do CPC, ex vi do artigo 523° do CPP.”

Dessa decisão só a arguida F… P… interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo este, por acórdão de 4 de Março de 2009, julgado procedente o recurso, nos seguintes termos (transcrição do correspondente dispositivo):
“…
III - Revoga-se a decisão proferida pelo tribunal "a quo", designadamente na parte que determinou a condenação da arguida F… P… pela prática de dois crimes, bem assim como no pagamento de quantitativos monetários a título indemnizatório, passando a parte dispositiva relativa a esta arguida, a ter a seguinte redacção:
Absolve-se a arguida F… P… da prática, em autoria material, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, previstos e punidos pelo disposto no artigo 143°, n.° 1, do Código Penal, pelos quais vinha pronunciada;
Julga-se improcedente por não provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante S… A… contra a arguida/demandada F… P… que, em conformidade, vai dele absolvido.
Julga-se improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil formulado pelo Hospital S… contra a arguida/demandada F… P… e, em conformidade, absolve-se a mesma do peticionado.
No demais, mantém-se a decisão recorrida.”

Desta decisão foi a ilustre mandatária das demandantes S… A… e M… E… notificada por carta remetida em 5/03/2009.
Não tendo sido interposto qualquer recurso no prazo legal, foi o processo devolvido pelo Tribunal da Relação ao tribunal recorrido.
Porém, em 4/05/2009, as demandantes S…A… e M… E… apresentaram neste Tribunal da Relação requerimento através do qual pretendem interpor recurso para o STJ, invocando previamente a ocorrência de justo impedimento, o que determinou nova remessa do processo para este tribunal de 2.ª instância.
Por despacho de 27/05/2009, da Exm.ª relatora do acórdão desta Relação de 4/03/2009, foi ordenado que o processo regressasse ao tribunal de 1.ª instância, “para aí se decidirem as questões pelas requerentes suscitadas”.
De novo os autos no 3.º Juízo Criminal de Oeiras, foi então proferido o seguinte despacho, em 15/09/2009, conhecendo do invocado justo impedimento:
“…
Inconformada com a decisão, F… P… interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Foi proferido por este Tribunal, em 4 de Março de 2009, douto acórdão que … decidiu revogar a decisão proferida pelo tribunal de Oeiras, …
Arguidas e demandantes presumiam-se notificadas deste acórdão, através dos seus Ilustres mandatários, em 10 de Março de 2009.
Em 4 de Maio de 2009, M… E… e S… A… interpuseram requerimento de recurso daquela decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, invocando justo impedimento.
Em suma e quanto a este incidente, consideram as recorrentes que foram notificadas daquele recurso em 9 de Março (afastando assim a presunção da notificação).
Contudo, prosseguem, antes de precludido o prazo de recurso previsto no artigo 411° do CPP, a Il. Mandatária das recorrentes adoeceu, ficando impossibilitada de trabalhar desde o dia 26/03/2009, conforme cópia digitalizada de atestado que juntam a fls 1323.
Esse atestado previa uma duração de doença de 21 dias ou seja até ao dia 16/04/2009, inclusive.
Nesse dia 16 de Abril, a sua mandatária ainda não se encontrava em "condições" de exercer a sua actividade laboral, pelo que "lhe foi entregue outro atestado, justificando a sua ausência por mais de 15 dias, ou seja até ao p.p. dia 30 de Abril". Atestado de que juntam cópia digitalizada, a fls 1324.
"Durante esse período, a sua mandatária não compareceu no seu escritório nem teve condições de exercer a sua actividade, pelo que não pode cumprir com o aludido prazo de 20 dias".
E só naquele dia 4 de Maio, por ser o primeiro dia útil após o dia 30 de Abril é que a Mandatária das recorrentes voltou ao seu escritório e começou a exercer a sua actividade profissional.
Assim, as recorrentes requerem seja declarado o justo impedimento da sua mandatária e que o recurso seja considerado tempestivo.
O Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se, a fls 1334 e pelos motivos ali expostos, no sentido de que o recurso fosse considerado tempestivo, por haver justo impedimento.
A arguida F… P…, pelo contrário, pronuncia-se a fls 1344 no sentido da extemporaneidade do recurso, por não se verificarem os pressupostos do justo impedimento.
Posto isto e atento o decidido a fls 1330, compete a este Tribunal decidir do incidente e da tempestividade, (ou não) do recurso.
Observados os fundamentos aludidos pelas recorrentes e esmiuçado o circunstancialismo factual supra descrito, verifica-se que não estão reunidos os pressupostos do justo impedimento como bem defende a arguida F… P….
Prevê o artigo 145°, n° 5 do Código de Processo Penal, a prática de actos processuais fora de prazos peremptórios, nos termos estabelecidos pelo artigo seguinte (146.º).
Este artigo 146°, n° 1 do Código de Processo Civil, na redacção conferida pelo Decreto Lei 125/98, de 12 de Maio dispõe: "Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto".
O artigo 107° do Código do Processo Penal contempla a possibilidade da prática de actos fora de prazos, desde que provado o justo impedimento e mediante autorização do juiz, garantido o contraditório.
Especificamente, o artigo 107° n° 2 prevê que "Os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade referida no número anterior, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento", dispondo-se no n° 3 que "O requerimento referido no número anterior é apresentado no prazo de três dias, contado do termo do prazo legalmente fixado ou da cessação do impedimento.".
Assim, é necessário procurar o conceito de justo impedimento no CPC.
Como se explica no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7/03/1995, proferido no processo n° 86 784, in BMJ 445, pág. 390, "a verificação do justo impedimento previsto no artigo 146° n° 1 do Código de Processo Civil supõe os seguintes requisitos: " - Um evento normalmente imprevisível, isto é, não susceptível de ser previsto pela maioria das pessoas; - Evento estranho à vontade das partes, entendendo como parte tanto o sujeito da relação processual como o seu mandatário; - Impossibilidade de praticar o acto, directamente ou por mandatário, mesmo usando da devida diligência.".
Por alteração legislativa operada após ter sido lavrado este Acórdão, deixou de se fazer qualquer exigência quanto à imprevisibilidade do impedimento (o primeiro requisito apontado) o que não assume qualquer relevância para o tratamento jurídico da questão, nem afecta a Jurisprudência citada pela arguida F... P....
As recorrentes não requereram a produção de qualquer prova que não seja a documental, que se resume à apresentação das cópias dos atestados.
Ora, analisado o exposto pelas recorrentes e o teor das referidas cópias dos atestados (não se alcançando porque é que não foram, como deviam ter sido, juntos os originais[1]) constata-se o preenchimento dos dois primeiros requisitos expressos pelo Acórdão do STJ, mas não se verifica o último.
De facto, nada é alegado quanto à impossibilidade da Il. Mandatária das recorrentes contactar as suas constituintes ou substabelecer os poderes que foram por esta conferidos, noutro seu colega ou, sequer, de praticar ela própria o acto.
Pelo contrário, não é referida naqueles atestados, cujas cópias não estão certificadas, qual a patologia que afectava a Il. Mandatária apenas se referindo que esta estaria impedida de comparecer no seu local de trabalho pelo período previsível de 21 dias, a que vieram acrescer mais um período previsível de 15 dias.
O impedimento, para ter os efeitos previstos no artigo 146° do CPC, tem que ser grave e absoluto, impedindo a parte, quer directamente, quer através do seu mandatário de praticar o acto ou de, diligentemente, praticar outros que o salvaguardem.
E tem que ter carácter de absoluta excepcionalidade, não se compadecendo a segurança jurídica do trânsito em julgado com qualquer vicissitude ligada à saúde ou bem estar dos senhores mandatários das partes, por menos grave que ela seja[2].
Assim, a doença, para ser impeditiva, tem que ser súbita e grave e nada disso é alegado ou demonstrado pelas recorrentes.
Registe-se que não é alegada, sequer, a gravidade do estado de saúde da Il. mandatária ou das suas consequências, porquanto se afirma no requerimento que esta "ainda não se encontrava em condições de exercer a sua actividade laboral, pelo que lhe foi entregue, outro atestado, justificando a sua ausência por mais de 15 dias, ou seja até ao p.p. dia 30 de Abril".
O teor da cópia do segundo atestado apresentada aponta apenas para um período previsível de doença de 15 dias, nada se atestando quanto à efectiva duração da doença e do estado patológico que, alegadamente, impedira a Ilustre mandatária das recorrentes/demandantes, por mais de um mês, de praticar qualquer acto relacionado com aquele mandato.
Não tendo sido demonstrada a impossibilidade de elaborar a peça processual em causa, mas tão pouco a impossibilidade de comparecer no seu local de trabalho e não tendo sido junto, como prova, documento autêntico (mas apenas cópias não certificadas), não se verificam os pressupostos que levaram o STJ, em acórdão de 29-04-2004, proferido no processo n.° 04B4800 (vide www.dgsi.pt), a decidir que "deve o Tribunal, antes de decidir a questão do justo impedimento, obter informações complementares sobre se a doença incapacitava para tal trabalho".
Por outro lado, não se alega, nem se adivinha dos autos, que a peça processual ora apresentada com o requerimento de justo impedimento não podia ser elaborada pela Il. Mandatária ou que esta estivesse incapacitada de contactar as suas constituintes e de substabelecer num seu colega a elaboração da peça. Nem tão pouco é alegado ou demonstrado que a Il. Mandatária estava impedida de requerer a prorrogação do prazo em obediência ao previsto no artigo 107°, n° 3 do CPP.
Beneficiou a Il. Mandatária de prazo suficientemente longo para a prática de um destes actos.
Ademais, cessando o período provável de doença no dia 30 de Abril, nada obstava a que, pelo menos nessa data, requeresse a prorrogação do prazo, oferecendo desde logo as provas que dispusesse, não se compreendendo como é que, após prazo de quase dois meses sobre a notificação da decisão judicial que pretendia pôr em crise, carecia de mais um fim de semana alargado[3] para a prática de tal acto que a normal diligência impunha.
Conferir o prazo em causa para a elaboração do recurso, atendendo à falta de prova cabal sobre o impedimento e ao que fica dito, corresponderia à postergação injustificável do princípio da segurança das decisões judiciais e violaria o disposto no artigo 146°, n° l do CPC e no artigo 107°, n° 2 e 3 do CPP.
Razão pela qual, decido ser de improceder a alegação de justo impedimento, rejeitando a prática do acto processual fora do prazo preclusivo previsto no artigo 411° do CPP.
E determino, por tal decisão acarretar a extemporaneidade do acto que as recorrentes quiseram praticar, o desentranhamento do requerimento de recurso, após trânsito.
Custas pelas recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC's.
Notifique.”

Não se conformando com tal decisão, recorreram as demandantes para este Tribunal, assim concluindo:
“A) Em 9 de Julho de 2008 foi proferida Douta Sentença referente aos presentes autos condenando a arguida F… P… pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física simples e no pagamento de uma indemnização à ora recorrente S… A… no valor de € 4.000,00 (quatro mil euros);
B) Em 11 de Setembro de 2008, não se conformando com a referida sentença, a arguida F… P… interpôs recurso para este Venerando Tribunal da Relação;
C) Desse recurso foi proferido Douto Acórdão, o qual alterou a matéria de facto dada como não provada e revogou a decisão proferida na parte em que condenou a arguida F… P…;
D)  Desse Douto Acórdão foram as ora Recorrentes notificadas, na pessoa da sua mandatária, no p.p. dia 9 de Março, tendo as ora recorrentes até 30 de Março para apresentarem novo recurso;
E) No dia 26.03.2009, a sua mandatária ficou doente e impossibilitada de se mexer e andar devido a problemas ao nível da coluna cervical;
F) Pela sua médica assistente foi lhe recomendado descanso absoluto;
G) Até ao dia 30 de Abril a sua mandatária não se encontrava em condições de se movimentar, mantendo-se o seu estado de saúde inalterado, agora com um agravamento: a mesma tinha padecido ainda de uma gastroenterite;
H) Foram-lhe entregues 2 atestados que comprovavam o seu estado de saúde;
I)    Durante todo esse período a sua mandatária não compareceu no seu escritório (facto testemunhado pelos seus Colegas de escritório) nem teve condições de exercer a sua actividade, urna vez que não podia se movimentar;
J)   Toda a documentação do seu processo estava no seu gabinete, além de todo o material de apoio (códigos, doutrina e jurisprudência), pelo que não pode cumprir com o aludido prazo de 20 dias;
K) Só no dia 4 de Maio, 1 dia útil seguinte ao do dia 30 de Abril é que pôde cumprir com a apresentação do respectivo recurso, alegando desde logo o justo impedimento para a prática extemporânea do respectivo acto;
L) O Douto Tribunal a quo julgou improcedente o justo impedimento, por considerar que os dois primeiros requisitos (evento normalmente imprevisível e evento estranho à vontade das partes) se encontravam preenchidos, mas o terceiro requisito não, uma vez que não tinha sido alegado nenhum facto que provasse que a mandatária se encontrava impedida de contactar as suas constituintes ou de substabelecer num outro colega ou de ela própria praticar o acto;
M) A relação cliente/advogado baseia-se numa relação de confiança que é conquistada ao longo do processo que os une quase como um laço familiar
N) Trata-se de um processo crime que corre termos desde o ano 2002, o seu julgamento teve 6 sessões (todas gravadas) e foram ouvidas, além das arguidas/assistentes, inúmeras testemunhas arroladas por ambas as partes;
O) Perante a complexidade do processo em termos de intervenientes e de duração, seria difícil outro Ilustre Advogado conseguir recorrer dessa decisão com os mesmos conhecimentos factuais e circunstanciais como a mandatária das recorrentes (que o foi desde o início do processo), como também o era, para as recorrentes, confiar noutro ilustre Advogado que nada saberia sobre todo o circunstancialismo envolvente e pouco tempo tinha para se inteirar de tudo;
P) A mandatária das recorrentes considerou que os atestados médicos seriam prova idónea, cabal e suficiente para comprovar o seu estado de saúde;
Q) O Douto Tribunal a quo baseou a fundamentação acima referida no douto Acórdão proferido em 29-04-2004 pelo STJ (processo n-º 04B4800), pois o mesmo refere que "deve o Tribunal, antes de decidir a questão do justo impedimento, obter informações complementares sobre se a doença incapacitava para tal trabalho";
R) Se o Douto Tribunal a quo considerava a prova junta insuficiente por não demonstrar qual a patologia que afectava a mandatária das recorrentes e os atestados médicos apenas referirem um período previsível, deveria ter proferido despacho a ordenar uma prova complementar;
S) Não se trata de um mero bem estar da Sra. Advogada, mas sim uma doença súbita e grave que quase a impossibilitava de sair da cama;
T) Conforme refere o preâmbulo do DL 131/2009 de 1 de junho, os advogados que exercem uma profissão liberal (como é o presente caso) não gozam de certos direitos e regalias que a generalidade dos cidadãos tem. E este é um desses exemplos;
U) O indeferimento foi proferido sem antes o Douto Tribunal a quo ter tomado as diligências necessárias para aferir se o justo impedimento foi ou não correcta e justamente alegado;
V) O douto Tribunal a quo refere também que a mandatária das recorrentes beneficiou ainda de mais um fim de semana alargado mas, na realidade, a mandatária praticou o acto em causa (recurso para o STJ) logo no 1.º dia útil seguinte ao da cessação do justo impedimento (n 2 do art. 107 do C.P.P.);
W) O Douto Tribunal a quo não aplicou correctamente o prescrito nos arts. 146 do C.P.C. e 107.º,  ns 2 e 3 do C.P.P. e constante da nossa Douta jurisprudência;
X) Pelo exposto deverá ser o Justo Impedimento considerado procedente por provado, e, em consequência, ser o Douto Despacho ora recorrido revogado por não ter atendido ao previsto, decretando-se o recebimento do recurso pelo mesmo rejeitado.
No entanto, V. Exas., Venerandos Desembargadores, farão, como sempre, a acostumada JUSTIÇA”

Responderam ao recurso o Ministério Público e a arguida F… P….
- o primeiro, concluindo no sentido de que deve ser considerado que inexistiu justo impedimento e que o douto despacho recorrido prolatou a decisão correcta;
- a segunda, pronunciando-se pela improcedência do recurso, concluiu do seguinte modo:
a) O impedimento, para ter os efeitos previstos no art.º 146 do CPC, tem de ser súbito e tão grave que impossibilite a parte, quer directamente quer por intermédio do seu mandatário, de praticar o acto ou, no caso de doença do mandatário, se esta for súbita e tão grave que o impossibilite, em absoluto, de praticar o acto, avisar o constituinte ou substabelecer o mandato;
b) Quem alega o justo impedimento na prática atempada de qualquer acto processual, tem de alegar os factos, e, obviamente, prová-los da impossibilidade de ter praticado o acto processual em causa no prazo peremptório devido.
c) As Recorrentes não fizeram qualquer prova, ou sequer alegaram factos, que permitam concluir que a doença invocada pela ilustre mandatária das recorridas a tenha impedido, em termos absolutos, de praticar o acto omitido, de avisar as recorrentes ou de substabelecer o mandato.
d)    Os factos agora alegados pelas Recorrentes em sede de recurso são matéria nova, não tendo sido alegados e, obviamente, também não tendo sido objecto de qualquer prova, no momento processual adequado: o requerimento em que se vem invocar o justo impedimento para a prática do acto.
e) Ora, os recursos, salvo melhor opinião, não se destinam a obter do Tribunal ad quem decisões sobre questões novas, salvo as de conhecimento oficioso e que não tenham sido já decididas.
f) O que manifestamente não acontece no caso dos autos.
         Peio exposto, e pelo que doutamente for suprido, deve o presente recurso ser considerado improcedente e mantida a douta decisão recorrida, com que se fará a costumada Justiça.

Admitido o recurso, no tribunal recorrido foi sustentado o despacho impugnado, tendo os autos subido a este Tribunal.
Deles teve “vista” o MP, tendo-se pronunciado a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta no sentido da improcedência do recurso, nos seguintes termos:
“A questão objecto do presente recurso é a de saber se constitui causa de justo impedimento a situação de doença da Exm.ª Mandatária das recorrentes, referindo o atestado apresentado que se considera impossibilitada de comparecer no seu local de trabalho.
A justeza da douta decisão proferida afigura-se-nos não merecer qualquer censura, na medida em que a Exm.a Mandatária apenas se encontrava impedida de se deslocar ao seu local de trabalho, nada sendo referido que a mesma teria que estar acamada, nem se verificou uma situação súbita e imprevisível de internamento, nada impedindo, por isso, que fosse manuscrito um simples pedido de alargamento do prazo e remetido pelo correio, bem como não existia da parte da Exm.a Mandatária a impossibilidade de contactar um colega que seguindo as suas orientações exercesse a defesa dos seus constituintes, pois não é alegado que estaria impossibilitada de falar ou mesmo de escrever.
Assim e sem necessidade de maior argumentação e tendo em conta o referido pelo Mm.° Juiz no douto despacho recorrido e pelo M.° P.° na Resposta apresentada, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, somos de parecer que deve ser confirmada a douta decisão proferida e, consequentemente, negado provimento ao recurso, sendo certo que assim se decidindo se fará inteira e habitual Justiça.”
Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, nada mais acrescentaram as recorrentes.
Efectuado o exame preliminar e obtidos os necessários vistos, foram os autos à conferência, cumprindo decidir.
***

II – FUNDAMENTAÇÃO:
1. Conforme Jurisprudência uniforme nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelos recorrentes a partir da respectiva motivação que fixam o objecto do recurso, sem prejuízo da apreciação de outras questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
A única questão a apreciar no presente recurso é a que respeita à tempestividade do recurso apresentado pelas ora recorrentes, para o STJ, do acórdão desta Relação proferido em 4/03/2009, mais concretamente, saber se se verifica o invocado justo impedimento que permita validar o recurso interposto desta decisão muito para além do prazo legal de 20 dias fixado no art. 411.º, n.º 1, do CPP.
É certo que o que está em causa é um dos pressupostos de admissibilidade do recurso em causa - a sua tempestividade -, conforme resulta do art. 414.º, n.º 2, do mesmo Código, cujo conhecimento compete, indubitavelmente, ao tribunal que proferiu a decisão de que se pretende recorrer - no caso, o(a) relator(a) do acórdão de 4/03/2009, proferido pela 3.ª secção desta Relação -, tornando possível a reclamação, para o Presidente do tribunal para o qual se pretende recorrer (no caso do STJ), nos termos do art. 405.º, do CPP, da decisão que eventualmente o não admitisse. Daí que, ao deferir-se à primeira instância o conhecimento “das questões pelas requerentes suscitadas” (cfr. despacho de 27/05/2009), tal conhecimento seja limitado, única e exclusivamente, à verificação ou não de justo impedimento, sem prejuízo da competência própria - da relatora da decisão recorrida - para prolação do despacho a que se refere o art. 414.º, n.ºs 1 a 3, do CPP.

2. Apreciando:

Nos termos do disposto no art. 107.º, n.º 2, do CPP, os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade judiciária, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento.
O requerimento em que este é invocado deve ser apresentado no prazo de três dias contado do termo do prazo legalmente fixado ou da cessação do impedimento (n.º 3, do mesmo artigo).
Pelas requerentes foi respeitado este prazo de três dias, tendo em conta a data invocada como sendo aquela em que terminou o impedimento.
Foram juntos aos autos dois atestados médicos comprovando a situação de doença da ilustre mandatária das requerentes, o primeiro com data de 26/03/2009 e atestando a doença “por um período previsível de vinte e um dias” e o segundo com data de 16/04/2009, atestando a doença “por um período previsível de quinze dias”. O termo previsível da doença seria pois, face a tais atestados médicos, em 30/04/2009, tendo o requerimento a invocar o justo impedimento sido apresentado no primeiro dia útil imediato: 4/05/2009.
O justo impedimento constitui uma verdadeira derrogação da regra da extinção do direito de praticar um acto pelo decurso de um prazo peremptório. O prazo para recorrer de uma decisão judicial tem natureza peremptória e o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto, nos termos do n.º 3 do art. 145.º, do CPC. “O acto poderá, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte” (n.º 4, da mesma norma).
Serve assim de válvula de escape ao sistema decorrente da extinção do direito de praticar o acto na sequência do decurso do prazo peremptório (António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Liv. Almedina, Coimbra – 1997, págs. 76- 77).
Nos termos do n.º 1 do art.º 146.º, do CPC, “Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”.
O conceito de justo impedimento assim configurado é bastante mais vasto do que o contido neste mesmo artigo na redacção antes de reforma de 1995.
À data da referida reforma introduzida pelo DL n.º 329-A/95 de 12/12, só era considerado justo impedimento o evento imprevisível (“normalmente imprevisível”, dizia a lei) estranho à vontade da parte que a impossibilitasse de praticar o acto por si ou por mandatário, o que levava a doutrina a restringir a respectiva previsão legal àquelas hipóteses em que «a pessoa que devia praticar o acto foi colocada na impossibilidade absoluta de o fazer, por si ou por mandatário, em virtude da ocorrência de um facto, independente da sua vontade, e que um cuidado e diligências normais não fariam prever» (cfr. RODRIGUES BASTOS, Notas ao CPC, 1°-321).
Com a Reforma do Código do Processo Civil introduzida pelo aludido DL n.º 329-A/95 “flexibiliza-se a definição conceitual de «justo impedimento» em termos de permitir a uma jurisprudência criativa uma elaboração, densificação e concretização, centradas essencialmente na ideia da culpa, que se afastou da excessiva rigidificação que muitas decisões, proferidas com base na definição constante da lei em vigor, inquestionavelmente revelam” – Vd. Relatório do referido Decreto-Lei.
O novo conceito de justo impedimento faz apelo, em derradeira análise, ao «meio termo» de que falava Vaz Serra (RLJ, 109.°-267): deve exigir-se às partes que procedam com a diligência normal, mas já não é de lhes exigir que entrem em linha de conta com factos e circunstâncias excepcionais.
A esse «meio termo» também já se referiu a nossa jurisprudência nomeadamente no Ac. RL de 22.03.2000 cujo sumário está disponível in www.dgsi.pt, “o justo impedimento só se verifica quando a pessoa que devia praticar o acto foi colocada na impossibilidade absoluta de o praticar, por si ou por mandatário, em virtude da ocorrência de um facto independente da sua vontade e que um cuidado e diligências normais não fariam prever”.
“Não basta que se trate de um evento não previsto pela parte, nem se exige que se trate de um evento totalmente imprevisível. O aceitável é o meio termo, devendo exigir-se às partes que procedam com a diligência normal, mas já não sendo de exigir-lhes que entrem na linha de conta com factos ou circunstâncias excepcionais” (neste mesmo sentido ver, ainda, os Ac. RL de 13.04.99 e RG de 23.06.2004, ambos in www.dgsi.pt.)
Segundo J. Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 1º, págs 257 e 258, citado no Ac. RL de 4.11.2004 in www.dgsi.pt), a nova redacção introduzida no n.º 1 do art.º 146.º visou a “flexibilização de modo a permitir abarcar situações em que a omissão ou o retardamento da parte se haja devido a motivos justificados ou desculpáveis que não envolvam culpa ou negligência séria”. Daí que, “à sua luz, basta para que estejamos perante o justo impedimento, que o facto obstacularizador da prática do acto não seja imputável à parte ou ao mandatário, por ter tido culpa na sua produção. Tal não obsta à possibilidade de a parte ou o mandatário ter tido participação na ocorrência, desde que, nos termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade”.
“Passa assim o núcleo do conceito de justo impedimento da normal imprevisibilidade do acontecimento para a sua não imputabilidade à parte ou ao mandatário… cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa”.
”Deixou, portanto a lei de fazer qualquer exigência a respeito da normal imprevisibilidade do evento, estranho à vontade da parte, para se centrar apenas na não imputabilidade à parte nem aos seus representantes ou mandatários pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto”.
Sobre o novo conceito de justo impedimento, escreveu-se ainda no Acórdão do S.T.J., de 17-07-02, P° 1.088, da 3ª Secção: ”É certo que actualmente, à luz do Art.° 146º, n.° 1, do CPC (…) o que releva decisivamente para a sua verificação, mais do que a ocorrência de um evento totalmente imprevisível ou em absoluto impeditivo, é que o evento que impediu a prática atempada do acto não seja imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, ou seja, que inexista culpa do sujeito requerente do acto, ou de seu representante ou mandatário, culpa essa a valorar “em consonância com o critério geral estabelecido no n.° 2 do Art.° 487.° do CC, e sem prejuízo do especial dever de diligencia e organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das causas”.
De tudo isto resulta que um evento previsível pode agora excluir a imputabilidade do atraso ou da omissão.
Contudo a parte interessada não pode beneficiar da excepcionalidade do conceito de justo impedimento quando tenha havido da sua parte negligência, culpa ou imprevidência. Se o evento era susceptível de previsão e ela se não acautelou contra a possibilidade da sua verificação, “sibi imputet”.
No que concerne à culpa, tal como na responsabilidade contratual, a mesma não tem de ser provada, cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa, isto é, a ocorrência de caso fortuito ou de força maior impeditivo (cfr. Art.º 146.º n.º 2 do CPC “a parte que alegar justo impedimento oferecerá logo a respectiva prova..” e art.º 799.º n.º 1 do C. Civil): “embora não esteja em causa o cumprimento de deveres, mas a observância de ónus processuais, a distribuição do ónus da prova põe-se nos mesmos termos” – Acórdão da Relação de Guimarães de 23.06.2004 in www.dgsi.pt
Ainda a propósito da culpa, Lopes do Rego refere que, decisivo para a verificação do justo impedimento é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário no excedimento ou ultrapassagem do prazo peremptório, sem prejuízo do especial dever de diligência e de organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das suas causas (Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil”, Almedina, pág. 125, citado no acórdão da RL de 4.11.2004).
Pode ler-se, a propósito da mesma temática, no Ac. do STJ de 9/7/91 (Proc. 488/91): “Quem alegue o justo impedimento terá que alegar, também, a sua impossibilidade de comunicação à parte, mandatário, ou outro advogado a quem fosse cometido o encargo de efectuar, imediatamente, a diligência em causa.
Em sintonia com a jurisprudência que julgamos unânime neste ponto, entendemos que, embora o actual art. 146º nº 1 do C.P.Civil o não diga expressamente, à semelhança do que aí se estatuía na anterior redacção, para que ocorra justo impedimento é necessário que, em consequência do obstáculo, o acto não possa ser praticado por mandatário. Tratando-se de não entrega de motivação de recurso, por não ter sido tempestivamente feita, terá de alegar-se e provar-se que não pudera ser feita por outro advogado.
Assim, não se verificará justo impedimento se, apesar de um acontecimento, normalmente imprevisível, houver possibilidades, usando a diligência normal, de o acto ser praticado pela parte ou pelo mandatário. O mesmo é dizer, se puder ser praticado por outro advogado, no qual possa substabelecer o mandatário impedido ou que a parte possa entretanto mandatar para o efeito.
Dito isto, vejamos o caso dos autos.
Decorrendo dos atestados médicos juntos aos autos que a ilustre mandatária das requerentes ficou doente – embora não se especifique qual a doença – no dia 26/03/2009, o que a impossibilitou de “comparecer no seu local de trabalho”, doença que se prolongou até 30/04/2009 e que determinou a junção do segundo atestado em 16/04/2009, aqueles documentos não provam que a mesma mandatária esteve ininterruptamente  - desde 26/3 e até 30/04 – impossibilitada de comunicar, quer com as mandantes, dando-lhes a conhecer a situação e permitindo-lhes, caso assim o entendessem, de outorgarem procuração a outro causídico,  quer com qualquer outro colega no qual pudesse substabelecer o mandato para a prática do acto omitido. A doença invocada no requerimento em análise – da coluna - , ainda que pudesse ter sido dolorosa e até incapacitante no ou nos primeiros dias, tem tratamento adequado – pelo menos não se invoca que o não tivesse - , não sendo crível nem estando minimamente indiciado que a ilustre mandatária das recorrentes tivesse estado absolutamente incapacitada para efectuar aquelas diligências por todo o período em que se manteve a doença, sendo certo que, pelo menos no dia 16/04/2009 se deslocou de novo ao médico para obter o segundo atestado.
Não colhe a alegação de que não contactou outro colega porque convinha ser ela própria a praticar o acto, pois era ela que melhor conhecia o processo, defendendo de forma mais eficaz os interesses das suas constituintes. Ninguém é insubstituível, nem a lei permite a derrogação de qualquer prazo peremptório à espera que um mandatário da parte se restabeleça para que o processo prossiga os seus termos. O acto é da parte, o advogado é apenas representante desta. Quando o advogado escolhido não está em condições de exercer o mandato, a parte tem de diligenciar pela escolha de outro que o esteja, caso aquele não tome a iniciativa de substabelecer noutro colega de profissão. O processo não pode ficar indefinidamente parado à espera que o mandatário impedido, por doença, se restabeleça, o que poderia demorar meses ou mesmo anos, com manifesto prejuízo para a justiça e os interesses dos cidadãos envolvidos no respectivo processo e, consequentemente, para a segurança da ordem jurídica globalmente considerada, protelando indefinidamente o trânsito em julgado das decisões proferidas ou ressuscitando causas pressupostamente há muito transitadas em julgado.
Em suma, não está demonstrado que, apesar da doença da ilustre mandatária das recorrentes verificada a partir do dia 26/03/2009, as mandantes tivessem ficado na impossibilidade de praticarem o acto no respectivo prazo legal – que só terminou no dia 30/03/2009, podendo ter sido praticado, com multa, até ao dia 2/04/2009 - , ou, pelo menos, que não pudesse o mesmo acto ter sido praticado muito antes da data em que o foi (4/05/2009).
Daí que, seja de confirmar o despacho recorrido ao decidir pela improcedência da alegação de justo impedimento e pela rejeição da prática do acto processual fora do prazo preclusivo previsto no art. 411.º, do CPP, e, por tal decisão acarretar a extemporaneidade do acto que as recorrentes quiseram praticar, determinou o desentranhamento do requerimento de recurso, após trânsito.

Apesar do decidido quanto à questão do justo impedimento - o que conduz impreterivelmente à inexistência de recurso validamente interposto -, para que não subsistam quaisquer dúvidas, ainda que infundadas, quanto à justiça da decisão de não permitir ao STJ conhecer do recurso interposto, não resistimos à tentação de esclarecer as recorrentes do seguinte: ainda que o recurso fosse considerado tempestivo, por verificado o invocado justo impedimento, jamais poderia o mesmo ser admitido, por ser irrecorrível, para o STJ, a decisão impugnada, quer na parte criminal[4], quer na parte cível, face ao disposto nos arts. 400.º, n.º 1 al. e) e n.º 2 (já que o valor do decaimento, que é de € 4000,00 relativamente à recorrente S…A…, é inferior a metade da alçada da Relação, enquanto que relativamente à recorrente M… E… não há decaimento, já que nenhuma delas recorreu da decisão de 1.ª instância) e 432.º, al. c), ambos do CPP.
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III – DECISÃO:
Pelas razões e nos termos acima expostos, julga-se improcedente o presente recurso das assistentes e demandantes M… E… e S… A…, confirmando-se a decisão recorrida
Custas pelas recorrentes, com taxa de justiça, individual, que se fixa em quatro (4) UC.
Notifique.

Lisboa,  09 de Março de 2010

(Elaborado em computador e revisto pelo relator, o primeiro signatário – art. 94.º, n.º 2, do CPP).
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[1]  Pois que aquele que alega justo impedimento deve, sob pena de indeferimento, oferecer logo a respectiva prova. Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 29/09/93, Processo 85185, Ia Secção e de 1/06/94, e P° 84490, 2a Secção — vide www.dgsi.pt.
[2]  E atente-se que, no caso, as recorrentes apenas têm legitimidade para recorrer na posição de demandantes, visto que, no que toca à decisão que as afectaria como arguidas, a decisão já se tornou definitiva, não podendo ser afectada através de recurso para o STJ. Deste modo, não estão em causa especiais garantias de defesa dos arguidos em processo penal.
[3]  Por estar junto ao feriado do dia 1° de Maio.
[4]  Ver, quanto a este ponto, o Ac. do STJ de 10/09/2009, proferido no Proc. n.º 433/09.7YFLSB (Recurso n.º 5297/09).