EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
ADJUDICAÇÃO
JUSTA INDEMNIZAÇÃO
DECLARAÇÃO DE UTILIDADE PÚBLICA
OCUPAÇÃO DE PRÉDIO
Sumário

I – A declaração de utilidade pública da expropriação é um acto nuclear do procedimento expropriativo e a adjudicação da propriedade depende de uma decisão judicial.
II - No plano objectivo, a declaração de utilidade pública releva, antes de mais, para a determinação da lei aplicável ao processo expropriativo e consequentemente para a fixação da justa indemnização.
III - Sem estar provada a existência de uma declaração de utilidade pública da expropriação não é possível, no âmbito de um processo de expropriação, adjudicar a propriedade do prédio ao expropriante pois aquela declaração é não só pressuposto necessário da expropriação como condiciona todo o processo expropriativo.
IV – A ocupação “via de facto”, abusiva, poderá fundamentar um pedido de indemnização; o que não pode é originar um processo de expropriação ao abrigo do art. 42º nº 2 al b) ou c) do Código das Expropriações.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório
“A” e “B” apresentaram contra o Município de Lisboa petição nos juízos cíveis de Lisboa e distribuída ao 3º Juízo, 1ª Secção, ao abrigo do art. 42º nº 2 al b) e c) do Código das Expropriações aprovado pela Lei 168/99 de 18/9, pedindo:
«se digne mandar notificar a entidade expropriante para, “ex vi” do nº 3 do art. 42º do Código das Expropriações se pronunciar, no prazo de 10 dias.
Mais requer que, caso não seja considerado justificado o atraso determine a avocação do processo expropriativo nº .../DGI/1996, ordenando a remessa dos elementos necessários à sua prossecução, no prazo máximo de trinta dias, sob a cominação ali prevista.».
Alegaram, em síntese:
- são proprietários do prédio urbano com a área 450 m2 sito na A..., freguesia da A..., Lisboa, concelho de Lisboa, descrito na ...ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa actualmente sob o nº ... e inscrito na matriz sob o art. ...º;
- o seu prédio foi ocupado pelo último troço construído sob o Eixo Norte-Sul, em Lisboa;
- a Câmara Municipal confirmou a ocupação do prédio dos requerentes pelo Eixo Norte/Sul no âmbito do processo expropriativo nº .../DGI/1996 e que era seu interesse adquirir a propriedade em causa;
- os requerentes têm direito à justa indemnização no montante de 675.000 €;
- não há consenso quanto ao valor da justa indemnização;
- em relação aos requerentes, o procedimento de expropriação desencadeado no ano de 1996 encontra-se parado há anos, por inércia da entidade expropriante em promover os seus termos, designadamente a arbitragem;
- o prédio já está ocupado pela via do Eixo Norte/Sul, a qual está aberta ao trânsito e em pleno funcionamento, sendo inviável a sua demolição ou destruição;
- nestes termos, a lei confere também aos interessados o direito de requerer a expropriação dos seus bens próprios (art. 42º nº 2 al c) do Código das Expropriações), tanto mais que a entidade expropriante não promoveu a arbitragem;
- daí que perante a inércia da entidade expropriante e dada a ocupação do prédio pela referida via, os interessados têm o direito de requerer que a constituição e o funcionamento da arbitragem se efectue no tribunal de comarca competente, mediante avocação do processo expropriativo.
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O Município de Lisboa pronunciou-se no sentido de não se ordenar as pretendidas remessa e avocação do processo expropriativo, alegando, em resumo:
- o prédio em questão foi objecto de processo expropriativo tendo o Município de Lisboa adquirido o mesmo por via de acordo, a “C”, “D”, “E”; “F” e “G” através de escritura de 30/3/2004 por 54.000,00 €;
- compete aos requerentes, em acção própria, deslindar com os expropriados, vendedores, a questão da titularidade do imóvel, que foi expropriado pelo Município de Lisboa e que foi destinado ao Eixo Norte/Sul;
- o Município de Lisboa não pode ser obrigado a pagar duas vezes o mesmo terreno (art. 37º 5 e 6 do C Exp);
- nem podem existir dois processos expropriativos sobre o mesmo prédio;
- inexistindo o processo expropriativo não pode ser remetido ao tribunal e muito menos, avocado.
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Notificados da resposta do Município de Lisboa, os requerentes vieram reiterar a sua pretensão, dizendo, em síntese:
- o prédio dos requerentes nada tem a ver com o prédio adquirido pelo Município de Lisboa, pois ambos têm artigos matriciais, descrições prediais, valores tributáveis, composições, confrontações e proprietários diferentes, sendo totalmente distintos e independentes um do outro;
- o prédio adquirido pelo Município de Lisboa corresponde à parcela nº 20 e sobre ele havia um ónus real;
- ora, sobre o prédio dos requerentes nunca incidiu qualquer ónus real;
- o prédio dos requerentes situa-se na parte superior de todas as parcelas assinaladas sob os nºs 20, 21, 22, 23, 24 e 45, ficando completamente fora dos seus limites;
- o prédio dos requerentes e os outros prédios foram destacados do descrito sob o nº ....
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Foi depois proferida decisão indeferindo o pedido de avocação do processo expropriativo, com estes fundamentos:
«Compulsados os autos, importa reter o seguinte:
- Os requerentes alegam que são proprietários do prédio urbano composto por barracão, com a área coberta de 120 m2 e logradouro de 330 m2, sito na A..., Letras D C, freguesia da A..., concelho de Lisboa, descrito na 5.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ... da dita freguesia.
- A Câmara Municipal de Lisboa adquiriu aos proprietários inscritos o prédio urbano sito na A... descrito na 5.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia da A..., por escritura pública de compra e venda celebrada em 30.03.2004 (vd. processo privativo n.º .../DPI/03).
Como se retira dos articulados apresentados pelas partes existe uma grande dificuldade na localização do prédio dos requerentes:
- Num primeiro momento, a Câmara Municipal considera que os dois prédios acima referidos são um apenas;
- Num momento posterior, a mesma entidade já não evidencia tantas certezas quanto à localização do(s) prédio(s).
Neste momento, podemos ter como certo o seguinte: não existem elementos que demonstrem que relativamente ao prédio dos requerentes foi iniciado sequer o processo de expropriação.
Ora, o pedido de remessa ou de avocação de processo expropriativo pressupõe a existência de um processo de expropriação iniciado e em curso.
Acontece que, no caso dos autos, nenhum acto do processo de expropriação foi praticado relativamente ao prédio dos requerentes:
- Não existe o acto de declaração de utilidade pública;
- Não existe posse administrativa;
- Não existem sequer negociações entre as partes que visassem a aquisição do prédio por parte da Câmara.
Cremos que a inexistência de processo expropriativo tem como consequência necessária a impossibilidade dos requerentes se socorrerem do mecanismo previsto no artigo 42.º do CE.
Não existindo processo de expropriação, não pode o tribunal solicitar a sua remessa ou a sua avocação.
Atento o que antecede, importa concluir que não estão preenchidos os pressupostos para a avocação do processo de expropriação.»
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Não se conformando apelaram os requerentes, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:
I – Ao contrário do que resulta do despacho recorrido de fls. 93 a 97, existe um acto de declaração de utilidade pública no âmbito do processo expropriativo nº .../DGI/1996 realizado pela Câmara Municipal de Lisboa, cuja avocação se requereu nos presentes autos.
II - O referido processo expropriativo é respeitante a um conjunto de várias parcelas que foram ocupadas pelo troço do Eixo Norte-Sul e a declaração de utilidade pública nele inserta tem por base uma pluralidade de interessados, nos quais se incluem os ora apelantes.
III - Conforme resulta da informação junta aos autos com n.º .../DPI-DAJ/08, de 07-05-2008, da Câmara Municipal de Lisboa, o processo E n.º .../DGI/1996, constitui o processo de instrução efectuado no âmbito do eixo viário fundamental Norte/Sul, e, no âmbito do processo de expropriação em causa foi elaborada a planta parcelar com os limites de terrenos e respectivas parcelas necessárias a construção da mencionada rodovia (planta n.º 96/121/02B, do DGI), cuja cópia está inserta no 2º volume do Proc. E n.º .../DGI/1996.
IV - Em tal planta está efectivamente inserido o prédio dos recorrentes.
V - No caso em apreço a posse administrativa existe, tanto mais que, os recorrentes já se encontram desapossados do seu prédio.
VI - Na verdade, através de ofícios da sua autoria (cfr. docs. n.ºs 19 e 21 do requerimento inicial), a Câmara Municipal de Lisboa, reconhece expressamente que o prédio dos recorrentes foi ocupado pelo Eixo Norte-Sul.
VII - O que, aliás, resulta inequivocamente demonstrado através das operações que executou no local mediante a colocação de um marco no limite extremo do prédio dos recorrentes com os dizeres “C.M.L.”, mediante a demolição do barracão e muro de vedação que existia no mencionado prédio e ainda mediante a colocação de rede malha-sol em todo o cumprimento do aludido prédio (cfr. docs. n.ºs 1 a 17 juntos com o requerimento inicial).
VIII - Mesmo que a posse administrativa não existisse, o que só por mera hipótese académica se admite, os seus elementos sempre poderia ser substituídos pelos elementos do cadastro, do registo e de outros existentes em arquivo da Câmara Municipal de Lisboa ou dos recorrentes.
IX - Acresce ainda que, ao contrário do que é referido no despacho recorrido de fls. 93 a 97 existiram previamente negociações entre as partes que visaram a aquisição do prédio dos recorrentes pela Câmara Municipal de Lisboa, as quais estão espelhadas e resultam inequivocamente dos docs. n.ºs 18 a 21 do requerimento inicial, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
X - O prédio dos requerentes foi efectivamente objecto de expropriação, não tendo tal factualismo sido sequer impugnado pelo Município de Lisboa na resposta que o mesmo apresentou nos presentes autos a fls _.
XI - De facto, foi a própria Câmara Municipal de Lisboa que, na sequência da exposição que lhe foi dirigida, em 31/10/2007, informou os ora recorrentes de que o seu prédio havia sido efectivamente ocupado pelo Eixo Norte/Sul, e, nessa sequência, solicitou-lhes a apresentação de uma proposta devidamente fundamentada para alienação do mencionado prédio ao Município de Lisboa (cfr. docs. n.ºs 19 e 21 junto ao requerimento inicial).
XII - No caso, a eventual ausência de determinados actos administrativos, ainda que relevantes, não é fundamento para negar aos recorrentes que já estão desapossados dos seus bens o direito ao prosseguimento da expropriação com vista ao recebimento da justa indemnização (cfr. neste sentido o sumário do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo 0536033, N.º do documento RP 200512070536033, de 07-12-2005, publicado in WWW.dgsi.pt /jtm.nst).
XIII - Considerar que por ausência de determinados actos administrativos, não existe processo expropriativo e, por isso, não se pode prosseguir com os actos subsequentes tendentes à fixação a indemnização, seria premiar a inércia da Câmara Municipal de Lisboa, aceitando que esta se pudesse prevalecer da falta de tais actos que lhe competia realizar.
XIV - Entendemos assim que, no caso sub judice, nada impede a pretendida avocação do processo de expropriação.
XV - Cremos, aliás, ser a que acima se expôs a interpretação correcta das normas do artigo 42° do Código das Expropriações.
XVI - Ao decidir da forma como o fez, violou o Tribunal «a quo», para além do mais, as normas contidas nos artigos 13º, n.º 3, 22º, 38º, n.º 1, 54º e 42º, n.ºs 1, 2, alíneas b) e c) e 3 do Código das Expropriações.
XVII - A presente situação é um dos casos mais injustos e gritantes em que se justifica plenamente a intervenção do Tribunal com vista a suprir a inércia da entidade expropriante.
XVIII - Por todo o exposto, deverá o despacho recorrido de fls. 93 a 97 ser revogado e substituído por outro que determine a avocação do processo expropriativo n.º .../DGI/1996 da Câmara Municipal de Lisboa, devendo o Tribunal recorrido promover a constituição e funcionamento da arbitragem de acordo com a Lei e a prossecução do procedimento até final.
*
O recorrido contra-alegou defendendo a confirmação do decidido.
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II – Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (art. 684º nº 3 e 685º A nº 1 do CPC), pelo que as questões a decidir são:
- se o prédio de que os recorrentes se arrogam proprietários foi expropriado pelo recorrido
- se deve ser ordenada a remessa ou a avocação do processo expropriativo ao abrigo do disposto no art. 42º nº 2 al b) e c) do Código das Expropriações aprovado pela Lei 167/99 de 18/9
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III – Fundamentação
A) Tendo em consideração os documentos juntos aos autos e o acordo das partes é de considerar assente a seguinte factualidade:
1 – Encontra-se registada na ...ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa através da Ap. 25 de 2/12/1992 a aquisição pelos ora recorrentes por compra a “H”, do prédio urbano descrito sob o nº .../... – Descrição em Livro: Nº ..., Livro nº: ... -, situado na A..., letras D.C., com a área total de 450 m2 – área coberta de 120 m2 e área descoberta de 330 m2 -, inscrito na matriz da freguesia da A... sob o nº ..., todo vedado por um muro com um portão para a A..., composto de barracão.
2 – Mais consta no aludido registo dessa Conservatória que o referido prédio foi destacado do prédio descrito sob o nº ....
3 – O prédio referido em 1 foi ocupado pela via do Eixo Norte-Sul.
4 – A Câmara Municipal de Lisboa executou ainda as seguintes operações:
a) colocação de um marco no limite extremo do prédio com os dizeres “CML”;
b) demolição do barracão e muro de vedação do mencionado prédio;
c) colocação de rede malha-sol em todo o comprimento do aludido prédio.
5 – Os recorrentes enviaram carta registada com aviso de recepção datada de 31/10/2007 à Câmara Municipal de Lisboa, que a recebeu, e cuja cópia consta como doc. 18 de fls. 26 a 34 destes autos que se dá aqui por reproduzida e onde comunicaram, além do mais:
«11 – Só através das notícias publicadas recentemente pelos órgãos de comunicação social, os m/constituintes tiveram conhecimento de que o seu prédio havia sido afectado para o último troço da via de trânsito do eixo norte-sul.
(…)
24 – (…) os m/constituintes nunca foram notificados, por qualquer meio, para o processo expropriativo em causa.
(…)
27 – (…) a entidade expropriante tomou a resolução de proceder à expropriação de um prédio registado a favor dos m/constituintes desde o ano de 1992, sem nunca os ter notificado para o processo em causa, o qual, segundo informação, entretanto obtida na autarquia, tem o nº .../DGI/1996.
31 - (…) a eventual declaração de utilidade pública (DUP) do prédio, a qual no caso se desconhece in totum, é também nula relativamente aos m/ constituintes, desde logo porque, dela nunca foram notificados, (…)
38 – Nesta conformidade, e, em face de todos os argumentos aduzidos, sou, a questionar a C.M.L. no sentido de saber se a mesma se predispõe a resolver extrajudicialmente a questão.
39 – Não obtendo resposta no prazo de 8 dias úteis, presumirei que o v/mutismo, como desinteresse em solucionar amigavelmente o problema, e, nesse caso, não restará outra alternativa aos m/constituintes, senão enveredar pela indesejável via litigiosa, socorrendo-se, para o efeito, do mecanismo previsto no artigo 42º, nº 2 alínea a) do Código das Expropriações.
(…)».
6 – A Câmara Municipal de Lisboa respondeu a essa carta em 3/1/2008 nestes termos:
«Assunto: Processo expropriativo referente ao último troço do eixo norte/sul, na freguesia da A..., concelho de Lisboa
Na sequência da exposição datada de 31/10/2007 que V. Exa remetera a este Departamento, informo que o prédio dos seus constituintes foi ocupado pelo Eixo Norte/Sul.
Assim, solicito a V. Exas se digne apresentar uma proposta devidamente fundamentada para alienação do mencionado prédio ao Município de Lisboa.».
7 – Em resposta, os recorrentes enviaram à Câmara Municipal de Lisboa um fax em 23/1/2008 com este teor:
«Acuso a recepção do s/ofício, datado de 03 de Janeiro p.p., (…)
De acordo com o mesmo, confirma-se pois que o prédio urbano pertencente aos m/constituintes foi de facto ocupado pelo Eixo Norte/Sul, por decisão da Câmara Municipal de Lisboa.
Decisão essa a que os m/clientes são completamente alheios, facto que a Câmara Municipal de Lisboa, certamente, não ignora.
Na exposição datada de 31/10/2007 que tive oportunidade de remeter aos v/serviços tive já o cuidado de apresentar uma proposta devidamente fundamentada para alienação do imóvel dos m/constituintes ao Município de Lisboa.
Nessa medida, questiono V. Exa no sentido de saber se o Município de Lisboa se predispõe a apresentar agora uma contraproposta tendo por base a exposição já apresentada?
(….)».
8 – Em 10/3/2008 a Câmara Municipal de Lisboa enviou aos recorrentes um fax com este teor:
«Assunto: Processo Expropriativo referente ao último troço do eixo norte/sul, na freguesia da A..., concelho de Lisboa
Em resposta ao fax remetido por V. Exa no passado dia 23 de Janeiro, esclarece-se que o prédio dos seus constituintes foi ocupado pelo eixo Norte/Sul, não por decisão da Câmara Municipal de Lisboa, mas antes, por decisão do Estado Português, encontrando-se o Município de Lisboa obrigado a adquirir os terrenos necessários à construção da mencionada rodovia de acordo com o traçado indicado pela Estradas de Portugal, EPE, tudo nos termos do protocolo celebrado entre ambos.
Por outro lado, na sequência do ofício nº .../DPI-DAJ/08, de 03-01-2008, remetido a V. Exa e atento o facto do eixo norte/sul ter sido executado sob o prédio dos seus constituintes, considera-se que a justa indemnização no âmbito de um processo expropriativo deverá ressarcir os prejuízos e não compensar os benefícios decorrentes.
Assim, informo V. Exa que o valor apresentado de € 1.500,00/m2 (mil e quinhentos euros/m2) não tem correspondência com qualquer aquisição feita por esta edilidade no local, pois, os valores para a zona cifram-se em montantes substancialmente inferiores.
Face ao exposto, solicita-se a V. Exa se digne fundamentar devidamente o valor de alienação proposto para o prédio dos seus constituintes, por forma a que este Município possa considerá-lo e encetar as diligências necessárias à sua aquisição por via do direito privado.».
9 – Em 07/05/2008 foi prestada, na Câmara Municipal de Lisboa a Informação nº .../DPI-DAJ/08 com o seguinte teor:
«Assunto: Resposta ao Departamento Jurídico no âmbito do Proc. nº .../08.5TJLSB do 3º Juízo, 1ª Secção da Comarca de Lisboa
Proc. E nº .../DGI/1996
Proc. E nº .../7ª /U1959 e Proc. Priv. Nº .../DPI/03
Em resposta ao Departamento Jurídico cumpre-me informar o seguinte:
O processo E nº .../DGI/1996, constitui o processo de instrução efectuada no âmbito do eixo viário fundamental Norte/Sul.
No âmbito do processo de expropriação foi elaborada a planta parcelar com os limites de terrenos e respectivas parcelas necessárias à construção da mencionada rodovia (planta nº 96/121/02B, do DGI), cuja cópia está inserta no 2º vo. Do Proc. E nº .../DGI/1996, cujo processo teve o devido acompanhamento por outro técnico que não o signatário.
A maioria das parcelas foram adquiridas por via do direito privado, onde se inclui a parcela nº 20 (Proc. Priv. Nº .../DPI/03 e Proc. E nº .../7ª/U/1959), a qual foi adquirida por escritura de compra e venda a “C” e outros, prédio este que se encontra delimitado a orla amarela na cópia da planta nº 03/152/02, do DPI.
Recentemente, o Dr “I”, advogado, em representação do Sr “A” e da Sra “B”, apresentou um requerimento onde alega que o Município de Lisboa se “apossou ilegitimamente” do prédio dos seus clientes, os quais nunca terão sido ouvidos no âmbito do processo expropriativo.
Subsequentemente, este Departamento questionou o Departamento de Infra-Estruturas relativamente à situação configurada e à localização espacial do prédio identificado pelos Requerentes (Doc. nº 5 da exposição apresentada pelos Requerentes), que elucidou que o prédio em causa está actualmente ocupado pelo eixo Norte-Sul.
Perante tal facto, este Departamento solicitou ao aludido mandatário a apresentação de uma proposta devidamente fundamentada para alienação do prédio ao Município de Lisboa, tendo em paralelo, averiguado em face das parcelas identificadas na planta parcelar acima referida, se o prédio em causa colidia com qualquer outro já adquirido.
Na verdade, constatou-se com a colaboração do DPI/DMRVE (Eng. “J”), que de facto, o prédio dos Requerentes colidia com a parcela nº 20 (Proc. E nº .../7ª/U/1959 e Proc. Priv. º .../DPI/03), supra identificada, motivo pelo qual, aqueles não terão sido considerados interessados no processo expropriativo.
(…)».
10 – Em 20/4/2000 a Câmara Municipal de Lisboa enviou a «“L”» o ofício nº ... conforme consta no Processo E nº ... 7ª U/1959 e Processo Privativo ... 7ª/U/03, com este teor:
«Assunto: Expropriação do Imóvel (Parcela 2...), com vista à execução do Eixo Norte/Sul – Lanço Padre Cruz/C.R.I.L
Para dar continuidade ao sistema viário da cidade, vai a Câmara, em conjunto com o I.C.O.R., concluir as obras do Eixo Norte/Sul – Lanço Padre Cruz/C.R.I.L, que constitui parte integrante da via fundamental que assegura a ligação entre vários pontos da cidade, com a Ponte 25 de Abril e a zona Oriental de Lisboa, bem como os novos eixos viários, nos quais se inclui a C.R.I.L.
A obra reveste carácter muito urgente, pelo que a Câmara Municipal de Lisboa encara requerer a declaração de utilidade pública da expropriação das propriedade necessárias à sua execução, entre as quais se inclui um prédio de que V. Exa é presumível proprietário, assinalado na planta em anexo.
Com vista à aquisição amigável da referida propriedade, de acordo com o prescrito no art. 11º da Lei nº 168/99 de 18 de Setembro (novo Código das Expropriações), vimos apresentar a V. Exa a proposta indemnizatória no montante de (…).
Nos termos do nº 5 do art. 11º do referido Código, tem V. Exa o prazo de 20 dias para responder (…).
Na falta de resposta ou de acordo sobre os valores indemnizatórios, tem a Câmara a faculdade de requerer de imediato a declaração de utilidade pública da expropriação, nos termos do nº 6 da mesma norma».
11 – No Processo E nº ... 7ª U/1959 e Processo Privativo ... 7ª/U/03 da Câmara Municipal de Lisboa consta um manuscrito datado de 3/3/2003 com este teor:
«Falei com a filha do Sr “M” que me informou que quer o seu pai quer o seu tio “L” já tinham falecido.
Disse também que o terreno já não é propriedade do seu tio há muitos anos.
(…)
Propt – “N” (Falecido)
Herdeiros
“D” (filho)
“C” (esposa)»
12 - Em 26/8/2003 a Câmara Municipal de Lisboa enviou a «Herdeiros de “N”» o ofício nº 003.../DPI conforme consta no Processo E nº ... 7ª U/1959 e Processo Privativo ... 7ª/U/03, com este teor:
«Assunto: Expropriação do Imóvel (Parcela 2...), com vista à execução do Eixo Norte/Sul – Lanço Padre Cruz/C.R.I.L (Proc. “E” nº .../59).
Para dar continuidade ao sistema viário da cidade, vai a Câmara, em conjunto com o I.E.P., concluir as obras do Eixo Norte/Sul – Lanço Padre Cruz/C.R.I.L, que constitui parte integrante da via fundamental que assegura a ligação entre vários pontos da cidade, com a Ponte 25 de Abril e a zona oriental de Lisboa, bem como os novos eixos viários, nos quais se inclui a C.R.I.L.
A obra reveste carácter muito urgente, pelo que a Câmara Municipal de Lisboa encara requerer a declaração de utilidade pública da expropriação das propriedade necessárias à sua execução, entre as quais se inclui um prédio de que V. Exa é presumível proprietário, assinalado na planta em anexo.
Com vista à aquisição amigável da referida propriedade, de acordo com o prescrito no art. 11º da Lei nº 168/99 de 18 de Setembro (novo Código das Expropriações), vimos apresentar a V. Exa a proposta indemnizatória no montante de (…).
Nos termos do nº 5 do art. 11º do referido Código, tem V. Exa o prazo de 20 dias para responder (…).
Na falta de resposta ou de acordo sobre os valores indemnizatórios, tem a Câmara a faculdade de requerer de imediato a declaração de utilidade pública da expropriação, nos termos do nº 6 da mesma norma.»
13 – Em 15/10/2003, “D” e outros, na qualidade de herdeiros de “N” enviaram à Câmara Municipal de Lisboa carta datada de 15/10/2003 que consta no Processo E nº ... 7ª U/1959 e Processo Privativo ... 7ª/U/03, com este teor:
«Na sequência do vosso ofício nº 003.../DPI e da reunião nas v/ instalações (…) na passada semana venho informar que os meus constituintes aceitam para o fim em vista – Construção Eixo Norte/Sul – o preço de € 54.000, 00 pela expropriação da parcela de terreno supra-referenciada, da qual, enquanto herdeiros de “N”, são os únicos titulares em termos de direito de propriedade.
(…).».
14 – No Proc. Privativo nº .../DPI/03 da Câmara Municipal de Lisboa consta o despacho de 26/11/2003 proferido pelo Presidente da Câmara com o teor «Autorizo nos termos da lei», aposto na proposta para aquisição da Parcela 2... referida no citado ofício nº 003.../DPI, constando nessa proposta:
«Considerando que:
A Câmara necessita de adquirir os prédios particulares comprometidos com a execução do Eixo Viário Fundamental Norte/Sul – 3º torço (ligação da Av. Padre Cruz à charneca do Lumiar);
Existe uma propriedade, registada como lote de terreno para construção, inserida no traçado do referido eixo viário, para a qual foi possível obter acordo com os proprietários;
A aquisição desta propriedade evita futuramente o recurso à expropriação, cuja declaração de utilidade pública irá ser solicitada a curto prazo;
Proponho a V. Exa, ao abrigo do disposto no art. 65º º 1 da Lei nº 169/99 de 18 de Setembro, conjugado com a Deliberação da Câmara nº 3/CM/2002 de 10 de Janeiro:
Adquirir a “D” e outros, ou a quem no acto da escritura provar pertencer-lhe, o lote de terreno para construção sito na A..., representado a tracejado amarelo na cópia da planta nº 03/152/02 do Departamento do Património Imobiliário, com a área total de 450 m2 e pelo valor global de € 54.000 (cinquenta e quatro mil euros e zero cêntimos).
Confrontações:
Norte: S... Lda~
Sul: A...
Nascente: C.M.L.
Poente: “O”
(…)
Justificação do Preço Proposto
O prédio a transmitir à Câmara apresenta as seguintes características:
. Natureza – Lote de terreno para construção (termos registais)
. Composição – Armazém edificado em 1960 sobre o qual incide um ónus real
. Características construtivas – Betão armado, com cobertura em chapa zincada
(…)
. Estado de ocupação – Vaga para efeitos de avaliação (Utilizada com habitação e com exploração/criação de rebanho de ovelhas, por um dos proprietários)
. Áreas – Lote de terreno = 450 mº2
Armazém = 123,25 m2
Tratando-se de uma propriedade para a qual incide sobre o armazém um ónus real, constituído por escritura outorgada em 1960/02/26 entre a C.M.l. e o ex-proprietário”“L””, (…)».
15 – Em 30/3/2004, na Divisão de Notariado e Apoio à Contratação da Câmara Municipal de Lisboa foi outorgada a escritura de compra e venda pela qual “C”, “D”, “E” e “F” declararam vender ao Município de Lisboa e este aceitou a venda de harmonia com o despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa datado de 26/11/2003 exarado na Proposta anexa ao Ofício de 28/10/2003 do Departamento do Património, pelo preço de 54.000 €, o prédio urbano «sito na A..., freguesia da A..., desta cidade de Lisboa, composto por um lote de terreno para construção, com a área de quatrocentos e cinquenta metros quadrados, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número trezentos e sessenta e oito, da ficha da referida freguesia, registado a seu favor pela inscrição G, Apresentação trinta de vinte e seis de Janeiro do ano corrente, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo ... (…)
O referido prédio encontra-se delimitado a orla cor amarela na cópia da planta número 03/152/02do Departamento de Património Imobiliário da Câmara Municipal de Lisboa (…)»
16 – Encontra-se registada na ...ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa através da Ap. 8 de 2004/05/26 a aquisição por compra a “C”, “D”, “E” e “F” a aquisição do prédio urbano situado em A..., A..., com o nº .../... da ficha dessa Conservatória com a área total de 450 m2, inscrito na matriz sob o nº ... com as seguintes composição e confrontações: lote de terreno para construção – Norte, com S... – Empresa Materiais, Eq, A.C. Civil Limitada; Sul, com A...; Nascente com Câmara Municipal de Lisboa; Poente com “O”.
17 – Na cópia simples junta pelos recorrentes a fls. 79 e 80 dos presentes autos como sendo extraída de «Livro das Descrições Prediais» consta, relativamente à descrição predial Nº ...:
«Terreno situado na estrada que vai da A... para a C..., freguesia da A....
(…)
1935 Março 18 12
Nº 4 - A requerimento de “P”, foi declarado que este prédio, depois dos destaques constantes dos averbamentos anteriores, se ficou compondo de: terreno com a área de 6.700 m2, na Estrada da Charneca, a confrontar do norte com a dita Estrada, ao sul com a A..., do nascente com “Q” e do ponte com “R”, inscrito na matriz respectiva sob o art. ....
(…)
1959 Janeiro 13 1
Nº 5 – A requerimento de “O”, foi destacado deste prédio descrito sob o nº ... e actualmente inscrito na matriz predial sob o nº ..., um terreno com 450 m2 e que passa a constituir a descrição nº ... do Lº B33.
Escritura de 2 de dezembro último fls 21 do lº 420 A do 13º Cartório Notarial.
(…)
1960 Janeiro 16 3
Nº 6 – A requerimento de “L” foi destacado desta descrição nº ... um terreno com 450 m2 designado pelo lote A, que passa a constituir a descrição predial nº ... do Lº B34 – Escritura de 2 de Dezembro de 1958 a fls. 28 do Lº 420 A do 13º Cartório Notarial».
1981 Novembro 30 1
O prédio nº ... tem a natureza rústica e a área de 5800 m2, situado na Estrada de São Bartolomeu, actual designação da antiga Estrada da Charneca, e está inscrito na matriz sob o actual artigo ...».
18 – No Processo E nº .../DP/1996 e Processo Privativo nº 63/DP/1997 da Câmara Municipal de Lisboa consta que em 27/11/1996 a Câmara Municipal de Lisboa deliberou aprovar a proposta nº 674/96 onde consta além do mais:
«Considerando o interesse público na execução do eixo rodoviário fundamental Norte/Sul, de ligação da auto-estrada do norte à auto-estrada do sul através das Ponte 25 de Abril;
(…)
Considerando a existência de 4 propriedades particulares comprometidas com o nó viário do Lumiar, bem como das infraestruturas viárias previstas para o local nomeadamente com zona de estacionamento e de acesso ao cemitério do Lumiar, que por não ter sido ainda possível as respectivas aquisições, urge nesta fase precaver possíveis dificuldade na implementação e ritmo da obra.
Tenho a honra de propor que a Câmara delibere
Requerer ao Governo, nos termos da legislação aplicável, designadamente no Código das Expropriações (Decreto-Lei nº 431/91 de 9 de Novembro), a declaração de utilidade pública urgente de expropriação com posse administrativa imediata dos prédios particulares e direitos a eles inerentes necessários à execução do Nó do Lumiar no cruzamento do eixo Norte/Sul com a Av Padre Cruz, conforme planta nº 96/116/02 do Departamento de Gestão Imobiliária, onde consta os troços dos arruamentos a executar, na medida em que a sua compra amigável se mostre impossível no imediato.»
19 – No Processo Privativo nº 63/DP/1997 da Câmara Municipal de Lisboa consta que em 12/11/1997 a Câmara Municipal de Lisboa deliberou aprovar, através da Deliberação nº 764/CM/97 a Proposta nº 764/CM/97 onde consta além do mais:
«Considerando o interesse público na execução do Eixo Rodoviário fundamental Norte/Sul, quer ao nível local e regional, quer nacional, visto que permite a ligação da auto-estrada do Norte à auto-estrada do Sul através da Ponte 25 de Abril;
(…)
Considerando a existência de 41 propriedades particulares comprometidas com o nó viário do Lumiar, bem como as infraestruturas viárias previstas para o local que por não ter sido ainda possível as respectivas aquisições, urge nesta fase precaver possíveis dificuldade na implementação e ritmo da obra;
Tenho a honra de propor que a Câmara delibere
Requerer ao Governo, nos termos da legislação aplicável, designadamente no Código das Expropriações (Decreto-Lei nº 431/91 de 9 de Novembro), a declaração de utilidade pública de expropriação com carácter de urgência dos prédios particulares e direitos a eles inerentes necessários à execução do Nó do Lumiar no cruzamento do eixo Norte/Sul com a Av Padre Cruz e a Charneca do Lumiar, conforme plantas nº 96/121/02-A e 96/121/02-B do Departamento de Gestão Imobiliária, onde constam os troços dos arruamentos a executar, na medida em que a sua compra amigável não é possível de imediato.
(Processo Privativo nº 63/DGI/97).»
20 – No Processo .../DGI/1996 consta uma cópia de fls. 2774 do Boletim da Câmara Municipal de Lisboa de 25/11/1997 onde está publicada a Deliberação nº 764/CM/97 (Proposta nº 764/97).
21 – No Processo .../DGI/1996 está junto um ofício datado de 2/12/1998 do Departamento de Construção de Vias dirigido ao Departamento de Gestão Imobiliária onde consta, além do mais:
«Assunto: Pedidos a fazer de declaração de utilidade pública
(…) foram-me pedidos elementos parra instrução de processos a remeter ao Governo relativos:
(…)
3) Eixo viário Fundamental Norte/Sul – Nó do Lumiar.
4) Eixo Viário Fundamental Norte/Sul – troço de ligação da Av. Padre Cruz à Charneca do Lumiar.
(…)
No que respeita a 3 pretende-se lançar a obra.
No que respeita a 4, a obra, a executar pela JAE, só será lançada após a comunicação de que todos os terrenos estão expropriados e as famílias realojadas.
Os elementos relativos ao pedido de V. Exa foram-lhe enviados pelo ofício 1614/DCV/96 de 96/12/04.
Após isso enviei a V. Exa os ofícios (…)
Venho hoje, novamente, pedir que me informe o que julgar conveniente, relativamente à situação em que se encontram as expropriações relativas aos pontos 3 e 4 (…)».
22 – No Processo .../DGI/1996 consta, em «Breves Notas da Reunião Realizada a 18/10/99 relativa ao Eixo Norte/Sul – Av, Padre Cruz/Charneca do Lumiar:
«(…)
3 – Confirmada a implantação do eixo, bem como a necessidade de adquirir as propriedades comprometidas com os nós previstos.
(…)».
23 - No Processo .../DGI/1996 consta um ofício da Direcção Municipal de Infra-Estruturas e Saneamento da Câmara Municipal de Lisboa dirigido ao Director do Departamento de Gestão Imobiliária com este teor:
«Assunto: Eixo Norte/Sul Av Padre Cruz (exclusive) limite do concelho de Lisboa
Plantas Parcelares
(…) junto se enviam plantas sobre o assunto em epígrafe. As expropriações deverão estar concluídas em Abril de 2000.».
24 - No Processo .../DGI/1996 consta uma «Informação» datada de 17/10/2000 do Departamento de Gestão Imobiliária da Câmara Municipal de Lisboa com este teor:
«Local: Eixo Norte/Sul – Lanço Padre Cruz/CRIL – Nó do Lumiar
Assunto: Informação sobre o estado e evolução dos processos das Expropriações
Esta informação tem por objectivo relatar sobre o estado de adiantamento das expropriações das parcelas necessárias para a construção do referido torço do Eixo Norte/Sul.
Actualmente e após o levantamento das parcelas afectadas está-se a proceder às tentativas de aquisição destas parcelas por via do direito privado.
Estes processos de negociação, têm por referência os valores de avaliação estimados por um perito (…)
Entretanto, com base nessas avaliações, foram efectuadas as notificações aos interessados, nomeadamente proprietários e inquilinos, com a proposta do valor de indemnização.
Presentemente, já obtivemos resposta de cerca de metade dos interessados (…)
Presentemente, estamos a aguardar resposta em relação à cabimentação orçamental, de forma a que seja possível acordos, que já existem em plano informal (…) para que sejam formalizados.
Nessa altura, será feito um novo pedido de declaração de utilidade pública que irá abranger a totalidade da parte do Eixo que falta executar, ou seja, Nó do Lumiar e troço Padre Cruz/CRIL, uma vez que estes actos administrativos que data de 1996 – deliberação 674/CM/96 – já caducaram.
(…).».
25 – Não consta nos presentes autos nem nos referidos processos privativos da Câmara Municipal de Lisboa que tenha havido declaração de utilidade pública da expropriação do prédio descrito na ...ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº .../... – Descrição em Livro: Nº ..., Livro nº: ... -, situado na A..., letras D.C., com a área total de 450 m2 inscrito na matriz da freguesia da A... sob o nº ..., cuja aquisição está registada a favor dos recorrentes através da Ap. 25 de 2/12/1992.
26 - Não consta nos presentes autos nem nos referidos processos privativos da Câmara Municipal de Lisboa que tenha havido declaração de utilidade pública da expropriação do prédio relativamente ao qual foi celebrada a escritura de compra e venda de 30/3/2004 entre “C”, “D”, “E” e “F” e o Município de Lisboa.
*
B) O Direito
Os recorrentes fundam a sua pretensão no disposto no art. 42º do Código das Expropriações aprovado pela Lei 168/99 de 18/9, invocando concretamente as alíneas b) e c) do seu nº 2.
Estabelece este artigo:
«1- Compete à entidade expropriante, ainda que seja de direito privado, promover, perante si, a constituição e o funcionamento da arbitragem.
2 – As funções da entidade expropriante referidas no número anterior passam a caber ao juiz de direito da comarca do local da situação do bem ou da sua maior extensão em qualquer dos seguintes casos:
a) Se for julgada procedente a reclamação referida no nº 1 do art. 54º;
b) Se o procedimento de expropriação sofrer atrasos não imputáveis ao expropriado ou aos demais interessados que, no seu conjunto, ultrapassem 90 dias, contados no termos do artigo 279º do Código Civil;
c) Se a lei conferir a interessado o direito de requerer a expropriação de bens próprios;
d) Se a declaração de utilidade pública for renovada;
e) Nos casos previstos nos artigos 15º e 16º;
f) Os casos previstos nos artigos 92º, 93º e 94º.
3 – O disposto nas alíneas b), c), d) e e) do número anterior depende de requerimento do interessado, decidindo o juiz depois de notificada a parte contrária para se pronunciar no prazo de 10 dias.
4 – Se for ordenada a remessa ou avocação do processo, o juiz fixa prazo para a sua efectivação, não superior a 30 dias, sob pena de multa até 10 unidades de conta, verificando-se atraso não justificado.»
O art. 43º determina:
«1 – As petições a que se referem (…) o nº 3 do artigo anterior (…) são apresentadas directamente na secretaria do tribunal competente para o processo de expropriação litigiosa.
2 – Os processos originados pelas petições referidas no número anterior são dependência do processo de expropriação; o juiz a quem este for distribuído determinará que aqueles processos lhe sejam remetidos, ficando com competência exclusiva para os respectivos termos subsequentes à remessa.
3 – Os processos recebidos nos termos da parte final do número anterior são apensados ao processo de expropriação.»
O art. 96º desse Código, sob a epígrafe «Expropriação requerida pelo proprietário» dispõe:
«Nos casos em que, em consequência de disposição especial, o proprietário tem o direito de requerer a expropriação de bens próprios, não há lugar a declaração de utilidade pública, valendo como tal para efeitos de contagem de prazos, o requerimento a que se refere o nº 3 do artigo 42º.».
Os recorrentes não invocam qualquer disposição especial – nem se vislumbra qual seja - que lhes confira o direito de requerer a expropriação do imóvel de que se arrogam proprietários e cuja aquisição se encontra registada a seu favor conforme consta na factualidade descrita em A).
Assim, improcede a sua pretensão com fundamento no disposto na al c) do nº 2 do art. 42º do Código das Expropriações.
Vejamos então se a sua pretensão é enquadrável na alínea b) do nº 2 do art. 42º, já que nenhuma das restantes alíneas deste artigo invocam e manifestamente não é nelas subsumível o caso dos autos.
Sustentam os recorrentes que foram expropriados sem que tenham sido notificados de qualquer acto no âmbito do processo expropriativo e afirmam que o seu prédio, ocupado por um troço do Eixo Norte/Sul, não é o mesmo prédio que o expropriante Município de Lisboa designa por Parcela 2... e que adquiriu por escritura de 30/3/2004 a “C”, “D”, “E” e “F”.
No caso de se tratar do mesmo prédio, fica por explicar como é que veio a ter dois números diferentes na ...ª Conservatória do Registo Predial conforme resulta dos pontos 1 e 16 da factualidade descrita em A).
Verifica-se, porém, que relativamente ao prédio cuja aquisição está registada a favor dos recorrentes naquela Conservatória consta, n registo predial, que tem o nº .../... e a área total de 450 m2 mas também consta «– Descrição em Livro: Nº ..., Livro nº: ...» e que foi destacado do prédio descrito sob o nº ....
Ora, como também se vê do ponto 17 da factualidade assente, em 16/1/1960, a requerimento de “L”, foi destacado da descrição nº ... um terreno com 450 m2 designado pelo lote A, que passou a constituir a descrição predial nº ... do Lº B....
Portanto, a serem prédios diferentes o prédio de que os recorrentes se arrogam proprietários e o prédio que constitui a Parcela 2... vendido ao recorrido, constituem ambos a descrição predial nº ... do Lº B... da ...ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa.
Também resulta da factualidade descrita que “L” é o nome da pessoa a quem a Câmara Municipal de Lisboa enviou o ofício ... datado de 19/4/2000 e que, segundo se diz no manuscrito referido em 11 da factualidade assente, já tinha falecido e já não era o proprietário do prédio que constitui a Parcela 2... e por isso foram depois contactados os herdeiros do também já falecido proprietário “N” através do ofício nº 003... datado de 26/8/2003, tendo estes outorgado a escritura de compra e venda referida em 15.
Acontece que, se o prédio é o mesmo, não cabe averiguar no âmbito de um processo de expropriação originado ao abrigo do art. 42º do Código das Expropriações se os herdeiros de “N” eram ou não os seus legítimos proprietários. Isto porque o prédio foi vendido ao Município de Lisboa através da figura da «Aquisição por via de direito privado» prevista no artigo 11º do Código das Expropriações, ou seja, a aquisição do prédio pelo recorrido foi efectuada sem que tenha havido declaração de utilidade pública da expropriação.
Na verdade, o art. 10º do CExpr. determina:
«1 – A resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação deve ser fundamentada, mencionando expressa e claramente:
a) A causa de utilidade pública a prosseguir e a norma habilitante;
b) Os bens a expropriar, os proprietários e demais interessados conhecidos;
c) (…)
d) (…)
(…)
5 – A resolução a que se refere o nº 1 anterior é notificada ao expropriado e aos demais interessados cuja morada seja conhecida, mediante carta ou ofício registado com aviso de recepção».
Por sua vez o art. 11º preceitua:
«1 – A entidade interessada, antes de requerer a declaração de utilidade pública, deve diligenciar no sentido de adquirir os bens por via de direito privado, salvo nos casos previstos no art. 15º, e nas situações em que jurídica ou materialmente, não é possível a aquisição por essa via.
(…)
6 – A recusa ou a falta de resposta no prazo referido no artigo anterior ou de interesse na contraproposta confere, de imediato, à entidade interessada na expropriação a faculdade de apresentar o requerimento para a declaração de utilidade pública, nos termos do artigo seguinte, notificando desse factos os proprietários e demais interessados que tiverem respondido.
(…)».
E, nos termos do art. 17º, «1 - O acto declarativo da utilidade pública e a sua renovação são sempre publicados, por extracto, na 2ª série do Diário da República e notificados ao expropriado (…)
2 – A publicação da declaração de utilidade pública deve identificar sucintamente os bens sujeitos a expropriação, com referência à descrição predial e à inscrição matricial, mencionar os direitos, ónus e encargos que sobre eles incidem e os nomes dos respectivos titulares e indicar o fim da expropriação
(…)».
Também o art. 2º do Código das Expropriações aprovado pelo DL 438/91 de 9/11 previa a aquisição por via do direito privado estipulando que «1 – A expropriação só pode ter lugar após se ter esgotado a possibilidade de aquisição por via do direito privado, salvo nos casos em que lhe seja atribuído carácter de urgência ou quando se verifiquem as situações previstas no nº 2 do art. 39º».
E o art. 15º também impunha que a declaração de utilidade pública fosse publicada na 2ª série do Diário da República.
Mas a verdade é que os recorrentes rejeitam que o prédio de que se arrogam proprietários seja o mesmo que foi objecto daquela escritura de compra e venda de 30/3/2004.
Ora, não se mostra demonstrado nos presentes autos nem nos processos privativos da Câmara Municipal de Lisboa remetidos ao tribunal, que tenha sido declarada a utilidade pública da expropriação desse prédio.
Aliás, nem os recorrentes nem o recorrido indicam qual tenha sido essa declaração de utilidade pública e a sua publicação no Diário da República.
Repare-se que na carta mencionada no ponto 5 da factualidade assente os recorrentes até disseram desconhecer a existência de qualquer declaração de utilidade pública da expropriação ao referirem-se à «eventual declaração de utilidade pública (DUP) do prédio, a qual no caso se desconhece in totum».
A declaração de utilidade pública é um acto nuclear do procedimento expropriativo e a adjudicação da propriedade depende de uma decisão judicial. No plano objectivo, a declaração de utilidade pública releva, antes de mais, para a determinação da lei aplicável ao processo expropriativo e consequentemente para a fixação da justa indemnização, pois no seu cálculo devem tomar-se em conta as normas em vigor à data da publicação do acto declarativo (cfr José Osvaldo Gomes, Expropriações por Utilidade Pública, 1997, pág. 327 a 329).
Sem estar provada a existência de uma declaração de utilidade pública da expropriação não é possível, no âmbito de um processo de expropriação, adjudicar a propriedade do referido prédio ao expropriante pois aquela declaração é não só pressuposto necessário da expropriação como condiciona todo o processo expropriativo (Ac do STA de 2/76/2004 (Proc. 030256) e 19/4/2005 (Proc. 0195/04) e Ac do STJ de 14/5/2009 – Proc. 08A4000, in www.dgsi.pt).
Assim, e citando o referido STJ de 14/5/2009:
«(…) a posse administrativa justifica-se sempre e apenas pela urgência da realização de trabalhos inerentes às obras projectadas e tem como pressuposto a declaração de utilidade pública da expropriação, pelo que nunca pode ter o alcance de a substituir.
A indispensabilidade da declaração de utilidade pública resulta da própria Constituição da República, dispondo o art. 62º (…):
“1. A todos é garantido o direito à propriedade e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição.
2. A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização”.
Este direito fundamental é reiterado no art. 1308º do C.Civil, nos termos do qual “ninguém pode ser privado, no todo ou em parte, do sue direito de propriedade senão nos casos previstos na lei”.
Por sua vez o nº 2 do art. 10º do C. Exp. estabelecia que “a declaração resultante genericamente da lei ou regulamento deve ser concretizada em acto administrativo que individualize os bens a expropriar, valendo este acto como declaração de utilidade pública para os efeitos do presente diploma”.
Consequentemente, não pode a expropriação deixar de assentar numa prévia declaração de utilidade pública, que especifique o fim concreto da expropriação e individualize os bens a ela sujeitos. A declaração de utilidade pública não pode, pois, ser considerada um simples pressuposto processual do procedimento expropriativo, uma simples formalidade preliminar da expropriação ou acto preparatório desta, antes constitui o facto constitutivo da relação jurídica de expropriação, integrante da causa de pedir do processo expropriativo. Trata-se, aliás, de verdadeiro acto administrativo impugnável contenciosamente, podendo o expropriado requerer o controlo judicial da própria legalidade da DUP, intentando no foro administrativo acção para impugnação do acto que declarou a utilidade pública da expropriação».
Assim, se realmente o prédio de que os recorrentes se arrogam proprietários não é o mesmo prédio que foi vendido por “C”, “D”, “E” e “F” ao Município de Lisboa poder-se-á configurar uma situação de ocupação “via de facto”, abusiva, que poderá fundamentar um pedido de indemnização já que a restituição da posse não se mostra possível atenta a obra ali realizada (neste sentido, Ac da RP de 22/3/2001 – Proc. 0031682, Ac da RP de 7/10/2002 – Proc. 0250857 e Ac do STJ de 11/10/2007 - Proc. 07B3035, in www.dgsi.pt). O que não pode é originar um processo de expropriação ao abrigo do art. 42º nº 2 al b) ou c) do Código das Expropriações.
Em consequência, não merece censura a decisão recorrida.
*
IV – Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso e confirma-se o despacho recorrido.
Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 16 de Março de 2010

Anabela Calafate
Antas de Barros
Folque de Magalhães