ACIDENTE DE VIAÇÃO
DEVER DE VIGILÂNCIA
PRESUNÇÃO DE CULPA
INDEMNIZAÇÃO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Sumário

1. Enquanto proprietária desde, pelo menos, 1995, de um bem imóvel (árvore ligada ao solo – artigo 204.º, n.º 1, alínea c) do Código Civil), a Ré tinha obrigação de vigilância em relação ao mesmo, mormente, mantendo essa mesma árvore e todos os bens incorporados na sua propriedade, em bom estado de conservação, conforme decorre do disposto no artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil.
2. Não tendo a Ré ilidido a presunção legal de culpa que sobre si impendia, conforme decorre do disposto no artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil, deve ressarcir os prejuízos decorrentes do seu comportamento omissivo, que lhe são directamente imputáveis e que, no caso, se traduziam em mandar abater aquela árvore ou, pelo menos, mandar cortar os ramos que pudessem interferir com a circulação automóvel e/ou pedonal relativamente ao espaço aéreo que a mesma invadia sobre a estrada – artigos 1305.º e 486.º do Código Civil.
3. O facto de estarmos perante uma situação de responsabilidade solidária relativamente ao ICERR e à proprietária do terreno em que a árvore se encontrava implantada, a ser apreciada em Tribunais materialmente distintos, não determina a suspensão da instância em quaisquer um destes processos.
4. O Tribunal pode fixar montantes superiores aos pedidos parcelares apresentados pelas partes logo que não seja ultrapassado o valor do pedido final pelas mesmas deduzido - artigos 569.º do Código Civil e 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
(sumário da Relatora)

Texto Integral

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

            I. RELATÓRIO

M, A e C, casados entre si, intentaram acção declarativa de condenação com processo comum na forma ordinária, contra J, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia total de € 1.452.521,00, sendo € 1.200.000,00 a pagar à A. M e € 252.521,00 aos AA. A e C, quantias estas acrescidas de juros de mora, desde a citação.

Para tanto alegaram que no dia 6 de Dezembro de 2000 pelas 21:30 horas, quando a 1.ª A. circulava na EN 118 no sentido B- C ao km 38,300, no veículo automóvel ligeiro de passageiros NT, no banco situado ao lado do condutor, uma árvore caiu em cima daquela viatura, tendo esta ficado tetraplégica em consequência do embate.

A árvore referida estava implantada no "Pinhal ", pertencente à Ré desde, pelo menos, 1995. Os 2.° e 3.° AA. são pais da 1.ª A., e pela situação em que esta se encontra têm tido despesas ressarcíveis.

A árvore em apreço caiu porque tinha pelo menos quarenta anos de idade, estava inclinada sobre a faixa de rodagem há seguramente mais de 10 anos, tinha as raízes à mostra, estava implantada em terreno arenoso com pouca fixação de árvores, pelo que já deveria ter sido abatida, mas a Ré não a abateu ou ordenou o seu corte.

A Ré tinha sido alertada para a situação pelos utentes da estrada, pelos órgãos do município de B e pelo Senhor Comandante dos Bombeiros de B.

Como consequência do embate a 1.ª A. sofreu as lesões corporais descritas nos autos que lhe determinaram tetraplegia, tendo sido submetida a diversas intervenções cirúrgicas, ficando com várias cicatrizes, tendo sofrido dores intensas. Por força das lesões sofridas e suas consequências, a 1.ª A.:

• Apenas tem sensibilidade do pescoço para cima e nos ombros, padecendo ainda de alteração da estrutura das vértebras C3 a C5, e diminuição acentuada da função respiratória;
• Ficou a padecer de uma incapacidade funcional permanente de 95%, com incapacidade absoluta permanente para o trabalho;
• Sofreu dores lancinantes, desloca-se de cadeira de rodas e necessita da assistência permanente de 3.ª pessoa e para certos actos de mais uma pessoa;
• Perdeu todos os movimentos e sensibilidade do pescoço para baixo;
• Só com o auxílio de medicamentos consegue ter um controle mecânico e relativo das fezes e urina, andando algaliada e necessitando de usar fraldas e apresenta escaras nas nádegas e ânus;
• Carece e carecerá toda a vida de controlo médico e medicamentoso correndo sério risco de contrair lesões renais, bem como descalcificação do esqueleto e péssima tonificação da massa muscular;
• Tem a expectativa de vida encurtada e péssima qualidade de vida;
• A sua deficiência afectou-a gravemente para toda a sua vida, sob o ponto de vista físico, psicológico, emocional e social;
• Deixou de poder realizar todos os projectos pessoais que tinha, como sendo casar, ter filhos, e realizar-se profissionalmente, bem como deixou de poder continuar com as danças de salão de que tanto gostava;
• É incapaz de estar em público ou em eventos sociais por carecer de medicação constante e não se dar conta de defecar e urinar;
• Sofre de depressão reactiva e ansiosa, apresentando humor deprimido com concentração dolorosa, padecendo de perda de iniciativa e inibição psico-motora;
• Vive em constante estado de amargura, desespero e angústia, perdendo a vontade de vive;

À data do acidente a 1.ª A. era funcionária do quadro privativo da Câmara Municipal de B, com a categoria de auxiliar dos Serviços Gerais, auferindo o vencimento mensal de Pte. 68.900$00 então correspondente ao índice 118, acrescido de subsídio de alimentação, sendo que tal vencimento teria beneficiado dos aumentos legais.

Como consequência das lesões que padece, a 1.ª A. está sem trabalhar, recebendo o subsídio de doença da ADSE, sendo que, caso em junta médica lhe seja imposta a aposentação por invalidez irá auferir uma pensão de cerca de € 120,00 mensais.

A 1.ª A. estudava na Escola Secundária de B, tendo concluído o 10.° ano de escolaridade, tendo a expectativa de melhorar os seus rendimentos, pois queria concluir o ensino secundário e tirar um curso superior.

A 1.ª A. precisa e precisará sempre de ser regularmente vigiada clinicamente, tomar medicamentos, fazer análises, exames médicos, usar algálias, fraldas e resguardos, sendo que tais despesas e os transportes necessários têm sido garantidos e suportados pelos pais da 1.ª A, aqui 2.° e 3.° AA.

Durante todo o tempo em que a 1ª esteve internada, os 2.° e 3.° AA. visitavam-na diariamente, tendo despendido quantias em transportes, próprio e públicos.

Para cuidar da 1.ª A. a 3.ª A. encerrou um pequeno estabelecimento de que era proprietária com o 2.° A. do qual retirava um lucro mensal de € 1.500,00.

Os 2.° e 3.° AA. despenderam a quantia de € 31.324,00 com as alterações arquitectónicas que tiveram de efectuar na casa onde habitam com a 1.ª A. Gastaram € 2.950,00 com a aquisição de uma cama adaptada à deficiência da 1.ª A. Necessitam ainda de comprar diversos equipamentos indispensáveis para minorar as deficiências da 1.ª A. e que ainda não foram adquiridos por insuficiência económica destes.

De acordo com as regras normais da vida os 2.° e 3.° AA. morrerão mais cedo que a 1.ª A. pelo que será necessário contratar alguém que lhe preste a assistência necessária. Peticionam assim, para além dos danos patrimoniais já indicados: € 200.000,00 a título de dano correspondente à perda de capacidade de trabalho da 1.ª A.; € 500.000,00 a título de danos não patrimoniais da 1.ª A.; € 500,00 a título de danos patrimoniais futuros da 1.ª A.; € 180.000,00 a título de danos patrimoniais futuros do 2.° e 3.° AA.

A Ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido, alegando, para o efeito, que é proprietária da herdade onde estava implantada a Acácia que caiu sobre a viatura onde seguia a 1.ª A. no momento dos factos, porém aquela árvore era sã, de copa verde, devidamente enraizada, não evidenciava raízes à mostra e não estava podre; era aprumada e não estava inclinada sobre a estrada.

A herdade era habitual e periodicamente limpa de matos e arbustos e as árvores, suas copas e ramos eram mandados cortar ou abater sempre que necessária. A Ré nunca foi alertada para mandar abater a árvore em causa ou outra. A queda da árvore, no circunstancialismo de tempo e lugar descrito nos autos, foi provocada por uma causa natural e imprevisível, sem que possa ser assacada qualquer responsabilidade à Ré.

O acidente não ocorreu como os AA. descrevem, pois, na verdade, na noite em que os factos ocorreram a região de B esteve sujeita a forte temporal com abundante queda de chuva e sob a acção de ventos muito fortes, com rajadas de intensidade superior a 100 km/hora, que recomendava uma especial atenção ao trânsito rodoviário como foi reconhecido pelo Serviço Nacional de Protecção Civil em diversos comunicados emitidos nessa noite.

Nessa noite ocorreram diversas quedas de árvores e postes de electricidade. O estado tempestuoso do tempo aconselhava a que se circulasse com redobradas cautelas e a velocidade mais moderada que o habitual. O condutor da viatura em que a 1.ª A. seguia apercebeu-se que a árvore se partira e tombava sobre a estrada, porém não travou a viatura que conduzia e prosseguiu a marcha para tentar passar por baixo da árvore em queda, tendo nessa altura sido apanhado por uma pernada da copa da árvore.

O condutor da viatura em que a 1.ª A. seguia só conseguiu imobilizar a viatura a cerca de 150 metros da árvore, sendo que a condução era negligente motivo pelo qual o condutor não conseguiu parar a viatura no espaço que tinha à sua frente de modo a evitar o embate.

A velocidade a que o condutor do automóvel em que a 1.ª A. seguia era excessiva atentas as adversas condições atmosféricas, o piso da estrada estar molhado, existirem lençóis de água e haver fortes rajadas de vento.

A vigilância que a Ré mandava efectuar aos arbustos e árvores existentes no local era a adequada face à inexistência de ocorrências passadas. O temporal que ocorria no momento do acidente, a sua imprevisibilidade e a falta de cuidado do condutor da viatura em que a 1.ª A. seguia afastam a culpa da Ré face ao sucedido.

Impugnou, ainda, os danos invocados pelos AA., referindo que os socorros prestados à 1.ª A. no local podem não ter sido os adequados e correctos face aos danos físicos que a mesma invoca, pois o transporte inadequado e impróprio de traumatizados da coluna pode provocar danos superiores aos causados pelo traumatismo e que muitas vezes são irreversíveis.

A viatura em que a 1.ª A. seguia estava segura na Companhia de Seguros que respondia pelos danos causados a terceiros incluindo os passageiros transportados gratuitamente, porém o acidente não foi participado à mesma. Alegou, por fim, que os valores peticionados são manifestamente exorbitantes.

Os AA. apresentaram réplica, ali referindo que a árvore estava já há muito tempo em risco de cair, sendo que não era sã.

É verdade que choveu e fez vento no dia e local da ocorrência, porém tal não motivou a queda da árvore, de tal modo que no concelho de B não foi registada a queda de qualquer outra árvore ou qualquer sinistro com nexo de causalidade estabelecido com relação à chuva ou vento. Naquela noite, antes da queda da árvore em apreço, apenas caiu, a escassas dezenas de metros onde aquela viria a cair, uma pernada velha e podre de um pinheiro.

Era total o estado de abandono e de falta de vigilância do arvoredo da propriedade da Ré, há longos anos. De tal sorte que após o sinistro em causa nos autos a Ré foi intimada, na pessoa do seu filho, pela Câmara Municipal de B e pelos Bombeiros Voluntários de B para proceder ao corte de várias árvores que pendiam sobre a EN 118 por risco de as mesmas caírem sobre a estrada, mas não as cortaram o que obrigou aquelas entidades a fazê-lo.

Já nos anos anteriores a 2000 tinham caído árvores no prédio da Ré, mantendo-se o risco de tal voltar a suceder.

Mesmo que a chuva ou o vento tenham contribuído para a queda da árvore, tal apenas poderia relevar em sede de nexo de causalidade adequada. Sobre a Ré recai a presunção legal de culpa constante do art. 493.° do CC.

É falso que o condutor da viatura em que seguia a 1.ª A. é que tenha agido com imperícia ao aperceber-se da aproximação da árvore em causa. Com a queda da árvore em cima da viatura o condutor perdeu o controle da mesma.

Admitindo os comunicados feitos pela Protecção Civil, desconhecem se lhes foi dada alguma publicidade e, em caso afirmativo, qual.

A 1.ª A. não foi objecto de transporte inadequado e impróprio de traumatizados da coluna.

Realizou-se audiência preliminar na qual foi proferido despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e a que constitui a Base Instrutória relevante para a decisão da causa, que consta de fls. 435 a 465 dos autos.

Os AA. apresentaram articulado superveniente e requereram a ampliação do pedido, peticionando a condenação da Ré a pagar à 1.ª A. a quantia de € 1.650.000,00 e aos 2.° e 3.° AA. a quantia de € 752.521,00.

Para tanto alegaram que em 22 de Fevereiro de 2007, a 1.ª A. continuava funcionária da Câmara Municipal de B, não tendo ainda sido presente a Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações, mas quando o for será aposentada com pensão de invalidez.

O trabalho da 1.ª A. é cansativo e é reduzida a sua produtividade, tendo a sua progressão na carreira sofrido atrasos, pois que tem e terá longos períodos de doença e internamento.

Desde a data da petição inicial, a 1.ª A. já voltou a estar internada outras vezes, tendo chegado a estar em perigo de vida. Por tais motivos sofreu atraso na sua ascensão profissional o que implica diminuição dos seus proventos, pois caso não tivesse dado faltas por doença estaria no escalão imediatamente superior ao que se encontra, pelo que, de 01.11.2004 a 31.12.2006 auferiu menos € 1.203,08 do que teria auferido se não tivesse dado faltas por doença. Nos dias em que falta a 1.ª A. não recebe subsídio de alimentação.

A progressão na sua carreira faz-se automaticamente desde que conclua o módulo de tempo de 4 anos no escalão imediatamente anterior, pelo que as suas faltas continuarão a repercutir-se na sua carreira.
Já tem a cadeira de rodas movida por comando accionado pela cabeça que lhe foi oferecida por donativos da população de B, mas necessitará de outras devido ao seu desgaste natural a um preço unitário de € 35.000,00.

Já adquiriu viatura automóvel pelo preço de € 28.000,00 mas no futuro terá de comprar outras, e terá de comprar as respectivas plataformas de acesso e acessórios no valor de € 2.500,00 cada.

A 1.ª A. continua a frequentar consultas de acompanhamento psicológico. O sofrimento psicológico e emocional dos AA. é cada vez maior e aumenta cada vez que o estado de saúde da 1.ª A. piora. Para melhorar os seus proventos, o A. A aceitou ir trabalhar para V em 15.05.2006, só vindo a B de 3 em 3 semanas, vivendo os AA. com grande sofrimento, tristeza e amargura, tendo aumentado a perturbação psíquica daquele A.

Os 2.° e 3.° AA. passaram a carecer de apoio médico psiquiátrico regular, necessitando a A. C de acompanhamento médico e medicamentoso devido ao seu estado de saúde e grave depressão ansiosa. A A. C tem dificuldade em dormir, agravada pela necessidade de ter de mudar a 1.ª A. de posição de 3 em 3 horas, e sofre de inquietação permanente, desgosto, desconforto emocional e físico, desinteresse pelo relacionamento social, fadiga persistente, mesmo esforço físico, desatenção para consigo própria e ansiedade e sofre igualmente de distúrbios psico-somáticos.

O A. A também sofre de distúrbios psicológicos, em especial desde que foi para.

Peticionam agora danos não patrimoniais para os 2.° e 3.° AA, que computam em 500.000,00, sendo € 250.000,00 para cada um. Referem ainda que os danos patrimoniais sofridos pela 1.ª A. estão desactualizados sendo mais ajustada a quantia de € 900.000,00.

Os danos não patrimoniais sofridos pela A. M são maiores do que inicialmente previsíveis pelo que deve ser arbitrada, nesta sede, uma indemnização de € 750.000,00.

A Ré ofereceu contestação ao articulado superveniente apresentado pelos AA., alegando que o mesmo não traduz a culpa da Ré em sede de responsabilidade civil por factos ilícitos, sendo certo que impugnou os danos e montantes invocados pelos AA.

O articulado superveniente foi admitido, assim como a ampliação do pedido, tendo sido aditados quesitos à Base Instrutória, a fls. 917 a 922, na sequência de tal ampliação.

Não foi admitida a junção do documento de fls. 609 a 617 por parte dos AA., tendo os mesmos apresentado recurso de agravo de tal despacho, recurso esse de que viriam a desistir por requerimento de fls. 1454 dos autos.

Em sede de audiência de julgamento foi aditado um quesito à Base Instrutória – fls. 931 dos autos.

A Ré apresentou articulado superveniente (fls. 984 e ss. dos autos), alegando, para o efeito, que na primeira sessão de julgamento foram trazidos aos autos factos novos susceptíveis de extinguir ou modificar o direito invocado pelos AA., designadamente porque foi suscitado em audiência que a 1.ª A. foi retirada do carro por uma testemunha que depôs em julgamento, sem formação médica e alguém que se identificou como enfermeira. Assim, entende a Ré que os danos sofridos pela A. M podem ter tido origem na sua indevida remoção do carro por pessoas não habilitadas para o efeito, ou agravadas por essa remoção e exposição aos elementos.

Em sede de audiência de julgamento foi admitido o articulado superveniente, tendo-se os AA. pronunciado quanto ao seu teor ainda em audiência de julgamento — cfr. fls. 1066 a 1068.

Foram aditados à Base Instrutória os quesitos resultantes da apresentação do articulado superveniente por parte da Ré a fls. 1068 e 1069.

A fls. 1166 e 1167 a Ré apresentou requerimento aos autos a confessar o teor de vários quesitos constantes da Base Instrutória.

Os AA. deduziram a fls. 1236 a 1240 incidente de falsidade do ofício de fls. 1112 dos Bombeiros de B por poder colocar em causa a credibilidade da testemunha A C tendo o mesmo sido decidido no sentido de que a testemunha compareceu no local do acidente após a ocorrência do mesmo.

Os AA. apresentaram novo articulado superveniente a fls. 1242 a 1246, alegando, para o efeito, que em 02.01.2008 caiu, parcialmente sobre a EN 118, mais uma árvore da propriedade da Ré que se encontrava junto ao local onde estava implantada a árvore em causa nestes autos.

A Ré apresentou contestação ao articulado superveniente junto pelos AA., alegando que sempre mandou e manda limpar a sua propriedade.

Não foi admitido o articulado superveniente de fls. 1242 a 1246 apresentado pelos AA..

Realizada Audiência de Discussão e Julgamento, foi proferida decisão sobre a matéria de facto, sem reclamações.

AA. e Ré apresentaram alegações de direito por escrito.

Após, foi proferida sentença, com a seguinte decisão:

“Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente, porque provada apenas em parte, e, em consequência:

1. Condeno a Ré, , a pagar à A. M:
a)        A quantia de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento;
b)        A quantia de € 385.000,00 (trezentos e oitenta e cinco mil euros) a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, sendo a contar da citação relativamente aos danos por perda de capacidade de ganho e a contar da presente sentença quanto aos demais danos futuros para aquisição de bens e serviços, e até integral pagamento;

2. Condeno a Ré, J, a pagar aos AA. A e C:
a) A quantia de € 131,403,50 (cento e trinta e um mil quatrocentos e três euros e cinquenta cêntimos) a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da citação da Ré no que tange aos danos patrimoniais vencidos a essa data, sendo que relativamente aos danos que apenas se foram vencendo durante a presente acção – danos por lucros cessantes e despesas com medicamentos, transportes a médicos e laboratórios, fraldas e algálias que apenas ocorreram após a citação - , os juros apenas são devidos a partir do mês em que cada um deles se venceu e até integral pagamento;
b) O que se liquidar em execução de sentença, relativamente aos danos patrimoniais pela aquisição da cadeira de rodas, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da citação da Ré e até integral pagamento;

3.         Condeno a Ré, J, a pagar ao A. A a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos; à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento;

4.         Condeno a Ré,J, a pagar à A. C a quantia de € 60.000,00 (sessenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, a contar da data da presente sentença, até integral pagamento;

5.         Absolvo a Ré J dodemais peticionado pelos AA. M, A e C”.

Inconformada, a Ré apelou do assim decidido, tendo apresentado alegações onde formula as seguintes conclusões:

1. Houve manifesto erro na apreciação da prova testemunhal, pelo que, atento o depoimento das testemunhas JQ, N, Eng° T e J, os quesitos 7° e 8° da Base Instrutória deveriam ter recebido a resposta de "Não Provado", o quesito 6° deveria ter recebido a resposta de "provado apenas que a árvore em causa encontrava-se implantada na berma do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no caminho B – S", o quesito 117° deveria ter merecido a resposta de "Provado", e o quesito 143° a resposta de "apenas provado que a árvore tombou toda".

2. Os depoimentos dos Senhores Eng.ª CA e Eng.º TO não podem ser valorados na apreciação da matéria de facto - enquanto prova testemunhal, na medida em que nenhum dos dois viu a árvore ou o terreno onde a mesma esteve implantado antes ou depois do acidente, tendo-se limitado a tirar ilações de fotografias, confessando ambos que sem ter visto a árvore antes da queda e a ter submetido a análises, todas as conclusões que extraíram não passam de meras hipóteses, nem enquanto prova pericial, já que esta não foi requerida por nenhuma das partes;

3. Idêntico erro na apreciação da prova se verificou na resposta dada ao quesito 116°. Mediante o depoimento da testemunha JC e os docs. juntos pela R. a fls. 1266 e ss, impunha-se que tal quesito recebesse a resposta de "Provado";

4. Já o quesito 131° não foi, pura e simplesmente respondido pela Mma. Juiz a quo, devendo o mesmo, por imposição do disposto no art. 24° do Cód. Estrada, ter merecido a resposta de "Provado";

5. Também se verificou erro na apreciação da prova na resposta ao quesito 131°-A, que, perante a prova produzida, designadamente quanto ao estado meteorológico e escuridão da noite de 6 de Dezembro de 2000, o limite máximo de velocidade permitido para aquele troço da EN 118 e a velocidade que se deu como assente a que circulava o veículo onde seguia a 1.ª A., impunha-se responder ao mesmo como "Provado";

6. Independentemente da procedência da impugnação sobre o julgamento da matéria de facto, a matéria constante dos autos, só por si, implicava a improcedência do peticionado pelos A.A.;

7. Por um lado, não existe nenhum facto voluntário ilícito da Ré gerador dos danos alegados pelos AA.;

8. Na verdade, entende a Ré que foi a queda da árvore e não a sua implantação, crescimento e manutenção o facto gerador dos danos sofridos pelos AA.;

9. Ora, para que haja responsabilidade civil do agente, "é necessário ... um facto voluntário do agente (não um mero facto natural causador de danos) ... o elemento básico da responsabilidade é o facto do agente, um facto dominável ou controlável pela vontade... ";

10. A queda da árvore, em si mesma, e como reconhecido pelo Tribunal a quo – v. fls. 34 da sentença recorrida – não foi um facto voluntário da Ré, por ela querido ou sequer antevisto, não estando assim verificado, desde logo, o primeiro dos requisitos legais para verificação da responsabilidade civil da Ré;

11. Mas mesmo que se considerasse como o Tribunal a quo que o facto gerador dos danos sofridos pelos AA. foi a implantação, crescimento e manutenção da árvore, o que só se configura por dever de patrocínio, nunca a responsabilidade da Ré se verificaria;

 12. Como é do conhecimento comum e resultou evidente dos depoimentos das testemunhas Enga CL, Eng° T e Eng° MT, as acácias são de geração espontânea, nascendo de toiça, pelo que quanto à implantação e crescimento da mesma nada poderá ser imputado à Ré, colocando-se a questão apenas quanto à manutenção da árvore;

13. Ora, e como atrás exposto, a omissão (neste caso do abate da árvore) não é, em si, susceptível de gerar directamente os danos sofridos pelo lesado - apenas poderá ser sua causa no caso em que haja um dever jurídico de praticar um acto que impedisse a consumação desse dano;

14. Sucede que, a árvore em causa esteve implantada na chamada "zona da estrada nacional", pelo que a mesma constituía património do Estado — v. resposta ao quesito 6°, al. a), n° 1 art. 2° do D.L. n° 13/71, de 23.01, e art. 11° da Lei n° 2.037/49, de 19.1949.

15. Ou seja, sendo a árvore em causa nos presentes autos propriedade do Estado e não da Ré, não estava aquela, sequer, em poder desta.

16. Acresce que a EP - Estradas de Portugal, S.A. (anterior IEP, anterior JAE) se encontra legalmente obrigada a vigiar e a conservar as estradas nacionais, os terrenos adjacentes e as árvores neles plantadas, incumbindo, assim, o dever de vigiar/abater a árvore à EP e não à Ré.

17. Isto é, o dever jurídico de abater a árvore, que manifestamente impediria a queda da árvore e, consequentemente, os danos sofridos pelos AA., não incumbia à Ré, pelo que o facto dela se ter abstido de mandar abater a árvore não pode ser entendido como causa dos danos sofridos pelos AA., sendo, por isso, insusceptível de gerar a sua responsabilidade civil — ex vi art. 486° C. C., a contrario senso;

18. Por outro lado, o facto da árvore não ser propriedade da Ré nem tendo a mesma o dever legal de a vigiar, fica afastada a previsão do art. 493° do C. Civ., não havendo qualquer inversão do ónus da prova da culpa — este incumbia, assim, aos AA., que, manifestamente, não lograram fazê-lo;

19. De facto, para além de não existir qualquer facto voluntário e ilícito imputável à Ré, a sua conduta não pode ser qualificada de culposa;

20. A culpa da Ré teria, por força do disposto no art. 487°, n° 2 do C.Civ., de ser aferida, em face das circunstâncias deste caso concreto, pela diligência da figura do bom pai de família.

21. Ficou provado que nem os utentes da EN118, nem os órgãos municipais, nem o Presidente da Câmara Municipal de B, nem os Bombeiros nem a então Junta Autónoma de Estradas alertou a Ré para os "perigos do local", nem lhe recomendaram que procedesse ao abate da árvore — v. resposta quesitos 19°, 125° e 126° da BI;

22. Se nenhuma dessas entidades avisou a Ré do risco que a árvore em questão representava para a circulação rodoviárias, era porque tal risco não era configurável por pessoas comuns, nem sequer por especialistas.

23. De igual modo, resultou do depoimento da Eng.ª CL - no qual se louvou o Tribunal a quo -, que para se aferir qual o verdadeiro estado fitossanitário de uma árvore seria necessário, retirar amostras do lenho e analisá-lo laboratorialmente, ou seja, que só mediante análise laboratorial — e não apenas a mera observação da árvore — é possível afirmar que uma árvore tem algum problema fitossanitário;

24. Isto é, se nem os técnicos, com formação, conhecimentos e experiência adequados podem antever o risco de queda da árvore sem antes analisar a mesma laboratorialmente, corno se pode exigir ao homem médio, neste caso a Ré, que o tenha antevisto?
 
25. Sendo a Ré fisioterapeuta, não tendo nenhum conhecimento de silvicultura, não tendo sido avisada por quem quer que fosse para proceder ao abate da árvore, não poderá deixar de concluir-se que a mesma agiu com a diligência que lhe era exigível, - exigível a qualquer homem médio - não tendo praticado qualquer acto legalmente censurável;

26. A árvore caiu devido a uma conjugação catastrófica de uma série de factores, todos fora do controlo da Ré: a imprevisibilidade própria da natureza, a qualidade do solo, a inclinação da árvore e as condições climatéricas que se fizeram sentir no dia e noite do acidente;

27. Verificou-se, como aliás já apurado em sede de investigação criminal pelos competentes serviços do M.P., que a árvore caiu por uma causa natural e imprevisível, pelo que não houve qualquer culpa por parte da Ré.

28. Por outro lado, os AA. bem sabendo que a entidade responsável pelas consequências da queda da árvore é a EP - Estadas de Portugal, S.A., intentaram contra tal instituição uma acção judicial arguindo a sua responsabilidade civil e peticionando a sua condenação no ressarcimento dos danos sofridos;

29. No âmbito de tal acção, que correu termos na 6.ª Unidade Orgânica do Trib. Administrativo de Círculo de Lisboa, , foi, em 30.12.2008, portanto, antes da prolação da sentença ora apelada, proferida sentença que condenou o antigo IEP – hoje EP – Estradas de Portugal, S.A. -, integralmente em todos os pedidos formulados pelos AA., v. cit. Doc. n° 1, que aqui se dá por reproduzido;

30. Não tendo sido nos presentes autos configurada pelos AA. a hipótese de responsabilidade solidária, só uma entidade poderá ser responsabilizada pelos danos causados aos AA. – a responsabilidade de uma exclui necessariamente a responsabilidade da outra.

31. Ou seja, a responsabilidade da EP, S.A. pelos danos causados aos AA. pela queda da árvore exclui manifestamente a responsabilidade da Ré ora apelante.

32. A decisão da presente causa, está, assim, dependente do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Trib. Administrativo e Fiscal de Lisboa, pelo que, ex vi n° 1 do art. 279° do C.P.C., deverá este Tribunal ordenar a suspensão da instância nos presentes autos até trânsito em julgado daquel'outra decisão.

33. Por outro lado, ainda, não poderá deixar de arguir-se expressamente a nulidade da sentença recorrida com base na al. d), do n° 1 do art. 668° do C.P.C.;

34. A Ré, tanto na sua Cont. como em sede de alegações de direito, suscitou a questão de a árvore que caiu sobre o veículo onde seguia a 1.ª A. em 06.12.2000, não lhe pertencia e que o dever da sua vigilância incumbia ao IEP, mas a Mma Juiz a quo não se pronunciou sobre tal matéria;

35. Ora, e como resulta do exposto supra, tal matéria é decisiva à boa decisão da causa, pelo que deveria a Mma Juiz a quo ter-se pronunciado sobre a mesma. Não o fazendo, feriu a sentença proferida de nulidade.

36. Por dever de patrocínio, mais se dirá, sem conceder, que concluindo-se pela responsabilidade civil da Ré, a indemnização em que a mesma venha a ser condenada terá de ser equitativamente reduzida, atentos os rendimentos da Ré e o seu baixo grau de culpabilidade.

37. Julgando como julgou, a douta sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 347°, 371°, 493° e 494°do Código Civil, e, ainda, o art.. 668°, n° 1, al. d) do C.P.C.

Conclui, assim, pela suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão proferida na causa prejudicial, isto é, no âmbito do Processo que, sob o n.º, corre termos do Trib. Administrativo de Círculo de Lisboa;

Caso assim não se entenda, entende que deve ser decretada a nulidade da sentença apelada, por omissão de pronúncia, ex vi al. d), do n° 1 do art. 668° do C.P.C., devendo, sempre e em qualquer caso, ser dado provimento ao recurso de apelação, revogando-se a sentença do Tribunal de 1.ª Instância, alterando-se nos termos requeridos a decisão que respondeu à matéria de facto que integra a base instrutória, e em qualquer caso, julgando improcedentes os pedidos dos AA. e absolvendo-se a Ré dos mesmos.

Também os AA. apelaram do assim decidido, tendo apresentado alegações onde formulam as seguintes conclusões:

1. A generalidade dos danos foi computada na petição, e alguns mesmo no articulado superveniente, em montante inferior ao real.

No entanto, o Tribunal deve computar os danos parcelares pelo seu valor justo, ainda que superior ao indicado pelos AA., conforme é pacificamente entendido pela jurisprudência e resulta, aliás, da la parte do art°. 569° do Código Civil.

 Com efeito, só a indemnização global atribuída a cada Autor (neste caso à M) ou conjunto de Autores (aqui o A e a C) está sujeita à proibição de condenação "ultra petitum" — art°. 661° N° 1 do C.P.C.

2. A tetraplegia é o grau ínfimo da condição humana, fundamento legal, pelo menos na Holanda, de eutanásia.

A M quer morrer mas continua viva e com inteira consciência do seu estado, sofrendo o mais horroroso, o mais trágico, de todos os sofrimentos. A M está destruída enquanto ser humano.

3. Por isso e por tudo o mais que, nessa sede, vem provado, os seus danos não patrimoniais devem ser computados pelo Tribunal da Relação em € 1.200.000,00.

Decidindo, nessa parte, como decidiu, a douta sentença recorrida violou o disposto no art°. 496° N°s. 1 e 3 do Código Civil.

4. Como se assinala na decisão recorrida, o cruel sofrimento diário dos AA. A e C é bem maior do que o que teriam se a M tivesse morrido.

Estão, emocional, psicológica e psiquicamente à beira do abismo, sobretudo a C cujo estado de saúde mental é trágico.

 Convivem diariamente com uma filha totalmente desvalorizada e destruída como pessoa e que pede que lhe ponham termo à vida.

5. Por isso e por tudo o mais que, nessa sede, vem provado, deve o dano não patrimonial da A. C ser computado em € 250.000,00 e o do Autor A em € 150.000,00.

Decidindo, nessa parte, como decidiu, a sentença recorrida fez incorrecta aplicação do disposto no art°. 496° N°s. 1 e 3 do Código Civil.

6. A Ré não agiu, como vem decidido, como "mera culpa", mas sim com culpa grosseira, escandalosa, a roçar o dolo eventual.

7. Os danos patrimoniais da M, resultantes da perda da sua capacidade de ganho, serão seriamente acrescidos no futuro, entre outras razões porque a sua idade (19 anos à data do acidente), as suas qualidades de trabalho, a sua inteligência, a sua perseverança, a sua personalidade lutadora, as legítimas expectativas de no futuro aumentar em muito os seus rendimentos e tudo o mais que, sob esse aspecto, vem provado, justificam que, a esse título, lhe seja atribuída indemnização de € 400.000,00, acrescida de juros legais a partir da citação.
 
A decisão ora sindicada violou, ao atribuir-lhe indemnização parcelar inferior a esse montante, o disposto nos art°s. 562°, 564° N°s. 1 e 2, e 566° N°s. 2 e 3, todos do Código Civil.

8. Também o dano emergente da aquisição a fazer pela M, de bens e serviços necessários ao seu tratamento e acompanhamento foi computado na sentença recorrida com excessiva parcimónia, assim se tendo violado as disposições legais referidas na conclusão anterior.

9. Considerando o que vem provado na sentença e que os valores de despesas e custos aí referidos aumentarão sempre no futuro (sendo certo que o valor constante da resposta ao quesito 96° rapidamente ascenderá a 3 ou 4 vezes mais), a indemnização parcelar a atribuir à M, nessa vertente (conclusão 8), deve ser fixada em € 400.000,00, acrescida dos juros legais pedidos.

10. Falece razão à M.ma Juíza quando decide que não é de atribuir indemnização à M pela aquisição da viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, que já tem, porque "não resulta da factualidade assente quem a pagou".
 
11. Efectivamente, não só se presume que quem pagou a coisa comprada foi o comprador, como o saber-se quem efectivamente pagou ou está a pagar aquela viatura é "res inter alios" relativamente à Ré, conforme se decidiu no acórdão do S.T.J. atrás referido.

12. A viatura foi comprada pela M, para a M e por causa da deficiência de que ficou a sofrer.

Mesmo que, por hipótese, tivesse sido doada, a doação teria sido feita a ela e não à ré, sendo ilegal, imoral e injusto que esta se "transformasse" em beneficiária dessa suposta doação.

Como se escreve no referido acórdão, "é indiferente que o pagamento das respectivas importâncias houvesse sido feito por outrem, fosse por empréstimo, fosse por doação, caridade, por engano ou por qualquer outra razão ou até sem razão nenhuma, pois a questão está tão só em que foram pagas".

13. Independentemente do exposto, o rigor impõe que se altere a resposta aos quesitos 109°, 110°, 111°, 167° e 168°, que deve passar a ser a seguinte:

"Provado que a 1ª Autora precisa de adquirir uma viatura automóvel "transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%", que actualmente já comprou uma que custou € 27.999,20, e posteriormente precisará de outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não será inferior a € 28.000,00 ".

É isso que resulta do documento de fls. 537/538 e dos depoimentos das testemunhas F, H e P, que foram indevidamente desvalorizados.

14. Face ao exposto deve esse dano — o referido na conclusão 10 — ser computado em € 27.999,20, arbitrando-se à A. M a correspondente indemnização, com juros legais a partir da notificação do articulado superveniente.

Decidindo doutro modo, a sentença violou o disposto nos artºs. 562° e 566° n°s. 1 e 2 do Código Civil.

15. Ao não arbitrar, pela razão que indicou, aos AA. A e C, casados no regime de comunhão de adquiridos (ver doc. de fl. 261), indemnização correspondente aos lucros cessantes do encerramento do mini-mercado que a A. C explorava, a M.ma' Juíza "a quo" partiu do errado pressuposto de que, antes do acidente, os rendimentos do casal A/C eram unicamente os lucros do mini-mercado.

16. Terá também eventualmente partido de outro errado pressuposto: o de que a A. C trabalharia agora no restaurante que o casal entretanto abriu (e diz-se "o casal" porque, atento o regime de bens do casamento, o restaurante é um bem comum).

17. Aliás, na resposta ao quesito 175° o Tribunal recorrido conheceu dum facto, depois vertido na sentença, que nunca foi alegado por ninguém.

Procedeu assim no segmento em que deu como provado, sob pretexto de que se trataria dum "esclarecimento", que o 2º A. se encontrava actualmente a trabalhar em B, onde abriu, com a 3ª A., um estabelecimento de restauração.

18. Conheceu, nessa parte, de facto que não podia conhecer, por nunca ter sido alegado por qualquer das partes, pelo que a resposta em causa e a sentença são, nessa parte, nulas – alínea d) do N° 1 do art. 668° do C.P.C. – o que determina que esse suposto "esclarecimento" deve considerar-se não escrito.
 
19. Regressando agora à questão substantiva resumida nas conclusões 15) e 16), assinala-se que nunca os AA. pediram indemnização emergente de uma eventual perda da capacidade de ganho do A. A, que não existiu, nem foi alegada, mas sim e só da A. C.

A situação laboral do A só veio a ser referida no articulado superveniente, mas unicamente para ser valorada em sede de dano não patrimonial.

20. Há manifesta contradição entre o(s) falso(s) pressuposto(s) de que partiu a M.ma Juíza e a resposta dada ao quesito 100°, do qual resulta que foi a C (e só ela) quem teve de encerrar (no singular e não no plural) o estabelecimento que explorava (de novo no singular) e de que auferia (ela, C) rendimentos.

21. Esse(s) falso(s) pressuposto(s) contraria(m) também as respostas dadas aos quesitos 97°, 98°, 99°, 112°, 114°, 176°, 177°, 178°, 179° e 180°.

22. Para hipótese, que não se aguarda, de não procederem as conclusões antecedentes, a resposta ao quesito 175° deve ser alterada no seguinte sentido:
 
            "Provado que durante o tempo em que o 2° A. viveu em V só vinha a B, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas".

23. Essa resposta já não permite as indevidas pressuposições de que partiu a Mma Juíza e é a que resulta da prova produzida, designadamente dos depoimentos das testemunhas F, H e P.

24. Do exposto resulta que deve ser atribuída indemnização aos AA. A e C, a título de lucros cessantes resultantes da perda dos lucros obtidos no mini-mercado que a A. C explorava e que teve de ser encerrado para prestar assistência permanente à M.

25. Esse dano deve ser computado em € 250.000,00, com juros legais a partir da citação.

Ao abster-se de o computar e atribuir a correspondente indemnização, a decisão recorrida violou o disposto nos art°s. 562°, 564° N°s. 1 e 2 e 566° N°s. 2 e 3, todos do Código Civil.

26. As quantias parcelares referidas nas conclusões 3, 5, 7, 9, 14 e 25 acrescem às demais não postas em causa neste recurso, de onde resulta que os danos globais dos 3 autores foram superiores aos pedidos formulados.

Assim, e atenta a proibição constante do N° 1 do art°. 661° do C.P.C., deve ser julgado procedente este recurso, condenando-se a ré a pagar aos autores as quantias constantes dos pedidos ampliados.

28. Conforme já resulta destas alegações, requer-se que se cumpra o disposto no N° 5 do art°. 690°-A do C.P.C., relativamente ao depoimento das seguintes testemunhas:

AS, (inquirido em 05/05/2.008, cassete N° 1, lado B, voltas 1.448 a 1.750 e cassete N° 2, lado A, voltas 0000 a 0498).

AM, inquirido em 29/10/2.007, cassete N° 1, lado A. de voltas 1.545 a 2.500 e lado B, voltas 0000 a 1.800 — fl.933.

JJ, inquirido no mesmo dia, cassete 2, lado A, voltas 0000 a 1.568 — fl. 934.

JC, inquirido na mesma data, cassete 2, lado B, voltas 1.569 a 2.500; cassete 3, lado A, voltas 0000 a 1.400 — fls. 934/935.

JP, inquirido também em 26/10/2.007, cassete 3, lado A, voltas 1.401 a 2.500 e lado B, voltas 0000 a 0989 — fl. 935.

A G, inquirido em 16/10/2.007, 2 cassetes N° 1, lado A, voltas 0000 a 2.297 — fls. 1.061/1.062.

A C, inquirido em 16/10/2.007, cassete N° 1. lado A, voltas 2.229 a 2.500 e lado B, voltas 000 a 2.278 — fl. 1.070.

CL, inquirida na mesma data, cassete 1, lado B, voltas 2.279 a 2.500; cassete 2, voltas 0000 a 1.729 — fls. 1.070/1.071.

JO, inquirido na mesma sessão de julgamento, cassete 2, lado B, voltas 1.730 a 2.500; cassete 3, lado A, voltas 0000 a 2.438 — fl. 1.071.

N, também inquirido nessa sessão, cassete 2, lado B, volta 1.730 a 2.500; cassete 3, lado A, voltas 2.440 a 2.500 e lado B, voltas 0001 e seguintes.

DS, inquirido em 26/11/2.007, 2 cassetes N° 1, lado A, voltas 0000 a 2.297 — fl. 1.097.

A MC inquirido em 26/11/2.007, 2 cassetes N° 2, lado B, voltas 1.279 a 2.347 — fls. 1.098/1.099.

T, inquirido em 26/11/2.007, 2 cassetes N° 3, lado B, voltas 1.987 a 2.500 e 2 cassetes N° 4, lado A, voltas 0000 a 2.325 — fl. 1.110.

A G, inquirido novamente em 11/12/2.007, cassete 2, lado A, voltas 0676 a 1.655 — fl. 1.176.
       
II. FACTOS PROVADOS

1. No dia 06 de Dezembro de 2000 a 1.ª A. viajava na Estrada Nacional (E.N.) 118 no sentido B — S (Alínea A) dos Factos Assentes);

2. Seguia no veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula NT no lugar da frente, ou seja, no banco situado ao lado do condutor, que era o seu amigo, e então namorado, R (Alínea B) dos Factos Assentes);

3. No dia 06.12.2000, cerca das 21:30 horas, junto ao quilómetro 38.300 da E.N. 118, uma árvore caiu em cima do veículo mencionado no ponto 2, no sítio que a 1ª A. nele ocupava (Resposta aos artigos 1.º, 5.° e 18. ° da Base Instrutória);

4. A referida árvore encontrava-se implantada no prédio rústico designado "Pinhal ", descrito na Conservatória do Registo Predial de B sob o n de B (Alínea D) dos Factos Assentes);

5. Desde pelo menos 1995 que a R. é dona desse prédio, possuindo-o, detendo-o materialmente e retirando dele as respectivas utilidades (Alínea E) dos Factos Assentes);

6. A árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. era: uma acácia mimosa; com cerca de 15 metros de altura; pesada; com tronco com cerca de 60 centímetros de diâmetro junto à base; tinha pelo menos 40 anos de idade; e encontrava-se implantada a cerca de três metros do limite do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no sentido B – S (Resposta aos artigos 4. ° e 6.° da Base Instrutória);

7. A árvore que caiu em cima da viatura onde a 1.ª A. seguia tinha raízes à mostra, do lado oposto à estrada, devido ao peso que exercia sobre a base do tronco porque estava inclinada sobre a faixa de rodagem há mais de 10 anos devido ao seu peso e em virtude de o terreno onde estava implantada ser arenoso, com pouca capacidade de fixação de árvores e sujeito a elevada erosão pelos elementos naturais, designadamente chuva e vento (Resposta aos artigos 7. °, 8.º, 9.º, 11.º, 12.° e 13.° da Base Instrutória);

8. Na noite do dia 6 para 7 de Dezembro de 2000, em grande parte do país, incluindo a região de B, o tempo apresentou-se com céu nublado ou encoberto, o vento soprou geralmente moderado de sul, com intensidade máxima instantânea do vento a ter atingido pontualmente valores de 100 km/hora, ou superior, e ocorreram períodos de chuva, aumentando de intensidade a partir do início da noite, tendo a quantidade de precipitação atingido um valor na ordem dos 10 mm e a intensidade máxima de precipitação tenha atingido 1 a 2 mm em 10 minutos (Resposta ao artigo 128. ° da Base Instrutória);

9. A situação descrita no ponto 7, conjugada com o que consta do ponto 8 provocou a queda da árvore sobre a viatura em que seguia a 1.ª A. (Resposta ao artigo 10.° da Base Instrutória);

10. A árvore tombou toda, fracturando-se pela base do tronco, por baixo das raízes que se situavam acima do nível do solo, onde o seu estado fitossanitário apresentava sinais de degradação (Resposta ao artigo 143. ° da Base Instrutória);

11. Perto da referida mimosa e também dentro do prédio da R. encontravam-se outras árvores, algumas delas de grande porte e/ou também inclinadas e com as copas sobre a faixa de rodagem (Resposta ao artigo 14. ° da Base Instrutória);

12. Da propriedade da R. descrita no ponto 4 caiu também, no dia 06.12.2000, uma pernada de um pinheiro, sobre a EN 118, próximo do local onde estava a árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. (Resposta ao artigo 144.º, 145.° e 146.° da Base Instrutória);

13. A vegetação do terreno do prédio da R., junto da EN 118, entre os quilómetros 36 e 39 era tão abundante e intensa que as bermas se encontravam "estranguladas" ou "estreitadas" ao ponto de os peões terem muitas vezes que circular sobre a faixa de rodagem destinada a veículos, o que acontecia há, pelo menos, 5 anos antes de 2000 (Resposta aos artigos 15.º, 16. ° e 17. ° da Base Instrutória);

14. A herdade da R. referida no ponto 4 tem marcos que a delimitam da EN 118 (Resposta ao artigo 115. ° da Base Instrutória);

15. As mimosas têm raízes oblíquas ou fasciculadas, com o esclarecimento de que é uma espécie utilizada para segurar e estabilizar terrenos arenosos e dunas (Resposta ao artigo 119. ° da Base Instrutória);

16. Podem ter uma duração de cerca de sessenta anos (Resposta ao artigo 120.° da Base Instrutória);

17. À R. nada lhe foi dito ou recomendado relativamente à limpeza da sua herdade referida no ponto 4 ou abate de árvores na mesma, pelos órgãos do Município, pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal de B, pelo Senhor Comandante dos Bombeiros ou pela Junta Autónoma das Estradas, antes de 06.12.2000 (Resposta aos artigos 125. ° e 126. ° da Base Instrutória);

18. Entre 6 e 7 de Dezembro o Serviço Nacional de Protecção Civil emitiu os comunicados n°s 18, 19, 20 e 21 conforme cópias fornecidas pelo actual Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil – docs. junto (Alínea J) dos Factos Assentes);

19. Nesses dias 6 e 7 ocorreram quedas de árvores (Resposta ao artigo 129.° da Base Instrutória);

20. O estado do tempo foi divulgado junto da população por diversos meios de comunicação social, designadamente televisões e rádios (Resposta ao artigo 130.° da Base Instrutória);

21. A Estrada Nacional 118 que liga B a S é uma via com cerca de oito metros de largura, habitual e diariamente com grande densidade de tráfego, quer de veículos ligeiros quer de veículos pesados e tractores agrícolas (Resposta ao artigo 121.° da Base Instrutória);

22. A viatura de matrícula NT circulava a uma velocidade não superior a 90 kms/hora (Resposta ao artigo 131. °-A da Base Instrutória);

23. Em sentido contrário – ou seja, no sentido S/B -  circulava outro veículo que era conduzido por A G (Resposta ao artigo 132. ° da Base Instrutória);

24. O condutor da viatura de matrícula NT apercebeu-se que algo estava a cair sobre o veículo que conduzia no momento em que passava, e o condutor da viatura que seguia em sentido contrário se apercebeu que a árvore se partira e tombava sobre a estrada (Resposta ao artigo 133. ° da Base Instrutória);

25. O A M conseguiu parar o veículo que conduzia evitando o choque com a árvore (Resposta ao artigo 134. da Base Instrutória)

26. O condutor da viatura de matrícula NT não travou a viatura que conduzia (Resposta ao artigo 135.° da Base Instrutória);

27. A viatura de matrícula NT ficou imobilizada a cerca de 150 metros da árvore caída (Resposta ao artigo 137. ° da Base Instrutória);

28. Após o acidente, A M retirou a M do veículo em que esta seguia antes da chegada dos Bombeiros ao local (Resposta ao artigo 185.° da Base Instrutória);

29. E depositou o corpo da M no chão até à chegada dos Bombeiros (Resposta ao artigo 186. ° da Base Instrutória);

30. Os bombeiros demoraram menos de 15 minutos a chegar ao local do acidente (Resposta ao artigo 187. ° da Base Instrutória);

31. A M foi bombeiro durante cerca de 27 anos até cerca de 5 a 7 anos antes de 2000, e é possuidor de conhecimento de primeiros socorros (Resposta ao artigo 190. ° da Base Instrutória);

32. E retirou a A. M em conjunto com V que é enfermeira e que se encontrava naquele local (Resposta ao artigo 191. ° da Base Instrutória);

33. A 1.ª A. à data tinha 19 anos (nasceu em 26-07-1981) (Alínea C) dos Factos Assentes);

34. Por força do embate da árvore na viatura onde seguia, a 1.ª A. ficou com as lesões constantes dos pontos 35, 52, 57, e 58 (quesitos 20.°, 37.°, 42.°, e 43.°) (Resposta aos artigos 2. ° e 3. ° da Base Instrutória);

35. A 1.ª A. sofre das lesões constantes dos documentos de fls. 31 a 33 e 35, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, designadamente, fractura das vértebras C3, C4, C5, C6 e C7, com instalação de tetraplegia (Resposta ao artigo 20. ° da Base Instrutória);

36. Foi primeiramente assistida no Hospital de B, depois transportada para o Hospital , de onde foi transferida para a UVM do Hospital (Resposta ao artigo 21.° da Base Instrutória);

37. No Hospital ficou em tracção esquelética até 14-12-2000 data em que foi submetida a intervenção cirúrgica extremamente melindrosa: corporectomia de C4, C5, C6 e artodese com enxerto e placa Orion de C3-C7 — docs. 1 e 2 (Resposta ao artigo 22. ° da Base Instrutória);

38. Como consequência desta intervenção cirúrgica, a 1.ª A. tem uma cicatriz deformante no pescoço, com 9 centímetros de comprimento e 2 centímetros de espessura (Resposta ao artigo 23. ° da Base Instrutória);

39. Foram-lhe então retirados partes de ossos da bacia, do lado esquerdo e direito, que foram enxertados nas cervicais (Resposta ao artigo 24. ° da Base Instrutória);

40. Ficou, nos lados esquerdo e direito do alto ventre (nos sítios de onde foram retirados parte dos ossos enxertados), com duas cicatrizes, uma em cada lado, com 11 centímetros de comprimento e 3 centímetros de espessura cada (Resposta ao artigo 25. ° da Base Instrutória);

41. Em 04,01.2001 foi submetida a nova intervenção cirúrgica para revisão da artodese, reaplicação de parafusos distais, aplicação de mais 2 parafusos de fixação do enxerto; e a outra, mais tarde, para que fosse retirado o material de osteossíntese (Resposta ao artigo 26.° da Base Instrutória);

42. A partir da data do sinistro, a A. passou a ser alimentada através de um tubo gástrico, introduzido pelas narinas, no qual eram injectados "alimentos" (Resposta ao artigo 27. ° da Base Instrutória);

43. Logo depois da intervenção de 04.01.2001 sobreveio uma fístula esofágica alta (Resposta ao artigo 28. ° da Base Instrutória);

44. Pelo que, em 07/11/2001, teve de ser submetida a nova intervenção cirúrgica: uma gastrotomia (Resposta ao artigo 29.° da Base Instrutória);
45. Sendo-lhe então introduzida, no corte cirúrgico, uma sonda através da qual passou a ser alimentada (Resposta ao artigo 30. ° da Base Instrutória);

46. A fístula esofágica "fechou" no início de Dezembro de 2001, pelo que só no dia 05.12.2001 começou a ser alimentada por via oral (Resposta ao artigo 31.° da Base Instrutória);

47. Como consequência da gastrotomia, a l.ª A. ficou com uma cicatriz na zona do estômago, com 10 centímetros de comprimento e 3 centímetros de espessura (Resposta ao artigo 32.° da Base Instrutória);

48. Para tentar colmatar a deformação estética resultante da cicatriz no pescoço, a 1.a A. foi submetida a uma intervenção cirúrgica cujo pré e pós-operatório foram particularmente dolorosos e penosos (Resposta ao artigo 33.° da Base Instrutória);

49. Foi então colocada numa cama "Striker", ficando "entalada" entre duas superfícies (uma inferior e outra superior) giratórias (Resposta ao artigo 34.° da Base Instrutória);

50. Foi-lhe então retirada pele da orelha esquerda para tentar dissimular parcialmente a cicatriz do pescoço (Resposta ao artigo 35.° da Base Instrutória);

51. Essa cirurgia não foi bem sucedida e a 1.ª A. sofreu dores intensíssimas no pré e pós-operatório, tendo ainda ficado com mais uma cicatriz, circular, na orelha, com cerca de 5 cm de diâmetro (Resposta ao artigo 36. ° da Base Instrutória);

52. A 1.ª A. apenas tem sensibilidade do pescoço para cima e nos ombros (Resposta ao artigo 37. ° da Base Instrutória);

53. Por causa da sensibilidade que tinha e ainda tem, sofreu dores de extrema intensidade, que por vezes quase a faziam desmaiar (Resposta ao artigo 38. ° da Base Instrutória);

54. Em 21.01.2002 foi internada no Centro de Medicina de Reabilitação (Resposta ao artigo 39. ° da Base Instrutória);

55. Onde, até 12.07.2002, fez um programa de reabilitação com tratamentos diários de fisioterapia e terapia ocupacional com apoio psicológico (Resposta ao artigo 40.° da Base Instrutória);

56. Naquele Centro fez ainda os exames complementares de diagnóstico que constam do documento n.º 1 (Resposta ao artigo 41. ° da Base Instrutória);

57. A 1.ª A. sofre de forma irreversível de alteração da estrutura das vértebras C3 a C5 e de diminuição acentuada da função respiratória (Resposta ao artigo 42.° da Base Instrutória);

58. A 1.ª A. sofre de incapacidade funcional permanente de 95% com incapacidade total e permanente para o trabalho (Resposta ao artigo 43.° da Base Instrutória);

59. As lesões sofridas, os seus tratamentos e suas sequelas provocaram à 1.ª A. dores lancinantes (Resposta ao artigo 44. ° da Base Instrutória);

60. Desloca-se em cadeira de rodas e necessita de assistência permanente de pessoa nos actos da vida diária, sendo que, para certos actos (tais como, tomar banho e defecar) carece da ajuda de mais uma pessoa (Resposta ao artigo 45. ° da Base Instrutória);

61. Perdeu todos os movimentos e sensibilidade do pescoço para baixo (com excepção dos ombros), designadamente nos órgãos sexuais, nos esfíncteres, no ânus, no recto, nos intestinos, no estômago, no aparelho urinário, no respiratório e nos membros inferiores e superiores (Resposta ao artigo 46. ° da Base Instrutória);

62. Só com o auxílio de medicamentos consegue ter um controle, meramente mecânico e muito relativo, das fezes e da urina (Resposta ao artigo 47. ° da Base Instrutória);

63. Não contém a urina nem as fezes, pelo que é obrigada a usar fraldas (Resposta ao artigo 48. ° da Base Instrutória);

64. Anda permanentemente algaliada (Resposta ao artigo 49.° da Base Instrutória);

65. Tem frequentes infecções urinárias provocadas, sobretudo, pela algaliação (Resposta ao artigo 50. ° da Base Instrutória);

66. Carece e carecerá toda a vida de permanente controlo médico e medicamentoso (Resposta ao artigo 51. ° da Base Instrutória);

67. Corre o risco sério, como todas as pessoas com lesões idênticas às suas, de vir a sofrer graves lesões renais (Resposta ao artigo 52. ° da Base Instrutória);

68. A falta de movimentos provoca e provocará necessariamente, cada vez mais, descalcificação do esqueleto e péssima tonificação da massa muscular (Resposta ao artigo 53. ° da Base Instrutória);

69. E provoca-lhe, constantemente, escaras nas nádegas e no ânus (Resposta ao artigo 54. ° da Base Instrutória);

70. Independentemente das deficiências e patologias de que já sofre precisamente por causa delas – é extremamente vulnerável à contracção de grande número de doenças (Resposta ao artigo 55. ° da Base Instrutória);
71. A 1.ª A. tem a sua expectativa de vida encurtada (Resposta ao artigo 56.° da Base Instrutória);

72. Em 22.01.2007 foram detectados na 1.ª A., marcados sinais de microlitíase bilateral, pelo que foi submetida a litotericia vesical (Resposta ao artigo 156.° da Base Instrutória);

73. Em consequência do mencionado no ponto 72 a 1.ª A. teve fortes hemorragias e chegou a estar com a tensão arterial muito baixa (Resposta aos artigos 157. ° e 158. ° da Base Instrutória);

74. E regressou ainda doente à casa onde habita com os pais, em B (Resposta ao artigo 160.° da Base Instrutória);

75. Não pode ter relações sexuais, nem prazer sexual, nem procriar (Resposta ao artigo 59. ° da Base Instrutória);

76. O namoro que a 1.ª A. tinha antes do embate terminou (Resposta ao artigo 60.° da Base Instrutória);

77. Perdeu quase todos os amigos, por falta de contacto com eles (Resposta ao artigo 61. ° da Base Instrutória);

78. A 1.ª A. tem dificuldade em estar em público ou em eventos sociais pois carece de medicação constante e corre o risco de defecar e urinar sem disso dar conta, só disso se apercebendo pelo cheiro das fezes e da urina (Resposta ao artigo 62. ° da Base Instrutória);

79. A 1.ª A. apresenta sinais de depressão reactiva e ansiosa, tem humor deprimido com concentração dolorosa, padece de perda de iniciativa e de inibição psico-motora, pelo que carece de ser acompanhada por psiquiatra (Resposta ao artigo 63. ° da Base Instrutória);

80.      Vive em permanente estado de amargura, desespero e angústia, inconformada com a sua situação (Resposta ao artigo 64. ° da Base Instrutória);

81. Perdeu a vontade de viver e muitas vezes tem sinceramente pedido que lhe ponham termo à vida (Resposta ao artigo 65.° da Base Instrutória);

82. Ansiava constituir família, ter filhos, e realizar-se profissionalmente, o que deixou de poder fazer (Resposta aos artigos 66. 0, 67. ° e 71. ° da Base Instrutória);

83. Tinha ainda uma grande paixão: as danças de salão, a que se dedicava desde muito jovem (Resposta ao artigo 68.° da Base Instrutória);

84. Era uma exímia dançarina, participando em competições e exibições por todo o país (Resposta ao artigo 69. ° da Base Instrutória);

85. As lesões que sofreu e sofre impedem a 1.ª A. de dançar, o que a angustia profundamente (Resposta ao artigo 70. ° da Base Instrutória);

86. A Autora M carece agora e continuará a carecer de apoio psicológico permanente (Resposta ao artigo 171. ° da Base Instrutória);

87. O apoio psicológico de que a 1.ª A. carece e carecerá é-lhe, actualmente, dado por uma psicóloga que se desloca a sua casa quinzenalmente (Resposta ao artigo 172.° da Base Instrutória);

88. Para além do que consta dos pontos 60, 63, 64 e 66 (resposta aos quesitos 45.°, 48.°, 49.°, 51.°), a 1.ª A. precisa e precisará, para sempre de fazer análises, exames médicos e usar resguardos (Resposta ao artigo 84. ° da Base Instrutória);

89. À data do acidente pertencia (e ainda pertence) ao quadro privativo da Câmara Municipal de B, com a categoria de Auxiliar dos Serviços Gerais, auferindo o vencimento mensal de Esc. 68.900$00 (ver doc. n.° 4), então correspondente ao índice 118, obviamente acrescido do subsídio de alimentação (Resposta ao artigo 72.° Instrutória);

90. Esse vencimento era, em 13 de Setembro de 2003, de € 387,91, correspondente ao índice 125, acrescido de subsídio de alimentação (Resposta ao artigo 73.° da Base Instrutória);

91. Como consequência das lesões de que padece, a 1.ª A. esteve sem trabalhar até 06.12.2003, recebendo o subsídio de doença da ADSE, tendo comparecido, entre a data do acidente e a data de regresso ao trabalho, por 6 vezes a uma Junta Médica, sendo a última em 02.12.2003 a qual determinou o regresso ao serviço da A. M  em 06.12.2003 com serviços adaptados à situação clínica (Resposta aos artigos 74. 0, 75. ° e 76.° da Base Instrutória);

92. A Junta Médica da ADSE reunida em 02 de Dezembro de 2003, referida em 91 da PI, deliberou considerá-la «abrangida pela al. d) do art. 11.° do Decreto-Regulamentar n.° 41/90», de 29 de Novembro, ordenando que então regressasse ao trabalho com serviços adaptados à sua situação clínica (Resposta ao artigo 148. ° da Base Instrutória);

93. Desde então não foi presente à Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações (Resposta ao artigo 149. ° da Base Instrutória);

94. Ainda hoje a Autora M continua funcionária da Câmara Municipal de B (Resposta ao artigo 150. ° da Base Instrutória);

95. E continuará a fazer exames clínicos complementares (Resposta ao artigo 151.° da Base Instrutória);

96. Por força da deliberação de 02 de Dezembro de 2003 da Junta Médica da ADSE, a Câmara Municipal de B adquiriu hardware e software para a Autora M comandar um computador, sendo esse o trabalho que ali faz e continuará a fazer até ser aposentada (Resposta ao artigo 152. ° da Base Instrutória);

97. Aquele comando é feito através de um acessório colocado no nariz e direccionado para as teclas do computador, as acciona através de emissão de raios infravermelhos (Resposta ao artigo 153. ° da Base Instrutória);

98. Em consequência das lesões de que a 1.ª A. padece, a mesma deu 26 dias de faltas por internamento em 2000, 365 dias de faltas por internamento em 2001; 171 dias de faltas por doença e 192 dias de faltas por internamento em 2002; 339 dias de faltas por doença por internamento em 2003; 5 dias de faltas por doença em 2004; 78 dias de faltas por doença e 2 dias de faltas por internamento em 2005; e 45 dias de faltas por doença e 30 dias de faltas por internamento em 2006 contabilizadas até ao dia 20 de Dezembro de 2006 (Resposta ao artigo 154.° da Base Instrutória);

99. Após o dia 20 de Dezembro de 2006 até ao dia 22 de Fevereiro de 2007, a 1.ª A. deu, pelo menos, mais 51 dias de faltas ao trabalho, pois esteve internada desde 21.11.2006 até 09.02.2007, data da alta, no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão para realização de exames médicos (Resposta aos artigos 155.° e 159.° da Base Instrutória);

100. Sendo auxiliar dos Serviços Gerais à data do acidente posicionada no escalão 1 ainda hoje se mantém nesse mesmo escalão (Resposta ao artigo 162. ° da Base Instrutória);

101. Se a 1.ª A. não tivesse dado as faltas por doença que deu, teria progredido para o escalão 2, índice 137, em 1 de Novembro de 2004 e por força de tal progressão teria auferido mensalmente: desde Novembro de 2004 o vencimento de € 425,15, desde Janeiro de 2005, o vencimento de € 431,51, e desde Janeiro de 2006, o vencimento de € 441,03, porém como não progrediu, auferiu mensalmente: o vencimento de € 397,22 desde Novembro de 2004, € 434,51 desde Janeiro de 2005 e desde Janeiro de 2006 € 412,06 (Resposta ao artigo 163.° da Base Instrutória);

102. A Autora M ainda não foi aposentada (Resposta ao artigo 147.° da Base Instrutória);

103.    Além de exercer a actividade profissional, a 1.ª A. estudava na E Secundária de B, no ensino secundário recorrente por unidades capitalizáveis em regime nocturno, tendo concluído no ano lectivo de 2000/2001 mais de 1/3 da totalidade das unidades que constituem o curso, o que lhe deu equivalência ao 10.° ano de escolaridade (Resposta ao artigo 78. ° da Base Instrutória);

104.    Antes do sinistro era uma pessoa inteligente, muitíssimo trabalhadora, activa, alegre, feliz, saudável e cheia de dinamismo (Resposta ao artigo 79. ° da Base Instrutória);

105.    Era intenção da 1.ª A. concluir o ensino secundário e tirar um curso superior para progredir profissionalmente, melhorar os rendimentos do seu trabalho e enveredar por uma profissão em que auferisse melhor remuneração do que aquela que poderia receber como funcionária pública na carreira a que pertencia (Resposta aos artigos 80. °, 81. 0, 82.° e 83.° da Base Instrutória);

106.    Para o resto da vida da 1.ª A., as despesas com assistência médica e medicamentosa e de meios auxiliares de diagnóstico terão um custo médio mensal não inferior a € 110,00; as despesas com fraldas e algálias um custo médio não inferior a € 150,00 por mês; e os transportes a médicos e psiquiatra um valor médio mensal não inferior a € 40,00 (Resposta aos artigos 90. ° 91. ° e 92. ° da Base Instrutória);

107.    Ademais, a 1.ª A. precisa de comprar outros equipamentos indispensáveis para minorar as suas deficiências e, por isso, muitos deles foram prescritos na Clínica de Alcoitão — vide doc. n.° 1 — que só não foram adquiridos por insuficiência económica dos AA.(Resposta ao artigo 105. ° da Base Instrutória);

108.    A 1.ª A. precisa e já tem uma cadeira de rodas eléctrica, movida por comando accionado pela cabeça, cujo preço unitário é de cerca de € 35.000,00 podendo necessitar de adquirir outras em virtude do desgaste daquela (Resposta aos artigos 106. 0, 164. 0, 165. ° e 166. ° da Base Instrutória);

109.    Para ocupar parte do tempo carece de adquirir um computador (e posteriormente outros) com sistema de infra-vermelhos para escrita, stick bucal e software compatível, cujo custo unitário não é inferior a € 2.500,00, a valores actuais (Resposta ao artigo 107. ° da Base Instrutória);

110.    Terá de comprar um elevador de transferências, cujo custo não é inferior a € 1.472,00, conforme documento de fls. 52, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (Resposta ao artigo 108. ° da Base Instrutória);

111.    A 1.ª A. precisa de adquirir uma viatura automóvel "transformada para transporte de passageiro com deficiência motora superior a 90%", que actualmente já tem, e posteriormente outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não é inferior a € 28.000,00 (Resposta aos artigos 109. 0, 110. 0, 111. 0, 167.° e 168.° da Base Instrutória);

112.    Sempre que comprar uma viatura tem de comprar a respectiva plataforma de acesso e acessórios, de acordo com as características das viaturas e da cadeira de rodas que então usar (Resposta ao artigo 169.° da Base Instrutória);

113.    A preços actuais cada plataforma e acessórios é de cerca de € 2.500,00 (Resposta ao artigo 170.° da Base Instrutória);

114.    Na falta dos seus pais, a 1.ª A. terá de contratar alguém que lhe preste assistência permanente num valor anual não inferior a € 14.000,00 (€ 1.000,00 x 14 meses) (Resposta ao artigo 113.° da Base Instrutória);

115.    Os 2.° e 3° AA. são, respectivamente, pai e mãe da 1.ª A. (Alínea F) dos Factos Assentes);

116.    A 3.ª A. tem 42 anos de idade pois nasceu em 20-06-1961 (Alínea G) Factos Assentes);

117.    O 2.° A. tem 44 anos de idade pois nasceu em 04-09-1959 (Alínea H) dos Factos Assentes);

118.    As despesas relacionadas com as despesas médicas, medicamentosas e de higiene diária da 1.ª A. são suportadas pelos 2.° e 3.° AA., que são seus pais, e são casados no regime de comunhão de adquiridos (Resposta ao artigo 85. ° da Base Instrutória);

119.    Desde o momento da alta da A. M  até Novembro de 2003, os 2.° e 3.° AA. despenderam uma média mensal de cerca de € 150,00 com despesas com medicamentos e transportes da 1.ª A. a médicos e laboratórios, e uma média mensal de cerca de € 150,00 com gastos com fraldas e algálias para a 1.ª A. (Resposta aos artigos 86. ° 87. ° 88. ° e 89. ° da Base Instrutória);

120.    Os 2.° e 3.° AA. visitaram e apoiaram diariamente a 1.ª A. durante todo o tempo em que esteve internada, primeiro no Hospital S. José e depois em Alcoitão (Resposta ao artigo 93.° da Base Instrutória);

121.    Essas visitas não eram, durante os dias úteis, em simultâneo, pois a 3.ª A. ia o dia inteiro e o 2.° A. visitava-a à hora de almoço, no intervalo do trabalho (Resposta ao artigo 94. ° da Base Instrutória);

122.    Entre os dias 06.12.2000 e 21.01.2002, com deslocações ao Hospital, onde a 1.ª A. esteve internada: o 2.° A. despendeu uma quantia média mensal de € 150,00 relativa a gasolina e portagens; e a 3.° A. uma quantia média mensal não inferior a € 85,80 para aquisição de passe da empresa de camionagem para as deslocações de B a e a quantia diária de € 1,00 para os bilhetes de ida e de volta de metropolitano entre o local onde parava a camioneta proveniente de B e o Hospital (Resposta ao artigo 95. ° da Base Instrutória);

123.    Entre os dias 21.01.2002 e 12.07.2002, com deslocações à Clínica de recuperação de Alcoitão, onde a 1.a A. esteve internada: o 2.° A. despendeu uma quantia média mensal de € 150,00 relativa a gasolina e portagens; e a 3.° A. uma quantia média mensal não inferior a € 85,80 para aquisição de passe da empresa de camionagem Ribatejana para as deslocações de B a Lisboa, bem como a quantia diária de € 1,00 para os bilhetes de ida e de volta de metropolitano entre o local onde parava a camioneta proveniente de B e a estação de comboios de Cais do Sodré, e a quantia diária de € 9,00 para os bilhetes de ida e volta entre a estação de comboios de Cais do Sodré e a Clínica de recuperação de Alcoitão (Resposta ao artigo 96. ° da Base Instrutória);

124.    Desde a data da alta, a assistência permanente à 1.ª A. tem sido assegurada pela 3.a A. e quando necessário e possível, pelo 2.° A. (Resposta aos artigos 98. 0, 112.° e 114.° da Base Instrutória);

125.    Que passa todo o tempo consigo (Resposta ao artigo 99.° da Base Instrutória);

126.    Por isso, a 3.a A. teve de encerrar, em Agosto de 2002, um pequeno estabelecimento de mini-mercado de que era proprietária com o seu marido e que explorava, do qual auferia mensalmente, em média, o lucro de € 1.500,00 (Resposta ao artigo 100.° da Base Instrutória);

127.    Os 2.° e 3.° AA. efectuaram alterações arquitectónicas na casa onde habitam com a 1.a A., tendo em vista a criação de acessibilidades destinadas a minorar dificuldades motoras daquela, que foram orçamentadas em € 31.324,00; com o esclarecimento que os 2.° e 3.° AA. já pagaram a quantia de € 20.000,00 (Resposta ao artigo 101. ° da Base Instrutória);

128.    Fizeram, designadamente, as seguintes obras (ver doc. n.° 11):
            - Alargaram 4 portas para que a cadeira de rodas da filha pudesse por elas passar;
            - fizeram duas novas portas (aberturas);
            - construíram um novo quarto adaptado para a deficiência da 1.a A.; - junto a esse novo quarto, construíram uma casa de banho com espaço para a cadeira de rodas e com louças adaptadas à deficiência;
            - para construir aquela casa de banho tiveram que alterar as canalizações da casa;
            - adquiriram e montaram uma porta de correr para aquela casa de banho;
            - construíram uma rampa na entrada da casa (Resposta ao artigo 102. ° da Base Instrutória);

129.    Gastaram com a aquisição de uma cadeira de rodas quantia não concretamente apurada (Resposta ao artigo 103. ° da Base Instrutória);

130.    Gastaram com a aquisição de uma cama articulada, com colchão anti-escara, adaptada à deficiência da filha, a quantia de € 2.950,00 — doc. n.° 12 (Resposta ao artigo 104.° da Base Instrutória);

131.    As despesas emergentes do estado de saúde de M obrigaram o Autor A, seu pai, a aceitar ir trabalhar para V no dia 15 de Maio de 2006, a fim de melhorar os proventos da sua profissão (Resposta ao artigo 173.° da Base Instrutória);

132.    Até então trabalhava em V, indo e vindo todos os dias de casa para o trabalho (Resposta ao artigo 174. ° da Base Instrutória);

133.    Durante o tempo em que o 2.° A. viveu em V, só vinha a B, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas, com o esclarecimento de que o 2.º A. encontra-se actualmente a trabalhar em B onde abriu, com a 3.ª A., um estabelecimento de restauração (Resposta ao artigo 175.° da Base Instrutória);

134.    Ambos os Autores A e C passaram a carecer de apoio médico regular, designadamente psiquiátrico (Resposta ao artigo 176.° da Base Instrutória);

135.    Desde o começo de 2006 a Autora C passou a ter acompanhament médico e medicamentoso constante, por causa do seu estado de depressão ansiosa (Resposta ao artigo 177.° da Base Instrutória);

136.    Tem dificuldade em dormir e constantes pesadelos, agravados pelo facto de, de 3 em 3 horas, ter de se levantar para mudar a M de posição, sob pena de esta vir a ter ainda mais escaras no corpo (Resposta ao artigo 178.º da Base Instrutória);

137.    Sofre e sofrerá de inquietação permanente, desconcentração, desconforto emocional e físico, desinteresse pelo relacionamento social, fadiga persistente mesmo sem esforço físico, desatenção para consigo própria e enorme ansiedade (Resposta ao artigo 179.° da Base Instrutória);

138.    Tem dificuldade em pensar, reflectir e tomar decisões (Resposta ao artigo 180. ° da Base Instrutória);

139.    Já sofre e continuará a sofrer de distúrbios psico-somáticos, como perturbações gástricas, dores no corpo, febre, cefaleias intensas, cansaço e perda de energia (Resposta ao artigo 181. ° da Base Instrutória);
140.    Também o Autor A, sobretudo desde que foi para V, sofre dos distúrbios referidos de 179 a 181, embora de forma menos intensa que a Autora C (Resposta ao artigo 182. ° da Base Instrutória);

141.    Todos os Autores vivem em estado de permanente tristeza profunda, melancolia, desconforto emocional e físico (Resposta ao artigo 183. ° da Base Instrutória);

142.    Aumentam dia a dia a tristeza e a revolta da M, por ver que o seu estado de saúde é um ónus emocional, psíquico e financeiro cada vez maior para seus pais (Resposta ao artigo 184. ° da Base Instrutória);

143. O inquérito n.° foi arquivado pelo M.° P.° com fundamentos constantes do despacho de fls. 93 e 94 junto aos autos (Alínea 1) dos Factos

            III. FUNDAMENTAÇÃO
           
            Ambas as partes recorreram da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, quer no que concerne aos factos fixados, cuja alteração solicitam, quer no que se reporta à aplicação do Direito aos factos.

            Por uma questão de economia processual e melhor compreensão das questões colocadas, proceder-se-á à análise das situações que se prendem com a análise da matéria de facto em cada um dos recursos interpostos, ficando para final a apreciação da aplicação do Direito a esses mesmos factos.

            Entende a Apelante J que o Tribunal deverá alterar a matéria de facto constante dos quesitos que se passam a enumerar, alegando ainda que o quesito 131.º da Base Instrutória não foi objecto de resposta pelo Tribunal.

            Seguindo a mesma linha de raciocínio desta Apelante, agrupar-se-ão os quesitos em relação aos quais se pretende a alteração fáctica para que a sua análise tenha o mesmo alinhamento lógico.

Assim, entende a Apelante que o Tribunal de 1.ª Instância deve alterar o conteúdo das respostas dadas aos quesitos 6.º, 7.º, 8.º, 117.º e 143.º da Base Instrutória, passando a constar quanto aos mesmos as seguintes respostas: relativamente aos quesito 7.º e 8.º - “Não Provado”; o quesito 6.º a resposta de “Provado apenas que a árvore em causa encontrava-se implantada na berma do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no caminho B – S”; o quesito 117.º a resposta de “Provado” e o quesito 143.º a resposta de “Apenas provado que a árvore tombou toda”.

Para tanto, e em resumo, refere que os depoimentos das testemunhas Eng.ª CL, Eng.º T e Eng.º MT, impunham resposta aos quesitos nos termos propostos e não, como o entendeu o Tribunal de e 1.ª Instância, nos termos em que foram respondidos.

            No fundo, estamos a tratar de uma questão que se prende com a convicção do Tribunal, matéria em relação à qual já, por várias vezes, nos pronunciamos e que entendemos por bem aqui novamente referenciar, para se compreender o posicionamento deste Tribunal de recurso quanto à apreciação desta questão.

“Na fixação da matéria de facto provada o Tribunal de 1ª Instância rege-se pelo princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 655.º/1 do Código do Processo Civil, só podendo ocorrer alteração da mesma por parte do Tribunal da Relação no âmbito do artigo 712.º do mesmo diploma legal.

Este princípio da livre apreciação da prova impõe que o julgador proceda a uma cuidadosa valoração de cada meio de prova produzido nos autos, interligando-o com os demais elementos probatórios do mesmo constantes, socorrendo-se dos conhecimentos científicos adquiridos e das regras de experiência comum da vida (LEBRE DE FREITAS, Introdução do Processo Civil – conceito e princípio gerais à luz do Código Revisto, Coimbra, 1996, págs. 157/ss).

A resposta a cada facto quesitado deve, assim, “… reflectir o resultado da conjugação de vários elementos de prova que na audiência ou em momento anterior foram sujeitos às regras da contraditoriedade, da imediação ou da oralidade” (ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, II, pág. 209/ss).

            “Estão [...] sempre sujeitas à livre apreciação do julgador a prova testemunhal (art. 396º do CC), a prova por inspecção (artigo 391.º do Código Civil) e a prova pericial (artigo 389.º do CC)” - (LEBRE DE FREITAS, ob. cit. pág. 158).

            No caso da avaliação dos depoimentos testemunhais prestados a tarefa que se impõe nada tem de linear, uma vez que exige ter em consideração não só o que a testemunha disse, mas também a forma como o disse, as hesitações, contradições, esquecimentos e lembranças inesperadas, exigindo-se do julgador uma verdadeira “arte de julgar”, adquirida ao longo de anos de experiência e com o auxílio de outras áreas do saber, como a psicologia e sociologia judiciárias.

            Certo é que não bastará a soma dos depoimentos num determinado sentido ou em outro para se aferir da verdade ou inverdade de um determinado facto. Antes de mais, deve o julgador interpretar as provas que lhe são submetidas e concluir pela sua credibilidade ou não, explicando o percurso lógico que o levou a considerar ou não um determinado depoimento em detrimento de um outro.

            Deve, pois, no exercício da livre apreciação da prova, fundamentar a respectiva decisão, motivação essa que mais não é do que o reflexo do princípio da boa administração da justiça – artigos 156.º/1, 515.º, 653.º/2 e 659.º do Código do Processo Civil.
           
            No exercício de tal apreciação impõem-se também ao juiz que se sujeite ao princípio da igualdade das partes, traduzida na consideração de todos os elementos de prova carreados para o processo, independentemente da parte que os produziu – art. 515.º do Código do Processo Civil.
É na apreciação da matéria de facto que se encontra, pois, a verdadeira arte de julgar.

Acresce que na apreciação e valoração de toda a prova não há qualquer hierarquização a seguir, sendo as mesmas livremente valoradas pelo julgador, excepto se a lei exigir, para a existência ou prova de determinado facto jurídico qualquer formalidade especial (artigo 347.º do CC e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra, vol. IV, 3ª edª., pág. 544), situação que também não se verifica nos autos.

            Com efeito, para que este Tribunal da Relação pudesse ter em conta o erro na apreciação da matéria de facto por parte do Tribunal da 1ª Instância era necessário demonstrar-se, através dos meios de prova indicados pela Apelante, a ocorrência de um erro na apreciação do valor probatório daqueles meios de prova, situação que também não se verificou.

            Por outro lado, mostram-se fundamentadas as respostas dadas pelo Tribunal a toda a Base Instrutória, sendo certo que o Tribunal da Relação tem de respeitar o princípio da convicção e livre apreciação da prova efectuada por aquele Magistrado, com base em todo o material probatório recolhido e constante dos autos e que, no caso, não se mostra ferida de manifesto erro de julgamento (neste sentido, entre outros, Ac. do STJ de 27.Set.2005, em www.dgsi.pt/jstj.nsf/954).

Diga-se, aliás, que a fundamentação à matéria de facto dada como provada apresentada pelo Tribunal é clara, minuciosa e exaustiva, fazendo uma valoração pormenorizada de cada meio de prova e da respectiva conjugação entre os mesmos”.

Feita esta ressalva, vejamos o conteúdo de cada um dos quesitos cuja resposta é impugnada e a análise dos meios de prova realizada pelo Magistrado de 1.ª Instância.

Quesito 6.º - A árvore em causa tinha, pelo menos, quarenta anos de idade e encontrava-se implantada no terreno do prédio da Ré, a dois metros do limite da faixa de rodagem daquela estrada, encostada à respectiva berma?

Resposta (que foi dada em conjunto com a resposta ao quesito 4.º): Provado apenas que a árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. era uma Acácia mimosa, com cerca de quinze metros de altura, pesada, com tronco com cerca de sessenta centímetros de diâmetro junto à base, tinha pelo menos quarenta anos de idade e encontrava-se implantada a cerca de três metros do limite do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no sentido B – S.

Quesito 7.º - Estava fortemente inclinada sobre a faixa de rodagem o que, aliás, já se verificava, então, há seguramente mais de dez anos?

Quesito 8.º - Tinha as raízes à mostra, do lado oposto à estrada, tamanho era o peso que, vergada sobre a via pública, exercia sobre a base do tronco?

Resposta aos quesitos 7.º e 8.º (que foi dada em conjunto com as respostas dadas aos quesitos 9.º, 11.º, 12.º e 13.º): Provado apenas que a árvore que caiu em cima da viatura onde a 1.ª A seguia tinha as raízes à mostra, do lado oposto à estrada, devido ao peso que exercia sobre a base do tronco porque estava inclinada sobre a faixa de rodagem há mais de dez anos devido ao seu peso e em virtude de o terreno onde estava implantada ser arenoso, com pouca capacidade de fixação de árvores e sujeito a elevada erosão pelos elementos naturais, designadamente chuva e vento.

Quesito 117.º - A árvore que veio a cair era uma árvore sã, de copa verde, devidamente enraizada, não evidenciando raízes à mostra e não estava podre?

Resposta: Não provado.

Quesito 143.º - A árvore tombou toda (e não só parte dela), fracturando-se pela base do tronco, por baixo das raízes que se situavam acima do nível do solo, onde o seu estado fitossanitário estava visivelmente degradado?

Resposta: Provado apenas que a árvore tombou toda, fracturando-se pela base do tronco, por baixo das raízes que se situavam acima do nível do solo, onde o seu estado fitossanitário apresentava sinais de degradação.

A fundamentação para a resposta a estes quesitos encontra-se exaustivamente analisada a fls. 1433 a 1445 dos autos, por forma a não deixar qualquer dúvida sobre a análise crítica feita aos depoimentos e prova documental constante dos autos, desde já se louvando a extrema atenção e cuidado da Senhora Magistrada que observou e transcreveu tal materialidade. Da sua análise, dúvidas não podem restar quanto à lisura, atenção e cuidado colocados na elaboração daquela peça processual e à qual não há quaisquer reparos a fazer, senão elogiosos pelo zelo e análise crítica ali deixados.

Os depoimentos cuja audição foi requerida não alteram a postura deste Tribunal de recurso, antes a reforçam.

Por uma questão de rigor entende-se ser de transcrever o trecho final de tal análise, constante da fundamentação às respostas aos quesitos, em confronto directo às críticas colocadas pela Apelante que, se entendem, sem fundamento: “[…] importa considerar como provado que a árvore em apreço não estava em bom estado biomecânico e fitossanitário, sendo pesada, com raízes apresentando sinais de degradação e à mostra, sujeita a elevada erosão e com pouca capacidade de fixação ao solo e que, por tais motivos se encontrava inclinada para a estrada, vindo a cair pelo seu próprio peso, sem prejuízo de se admitir que a chuva e o vento que se fizeram sentir na noite em apreço possam ter contribuído, por aumentar o peso da mesma e por fazê-la balancear, para a queda da mesma, porém, ainda que possam ter contribuído não foram determinantes, pois se não se verificassem os outros factores a mesma não teria caído, mas podia ter caído sem chuva e vento” – fls. 1444 dos autos.

Esta apreciação tem na sua origem os suportes documentais juntos a fls. 385 e 386, baseados em fotografias tiradas à base da árvore em apreciação, no dia seguinte ao do acidente, bem como todas as demais constantes de fls. 826 a 839, elementos estes que foram exibidos às testemunhas ouvidas e em relação aos quais as testemunhas “Eng.ª CL  (Engenheira Florestal, com currículo de mérito na sua área de especialização - doença de árvores e queda de árvores), e do Eng.º T (Engenheiro Florestal, com mestrado em recursos naturais e integrado no projecto europeu de investigação sobre os efeitos nas árvores da neve, chuva, vento e fogo), os quais não obstante não terem visto a árvore no dia dos factos, nem antes, nem depois, analisaram com exaustão as fotografias da mesma, com especial incidência para as fotos de fls. 826 e segs. – que correspondem à arvore em causa nos autos, como foi reconhecido por todas as testemunhas presenciais” – pág. 1438 dos autos.

Muito embora as partes não tenham requerido a realização de prova pericial quanto ao estado da árvore, a verdade é que os especiais conhecimentos destes dois engenheiros ouvidos em Audiência, cuja credibilidade científica não foi posta em causa, bem como a forma como descreveram todo o processo de degradação a que a esta mesma árvore foi sujeita ao longo dos anos, não podem deixar de ser considerados como mais que fundamentadores das respostas aos quesitos cuja alteração se pretende.

Diga-se, porém, que mesmo sem a audição destas notáveis testemunhas, que tiveram um depoimento muito esclarecedor, sempre seria de presumir, para qualquer cidadão médio, que uma árvore com as dimensões da mencionada nos autos, com raízes à mostra - o que denunciava a sua fraca base de sustentação -, inclinada há vários anos e num terreno arenoso, sempre poderia cair a qualquer momento, quer ocorresse ou não o agravamento das condições meteorológicas. E este simples juízo de apreciação sempre seria de se impor à Apelante que tinha todos os elementos fácticos para assim poder concluir.

Diga-se, por fim, que entendemos que a prova realizada foi de uma transparência linear, sem que se possa apontar qualquer erro de apreciação - conclusão que é dificilmente comportável com a sua impugnação -, razão pela qual se mantêm as respostas dadas aos quesitos em apreciação.

            No que se reporta ao quesito 131.º, em relação ao qual a Apelante sustenta que não houve resposta por parte do Tribunal de 1.ª Instância, devendo ser-lhe dado a resposta de “Provado”, labora novamente a Recorrente em apreciação que não corresponde à realidade.

            Com efeito, o quesito foi objecto de resposta, e clara, senão vejamos:

            “Quesito 131.º - O estado tempestuoso do tempo e a hora nocturna – cerca das 21.30 h segundo os AA. – aconselhava a que se circulasse nas estradas com redobradas cautelas e a uma velocidade ainda mais moderada do que a que a prudência habitual já aconselha?

            Resposta: Provado apenas o que consta da resposta ao quesito 128.º.

            Quesito 128.º - Na noite 6 para 7 de Dezembro de 2000, grande parte do país, incluindo a região de B, esteve sujeito a forte temporal, com abundante queda de chuva e sob a acção de ventos muito fortes com rajadas de intensidade superior a 100 km/hora?

            Resposta: Provado apenas que na noite de 6 para 7 de Dezembro de 2000, em grande parte do país, incluindo a região de B, o tempo apresentou-se com céu nublado ou encoberto, o vento soprou geralmente moderado de sul, com intensidade máxima instantânea do vento a ter atingido pontualmente valores de 100 km/hora, ou superior, e ocorreram períodos de chuva, aumentando de intensidade a partir do início da noite, tendo a quantidade de precipitação atingido um valor na ordem dos 10 mm e a intensidade máxima de precipitação tenha atingido 1 a 2 mm em 10 minutos”.

            No que se reporta ao estado do tempo no momento em que caiu a árvore dos autos, a extensa fundamentação constante de fls. 1445 a 1447 dos autos, com recurso a informações meteorológicas, cujos documentos constam dos autos, bem como à prova testemunhal, podemos concluir que está mais do que fundamentado o percurso lógico com base no qual o Tribunal de 1.ª Instância assentou a sua convicção. Por outro lado, no que se reporta à formulação do quesito 131.º propriamente dito, este apenas traduz uma opinião, sem factos que o pudessem alicerçar e, nessa medida, insusceptível de resposta para além daquela que consta ao quesito 128.º, acima transcrita.
 
            Entende ainda a Apelante que a resposta ao quesito 131.º-A devia ser “Provado”, face aos elementos probatórios constantes dos autos.

            Analisando, temos:

            “Quesito 131.º-A – A velocidade a que o R conduzia era uma velocidade excessiva?

            Resposta: Provado apenas que a viatura de matricula NT circulava a uma velocidade não superior a 90 km/hora”.

            A fundamentação a este quesito consta de fls. 1425 a 1427 dos autos, não se vislumbrando qualquer erro na apreciação de tal prova, sendo certo que o conteúdo deste quesito, tal como se encontra formulado, encerra uma conclusão, sem quaisquer factos que o possam apoiar. Quando muito, o seu conteúdo apenas poderia se reportar a uma conclusão a retirar dos factos que a Apelante deveria ter alegado para comprovar tal materialidade, tanto mais que o ónus de alegação e prova desta factualidade recai sobre si. Não o tendo feito, nada mais há a acrescentar nesta fase processual.

            Concluindo, a redacção deste quesito nunca poderia ter sido objecto de resposta “Provado”, como o pretende a Apelante sendo de assinalar que a Senhora Juiz de 1.ª Instância encontrou ainda uma resposta comportável e explicativa perante aquela formulação.

Não se verifica, pois, qualquer erro no julgamento da matéria de facto ou indevida valoração dos meios de prova, de que cumpra conhecer.

            Entende-se, assim, ser de manter as respostas dadas pelo Tribunal de 1.ª Instância aos quesitos acima mencionados.

            No que se reporta à fixação dos factos pelo Tribunal de 1.ª Instância, também os AA. apelaram, entendendo que deve ser alterado o conteúdo das respostas dadas aos quesitos 109.º, 110.º, 111.º, 167.º e 168.º da Base Instrutória, em conformidade com a prova documental e testemunhal produzida, ali passando a constar a seguinte resposta: “Provado que a 1.ª Autora precisa de adquirir uma viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, que actualmente já comprou uma que custou € 27.999.20, e posteriormente precisará de outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não será inferior a € 28.000,00”.

            A redacção e resposta única a estes quesitos, é a seguinte:
           
“Quesito 109.º - Precisa de adquirir (a 1.ª A.) uma viatura automóvel “transformada para transporte de passageiro com deficiência motora superior a 90%” (e posteriormente outros) pois só assim pode ser transportada em veículo automóvel (no caso concreto conduzido pelo seu pai ou, esporadicamente, outra pessoa)?
           
            Quesito 110.º - Trata-se de uma “ferramenta” indispensável para a 1.ª A. se deslocar ao médico e a outros lugares?

            Quesito 111.º - A aquisição de um veículo desses custa € 35.000,00 a valores actuais – doc. n.º 14 que se junta e se reproduz para os devidos efeitos?

            Quesito 167.º - Além da viatura automóvel referida em 124 da PI que já adquiriu, terá de comprar outras?

            Quesito 168.º - A preços actuais a viatura custa cerca de € 28.000,00?

Resposta conjunta a todos estes quesitos: Provado apenas que a 1.ª A. precisa de adquirir uma viatura automóvel “transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%”, que actualmente já tem, e posteriormente outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não é inferior a € 28.000,00”.

A alteração que se propõe é apenas a substituição da expressão “… que actualmente já tem…” para “… que actualmente já comprou uma que custou € 27.999,20 …”.

Muito embora a fundamentação a estes quesitos seja extensa, conforme se pode verificar de fls. 1428 a 1432 dos autos, sendo também esclarecedor o teor dos documentos juntos a fls. 54, 538 e 540 bem como os depoimentos de MF e da avó paterna da 1.ª A., H, criticamente analisados e em relação aos quais, nenhum reparo há a fazer, a verdade é que há documentos nos autos em relação aos quais se deve tirar um outro tipo de ilação.

Assim, a factura constante de fls. 538, emitida em nome da 1.ª A. no valor de € 27.995,20 deve ser conjugada com o recibo de fls. 540, relativo àquela mesma compra o que, só por si, determina a requerida alteração e a sua contabilização em termos indemnizatórios, tanto mais que é ali indicada a forma de pagamento (cheque) e a respectiva regularização desse mesmo pagamento, não havendo qualquer factor que possa levar a descredibilizar esta prova.
Determina-se, assim, a alteração da resposta única dadas aos quesitos 109.º, 110.º, 111.º, 167.º e 168.º da Base Instrutória que deve passar a ter a seguinte redacção:

“Provado que a 1.ª Autora precisa de adquirir uma viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, que actualmente já comprou uma que custou € 27.999.20, e posteriormente precisará de outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não será inferior a € 28.000,00”.

Entendem ainda os AA. que o Tribunal de 1.ª Instância, ao responder ao quesito 175.º da Base Instrutória,  com um esclarecimento, conheceu de um facto que “nunca foi alegado por ninguém” devendo, assim, tal resposta ser considerada nula nos termos e para os efeitos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

O teor do quesito em causa é o seguinte:

“Quesito 175.º - Agora mora em V (o 2.ª A.), só vindo a B, por causa das suas dificuldades económicas, de 3 em 3 semanas, em média?

Resposta: Provado apenas que durante o tempo o tempo em que o 2.º A. viveu em V, só vinha a B, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas, com o esclarecimento de que o 2.º A. encontra-se actualmente a trabalhar em B onde abriu, com a 3.ª A., um estabelecimento de restauração”.

A fundamentação a este quesito está lavrada a fls. 1428 a 1432 dos autos, assente mais concretamente no depoimento da avó da 1.ª A., H, sem que tenha sido objecto de especificação, em particular, naquela peça processual. Porém, após recurso à audição deste depoimento, podemos verificar que a realidade fáctica que se pode retirar é algo distinta.

Antes de prosseguirmos esta análise, devemos ter presente que o quesito 175.º da Base Instrutória resulta de matéria alegada pelos AA. no seu articulado superveniente, em 22 de Fevereiro de 2007 sendo que a resposta dada ao mesmo foi proferida em 02 de Junho de 2008, ou seja, mais de um ano depois da sua invocação, sendo normal que as situações de vida se tenham alterado e, consequentemente, imponham uma resposta consentânea com a  realidade presente, tanto mais que, face ao depoimento da mãe do 2.ª A. a abertura deste estabelecimento ter-se-ia situado em 16 de Julho de 2007.

Importa, assim, saber se a última parte desta resposta comporta ou não, enquanto facto explicativo, essa mesma factualidade. Ora, a verdade é que o depoimento da testemunha H não foi acompanhado de documentos (nem tinha de o ser), para comprovar essa mesma realidade. Do por si afirmado (de que não se duvida em termos de apreciação da prova) apenas se pode extrair que o 2.º A. está, neste momento, à frente de um estabelecimento de restauração sem que, com tal afirmação, se possa ter como adquirido que tal estabelecimento foi por si adquirido com a 3.ª A. (apesar de serem casados entre si), nem sequer há consequências jurídicas que se possam retirar de uma tal afirmação.

Certo é também que não podemos olvidar a afirmação feita por um familiar próximo (avó paterna da 1ª A.), quanto ao facto de o 2. A. não estar já a trabalhar em V, mas sim, em B, e a trabalhar num estabelecimento de restauração. No entanto, como já referimos, a referência à exploração conjunta com a 3.ª A. falece de qualquer suporte documental que a sustenha, tanto mais que a 3.ª A. está, permanentemente, ao lado da sua filha, 1.ª A., conforme resulta de toda a prova dos autos.

A referência a uma “manifesta contradição” entre a resposta dada ao quesito 100.º e aos quesitos 97.º, 98.º, 112.º, 114.º, 176.º, 177.º, 178.º, 179.º e 180.º da Base Instrutória, para fundamentar a alteração à resposta ao quesito 175.º da Base Instrutória, não tem qualquer sentido.

Com efeito, no quesito 100.º a questão é colocada no singular, no que se refere à 3.ª A. que, após o acidente que vitimou a 1.ª A. e para lhe dar assistência, teve de deixar de trabalhar no estabelecimento de mini-mercado anteriormente por si explorado (tenha-se, aliás, presente o contrato de trespasse deste estabelecimento que se encontra junto aos autos). Nos demais quesitos mencionados é expressamente referido que a 3.ª A. cuida em quase exclusividade da 1.ª A. – apenas ajudada por vezes pelo 2.º A. Não se verifica, pois, qualquer dualidade de critérios nas respostas proferidas.

Assim sendo, embora sendo de alterar a resposta ao quesito 175.º da Base Instrutória, tal alteração não poderá ser realizada em todo o segmento pretendido pelos AA., mas apenas no que resulta da prova atendível passando, assim, este quesito a ter a seguinte redacção:

“Provado apenas que durante o tempo o tempo em que o 2.º A. viveu em V, só vinha a B, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas, com o esclarecimento de que o 2.º A. encontra-se actualmente a trabalhar em B, a explorar um estabelecimento de restauração”.

Esta situação profissional do 2.º A. apenas foi referenciada para base de um pedido de indemnização por danos não patrimoniais e, como tal, apenas nesta vertente será analisada no local próprio.

A questão colocada quanto aos lucros cessantes resultantes do encerramento do estabelecimento de mini-mercado que a 3.ª A. explorava será objecto de análise em sede de fixação indemnizações.

Decididas que se encontram as questões relativas à apreciação da prova, cumpre proceder à análise das questões jurídicas suscitadas por cada um dos Apelantes.

Assim, no que se reporta à Apelante J esta defende que, independentemente da procedência ou não da sua pretensão quanto à alteração da matéria de facto que propôs, sempre a acção teria de improceder, desde logo, porque não há qualquer facto ilícito que tenha praticado e que seja gerador dos danos sofridos pelos AA.

Salvo o devido respeito, entende-se não assistir razão à Apelante/Ré. Com efeito, sendo a proprietária da acácia mimosa que caiu sobre a viatura em que a 1.ª A. seguia, conforme é descrito na matéria de facto dada como provada relativamente à dinâmica do acidente, a sua responsabilidade está presente e é incontestável. Enquanto proprietária do bem, é-lhe imposto o dever de do mesmo cuidar e, em caso de incumprimento desta obrigação, quer por acção, quer por omissão, de responder pelos danos causados por aquele mesmo bem.

Esta é a situação visualizada pelo artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil e que nos permite afirmar que a Ré, enquanto proprietária, desde, pelo menos, 1995, de um bem imóvel (árvore ligada ao solo – artigo 204.º, n.º 1, alínea c) do Código Civil), tinha obrigação de vigilância em relação ao mesmo, mormente, mantendo essa árvore e todos os bens incorporados na sua propriedade, em bom estado de conservação.

Ora, está provado que a árvore em causa, com cerca de quarenta anos, estava inclinada sobre a faixa de rodagem, há mais de dez anos, com raízes à mostra, devido ao peso que exercia sobre a base do tronco. A existência e falta de manutenção desta situação é directamente imputável à Ré uma vez que sempre lhe era exigível que, enquanto proprietária, mandasse abater aquela árvore ou, pelo menos, cortar os ramos que pudessem interferir com a circulação automóvel e/ou pedonal relativamente ao espaço aéreo que invadia a estrada, comportamento que omitiu – artigos 1305.º e 486.º do Código Civil.

Por outro lado, há uma presunção legal de culpa em relação à Ré e que esta não conseguiu ilidir, conforme decorre da letra da lei “… salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua” – artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil. Tenha-se presente que estamos perante uma situação de incúria que se prolongou no tempo, durante vários anos, sendo certo que sempre era imposto à Ré que vigiasse e conservasse o bem, no caso, a árvore, que era da sua propriedade – neste sentido, veja-se, entre outros, e representando uma posição já firmada na jurisprudência, o Ac. do STJ de 27.Mai.1997, no BMJ 467/565 e o Ac. do STA de 22.Fev.1996, na Revista dos Acórdãos Doutrinais do STA, n.º 413, pág. 561.

            Podemos assim afirmar que há, sim, um facto ilícito praticado pela Ré e gerador de danos a terceiros que, no caso, se traduziu numa comportamento omissivo da sua parte – abate ou corte de ramos da árvore que caiu sobre a viatura em que a 1.ª A. circulava – comportamento esse que lhe é directamente imputável.
            Aliás, bastaria a leitura da matéria de facto dada como provada sob os Pontos 5, 6, 7 e 10 a 14 – e que se passam a transcrever - para compreender o comportamento da Ré perante a obrigação legal que sobre si impende de cuidar dos seus bens por forma a não violar o direito de outrem, para, sem qualquer dúvida, se formar um juízo de culpa quanto à mesma.
           
“5. Desde pelo menos 1995 que a R. é dona desse prédio, possuindo-o, detendo-o materialmente e retirando dele as respectivas utilidades (Alínea E) dos Factos Assentes);

6. A árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. era: uma acácia mimosa; com cerca de 15 metros de altura; pesada; com tronco com cerca de 60 centímetros de diâmetro junto à base; tinha pelo menos 40 anos de idade; e encontrava-se implantada a cerca de três metros do limite do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no sentido B – S (Resposta aos artigos 4. ° e 6.° da Base Instrutória);

7. A árvore que caiu em cima da viatura onde a 1.ª A. seguia tinha raízes à mostra, do lado oposto à estrada, devido ao peso que exercia sobre a base do tronco porque estava inclinada sobre a faixa de rodagem há mais de 10 anos devido ao seu peso e em virtude de o terreno onde estava implantada ser arenoso, com pouca capacidade de fixação de árvores e sujeito a elevada erosão pelos elementos naturais, designadamente chuva e vento (Resposta aos artigos 7. °, 8.º, 9.º, 11.º, 12.° e 13.° da Base Instrutória);

10. A árvore tombou toda, fracturando-se pela base do tronco, por baixo das raízes que se situavam acima do nível do solo, onde o seu estado fitossanitário apresentava sinais de degradação (Resposta ao artigo 143. ° da Base Instrutória);

11. Perto da referida mimosa e também dentro do prédio da R. encontravam-se outras árvores, algumas delas de grande porte e/ou também inclinadas e com as copas sobre a faixa de rodagem (Resposta ao artigo 14. ° da Base Instrutória);

12. Da propriedade da R. descrita no ponto 4 caiu também, no dia 06.12.2000, uma pernada de um pinheiro, sobre a EN 118, próximo do local onde estava a árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. (Resposta ao artigo 144.º, 145.° e 146.° da Base Instrutória);

13. A vegetação do terreno do prédio da R., junto da EN 118, entre os quilómetros 36 e 39 era tão abundante e intensa que as bermas se encontravam "estranguladas" ou "estreitadas" ao ponto de os peões terem muitas vezes que circular sobre a faixa de rodagem destinada a veículos, o que acontecia há, pelo menos, 5 anos antes de 2000 (Resposta aos artigos 15.º, 16. ° e 17. ° da Base Instrutória);

14. A herdade da R. referida no ponto 4 tem marcos que a delimitam da EN 118 (Resposta ao artigo 115. ° da Base Instrutória)”.
           
De forma a tentar afastar a sua responsabilidade, alega ainda a Apelante que a árvore mencionada nos autos estava implantada na “zona da estrada nacional” constituindo, assim, património do Estado sendo esta entidade, como tal, responsável pelos prejuízos decorrentes da queda dessa mesma árvore.
           
Ora, conforme consta da matéria de facto provada acima transcrita quanto ao Ponto 6, “A árvore que caiu em cima da viatura onde seguia a 1.ª A. (…) encontrava-se implantada a cerca de três metros do limite do lado direito da faixa de rodagem da EN 118, para quem segue no sentido B – S”, o que claramente equivale a dizer que não fazia parte da mencionada “zona da estrada nacional” conforme definido no disposto no artigo 2.º do Decreto-Lei 13/71, de 23 de Janeiro (e não, como é indicado pela Apelante, por referência ao artigo 11.º da Lei 2037, de 19 de Agosto de 1949, que expressamente remetia para o seu artigo 10.º, revogado pelo artigo 19.º do Decreto-Lei acima mencionado).

Diga-se, aliás, que a referência feita pela Apelante para enquadrar a árvore dos autos na “zona da estreada nacional” por referência ao artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 13/71, de 23 de Janeiro, é de difícil compreensão.

Com efeito, transcrevendo-se a disposição em causa, temos que:

“1. Constitui zona da estrada nacional:
a) o terreno por ela ocupado, abrangendo a faixa de rodagem, as bermas e, quando existam, as valetas, passeios, banquetas ou taludes;
(…)”

Atendendo ao local em que a árvore estava implantada, entendemos nada mais haver a acrescentar para se concluir, como se tem vindo a fazer, pela improcedência da tese da Apelante.

A localização da árvore, propriedade da Ré, atenta a sua inclinação sobre a via, que durou por um período superior a dez anos, ocupando o espaço aéreo abrangente em que os utentes e as viaturas transitavam, determina que, em paralelo com a responsabilidade civil imputável à proprietária daquela árvore, a ora Ré e Apelante, concorra também a eventual responsabilidade do ICERR, cuja apreciação está a ser realizada em sede própria, no caso, no âmbito do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que proferiu já sentença a condenar o EP – Estradas de Portugal, SA (actual sucessora do ICERR), sentença essa que se encontra em recurso e sobre a qual este Tribunal nada mais tem a referir.

            Esta referência apenas é apontada por, no entender da Apelante, esta situação ser fundamentadora do seu pedido de suspensão da instância até que aquele Tribunal profira decisão final. Ora, quanto a este ponto, entendemos que também não assiste razão á Apelante.

            Com efeito, bem basta aos AA. terem já tido que intentar duas acções para determinar a apreciação do mesmo facto danoso – decorrente da competência material do Tribunal – facto em relação ao qual são alheios. A apreciação da responsabilidade de cada uma destas entidades em nada prejudica ou impede a apreciação da dinâmica do acidente e/ou das conclusões a retirar em sede de execução das respectivas decisões. No fundo, trata-se apenas de se saber se estamos perante uma situação de responsabilidade solidária. O que os AA. não podem é executar duas vezes a mesma indemnização, tal como se passa em qualquer acção que seja simultaneamente de viação e de trabalho, situação que não constitui matéria de apreciação neste momento.
           
            Acresce que, o facto de o ICERR poder ser responsável pelos danos causados aos AA. não exclui a responsabilidade da Ré, enquanto proprietária do terreno em que a árvore se encontra implantada. Estamos a falar de responsabilidades solidárias que nada colidem na sua apreciação, conforme já acima se deixou expresso.

            Alega também a Apelante que o Tribunal de 1.ª Instância não se pronunciou sobre a questão que lhe foi colocada, no caso, que a árvore que caiu, e em discussão nos autos, não lhe pertencia e que o dever de vigilância sobre a mesma incumbia ao IEP, com o que feriu a sentença de nulidade, por omissão de pronúncia.

            Salvo o devido respeito, a Apelante não tem qualquer razão.

            Com efeito, o Senhor. Juiz de 1.ª Instância pronunciou-se expressamente sobre essa questão e dela retirou a ilação jurídica possível, em conformidade com a sua análise: condenou a Ré nos termos que vêm definidos na sentença proferida. Por outro lado, a partir do momento em que foi dado como provado que a árvore é propriedade da Ré – Pontos 4 e 5 dos Factos Provados – sendo certo que tal redacção resultou do acordo das partes, entendemos que nada mais há a referir quanto a esta matéria.
           
            Defende ainda a Apelante que, em caso de o Tribunal de recurso entender que a sua condenação se deve manter, sempre os montantes indemnizatórios teriam de ser equitativamente reduzidos, “atentos os rendimentos da Ré e o seu baixo grau de culpabilidade”.

            Mais uma vez discordamos da Apelante.

            Conforme já acima referimos, a árvore em apreciação nos autos apresentava-se com uma inclinação exterior e com sinais visíveis do seu estado de saúde degradado, expresso desde logo pelas suas raízes expostas, situação que se prolongou durante anos, sendo certo que era possível a um qualquer cidadão médio concluir pela sua derrocada, a qualquer momento. Trata-se da formulação de um juízo com base na experiência comum – faltando, como faltava, uma base de sustentação, a árvore dos autos tinha sérias probabilidades de, a qualquer momento, cair, como efectivamente veio a acontecer.

            Este juízo de senso comum era exigível à Ré, enquanto proprietária do terreno em que árvore estava implantada, com as obrigações decorrentes de vigilância que deve exercer sobre os seus bens e a verdade é que não a teve. O facto de poder haver co-responsabilidade nesta actuação não exonera a Ré da sua cota parte de culpa e esta, como vimos, existe.

Aliás, como já antes tínhamos referido, incumbindo à Ré a alegação e prova de que não teve culpa no evento e/ou, que “os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua” (na expressão do artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil, que aqui estabelece uma inversão do ónus da prova para a situação em apreciação), sempre teríamos de concluir pela culpa da Ré.
           
Dizer-se que esta culpa é reduzida, como o pretende a Apelante, é uma afirmação temerária. Na verdade, todos sabem que uma árvore de grande porte, como o era a dos autos, ao cair, pode provocar danos graves (como veio a provocar) a qualquer veículo e/ou utente que transite na via pública, tendo em conta a sua inclinação no local – no caso, para cima da estrada nacional por onde circulava o veículo em que a 1.ª A. seguia, sem que se possa imputar a tal condução automóvel qualquer culpa ou uma actuação que concorresse para o agravamento dos danos sofridos.

            Caso a Ré tivesse actuado diligentemente, nunca este acidente teria ocorrido nos moldes em que ocorreu – por queda da árvore em cima do veículo em que a 1.ª A. se fazia transportar. O comportamento omissivo e culposo da Ré é, assim, o facto que determinou a ocorrência dos danos em apreciação nestes autos e, tal como se concluiu na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, foi um comportamento em que a Ré actuou com negligência que, por lhe ser censurável, sempre terá de ser causa adequada para a fixação de uma indemnização aos lesados, os aqui AA.
           
            Relativamente à situação económica da Ré, cujos contornos não estão provados nos autos, sendo tal responsabilidade de alegação e prova imputáveis à mesma, nada há a referir atento o disposto no artigo 494.º do Código Ciivl.

Analisando a questão de Direito suscitada pelos AA. temos desde logo que, atenta a alteração da resposta única dadas aos quesitos 109.º, 110.º, 111.º, 167.º e 168.º da Base Instrutória, há que se considerar como indemnizável o montante dispendido pela 1.ª A. na aquisição da viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, com necessidade de ser conduzido por outra pessoa, no montante de € 27.999,20 bem como a imperiosa necessidade futura de aquisição de outras viaturas do mesmo género – tanto mais que se trata de um bem de desgaste rápido -, sendo da mais elementar dedução que as futuras aquisições sempre terão um valor em muito superior ao valor desta viatura já adquirida.

            Assim, há que acrescer aos danos patrimoniais da 1.ª A. a quantia de € 27.999,20 (valor da aquisição da viatura da 1.ª A.), acrescida de juros legais desde a data da notificação do articulado superveniente, no caso, desde 24 de Fevereiro de 2007 e até integral pagamento.

Como esclarecimento prévio desde já se deixa expresso que a alteração deste valor, bem como a apreciação dos demais pedidos formulados, em que se pede a alteração dos valores fixados a diversos danos, será apreciada tendo em conta o estatuído no artigo 569.º do Código Civil e logo que não ultrapassados os limites do artigo 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o que na prática equivale a dizer-se que nada impede o Tribunal de fixar montantes superiores aos pedidos parcelares apresentados pelas partes logo que não seja ultrapassado o valor do pedido final pelas mesmas deduzido.

No que respeita a esta mesma 1.ª A., é apresentado um pedido de alteração do valor fixado a título de danos não patrimoniais por se entender que o que foi fixado não teve em conta a dimensão dos danos sofridos pela mesma a este título.

            Ora, o Tribunal de 1.ª Instância fixou a quantia de € 280.000,00 a título de danos não patrimoniais sofridos pela 1.ª A.

            Se atentarmos no teor da matéria de facto dada como provada, nomeadamente nos seus pontos 35 a 86, 141 e 142, sempre teremos de concluir que dificilmente se pode imaginar uma vida tão sofrida, como aquela que é vivencida pela 1.ª A e que foi pormenorizadamente retratada e analisada pela Senhora Juíza de 1.ª Instância.

            A fixação de uma indemnização por danos morais em situações como a descrita é tanto ou mais delicada quanto é certo que esta indemnização em pouco ou nada poderá ser utilizada para efeitos de minorar a dor da 1.ª A. Por outro lado, no entanto, não atribuir uma indemnização condigna a uma situação como a descrita é desacreditar todo esse sofrimento que se vence a cada momento de vida.

            Este Tribunal de recurso está ciente da vasta jurisprudência publicada e citada pelas partes no que se reporta à fixação de uma indemnização em casos similares mas a verdade é que em nenhum dos casos mencionados é expressa uma situação de quase não-vida como aquela que aqui estamos a analisar e que, por tal sorte, sempre terá de ter parâmetros distintos dos ali enunciados.

O próprio sentimento de morte desejada manifestado pela 1.ª A. – por impossibilidade total de poder viver condignamente -, que se encontra fechada num corpo em que apenas a mente raciocina e sente, torna essa mesma existência num calvário muito mais doloroso, quer para si, quer para os que a rodeiam, situação que tem de ser ponderada como relevante para a fixação de uma indemnização.

Assim sendo, entende-se, tendo presente os pressupostos acima definidos, que a indemnização a fixar à 1.ª A., a título de danos não patrimoniais, não deverá ser inferior a € 320.000,00 (trezentos e vinte mil euros).

            No que se reporta aos danos não patrimoniais dos 2.º e 3.ª AA., estes foram fixados pelo Tribunal de 1.ª Instância, respectivamente, em € 50.000,00 e € 60.000,00 montantes estes que os mesmos não aceitam pedindo, assim, que sejam alterados para € 150.000,00 no caso do 2.ª A. e para € 250.000,00 no caso da 3.ª A.

            Da matéria de facto dada como provada resulta que estes pais têm tido um sofrimento que não pode ser contabilizado em termos diários, mas sim, contínuo, sem tréguas, uma vez que assistem impotentes ao sofrimento irreversível de uma filha, na flor da idade, sem que nada possam fazer para o minorar. Esta situação, por si só dolorosa, é agravada pelo facto de se saberem sem alternativas para alterar este estado de tormenta e de, legitimamente, se questionarem quem será, no futuro, a prestar o tipo de assistência contínua, não só física como psicológica, à 1.ª A.

            A situação é tanto ou mais dolorosa quanto é certo que a 3.ª A. prescindiu de toda a sua vida pessoal e profissional para se dedicar inteiramente à sua filha, 1.ª A., num esforço titânico que lhe é imposto até pelo simples facto de ter de a mudar de posição de três em três horas, quer seja dia, quer seja noite. Toda esta família ficou disfuncional, como não poderia deixar de ser, perante a vivência desta tragédia. E a esta realidade, em concreto, não pode o Tribunal ficar indiferente.

            Tal como foi entendimento da 1.ª Instância, critério que também foi aceite pelos AA., a atribuição de uma indemnização aos pais da 1.ª A. deve ser diferenciada. Não se trata de uma distinta valorização quantitativa da dor, mas sim, de verificar os danos causados por esse sofrimento em cada um dos pais e que, conforme resulta da matéria de facto dada como provada, sempre terá de ser entendido como mais gravosos no que se reporta à 3.ª A. que, há vários anos e sem qualquer pausa, tem acompanhado continuamente a 1.ª A. – veja-se, entre outros, o que resulta dos Pontos 124 a 126, 133 e, muito em particular, os Pontos 134 a 142 cujo teor, por ser elucidativo, se transcreve:

“134.     Ambos os Autores A e C passaram a carecer de apoio médico regular, designadamente psiquiátrico (Resposta ao artigo 176.° da Base Instrutória);

135.      Desde o começo de 2006 a Autora C passou a ter acompanhamento médico e medicamentoso constante, por causa do seu estado de depressão ansiosa (Resposta ao artigo 177.° da Base Instrutória);

136.      Tem dificuldade em dormir e constantes pesadelos, agravados pelo facto de, de 3 em 3 horas, ter de se levantar para mudar a M de posição, sob pena de esta vir a ter ainda mais escaras no corpo (Resposta ao artigo 178.º da Base Instrutória);

137.      Sofre e sofrerá de inquietação permanente, desconcentração, desconforto emocional e físico, desinteresse pelo relacionamento social, fadiga persistente mesmo sem esforço físico, desatenção para consigo própria e enorme ansiedade (Resposta ao artigo 179.° da Base Instrutória);

138.      Tem dificuldade em pensar, reflectir e tomar decisões (Resposta ao artigo 180. ° da Base Instrutória);

139.      Já sofre e continuará a sofrer de distúrbios psico-somáticos, como perturbações gástricas, dores no corpo, febre, cefaleias intensas, cansaço e perda de energia (Resposta ao artigo 181. ° da Base Instrutória);

140.      Também o Autor A, sobretudo desde que foi para V, sofre dos distúrbios referidos de 179 a 181, embora de forma menos intensa que a Autora C (Resposta ao artigo 182. ° da Base Instrutória);

141.      Todos os Autores vivem em estado de permanente tristeza profunda, melancolia, desconforto emocional e físico (Resposta ao artigo 183. ° da Base Instrutória);

142.      Aumentam dia a dia a tristeza e a revolta da M, por ver que o seu estado de saúde é um ónus emocional, psíquico e financeiro cada vez maior para seus pais (Resposta ao artigo 184. ° da Base Instrutória)”.

            O circunstancialismo descrito determina que este Tribunal de recurso fixe uma indemnização por danos morais de € 80.000,00 (oitenta mil euros) para o 2.º A. e de € 100.000,00 (cem mil euros) para a 3.ª A.

            Prosseguindo na análise dos pontos suscitados pelos AA. no seu recurso, verifica-se que o Tribunal de 1.ª Instância fixou o montante de € 135.000,00 à 1.ª A., a título de danos patrimoniais decorrentes da sua perda de capacidade de ganho, quantia esta que é contestada em sede de recurso ali se defendendo a atribuição de uma quantia, a esse título, de € 400.000,00. Fixou também o Tribunal de 1.ª Instância o montante de € 250.00,00 a título de danos patrimoniais futuros à 1.ª A. montante este que é também contestado sendo proposta a quantia de € 400.000,00 para ressarcimento de tal dano.

            Para apreciação desta questão tenhamos em atenção que, à data do acidente, a 1.ª A. tinha dezanove anos de idade e que a situação em que se encontra desde o acidente é de incapacidade funcional permanente de 95% com incapacidade total e permanente para o trabalho – Ponto 58 dos Factos Provados.

            A situação de saúde da 1.ª A. é, infelizmente, irreversível, determinando que esta, durante o seu período provável de vida, ainda que o mesmo possa ser reduzido em relação à maioria das mulheres com saúde, tenha de ter cuidados diários de particular relevância que implicam, necessariamente, despesas elevadas, cujo custo e necessidade são do conhecimento comum, como é o caso de fraldas, algálias, assistência médica e medicamentosa, exames médicos e outros.

            Há ainda que ter em atenção o circunstancialismo profissional que envolve a 1.ª A., quer antes, quer depois do acidente, e que se encontra descrita na matéria de facto dada como provada, de que se faz um pequeno resumo, com referência aos Pontos em que se encontra:

“89. À data do acidente pertencia (e ainda pertence) ao quadro privativo da Câmara Municipal de B, com a categoria de Auxiliar dos Serviços Gerais, auferindo o vencimento mensal de Esc. 68.900$00 (ver doc. n.° 4), então correspondente ao índice 118, obviamente acrescido do subsídio de alimentação (Resposta ao artigo 72.° Instrutória);

90. Esse vencimento era, em 13 de Setembro de 2003, de € 387,91, correspondente ao índice 125, acrescido de subsídio de alimentação (Resposta ao artigo 73.° da Base Instrutória);

91. Como consequência das lesões de que padece, a 1.ª A. esteve sem trabalhar até 06.12.2003, recebendo o subsídio de doença da ADSE, tendo comparecido, entre a data do acidente e a data de regresso ao trabalho, por 6 vezes a uma Junta Médica, sendo a última em 02.12.2003 a qual determinou o regresso ao serviço da A. M  em 06.12.2003 com serviços adaptados à situação clínica (Resposta aos artigos 74. 0, 75. ° e 76.° da Base Instrutória);

92. A Junta Médica da ADSE reunida em 02 de Dezembro de 2003, referida em 91 da PI, deliberou considerá-la «abrangida pela al. d) do art. 11.° do Decreto-Regulamentar n.° 41/90», de 29 de Novembro, ordenando que então regressasse ao trabalho com serviços adaptados à sua situação clínica (Resposta ao artigo 148. ° da Base Instrutória);

93. Desde então não foi presente à Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações (Resposta ao artigo 149. ° da Base Instrutória);

94. Ainda hoje a Autora M continua funcionária da Câmara Municipal de B (Resposta ao artigo 150. ° da Base Instrutória);

95. E continuará a fazer exames clínicos complementares (Resposta ao artigo 151.° da Base Instrutória);

96. Por força da deliberação de 02 de Dezembro de 2003 da Junta Médica da ADSE, a Câmara Municipal de B adquiriu hardware e software para a Autora M comandar um computador, sendo esse o trabalho que ali faz e continuará a fazer até ser aposentada (Resposta ao artigo 152. ° da Base Instrutória);

97. Aquele comando é feito através de um acessório colocado no nariz e direccionado para as teclas do computador, as acciona através de emissão de raios infravermelhos (Resposta ao artigo 153. ° da Base Instrutória);

98. Em consequência das lesões de que a 1.ª A. padece, a mesma deu 26 dias de faltas por internamento em 2000, 365 dias de faltas por internamento em 2001; 171 dias de faltas por doença e 192 dias de faltas por internamento em 2002; 339 dias de faltas por doença por internamento em 2003; 5 dias de faltas por doença em 2004; 78 dias de faltas por doença e 2 dias de faltas por internamento em 2005; e 45 dias de faltas por doença e 30 dias de faltas por internamento em 2006 contabilizadas até ao dia 20 de Dezembro de 2006 (Resposta ao artigo 154.° da Base Instrutória);

99. Após o dia 20 de Dezembro de 2006 até ao dia 22 de Fevereiro de 2007, a 1.ª A. deu, pelo menos, mais 51 dias de faltas ao trabalho, pois esteve internada desde 21.11.2006 até 09.02.2007, data da alta, no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão para realização de exames médicos (Resposta aos artigos 155.° e 159.° da Base Instrutória);

100. Sendo auxiliar dos Serviços Gerais à data do acidente posicionada no escalão 1 ainda hoje se mantém nesse mesmo escalão (Resposta ao artigo 162. ° da Base Instrutória);

101. Se a 1.ª A. não tivesse dado as faltas por doença que deu, teria progredido para o escalão 2, índice 137, em 1 de Novembro de 2004 e por força de tal progressão teria auferido mensalmente: desde Novembro de 2004 o vencimento de € 425,15, desde Janeiro de 2005, o vencimento de € 431,51, e desde Janeiro de 2006, o vencimento de € 441,03, porém como não progrediu, auferiu mensalmente: o vencimento de € 397,22 desde Novembro de 2004, € 434,51 desde Janeiro de 2005 e desde Janeiro de 2006 € 412,06 (Resposta ao artigo 163.° da Base Instrutória);

102. A Autora M ainda não foi aposentada (Resposta ao artigo 147.° da Base Instrutória);

103.      Além de exercer a actividade profissional, a 1.ª A. estudava na E Secundária de B, no ensino secundário recorrente por unidades capitalizáveis em regime nocturno, tendo concluído no ano lectivo de 2000/2001 mais de 1/3 da totalidade das unidades que constituem o curso, o que lhe deu equivalência ao 10.° ano de escolaridade (Resposta ao artigo 78. ° da Base Instrutória);

104.      Antes do sinistro era uma pessoa inteligente, muitíssimo trabalhadora, activa, alegre, feliz, saudável e cheia de dinamismo (Resposta ao artigo 79. ° da Base Instrutória);

105.      Era intenção da 1.ª A. concluir o ensino secundário e tirar um curso superior para progredir profissionalmente, melhorar os rendimentos do seu trabalho e enveredar por uma profissão em que auferisse melhor remuneração do que aquela que poderia receber como funcionária pública na carreira a que pertencia (Resposta aos artigos 80. °, 81. 0, 82.° e 83.° da Base Instrutória)”.

            Muito embora se possam aplicar fórmulas para encontrar o capital inicial para estabelecer uma renda anual que se esgote até ao fim da vida da 1.ª A. (tendo como base um cálculo de esperança de vida até aos 82 anos ou antes, atenta a incapacidade de que sofre e que, necessariamente, lhe irá provavelmente encurtar esse período), a verdade é que, atendendo às circunstâncias particularmente gravosas em que se encontra, tais fórmulas sempre seriam insuficientes.

            Tendo em consideração os cálculos efectuados pelo Tribunal de 1.ª Instância a este título - e muito embora se considere que a Ré actuou de forma negligente e que a 1.ª A. em nada contribuiu para o acidente em apreciação -, bem como o facto de não haver qualquer indício de que os preços e serviços de que a 1.ª A necessita venham a sofrer qualquer redução (antes pelo contrário), entende-se que os valores fixados devem ser alterados para € 200.000,00 (duzentos mil euros) a título de danos patrimoniais pela perda de capacidade de trabalho e de € 300.000,00 (trezentos mil euros) a título de danos futuros.
           
            Entendem também os AA. que deveria ser fixada uma indemnização pela perda de capacidade de ganho da 3.ª A., decorrente do encerramento de mini-mercado por si explorado, na sequência do acidente que vitimou a 1.ª A. e para prestar assistência a esta última, pedindo, a esse título, a fixação de uma indemnização de € 250.000,00.

Conforme resulta da matéria de facto dada como provada, Pontos 124 a 126, a 3.ª A. “desde a data da alta, a assistência permanente à 1.ª A. tem sido assegurada pela 3.ª A. e quando necessário e possível, pelo 2.° A., que passa todo o tempo consigo. Por isso, a 3.ª A. teve de encerrar, em Agosto de 2002, um pequeno estabelecimento de mini-mercado de que era proprietária com o seu marido e que explorava, do qual auferia mensalmente, em média, o lucro de € 1.500,00”, suportou prejuízos que se encontram comprovados e que sempre teriam de ser atendidos, pelo menos, até à data em que o 2.º A. passou a explorar um estabelecimento de restauração, no caso, até Julho de 2007, fazendo fé no depoimento da mãe deste mesmo 2.º A. Trata-se, porém, de uma data não concretamente discutida no processo e que sempre teria de ser objecto de prova para poder ser quantificada.

Assim, muito embora considerado como relevante o pedido de indemnização, que deverá ter em consideração a quantia de € 1.500,00 mensais, o mesmo apenas poderá ser apurado em sede de execução de sentença, tendo como parâmetros o momento do encerramento do mini-mercado e o momento em que o 2.º A. passou a explorar o estabelecimento de restauração.

            Este montante indemnizatório deverá ser arbitrado aos 2.º e 3.ª AA. uma vez que são casados entre si sendo certo que, a supressão dos rendimentos do trabalho de um dos cônjuges, acarreta prejuízos para ambos em termos de economia familiar – artigo 1724.º, alínea a),  do Código Civil

            Sendo estas as questões colocadas pelas partes em sede de conclusões das suas alegações e de que este Tribunal de recurso tomou conhecimento, e não havendo outras oficiosamente a conhecer, deve a decisão final ser alterada nos termos que acima se deixam transcritos.


IV. DECISÃO

            Face ao exposto, julga-se improcedente, por não provada, a Apelação apresentada pela Apelante J.

Bem como julga-se parcialmente procedente, na medida em que foi provada, a Apelação apresentada pelos AA., determinando-se, em conformidade:

- a alteração da resposta única dadas aos quesitos 109.º, 110.º, 111.º, 167.º e 168.º da Base Instrutória, que passa a ter a seguinte redacção:

“Provado que a 1.ª Autora precisa de adquirir uma viatura automóvel transformada para transporte de passageiros com deficiência motora superior a 90%, que actualmente já comprou uma que custou € 27.999.20, e posteriormente precisará de outras, para ser transportada em veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, cujo custo não será inferior a € 28.000,00”.

            - a alteração da resposta dada ao quesito 175.º da Base Instrutória, que passa a ter a seguinte redacção:

“Provado apenas que durante o tempo o tempo em que o 2.º A. viveu em V, só vinha a B, em média de 3 em 3 semanas, por causa das dificuldades económicas, com o esclarecimento de que o 2.º A. encontra-se actualmente a trabalhar em B, a explorar um estabelecimento de restauração”.

            E, em consonância com o que acima se deixa expresso, para além dos valores já fixados na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, aditar e alterar ainda os seguintes valores indemnizatórios:

            - Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., a título de danos patrimoniais a quantia de € 27.999,20 (valor da aquisição da viatura da 1.ª A.), acrescida de juros legais desde a data da notificação do articulado superveniente, no caso, desde 24 de Fevereiro de 2007, e até integral pagamento;

            - Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 320.000,00 (trezentos e vinte mil euros), alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

- Condenar a Ré a pagar à 1.ª A., as quantias de € 200.000,00 (duzentos mil euros) a título de danos patrimoniais pela perda de capacidade de trabalho e de € 300.000,00 (trezentos mil euros) a título de danos futuros, alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

            - Condenar a Ré a pagar as quantias de € 80.000,00 (oitenta mil euros) para o 2.º A. e de € 100.000,00 (cem mil euros) para a 3.ª A., a título de danos não patrimoniais, alterando-se, assim, o valor inicialmente fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância.

- Condenar a Ré a pagar aos 2.ª e 3.ª AA. a quantia que se vier a apurar a título de danos patrimoniais decorrentes do encerramento do mini-mercado explorado pela 3.ª A., tendo por base a quantia de € 1.500,00 mensais (mil e quinhentos euros), contados desde o momento do encerramento daquele estabelecimento até ao momento em que o 2.º A. passou a explorar o estabelecimento de restauração, com juros desde a fixação daquele montante e até integral pagamento.
            Mantém-se, no mais, a condenação fixada por aquele Tribunal de 1.ª Instância.

            Custas pela Apelante/Ré e pelos Apelantes/AA., na proporção de 80% e 20%, respectivamente, sem prejuízo do apoio judiciário.

Lisboa, 13 de Abril de 2010

Dina Maria Monteiro
Luís Espírito Santo
A Pires Robalo