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UNIÃO DE FACTO
DISSOLUÇÃO
CASA DA MORADA DE FAMÍLIA
Sumário
1. A união de facto considera-se dissolvida, nomeadamente, mediante acto jurídico que se consubstancia na mera vontade de um dos seus membros. 2.O facto de residirem na mesma casa não obsta a que a união de facto tenha terminado. 3. Cada um pode romper a relação quando quiser sem que o outro possa pedir qualquer indemnização, mas o direito à utilização da casa de morada de família, em caso de dissolução da união de facto, encontra-se protegido. 4.Quer a casa seja um bem próprio de um dos ex – companheiros, quer seja um bem comum ou de outrem (arrendada), qualquer um dos ex – companheiros tem o direito de solicitar ao Tribunal que lhe atribua o direito à utilização de casa (habitação) que foi a morada de família, quando ainda unida. 5. A dissolução da união de facto, nomeadamente por vontade de um dos seus membros, terá de ser judicialmente declarada, quando se pretendam fazer valer direitos da mesma dependentes, a proferir na acção onde os direitos reclamados são exercidos, ou em acção que siga o regime processual das acções de estado. 6. Assim, pretendendo a autora que lhe seja atribuído o direito à utilização da casa de morada de família, a declaração da dissolução da união de facto é um pressuposto do reconhecimento desse direito, uma vez que se trata de fazer valer os direitos que a lei confere à autora, enquanto ex – companheira de uma união de facto já dissolvida (artigo 3º, alínea a), nada impedindo que o tribunal declare tal dissolução. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
I – A, moveu contra B, a presente acção declarativa para dissolução de união de facto e partilha do património comum, pedindo que o Tribunal:
1.declare dissolvida a união de facto que a liga ao Réu desde 1988, por impossibilidade de subsistência da vida em comum;
2.condene o Réu a pagar-lhe, a título de indemnização por danos patrimoniais e morais, os primeiros resultantes das despesas em que a segunda incorreu em consequência das agressões físicas contra ela cometidas, os segundos causados pela vivência diária e pela separação, tudo no montante de € 72.000,00;
3.reconheça o seu direito de propriedade, em comum e sem distinção de parte ou direito, sobre o imóvel, e sobre todo o seu recheio e valores constantes das contas bancárias de que ela e o Réu sejam ambos titulares à data da apresentação da presente acção;
4.decrete a repartição igualitária entre si e o Réu de todo o património de ambos;
5. atribua uma indemnização, a título de enriquecimento sem causa do Réu, no valor de metade do acervo de ambos, caso não seja considerada a partilha nos termos supra solicitados;
6. atribua o gozo da casa de morada de família caso o Réu não possa liquidar de imediato os valores em que vier a ser condenado ou até que aquela seja alienada e o valor do respectivo preço repartido igualitariamente entre ambos.
Pessoal e regularmente citado, o Réu não contestou.
Procedeu-se à elaboração de despacho saneador tabelar e à realização de audiência de julgamento.
Fixados os factos julgou improcedente os pedidos de dissolução da união de facto existente entre a A. e o Réu, do reconhecimento do direito de propriedade da A. sobre os bens melhor identificados e da partilha dos mesmos e pedido de indemnização no valor de metade dos bens, e também do pedido de atribuição do gozo da casa morada de família, por constatar que ambos residiam na mesma casa facto que obstava à procedência do pedido principal.
Condenou o réu a pagar à A. uma indemnização por danos morais no montante de €3500,00 e de uma indemnização em montante a apurar em sede de liquidação pelas despesas decorrentes para a A. das agressões que lhe foram infligidas pelo réu.
Não se conformando com a decisão interpôs recurso e nas suas alegações concluiu:
- a sentença de que se recorre considerou provada a factualidade alegada pela A., ora Recorrente;
- entendeu aditar ao vertido no n.º 2 d a Lei 772001 de 11 de Maio a consumação da dissolução da união de facto, situação que não se encontra prevista na letra nem no espírito da lei;
- e com tal entendimento indeferiu todos os pedidos decorrentes da declaração de dissolução da união de facto, não reconhecendo o efeito constitutivo desta mesma declaração e condenando o recorrido a liquidar a mísera quantia de €3.500,00;
- é urgente declarar a dissolução da união de facto entre a Recorrente e o Recorrido, consequentemente reconhecer o seu direito de propriedade sobre o acervo comum de ambos os cônjuges de facto e proceder à respectiva partilha;
- caso se entenda, fundamentadamente, que neste caso não poderá ser reconhecido o direito de propriedade nos termos em que este foi peticionado, requer que o Recorrido seja condenado no pagamento à recorrente de uma indemnização, a título de enriquecimento sem causa, de valor equivalente a metade do acervo de ambos os cônjuges;
- no que se refere à indemnização dos danos das sucessivas agressões de que foi vítima ao longo dos anos, requer a condenação do Recorrido na indemnização a liquidar à recorrente de valor de €72.000;
- deve ser anulada a sentença e proferida outra em sua substituição que respeite a Lei reconheça os legítimos direitos e interesses da Recorrente.
Factos
1.A Autora e o Réu vivem em união de facto desde pelo menos 1989.
2. Da união de ambos nasceu uma filha a quem deram o nome de X.
3.A Autora e o Réu são ambos de condição social modesta.
4.A Autora encontra-se reformada por invalidez e o Réu trabalha para a firma….
5.O Réu tem problemas com a ingestão de bebidas alcoólicas, abusando reiteradamente do consumo das mesmas.
6. O Réu agride a Autora e esta, pelo menos uma vez, foi assistida em hospital em consequência das agressões;
7.A Autora é uma pessoa doente e que necessita de tratamentos médicos.
8.A casa de morada de família encontra-se registado em nome do Réu.
9.Desde o início da vivência com o Réu que a Autora sempre suportou, com o dinheiro que recebia da sua pensão e dos pequenos trabalhos que fazia, os encargos com o pagamento da prestação correspondente ao pagamento do empréstimo bancário para aquisição do imóvel.
10. O Réu pretende que a Autor abandone a casa de morada de família;
11.Foi a Autora quem pagou a verba necessária, levantando certificados de aforro, para obstará venda judicial do imóvel supra referido.
12.A Autora foi proprietária de uma casa, adquirida durante o seu casamento, a qual foi vendida em processo judicial.
13.Existiu urna penhora sobre o imóvel supra referido, registada a favor da Caixa Geral de Depósitos, em consequência da falta de liquidação do empréstimo contraído para aquisição da mesma.
14.O exercício do poder paternal relativamente a X foi regulado por sentença judicial e foi atribuído à Autora.
15.O Réu nunca liquidou o valor lixado para efeitos de pensão de alimentos à filha X.
16.Foi a Autora quem exerceu funções de encarregada de educação da filha e quem tem diligenciado para que nada falte à mesma.
17.O filho da Autora, fruto do seu casamento, viveu com aquela e com o Réu na casa de morada de família de ambos.
18.A Autora é uma pessoa nervosa e ansiosa.
14.A filha da Autora e do Réu é estudante.
20.A Autora comprou grande parte do recheio da casa de morada de família;
21.A Autora despendeu diversas quantias com o pagamento de despesas hospitalares e medicamentos em consequência das agressões do Réu.
Houve contra alegações defendendo a manutenção da decisão
Corridos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento
II - Apreciando
O recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso (art. 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3 do CPC), acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Decidiu-se na decisão recorrida que, a recorrente não podia pedir a cessão da união de facto residindo na mesma casa com o seu companheiro. E, em face de tal entendimento julgou improcedentes alguns dos pedidos formulados, não os apreciando.
Podemos adiantar que a apelante tem razão quanto ao pedido de declaração do fim da união de facto e sua dissolução, consequentemente merece provimento esta parte
do pedido. Ninguém defenderia ou mesmo indeferiria uma acção de divórcio com fundamento na separação de facto, pela simples razão de os cônjuges viverem debaixo do mesmo tecto.
Quantos casais vivem debaixo do mesmo tecto e nada têm em comum fazendo vidas separadas. Seguramente não é o desejável, mas é o possível quando não têm recursos ou formas de poderem sobreviver com autonomia. Se tal facto não obsta ao decretamento do divórcio não pode de modo algum ser óbice no caso presente de declaração do fim da união de facto.
Hoje esta questão é recorrente, sem autonomia financeira para suportarem os encargos financeiros de outra residência e, quantas vezes nem para assegurarem os encargos da casa morada de família e sustento próprio e dos filhos, outra não pode ser a solução, pelo menos transitória enquanto não se decidem várias questões que reponham a possibilidade de o fazerem. Aliás, no caso vertente, não se valorizou a declaração de fls. 206, em que a … declarou que autora frequentou o centro de Março de 1998 a Agosto de 1999, beneficiando dos serviços de Apoio Social, incluindo refeitório, roupeiro e serviço de enfermagem.
No que se reporta ao fim da união de facto, não era necessária qualquer prova para a procedência desse pedido ou que fazem vidas separadas, bastava a declaração da autora, ora apelante de que pretende por fim a essa união para ser julgado procedente esse pedido.
Na união de facto as partes não têm revelar as razões nem violações de deveres conjugais, eles não são casados. Apenas que pretendem pôr fim a essa coabitação, basta a declaração de que pretendem ver decididas as questões com ela relacionada, para se poder ver ínsito o pedido de cessão de união de facto.
Embora, como refere o Professor Pereira Coelho, RLJ 120º, páginas 79-86, para a generalidade dos efeitos não possa ser considerada como relação de família, na definição do artigo 36, nº1 da Constituição da República Portuguesa, é patente que a união de facto, como incontornável situação da realidade sociológica, tem vindo a ser objecto de crescentes medidas legislativas de protecção.
No nosso ordenamento jurídico temos uma generalizada concessão de efeitos à união de facto, quer - e especialmente - na área do direito da segurança social, quer no âmbito do direito civil.
Classificando os efeitos meramente civis de desfavoráveis e de favoráveis, o citado Professor, na referida anotação, elenca como um dos efeitos favoráveis o de «cessada a união de facto, cada um dos sujeitos da relação tem direito a participar na liquidação do património adquirido pelo esforço comum, liquidação que, segundo determinada orientação, deve fazer-se de acordo com os princípios das sociedades de facto quando os respectivos pressupostos se verifiquem» página 80.
Em termos processuais, esta forma de liquidação pressupõe a declaração judicial da cessação da relação de união de facto, uma vez que, não havendo acordo sobre os critérios da liquidação, o subsequente processo especial liquidatário corre por dependência (apenso) dessa acção de dissolução, nos termos dos artigos 1122 e sgs. do Código de Processo Civil, aplicando-se ainda o disposto nos artigos 1011 e sgs. do Código Civil.
Uma outra forma para efectivar a liquidação em apreço é a de, em acção declarativa de condenação, o convivente em união de facto, que se considere empobrecido relativamente aos bens em cuja aquisição participou, pedir que o outro convivente seja condenado a reembolsá-lo, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa (artigos 473, 474 e 479, nº1 do Código Civil) - cf. acórdão do STJ, de 8/5/97, CJSTJ, ano V, II-81.
Não há dúvida de que a lei considera a união de facto dissolvida mediante acto jurídico que se consubstancia na mera vontade de dos seus membros; assim sendo, a declaração judicial de dissolução não se traduz num acto extintivo da união de facto, mas num mero acto declarativo que se limita a constatar ou a declarar uma realidade já verificada.
A dissolução prevista na alínea b) do n.º1 da lei n.º 7/2001 “ apenas terá de ser judicialmente declarada quando se pretendam fazer valer direitos da mesma dependentes, a proferir na acção onde os direitos reclamados são exercidos, ou em acção que siga o regime processual das acções de estado” (n.º2 do referido artigo 8.º).
A Lei 7/2001 regula a situação jurídica de duas pessoas, independentemente do sexo, que vivam em união de facto há mais de dois anos.
A lei considera a união de facto dissolvida, nomeadamente, mediante acto jurídico que se consubstancia na mera vontade de um dos seus membros (artigo 8º, n.º 1, alínea b).
Cada um pode romper a relação quando quiser sem que o outro possa pedir qualquer indemnização, mas o direito à utilização da casa de morada de família, em caso de dissolução da união de facto, encontra-se protegido.
Quer a casa seja um bem próprio de um dos ex – companheiros, quer seja um bem comum ou de outrem (arrendada), qualquer um dos ex – companheiros tem o direito de solicitar ao Tribunal que lhe atribua o direito à utilização de casa (habitação) que foi a morada de família, quando ainda unida.
Casa de morada de família é aquela que constitua ou tenha constituído a residência permanente dos cônjuges, ou companheiros de união de facto, a sua residência principal e que um dos mesmos seja titular do direito que lhe confira o direito à utilização da mesma.
A casa de morada de família manterá esta qualificação se for e enquanto for a “residência da família”, fixada nos termos do artigo 1673º CC. Assim, a casa de morada de família só deixará de o ser se os cônjuges (ou companheiros) acordarem, expressa ou tacitamente, na alteração da sua residência, ou se o tribunal fixar uma nova residência a requerimento de qualquer dos cônjuges. Também é óbvio o desaparecimento da casa de morada de família na hipótese de separação de pessoas e de bens, ou de dissolução da união de facto.
Resulta, pois, do exposto que esta dissolução da união de facto, nomeadamente por vontade de um dos seus membros, apenas terá de ser judicialmente declarada, quando se pretendam fazer valer direitos da mesma dependentes, a proferir na acção onde os direitos reclamados são exercidos, ou em acção que siga o regime processual das acções de estado (artigo 8º, n.º 2).
Assim, se um dos ex – companheiros da união de facto dissolvida pretender exercer direitos que dela dependam, como é o caso do direito à atribuição da casa de morada de família, impõe-se ao outro. Tal declaração é um pressuposto do direito reclamado com a diferença, no que respeita à atribuição da casa de morada de tribunal, constatada a união de facto e a sua dissolução, que assim o declare.
Tal declaração constitui um pressuposto do reconhecimento do direito à casa de morada de família e residência comum, impondo-se que seja proferida apenas quando se trate de fazer valer os direitos que a lei confere aos ex – companheiros de uma união de facto já dissolvida.
A lei impõe que o tribunal profira tal declaração mas não impõe que o interessado deduza tal pedido como se estivéssemos face a uma cumulação real de pedidos.
Acresce que, em sede de jurisdição voluntária, será admissível a decisão mais conveniente e oportuna que o tribunal entenda dever proferir, ainda que não seja aquela decisão que foi pedida, importando, no entanto, que haja uma conexão ao nível da decisão entre o que se decidiu e o que se pediu.
Face à letra da lei não se duvida igualmente de que se um dos ex-companheiros da união de facto dissolvida pretender exercer direitos que dela dependam, como é o caso do direito à atribuição da casa de morada de família, impõe-se ao Tribunal, constatada a união de facto e a sua dissolução, que assim o declare.
Dispõe o n.º2 do artigo 8.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio quando prescreve in fine “ ou em acção que siga o regime processual das acções de estado” parece inculcar a possibilidade de ser instaurada acção autónoma tendo em vista o mero reconhecimento da dissolução da união de facto. No entanto, atenta a natureza declarativa dessa acção e o comando ínsito na primeira parte do preceito de que “ a dissolução […] apenas terá de ser judicialmente declarada quando se pretendam fazer valer direitos da mesma dependentes”, não se vê que interesse em agir assista ao companheiro de facto quando não pretenda fazer valer os direitos dependentes da declaração judicial da dissolução da união de facto. Por isso, já se decidiu que um pedido autónomo de declaração judicial de dissolução da união de facto deve ser indeferido liminarmente por falta de interesse em agir: ver Ac. da Relação de Lisboa de 26-10-2006 (Ana Paula Boularot) C.J., 4, pág. 100.
França Pitão considera que a parte final do referido n.º2 do artigo 8.º da lei n.º 7/2001 não tem “ qualquer fundamento legal, nem justificação racional” constituindo um lapsus scriptae “ no sentido de o legislador ter introduzido inadvertidamente a proposição ‘ou’, conjugando-a com uma deficiente redacção da parte final do preceito. De facto a parte final daquele n.º 2 do artigo 8.º da lei n.º 7/2001 só fará sentido se se entender como um complemento ao restante texto, no sentido de considerar que o meio processual próprio para a declaração de dissolução da união de facto é a acção de estado” (Uniões de Facto e Economia Comum, Almedina, 2002, pág. 321).
Quer isto dizer que a referida declaração de dissolução da união de facto não dispõe de autonomia só se impondo que seja proferida quando se trate de fazer valer os direitos que a lei confere aos companheiros de uma união de facto já dissolvida.
O pedido que importa deduzir é naturalmente aquele que corresponde ao direito que o ex-companheiro julgue assistir-lhe, direito que, no caso vertente, é o direito ao arrendamento da casa de morada de família.
A declaração judicial da dissolução da união de facto constitui um pressuposto do reconhecimento do direito à casa de morada de família e residência comum: a lei impõe que o tribunal profira tal declaração, mas não impõe que o interessado deduza tal pedido como se estivéssemos face a uma cumulação real de pedidos.
No caso vertente, não colhe a argumentação de que vivendo na mesma casa não pode pedir a declaração do fim da união de facto. E, apesar disso fixou uma indemnização por maus-tratos e outra a liquidar, quanto às despesas suportadas, para o tratamento dos mesmos. A questão que urge responder é se a A. tem de continuar a apanhar ou vai pedir ajuda, como já fez à .. ou, em alternativa resta-lhe esperar pela solução da sua situação de facto seja resolvida de forma trágica. A violência doméstica é hoje uma preocupação constante e pelas razões que são sobejamente conhecidas. Como vem provado que o companheiro tem problemas com ingestão de bebidas alcoólicas abusando reiteradamente do consumo das mesmas, a autora está perigosamente exposta continuando na mesma casa. Ou aguarda pela resolução da situação quando já não houver solução por ter sido resolvida pelos próprios de forma definitiva. Impõe-se que o tribunal tenha um papel moderador e dissuasor de condutas violentas. Mas, para tal desiderato tem de resolver os conflitos em tempo útil.
Refira-se ainda que, em sede de jurisdição voluntária, será admissível a decisão mais conveniente e oportuna que o Tribunal entenda dever proferir ainda que não seja aquela decisão que foi pedida, importando, no entanto, que haja uma conexão ao nível da decisão entre o que se decidiu e o que se pediu.
Como se decidiu no Ac. da Relação de Lisboa de 13-1-2000 (P. 6018/8/99); publicado in www.dgsi.pt o seguinte:
“O processo de atribuição casa de morada de família regulamentado no artigo 1413º do C.P.C. é um processo de jurisdição voluntária. Nestes processos o tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes (artigo 1409º/2 do C.P.C.). Isto significa que " na jurisdição voluntária o princípio da actividade inquisitória do juiz prevalece sobre o princípio da actividade dispositiva das partes.
Ao passo que na jurisdição contenciosa o juiz só pode, em regra, servir-se dos factos fornecidos pelas partes (artigo 664º), na jurisdição voluntária pode utilizar factos que ele próprio capte e descubra.
O material de facto, sobre que há-de assentar a resolução, é não só o que os interessados ofereçam, senão também o que o juiz conseguir trazer para o processo pela sua própria actividade" (Processos Especiais, Vol II, José Alberto dos Reis, pág. 399)
Relendo o pedido verifica-se que a requerente formula a pretensão de que lhe seja atribuída a utilização da casa de morada de família, mas só se não forem deferidos os pedidos anteriores.
Essa pretensão, assim apresentada, significa que o tribunal, quando tiver de decidir dar ou não de arrendamento a casa de morada de família, tem de condenar o réu para além do pedido incorrendo, portanto, na nulidade a que se refere o artigo 661º/1 do C.P.C.
A primeira observação a fazer é a de que, em jurisdição voluntária, não é absoluta a regra do artigo 661º. Tem sido admitida a condenação ultra petitum designadamente no âmbito de processo tutelares cíveis: no Ac. da Relação de Coimbra (Raúl Campos) de 25-5-1977,B.M.J. 270-265 diz-se expressamente que nada obsta, em princípio, a que em acção de alimentos (devidos a um menor) seja fixada uma prestação superior à pedida, por se tratar de processo de jurisdição voluntária; a mesma orientação encontra-se no Ac. da Relação de Lisboa de 16-1-1986 (Ianquel Milhano),C.J., 1, pág. 91 e ainda no Ac. da Relação de Évora de 11-12-1975 (Manso Preto),B.M.J.254-246, embora neste aresto se restrinja esse poder de fixação além do pedido "quando se verifiquem circunstâncias que o justifiquem, face ao princípio fundamental de carácter geral do nosso direito, que emana do artigo 661º do Código de Processo Civil.
Dir-se-á que em todos os indicados casos está em causa uma limitação quantitativa (proibição de o juiz ultrapassar em quantidade os limites constantes do pedido formulado) ao passo que, no caso em apreço, o que se está a fazer é a condenar em objecto diverso do que se pediu, ou seja, desrespeita-se uma limitação qualitativa.
Esta crítica é exacta, mas os exemplos apresentados servem para demonstrar que, no plano da jurisdição voluntária, não se verifica uma absoluta intangibilidade dos limites de condenação.
A adopção da solução mais conveniente e oportuna, quando o tribunal escapa aos critérios de legalidade estrita (artigo 1410º do C.P.C
Repare-se que o caso vertente: se o tribunal, não declarasse constituído o arrendamento, limitando-se a condenar o requerido no pedido, essa condenação implicaria a atribuição à requerente da utilização exclusiva da casa de morada de família, que é o móbil principal da sua pretensão, sem que o requerido auferisse qualquer contrapartida.
Por outra palavras: nos processos de jurisdição voluntária pode o tribunal condenar em objecto diverso do pedido quando entre a condenação e a pretensão exista uma efectiva conexão e quando, assim procedendo, se tenha como objectivo realizado uma solução mais adequada para o litígio.
Mas, uma tal condenação não pode ir ao ponto de, como diz o Prof. Antunes Varela," se permitir a postergação das normas imperativas aplicáveis à situação" (Manual de Processo Civil, 1985, pág. 72). Quer isto dizer que o tribunal não poderia em vez de constituir um arrendamento (opção imperativa da lei) impor por exemplo à requerente a celebração de contratos de hospedagem em benefício do requerido.
A declaração de dissolução da união de facto não tem autonomia em relação ao pedido que o companheiro da união de facto já dissolvida haja deduzido; por isso, estando nós face a uma cumulação aparente, o Tribunal não desrespeita o princípio do pedido quando conhece do pedido que foi deduzido (o de atribuição da casa de morada de família) declarando o pressuposto de que o pedido depende, ou seja, declarando judicialmente dissolvida a união de facto, mesmo que não tivesse sido pedida.
Aceitando-se que o pedido de dissolução da união de facto pudesse ser deduzido autonomamente, estava implícito esse pedido no pedido de atribuição do direito ao arrendamento da casa de morada de família por se dever entender que quem reclama o arrendamento da casa que foi a casa de morada de família, pretende obviamente o reconhecimento de que houve uma vivência da união de facto naquela habitação que se extinguiu. Importa, claro está, que os factos integrativos da dissolução e da anterior vivência na casa de morada de família em união de facto tenham sido alegados. Aliás, no caso vertente a apelante fez vários pedidos que enumerou de a) a f) sendo que o último se reporta ao gozo da casa morada de família se e nas condições aí expostas.
Sendo certo que, no caso vertente, não foi registada a prova e como tribunal de recurso, não se pode substituir ao conhecimento e decisão que importa tomar na primeira instância. Aliás, sempre se estaria suprimir uma instância. No entanto, houve factos que falharam e importa apurar para se poder atribuir a casa que foi morada de família deste casal enquanto mantiveram uma união de facto, caso se mostre necessário.
Importa alargar a base instrutória e apurar quanto aufere cada um e a sua situação económica entre outros factores que têm de ser ponderados na decisão a proferir sobre tal matéria. Foi dado como provado que foi fixada uma pensão de alimentos e também se provou que o réu nunca a pagou. Por outro lado, não se apurou o valor locatício da casa morada de casal. No entanto, em face dos vários pedidos subsidiário que foram formulados importa apurar tais factos e decidir. Bem pode acontecer que se a A. receber o valor que despendeu com a casa que foi morada de família, não tenha interesse na sua atribuição. Estamos no campo das suposições e, impõe-se apurar os factos para se poder decidir as questões que vêm colocadas, a acção não teve contraditório, por banda do réu há dúvidas sobre se teve ou não conhecimento.
Com a conflituosidade existente resulta dos autos que quem recebeu a citação foi a autora que assinou a carta registada e também deve ter recebido a carta do art. 241 do CPC, cf. fls.201.
Impõe-se, nestes processos de jurisdição voluntária tentar uma solução consensual que pode ser levada a cabo com uma conferência, pelo menos para encontrar uma solução mitigada para a atribuição da casa que foi morada deste casal enquanto viveram em união de facto, entre outras questões que foram colocadas e que se impõe decidir. A A. juntou cadernetas e fez prova dos pagamentos, como consta dos autos.
Há que apurar se há ou não procedência dos outros pedidos caso contrário tem de ser apurado o valor locativo da fracção para uma eventual atribuição do arrendamento à A. se for julgada procedente tal pretensão. No entanto, resulta dos vários pedidos que a autora pretende em primeiro lugar fazer a separação e divisão do
património e só na impossibilidade de receber a sua parte concluiu com o pedido de atribuição da casa morada de família
Concluindo
1. A união de facto considera-se dissolvida, nomeadamente, mediante acto jurídico que se consubstancia na mera vontade de um dos seus membros.
2.O facto de residirem na mesma casa não obsta a que a união de facto tenha terminado.
3. Cada um pode romper a relação quando quiser sem que o outro possa pedir qualquer indemnização, mas o direito à utilização da casa de morada de família, em caso de dissolução da união de facto, encontra-se protegido.
4.Quer a casa seja um bem próprio de um dos ex – companheiros, quer seja um bem comum ou de outrem (arrendada), qualquer um dos ex – companheiros tem o direito de solicitar ao Tribunal que lhe atribua o direito à utilização de casa (habitação) que foi a morada de família, quando ainda unida.
5. A dissolução da união de facto, nomeadamente por vontade de um dos seus membros, terá de ser judicialmente declarada, quando se pretendam fazer valer direitos da mesma dependentes, a proferir na acção onde os direitos reclamados são exercidos, ou em acção que siga o regime processual das acções de estado.
6. Assim, pretendendo a autora que lhe seja atribuído o direito à utilização da casa de morada de família, a declaração da dissolução da união de facto é um pressuposto do reconhecimento desse direito, uma vez que se trata de fazer valer os direitos que a lei confere à autora, enquanto ex – companheira de uma união de facto já dissolvida (artigo 3º, alínea a), nada impedindo que o tribunal declare tal dissolução.
III – Decisão: em face do exposto, julga-se procedente a apelação, revogando-se a decisão decretando-se a dissolução da união de facto devendo os autos prosseguir para apreciação dos vários pedidos que foram formulados.