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JUNTA DE FREGUESIA
PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
Sumário
Ao atribuir à junta de freguesia a competência para instaurar pleitos e defender-se deles, o art.º 34.º n.º 1 al. c) da Lei 169/99 de 18 de Setembro está a conferir-lhe personalidade judiciária. (sumário elaborado pelo Relator)
Texto Parcial
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
I – Relatório
A… instaurou acção declarativa de condenação com processo comum contra:
JUNTA DE FREGUESIA DE …,
pedindo que seja:
a) reconhecido que a relação laboral existente entre o A. e a R. iniciada em 13 de Maio de 2008 configura um contrato de trabalho sem termo;
b) a R. condenada a pagar ao A. a quantia de €315,00 (trezentos e quinze euros), correspondente à remuneração dos 20 dias de trabalho realizados no mês de Julho de 2009;
c) a R. condenada a pagar ao A. a quantia de €772,92 (setecentos e setenta e dois euros e noventa e dois cêntimos), a título de retribuição correspondente a férias e respectivo subsídio de férias, proporcionais ao tempo de serviço prestado em 2008 e 2009;
d) a R. condenada a pagar ao A. a quantia de €98,42 (noventa e oito euros e quarenta e dois cêntimos), a título de subsídio de Natal proporcional ao tempo de serviço prestado no ano de 2008;
e) a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 275,59 (duzentos e setenta e cinco euros e cinquenta e nove cêntimos), a título de subsídio de Natal proporcional ao tempo de serviço prestado no ano de 2009;
f) a R. condenada a pagar ao A. a quantia de €1.417,50 (mil, quatrocentos e dezassete euros e cinquenta cêntimos), a título de indemnização nos termos do disposto no art. 391.°, n.° 3 do Cód. Trabalho;
g) a R. condenada no pagam vencidos e vincendos à taxa legal em vigor, desde a data do despedimento até ao efectivo pagamento, sobre as quantias enunciadas nas alíneas b) a f) deste pedido (sic).
Contestou a Ré defendendo-se por excepção – arguindo a incompetência do Tribunal do Trabalho em razão da matéria – e por impugnação.
Em despacho proferido a fls. 68 a 70, o senhor juiz decidiu a invocada excepção de incompetência material, julgando tal excepção improcedente.
Na mesma altura, entendendo verificar-se uma outra excepção, proferiu o seguinte despacho:
“Existe, no entanto, e seguindo a ordem estabelecida no art.Q 288, n.2 1, Cód. Proc. Civil, uma outra excepção que impede o conhecimento do mérito da causa. A acção vem proposta, como acima se disse, contra uma Junta de Freguesia. Ora, esta é apenas um órgão (executivo) de uma pessoa colectiva, a freguesia (cfr. art.2 246.2 da Constituição, e art.9 23.2 da Lei n.2 169/99). Sendo apenas um órgão, a R. não tem personalidade jurídica nem, como decorre do art.9 5.9, n.2 2, Cód. Proc. Civil, personalidade judiciária. Quem deve ser demandado, porque é quem tem personalidade jurídica, é a própria freguesia e não os seus órgãos. Esta falta de personalidade judiciária não pode ser sanada nos termos previstos no art.2 265.2, n.2 2, porque a lei apenas prevê a sanação neste tipo de situações quando estejam em causa agências, filiais ou sucursais (art.2 8.2). Por outro lado, não estamos perante a possibilidade de modificação subjectiva da instância pois que isso implica a substituição de uma pessoa por outra. E neste caso não temos pessoa alguma. Sendo assim, impõe-se a absolvição da instância por falta insanável de um pressuposto processual. Pelo exposto, julgo verificada a excepção de falta de personalidade judiciária e absolvo a R. da instância. Custas pelo A.”.
Inconformado com a decisão, veio o Autor interpor recurso de agravo para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, com as seguintes conclusões:
(…)
A Ré não contra-alegou. recorrida.
Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação.
Nada obstando ao conhecimento da causa, cumpre decidir.
O âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) , salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Assim, a questão essencial a que cumpre dar resposta no presente recurso consiste em saber se a Junta de Freguesia tem personalidade judiciária para ser demandada nos presentes autos
II - FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos com interesse para a decisão do recurso constam do relatório acima.
III – FUNDAMENTOS DE DIREITO
A questão que vem suscitada no presente recurso consiste em saber se a Junta de freguesia tem personalidade judiciária de modo a poder ser intentada contra ela, uma acção.
A decisão recorrida entendeu que, sendo a Junta de Freguesia apenas um órgão (executivo) de uma pessoa colectiva, a freguesia, não tem personalidade jurídica nem personalidade judiciária.
O recorrente, por seu turno, apoiado em jurisprudência vária dos nossos tribunais superiores, bem como na legislação que atribui competência às autarquias (Lei n.º 169/99 de 18.09) entende que deve ser reconhecida à R. personalidade judiciária.
E com razão, adiantemo-lo desde já.
A personalidade judiciária consiste na susceptibilidade de ser parte (art.º 5.º n.º 1 do CPC).
Parte, - figura essencialmente processual - é a pessoa pela qual ou contra a qual é requerida, através da acção, a providência judiciária.
O critério geral fixado na lei para se saber quem tem personalidade judiciária, é o da correspondência entre a personalidade jurídica e a personalidade judiciária (“quem tivar personalidade jurídica tem igualmente personalidade judiciária” – n.º 2 do art.º 5.º do CPC).
Há, todavia, no Código do Processo Civil, excepções ao princípio da correspondência (coincidência ou equiparação), todas no sentido de estender a personalidade judiciária a quem não goza de personalidade jurídica (ou a quem é, pelo menos, duvidoso que a possua) – cfr. os art.ºs 6.º e 7.º.
De modo que, sempre que a lei atribuir a uma entidade a possibilidade de ser parte num litígio, está a conferir-lhe personalidade judiciária – mesmo que não possua personalidade jurídica.
No caso dos autos discute-se se a Junta de Freguesia tem personalidade judiciária passiva, ou seja, se contra ela pode prosseguir a acção intentada pelo autor.
A junta de freguesia é um dos órgãos representativos da freguesia (o outro é a assembleia de freguesia – cfr. art.º 2.º da Lei 169/99 de 18 de Setembro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias).
De harmonia com o disposto no art..º 34º n.º 1 al. c) do mesmo diploma legal, compete à junta de freguesia no âmbito da organização e funcionamento dos seus serviços, bem como no da gestão corrente, “instaurar pleitos e defender-se neles, podendo confessar, desistir ou transigir, se não houver ofensa de terceiros”.
Ao atribuir à junta de freguesia a competência para instaurar pleitos e defender-se deles, a lei está a conferir-lhe personalidade judiciária, a susceptibilidade de ser parte (activa ou passiva).
Face ao conceito de personalidade judiciária e à letra da lei, não podem, pois, existir dúvidas sobre a personalidade judiciária das juntas de freguesia.
E nesse sentido têm sido inúmeras as decisões jurisprudenciais, quer no que se refere à personalidade judiciária das juntas de freguesia, quer no que se refere à personalidade judiciária das câmaras municipais (cfr. entre outros, os Acs. do STJ de 27.03.90, 3.10.91, 1.6.93, 12.12.96, 23.04.98, 17.11.98, 2.05.2002, e jurisprudência do STA aí citada, da RL de 18.06.96, da RP de 21.03.2000 e 25.03.2003 e da RC de 15.02.2005).
Face ao sobredito tem de se concluir, como já concluímos acima, que assiste razão ao recorrente.
IV - DECISÃO
Em conformidade com os fundamentos expostos, concedendo provimento ao agravo, revoga-se o despacho recorrido, devendo os autos prosseguir para conhecimento das demais questões.
Sem Custas