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DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
INTERRUPÇÃO DA INSTÂNCIA
PRAZO
RETRIBUIÇÃO MISTA
Sumário
1. O prazo para a deserção da instância, a que alude o art. 285º do PC, conta-se a partir da notificação às partes do despacho a declarar interrompida a instância. 2. Auferindo o trabalhador uma retribuição certa acrescida de comissões sobre as vendas efectuadas, é inquestionável que, face ao carácter retributivo das comissões, o valor das comissões deva integrar a retribuição das férias bem como o respectivo subsídio. 3. Sendo o valor das comissões mensais variável, temos como mais consentâneo para o cálculo do valor da retribuição das férias o critério da média das comissões auferidas no ano de referência do direito a férias. Este critério deve sofrer restrição no ano da admissão e no ano da cessação do contrato, em que apenas se atenderá à média das comissões auferidas nos meses desses anos. (sumário elaborado pelo Relator)
Texto Parcial
Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:
Relatório
A..., veio intentar acção declarativa, com processo comum, contra B..., pedindo a condenação desta a pagar a quantia de €13.359,23 (treze mil trezentos e cinquenta e nove euros e vinte e três cêntimos), assim discriminada:
a)€8.453,57 (oito mil quatrocentos e cinquenta e três euros e cinquenta e sete cêntimos), a título de diferenças da remuneração de férias relativamente aos anos de 1988 a 2002;
b)€382,41 (trezentos e oitenta e dois euros e quarenta e um cêntimos), a título de diferenças entre os proporcionais da retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal, pagos e devidos;
c)€4.523,25 (quatro mil quinhentos e vinte e três euros e vinte e cinco cêntimos), a título de juros vencidos, acrescido dos juros vincendos desde esta data até ao efectivo e integral pagamento.
Alega o Autor, em resumo que trabalhou para a Ré até 16 de Agosto de 2002, como vendedor.
Enquanto esteve ao serviço da Ré, sempre auferiu uma remuneração mista, composta por uma parcela fixa e certa e uma parte variável, correspondente ao valor de comissões sobre vendas que, em regra, eram processadas no vencimento do mês seguinte daquelas.
Ora, a Ré sempre processou os subsídios de férias nos termos legais e processou e pagou a retribuição de férias apenas com base no vencimento base, não contemplando a parte correspondente à média das referidas comissões recebidas no período de férias.
É pois o Autor credor da diferença entre o valor das retribuições de férias recebido e devido, ou seja, o valor da média comissional verificada no mesmo período e incluída no subsídio de férias.
Designada audiência de partes, não foi possível obter o acordo entre Autor e Ré.
A Ré apresentou a sua contestação arguindo a prescrição resultante do facto de ter sido citada decorrido mais de um ano sobre a data da cessação do contrato. E alegou que a retribuição de férias era e sempre foi paga pelo vencimento base que se traduz no valor complexo constituído pela parte certa e parte variável, esta correspondente ao valor das comissões em função das vendas promovidas no mês anterior.
Na resposta veio o Autor responder à invocada prescrição que deve ser julgada improcedente.
Foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção da prescrição.
Dispensou-se a realização da audiência preliminar e a fixação da base instrutória.
Entretanto, em 14.10.2005 foi proferido o seguinte despacho: “aguardem os autos que seja dado cumprimento ao despacho de 5.07.13, sem prejuízo do disposto no art. 51º nº 2 al. b) do CCJ”.
Os autos foram remetidos à conta e as custas respectivas pagas pelo Autor.
Em 31.10.2006 foi proferido o seguinte despacho: “nos termos do art. 285º declaro interrompida a instância”, o qual foi notificado às partes por cartas expedidas em 3.11.2006.
Em 4.11.2008 o Autor veio requerer o prosseguimento dos autos (fls. 412).
E, por despacho de 2.04.2009, foi designada nova data para a realização da audiência de julgamento.
A Ré notificada desse despacho, arguiu a nulidade do mesmo, por em seu entender se dever considerar extinta a instância.
O Mº Juiz proferiu despacho a fls. 427-430 no qual decidiu indeferir a reclamação por entender não se verificar a extinção da instância, pelo que o “despacho que designa audiência de julgamento não padece de qualquer nulidade”.
A Ré interpôs recurso desse despacho, cuja alegação termina com as seguintes conclusões:
(...)
O Recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso.
O recurso foi admitido para subir com o primeiro que depois da sua interposição haja de subir imediatamente.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento que decorreu com observância do legal formalismo, como decorre da respectiva acta.
A matéria de facto foi decidida nos termos constantes do despacho de fls. 458 a 463, que não sofreu qualquer reclamação.
De seguida foi elaboradaa sentença foi proferida a seguinte decisão:
“Nestes termos, julgo totalmente improcedente por não provada a acção e, consequentemente, absolvo do pedido deduzido pelo Autor A... a B...
O Autor interpôs recurso desta decisão e termina a sua alegação formulando as seguintes conclusões:
(...)
A Recorrida contra-alegou pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
Admitido o recurso foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação.
O Sr. Procurador-Geral adjunto pronunciou-se no sentido da procedência do recurso de agravo.
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
A questão que emerge do recurso de agravo consiste em saber se a instância já estava extinta na data em que foi designada a audiência de julgamento;
O objecto do recurso de apelação traduz-se em saber se o A. tem direito a diferenças retributivas no que respeita à retribuição das férias de 1988 a 2002 e bem assim nos proporcionais de férias, subsídios férias e de Natal.
Fundamentação de facto:
Com relevo para a decisão ficaram apurados os seguintes factos:
1.º Autor foi admitido ao serviço da Ré em 15 de Fevereiro de 1988.
2.º Autor cessou a sua prestação laboral, no dia 16 de Agosto de 2002.
3. Á data da cessação do contrato o vencimento base do Autor era de € 555,49.
4. 0 Autor recebeu o subsídio de férias nos meses referidos a fls. 29, tendo gozado as férias nos meses imediatamente a seguir, ou seja, em Agosto, nos anos de 1988 a 1991, e nos anos de 1993 a 1999 e no ano de 2001; em Julho, nos anos de 1992 e 2000 e em Abril de 2002.
S. No ano de 1988, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento juntos a fls. 305 e s., 308 a 316 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
6. No ano de 1989, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento juntos a fls. 317 a 330 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
7. No ano de 1990, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento a fls. 331 a 337 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
S. No ano de 1991, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento juntos a fls. 339 a 344 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
9. No ano de 1992, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento, juntos a fls. 344 a 351 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
10. No ano de 1993, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento, juntos a fls. 352 a 358 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
11. No ano de 1994, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos de vencimento, juntos a fls. 359 a 365 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
12. No ano de 1995, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 89 a 102 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
13. No ano de 1996, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 103 a 116 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
14. No ano de 1997, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 117 a 130 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
15. No ano de 1998, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 131 a 144 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
16. No ano de 1999, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 145 a 158 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
17. No ano de 2000, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 159 a 171 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
18. No ano de 2001, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 172 a 186 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
19. No ano de 2002, a Ré pagou ao Autor as quantias especificadas nos recibos juntos a fls. 187 a 194 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
20. Na data da cessação do contrato, a Ré pagou ao Autor as quantias de € 695,46, € 347,78 e € 695,46 a título de proporcionais de subsídio de férias, retribuição de férias e de subsídio de Natal, respectivamente.
21. A Ré pagava ao Autor subsídio de férias, incluindo a média das comissões auferidas nos doze meses anteriores.
22. A Ré pagou ao Autor a retribuição de férias, incluindo as comissões em função das vendas por estas promovidas no mês anterior.
23. 0 Sindicato dos Trabalhadores Técnicos de Vendas emitiu documento cuja cópia foi junta a fls. 10, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
24. 0 Sindicato dos Trabalhadores Técnicos de Vendas remeteu ao Autor escrito cuja cópia se encontra junta a fls. 11 a 13 e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
25. 0 Sindicato dos Técnicos de Vendas emitiu o documento datado de 17 de Maio de 2001 e dirigido à Ré cuja cópia se encontra junta a fls. 30 e cujo conteúdo se dá por reproduzido.
26. 0 Sindicato dos Técnicos de Vendas emitiu o documento datado de 06 de Novembro de 2002 e dirigido à Ré cuja cópia se encontra junta a fls. 32 e seguintes cujo conteúdo se dá por reproduzido.
27. O Autor era filiado no Sindicato dos Técnicos de Vendas.
Fundamentação de direito Quanto ao recurso de agravo
A questão a decidir consiste em saber se quando o Autor requereu o prosseguimento dos autos, no dia 4 de Novembro de 2008, já estava extinta a instância.
Para a apreciação desta questão relevam os seguintes factos:
1 - Em 24 de Janeiro de 2005, realizou-se audiência de discussão ficando o autor, por despacho aí proferido, notificado para juntar aos autos até 28 de Fevereiro de 2005, mapa contendo todas as retribuições variáveis auferidas entre 15 de Fevereiro de 1988 e a data da cessação do contrato em 16 de Agosto de 2002, declarando-se interrompida a referida audiência (d. fls. 289 a 291);
2 - Em 11.02.2005, na sequência de despacho proferido foi o autor notificado para juntar também até aquela data recibos de 1988 e 1989 (d. fls. 292 e 293);
3 - Em 01 de Março de 2005, veio o autor juntar documentos (d. fls. 295 a 378), os quais foram notificados à ré em 08.06.2005 (d. fls. 379);
4 - Em 11.07.2005 foi proferido despacho que convidou as partes a juntarem no prazo de trinta dias acordo quanto à matéria de facto, o qual foi notificado àquelas em 15.07.2005 (d. fls. 380, 381 e 382);
5 - A fls. 383 por despacho de 14.10.2005, notificado em 19.10.2005, determinou-se que os autos aguardassem o cumprimento por autor e ré do despacho referido em 4. (d. fls. 383, 384 e 385);
6 - Em 27.04.2006, o processo foi remetido à conta nos termos do artigo 51º do CCJ - (d. fls. 388);
7 - Em 09.05.2006, autor e ré foram notificados da conta e para efeitos de reclamação (d. fls. 390 a 393);
8 - A fls. 397, por despacho datado de 31.10.2006 e cuja notificação às partes foi expedida a 03.11.2006, foi declarada interrompida a instância nos termos do artigo 285º do Código de Processo Civil (d. fls. 397 a 399);
9 - A fls. 412 por requerimento que deu entrada no Tribunal no dia 04 de Novembro de 2008, veio o autor requerer o prosseguimento dos autos;
10- Por não ter dado cumprimento ao artigo 229º-A do CPC, foi ordenado que juntasse aos autos comprovativo de notificação à contraparte, o que não fez;
11- A fls. 415 por despacho de 11.12.2008 foi a ré notificada para se pronunciar ao que não respondeu;
12 - A fls. 418 por despacho de 02 de Abril de 2009, foi designada pelo Tribunal data para realização da audiência de julgamento.
Perante estes factos a sentença recorrida considerou que o prazo para a deserção da instância se conta a partir da notificação às partes do despacho que declara a interrupção da instância, pelo que tendo o despacho que declarou a interrupção da instância sido notificado às partes por cartas expedidas em 3.11.2006, considera-se tal notificação efectuada em 6.11.2006, por isso, quando o Autor requereu a prossecução dos autos, em 4.11.2008, ainda não tinha decorrido o prazo de dois anos para a deserção da instância.
A ré, aqui Agravante, discorda da sentença recorrida por entender que em 4.11.2008, quando o Autor veio requerer a prossecução dos autos, a instância já estava extinta, uma vez que o processo esteve parado durante mais de três anos, pelo menos desde 20.05.2005, pois entende que o tribunal devia ter interpretado o comando do art. 285º do CPC no sentido de que a interrupção opera automaticamente pelo simples decurso do tempo, sem dependência de declaração judicial para o efeito.
Vejamos:
O art. 285º do CPC dispõe que “a instância interrompe-se quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento”. Por sua vez, o nº 1 do art. 291º nº 1 do CPC refere que se “considera deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida durante dois anos”.
Face a estes preceitos, enquanto a deserção da instância não necessita, para se verificar, de algum despacho judicial que a declare, uma vez que a lei expressamente o dispensa, operando ela assim automaticamente pelo mero decurso do mencionado prazo de dois anos a contar do momento em que a instância tenha ficado interrompida, já quanto à interrupção da instância a lei não dispensa tal despacho, não operando, pois, de forma automática.
Justifica-se a necessidade de despacho judicial a declarar a interrupção da instância por esta ter por pressuposto não só o decurso do prazo de um ano e um dia mas também um juízo sobre a falta de diligência da parte onerada com o impulso processual em promover os termos do processo durante tal período, juízo esse que a parte pode rebater, após notificada do mesmo despacho, nomeadamente mediante recurso se for admissível.
Este despacho tem natureza declarativa, visto que se limita a apurar e declarar a verificação dos requisitos da interrupção.
E aqui surgem as divergências na jurisprudência.
Enquanto uns entendem que “a interrupção da instância não nasce com o despacho que a declara, devendo a mesma ter-se como ocorrida logo que se perfaz o tempo de paragem da marcha do processo previsto na lei.
Assim, não dependendo o decurso do prazo de um ano e a respectiva interrupção da instância do despacho declarativo desta, por maioria de razão a deserção da instância ocorrerá logo que decorridos três anos e um dia sobre o seu não impulso, independentemente da existência ou não de despacho prévio a declarar a sua interrupção e independentemente do decurso ou não do prazo de dois anos sobre a data da notificação deste despacho, quando proferido” (vejam-se os Acórdãos deste Tribunal da Relação de Lisboa de 4.02.2010 (Carlos Valverde); de 15 de Outubro de 2009 (Fátima Galante) disponíveis em www.dgsi.pt.
Outros, porém, entendem que para que “a instância se interrompa, não é dispensável a prolação de uma decisão judicial expressa, de natureza meramente declarativa (porque de simples constatação de uma realidade do processo), declarando tal interrupção e, por isso, a instância não pode ser julgada extinta por deserção sem que a interrupção tenha sido previamente declarada por decisão judicial e subsista pelo lapso temporal de 2 anos”- Ac. do STJ de10-04-2008, do qual foi relatora a Sra. Juíza Conselheira Maria Dos Prazeres Pizarro Beleza, in http://www.dgsi.pt.
«A entender-se que a interrupção da instância operava desde a data em que se completava o prazo não teria utilidade o despacho a declará-la, nem a sua notificação às partes, mormente naquelas situações em que entretanto até já tivesse também decorrido o prazo para a deserção da instância», por isso «o prazo para a deserção da instância só poderá contar a partir da notificação às partes do despacho a declarar interrompida a instância» - Acórdãos desta Relação de Lisboa de 06-11-2008, (Pereira Rodrigues), de 5 de Março de 2009 (Carlos Marinho) in http://www.dgsi.pt/.
Subscrevemos este último entendimento pelas razões neles referidas e por razões de certeza e segurança jurídicas.
Resulta dos factos provados que o despacho que declarou a interrupção da instância foi notificado às partes por cartas expedidas em 3.11.2006, pelo que se considera tal notificação efectuada em 6.11.2006, pelo que quando o Autor requereu a prossecução dos autos, em 4.11.2008, ainda não havia decorrido o prazo de dois anos para a deserção da instância.
Nega-se, pois, provimento ao agravo interposto pela Ré.
Recurso de apelação
O Autor, aqui apelante, pugna para que a retribuição das férias dos anos de 1988 a 2002 e nos proporcionais de férias e subsídio de férias e de Natal no ano da cessação do contrato de trabalho, seja calculada pela média das comissões auferidas no ano anterior ao respectivo pagamento.
A sentença recorrida considerou válido o critério utilizado pela Ré de calcular a parte variável da retribuição de férias pelo valor das comissões em função das vendas promovidas pelo Autor no mês anterior ao gozo das férias.
Considerando que o contrato de trabalho entre Autor e Ré se iniciou em 15.02.1988 e cessou em 16.08.2002 é aplicável ao mesmo, por força do disposto no nº 1 do art. 8º da Lei nº 99/2003 de 27.07 e por se tratar de efeitos de factos totalmente passados até 30.11.2003, a LCT (regime jurídico do contrato individual de Trabalho aprovado pelo DL 49.408 de 24.11.69) e a LFFF (lei das férias, feriados e faltas, aprovada pelo DL 874/76 de 28.12.
O art. 6º nº 1 da LFFF dispõe que “a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e deve ser paga antes do início daquele período”.
Este preceito tem suscitado dúvidas de interpretação, visto que para se determinar os montantes que o trabalhador receberia se estivesse ao serviço é necessário recorrer a um juízo hipotético de prognose, que se baseia no que presumivelmente aconteceria, em termos de remuneração, caso o trabalhador estivesse a desenvolver a sua actividade, sendo que esse juízo deve ser formulado antecipadamente pois a remuneração deve ser paga antes do início das férias.
Mas o objectivo do legislador com esta norma foi o de evitar que o trabalhador seja penalizado em termos retributivos relativamente à parte da sua actividade que não pode desenvolver, em virtude do gozo de férias, garantindo-se, assim, que o trabalhador não se sinta tentado, por necessidade económica, a não gozar férias, o que poderia suceder se estas se traduzissem numa diminuição da retribuição.
Este princípio da não penalização remuneratória significa que, em termos de contrapartida pelo trabalho, tudo se passa como se não existisse tempo de repouso. Trata-se de uma regra imperativa quanto ao mínimo, garantindo apenas a ausência de impacto negativo patrimonial, nada obstando a que se retribua o período de férias com acréscimo ([1]).
Quando a remuneração é certa não há problemas quanto à determinação da retribuição das férias. As dúvidas surgem quando a retribuição é variável, como é o caso das comissões.
Normalmente nos casos em que há grande variabilidade no montante das retribuições de uns meses para os outros, a jurisprudência, recorrendo a uma interpretação extensiva do disposto no art. 84º nº 2 da LCT, atende à média das remunerações do ano anterior.
Porém, por vezes a média das retribuições pode ser inferior “à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo”. Por isso, se entende que “o cálculo da média do período de referência apenas se aplica quando origine um montante superior àquele que o trabalhador receberia se estivesse ao serviço efectivo. O princípio da não penalização retributiva intervém, assim, sempre que a média se revele inferior à remuneração hipoteticamente previsível. O salário durante as férias tem assim uma dupla limitação mínima: a média do período de referência e a remuneração hipotética” ([2]).
Na determinação da média das comissões há que atender ao período que decorre de Janeiro a Dezembro do ano anterior ao gozo das férias, uma vez que as férias que se gozam em determinado ano são as vencidas em 1 de Janeiro desse ano e que se reportam ao trabalho prestado no ano civil anterior (art. 2º nº 2 e 3º nº 1 da LFFF).
No caso vertente verifica-se que o Apelante auferia uma retribuição certa acrescida de comissões sobre as vendas efectuadas. E as partes não contestam que as comissões assumam natureza retributiva e que devam integrar a retribuição das férias.
A divergência surge quanto à forma de cálculo da parte variável da retribuição das férias, pois enquanto a Recorrida utiliza o método de pagar na retribuição das férias a parte fixa e as comissões em função das vendas promovidas no mês anterior, o Recorrente entende que o valor das comissões deveria ser alcançado pela média das comissões auferidas no ano anterior.
A sentença recorrida considerou que o método utilizado pela Recorrida não ofendia o princípio consignado no nº 1 do art. 6º do DL 874/76 de 28/12, pois que desta forma pagava ao trabalhador o montante que lhe seria devido se estivesse a trabalhar.
Aparentemente este critério parece estar em conformidade com o referido normativo. Mas, ponderando melhor, pode acontecer que ele não traduza a totalidade da realidade comissional no período de referência a que se reporta o direito a férias (este reporta-se ao ano anterior ao seu gozo). Basta pensar-se nos casos em que a força de vendas de uma empresa se localiza em determinadas épocas do ano e os trabalhadores gozam férias em períodos de menos trabalho, para se verificar que nesses casos o cálculo do valor das comissões, para efeitos de retribuição de férias, efectuado com base nas comissões relativas às vendas promovidas no mês anterior ao das férias prejudica o trabalhador.
Por isso, temos como mais consentâneo o critério do recurso à média das comissões auferidas no ano de referência do direito a férias, ou seja, ao período que vai de Janeiro a Dezembro de cada ano, para efeitos da retribuição das férias do ano seguinte.
Este critério deve sofrer restrição no ano da admissão e no ano da cessação do contrato, em que apenas se atenderá à média dos meses desses anos que servem de base à formação do direito a férias desses anos.
Assim, no caso vertente, há que apurar se a média das comissões de cada ano (Janeiro a Dezembro) anterior ao gozo das férias, acrescida da retribuição fixa excede o valor que efectivamente foi auferido pelo Autor e, em caso afirmativo, deverá ser paga a este a respectiva diferença. No ano da cessação do contrato, para efeito dos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, atender-se à média dos meses desse ano, desde Janeiro até à data da cessação.
Relega-se para liquidação de sentença o concreto apuramento das respectivas diferenças, se as houver.
Serão devidos juros de mora á taxa legal desde o vencimento das respectivas prestações, os quais, porém, não serão devidos durante o período de interrupção da instância.
Procede, assim, o recurso de apelação.
Decisão:
Nos termos expostos, acordam os juízes desta secção:
a) Em negar provimento ao agravo;
b) Julgar procedente o recurso de apelação, e, em consequência, condenar a Ré a calcular a parte variável da retribuição das férias do Autor nos anos de 1998 a 2002, pela média das comissões de cada ano (Janeiro a Dezembro) anterior ao gozo das férias, pagando ao Autor a respectiva diferença, se a houver, relativamente ao que efectivamente lhe pagou a título de comissões calculadas pelo critério do valor das vendas efectuadas no mês anterior às férias, e a calcular a retribuição relativa aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal do ano da cessação, pela média das comissões auferidas nos meses de trabalho desse ano.
c) Sobre as respectivas diferenças acrescerão os respectivos juros de mora devidos desde as datas dos vencimentos de cada prestação, às taxas legais, mas com excepção do período de interrupção da instância em que não serão devidos.
d) Remete-se para o incidente de liquidação de sentença o concreto apuramento dessas eventuais diferenças.
Custas do agravo e da apelação a cargo da Ré.
Lisboa, 30 de Junho de 2010
Seara Paixão
Ferreira Marques
Maria João Romba
---------------------------------------------------------------------------------------- [1] José Andrade Mesquita, O Direito a Férias, publicado em Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Vol. III, IDT, Almedina, pág. 106 e ss. [2] José Andrade Mesquita, ob. Cit. Pag. 113.