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DESPESAS DE CONDOMÍNIO
PARTE COMUM
DELIBERAÇÃO
PROPRIEDADE HORIZONTAL
Sumário
– Os autores, como condóminos donos de uma fracção situada no 1º andar do prédio, não estão obrigados ao pagamento das despesas com os elevadores que têm o seu ponto de início exactamente nesse 1º andar. – Isto porque tais elevadores não servem a fracção dos autores que, obviamente, não os podem utilizar nem para sair nem para entrar no prédio e na fracção. (sumário do Relator)
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
F e mulher L, instauraram a presente acção declarativa de apreciação negativa, sob a forma sumária, contra o Condomínio, alegando que em 11.11.1975 foi constituída a propriedade horizontal do prédio referido no artigo 1º da petição inicial.
Alegam serem proprietários da fracção E, 1 º andar DA desse prédio e condóminos desde a constituição do condomínio e que tal prédio é servido por dois elevadores que partem do 1 º andar e vão até ao 7º andar e que esses elevadores nunca foram utilizados nem são susceptíveis de ser utilizados pelos autores, uma vez que a entrada inicial dos mesmos se situa no mesmo andar que a sua fracção e que os autores não são proprietários de qualquer arrecadação, arrumo sótão ou outra fracção no imóvel.
Mais alegaram que desde a constituição do condomínio que os condóminos acordaram que as despesas com os elevadores seriam suportadas apenas pelos condóminos das fracções servidas pelos elevadores e que por isso, até 2008, os autores nunca constaram dos orçamentos anuais aprovados como responsáveis pelo pagamento de tais despesas. Em Março de 2008, porém, a administradora do réu enviou aos autores a carta que se encontra junta aos autos a fls. 46, pretendendo o réu que os autores passem a comparticipar nas despesas com os elevadores. Tal decisão não foi aprovada em nenhuma assembleia de condóminos e ainda que o fosse não seria válida, face ao disposto no artigo 1424º, nº 4 do Código Civil, e considerando que os autores não usam os elevadores nem têm necessidade ou possibilidade de os usar.
Concluíram pedindo que a acção seja julgada procedente e que seja declarado e reconhecido que, na qualidade de condóminos do prédio urbano identificado no artigo 1º da petição inicial, não são obrigados a comparticipar em nenhuma despesa com os elevadores do referido prédio.
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Regularmente citado veio o réu apresentar contestação, na qual alega, em síntese, que o autor marido utiliza os elevadores para aceder a parte comum do telhado, quando tal se mostra necessário, e para ir entregar o cheque de pagamento da prestação condominial à Administradora.
Mais invocou o artigo 6º do Regulamento do Condomínio, aprovado em Assembleia Geral de Condóminos em 24.04.2007, cuja acta os autores receberam, não tendo impugnado essa Assembleia. Alegou, por fim, que os autores sempre têm pago as despesas de conservação com os elevadores na proporção da respectiva permilagem e sempre aceitaram comparticipar nessas despesas, a tal estando obrigados nos termos do disposto no artigo 1424º do Código Civil.
Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
O processo seguiu os seus termos, realizando-se o julgamento e vindo a ser proferida sentença que julgou a acção provada e procedente, reconhecendo que os AA não estão obrigados a comparticipar nas despesas com os elevadores do prédio.
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Inconformado, recorreu o Réu, concluindo que:
- Existe uma contradição entre a fundamentação da sentença e a sua conclusão, o que se deve a uma errónea apreciação das questões de facto e de direito.
– O critério de aplicação do art.? 1424.°, n" 4 do CC deverá ser objectivo, não relevando, para a aplicação da norma, a utilização em si dos ascensores, mas, simplesmente, a mera possibilidade de utilização, sendo certo que o uso dos elevadores se encontrava disponível para os Recorridos, para que os pudessem utilizar dentro das limitações inerentes às suas funções e fins. Encontrando-se assim obrigados por lei a participar nas despesas dos referentes aos ascensores.
– Em 2007 foi deliberado em Assembleia de Condóminos a aprovação do regulamento de condomínio que obrigava todos os condóminos ao pagamento das despesas referentes às partes comuns do prédio de que eram proprietários.
– O regulamento de condomínio revogou todas as deliberações sociais que tinham a sua aplicabilidade tácita, incluindo aquelas que isentavam os Recorridos das despesas referentes aos ascensores.
– Em deliberação extraordinária da Assembleia Geral foi decidida a reparação dos ascensores, e que esta importância seria suportada por todos os condóminos, em conformidade com o regulamento de condomínio, a lei e a jurisprudência.
– Os Recorridos não impugnaram a deliberação da Assembleia Geral apesar de terem sido notificados em tempo das actas que determinavam o pagamento por todos os condóminos das despesas referentes às partes comuns, em especial as referentes aos ascensores, sendo por isso a deliberação válida e produzindo efeitos em relação aos Recorridos e aos demais Condóminos.
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Foram dados como provados os seguintes factos:
1. Em 11.11.1975 foi constituída a propriedade horizontal do prédio
2. Os autores, na qualidade de proprietários da fracção E, 1º andar DA do prédio urbano ….são condóminos da ré desde a constituição do condomínio.
3. O prédio urbano referido em 1 é servido por dois elevadores que partem do primeiro andar e vão até ao sétimo andar.
4. A entrada inicial dos referidos elevadores situa-se no mesmo andar que a fracção dos autores, não tendo estes qualquer arrecadação, arrumo, sótão ou outra fracção no mencionado prédio.
5. As despesas com os elevadores em causa estão incluídas na "área A".
6. Desde a constituição do condomínio e pelo menos desde a assembleia de condóminos realizada em 25.03.1979 que os condóminos acordaram que as despesas com os elevadores seriam suportadas exclusivamente pelos condóminos das fracções servidas pelos elevadores, ou seja, as fracções G e H (2º andar), as fracções I e J (3º andar), as fracções L e M (4º andar), as fracções N e O (5º andar), as fracções P e Q (6º andar) e as fracções R e S (7º andar).
7. Desde o início da constituição da propriedade horizontal que tal situação relativa aos elevadores se vem mantendo.
8. Dos orçamentos anuais aprovados pela assembleia de condóminos até 2008 nunca constaram os autores como responsáveis pelo pagamento das despesas com os elevadores.
9. No dia 28 de Março de 2008 a ré enviou ao autor marido a carta que se encontra junta aos autos a fls. 46, com o seguinte teor: " de Março de 2008. Ex.mo Senhor Condómino: Vimos pela presente informá-lo que a partir do 29 trimestre e de acordo com o art. 1424 alinea 4, todos os condóminos a partir da fracção C passam a comparticipar das despesas dos elevadores. Se tiver alguma dúvida pode entrar em contacto com um dos administradores. Sem outro assunto de momento. Com os melhores cumprimentos, A Administração".
10. Junto com a referida carta, a ré enviou ao autor marido os três "mapas de pagamentos dos elevadores novos" juntos aos autos a fls. 47 a 49, sendo um com plano de pagamento a 36 meses pelo qual, segundo a ré, o autor marido teria de pagar € 583,20 por ano; outro com plano de pagamento a 48 meses pelo qual, segundo a ré, o autor marido teria de pagar e 476,40 por ano e outro com um plano de pagamento a 60 meses, pelo qual e segundo a ré, o autor marido teria de pagar € 441 ,60 por ano.
11. No dia 20 de Maio de 2008 iniciou-se assembleia extraordinária de condóminos com a ordem de trabalhos "apresentação, apreciação e decisão das propostas de reparação, remodelação ou substituição dos elevadores", a qual se suspendeu nesse mesmo dia, tendo continuado e cessado no dia 26 de Maio de 2008.
12. Nesta assembleia de condóminos foi decidido por maioria dos condóminos presentes proceder à remodelação dos elevadores do prédio em causa, tendo aí sido deliberado a adjudicação do orçamento da "Thyssenkrupp Elevadores S.A." com a ref: 08AF1 020241, pelo valor de € 25.642,00 acrescido de IVA à taxa legal em vigor, bem como a renovação das duas cabines dos elevadores pelo valor adicional de € 1.350,00 e acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
13. Consta da acta nº 50, de 26 de Maio de 2008, junta aos autos a fls. 53 a 58, que foi decidido por unanimidade dos presentes que, para pagamento dos referidos valores, será efectuado um crédito junto do banco pelo valor de € 26.992,00 acrescido de IVA à taxa legal em vigor, que será liquidado em 36 prestações, valor esse que poderá ser reduzido no caso de o condomínio optar por efectuar o pagamento de uma entrada.
14. Na assembleia de condóminos de 26 de Maio de 2008 não foi deliberado que os autores deveriam comparticipar nas despesas aprovadas na mesma.
15. A acta da assembleia de condóminos de 20/26 de Maio de 2008 foi enviada pela ré ao autor marido em 18/06/2008.
16. A decisão da administração do condomínio de fazer os autores comparticipar nas despesas do condomínio com os elevadores não foi aprovada em nenhuma assembleia de condóminos.
17. Foi aprovado em Assembleia Geral de Condóminos de 24 de Abril de 2007 o Regulamento do Condomínio que se encontra junto aos autos a fls. 80 a 89, tendo os autores recebido a respectiva acta.
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Cumpre apreciar.
Está aqui em causa saber se os AA, condóminos do prédio dos autos, devem ser isentos do pagamento das despesas relativas aos elevadores do edifício, uma vez que tais elevadores partem do 1º andar, onde se situa a fracção dos AA.
Na sentença recorrida foi dada razão aos AA, declarando-se que os mesmos não estão obrigados a comparticipar nas despesas atinentes aos elevadores.
O recorrente entende, ao invés, que a solução deveria ser a oposta, na medida em que, potencialmente, os AA têm à sua disposição o uso dos elevadores. Além disso, trata-se de matéria aprovada pela Assembleia Geral de Condóminos em 24/4/2007.
A sentença recorrida baseia-se antes do mais no disposto no art. 1424º nº 4 do Código Civil, o qual dispõe que: “Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”.
Alega o recorrente que existe contradição na sentença recorrida já que, por um lado admite que o que releva não é o uso ou utilização efectiva que cada condómino faça das coisas ou serviços comuns mas a possibilidade de utilização dos mesmos, e por outro lado tomou a decisão levando em conta o facto de não se ter provado que os AA hajam alguma vez usado os elevadores.
Contudo, não existe qualquer contradição.
Quando se diz que o que releva não é a utilização efectiva mas a possibilidade de utilização, reportamos a uma situação diferente da dos autos. Imaginemos que um condómino do 2º andar alegava nunca ter usado o elevador por preferir subir e descer as escadas a pé. Isso não impede que, estando a sua fracção servido pelo elevador, ele tenha de comparticipar nas respectivas despesas. Ou seja, pouco importa que o condómino use efectivamente a coisa ou serviço, desde que estes sirvam a fracção de que é dono.
Como se observa no Acórdão da Relação do Porto de 11/10/2001 – CJ 2001, T.IV, pág. 209, “a razão de ser da comparticipação dos condóminos nas despesas comuns reside na afectação ou possibilidade de aproveitamento da serventia de certos bens ou serviços ao uso de determinadas fracções do condomínio. A obrigação de contribuição para as referidas despesas não depende da efectiva utilização, mas, tão só, da possibilidade de utilização dessas coisas comuns ao serviço da utilização da fracção”.
Neste acórdão estava exactamente em causa o facto de o elevador do prédio constituir o único acessoàs garagens, pelo que o condómino dono de uma das garagens teria de comparticipar nas despesas inerentes a esse elevador.
De resto nesse mesmo acórdão pode ler-se que “as despesas relativas a elevadores não serão devidas, por exemplo, pelos condóminos de fracções do rés-do-chão que não possam utilizá-los para acesso a essas fracções em virtude de, designadamente,a porta de acesso ao exterior do edifício se situar a esse nível e o elevador arrancar daí para os andares superiores ...”.
Trata-se como bem se vê de situação exactamente idêntica à dos presentes autos.
A alegação do recorrente de que o elevador serve partes comuns do prédio, nomeadamente o telhado, é, salvo o devido respeito, totalmente irrelevante. O art. 1424º nº 4 é muito claro ao referir-se às fracções que possam ser servidas pelo elevador. Ora uma fracção situada no mesmo piso em que se inicia o elevado não pode ser servida por ele. O respectivo dono entra e sai da sua fracção para a porta de saída do prédio sem qualquer possibilidade de usar o elevador.
O que releva, repete-se, é a circunstância de o elevador servir especificamente a fracção do condómino em causa, ou servir uma garagem, uma arrecadação no sótão, uma cave, que se incluam nessa mesma fracção, uma vez que constituirão uma extensão da mesma.
Cite-se ainda, dentro de idêntica perspectiva, Aragão Seia, “Propriedade Horizontal”, pág. 124: “Quanto aos elevadores já não é possível uma repartição de encargos semelhantes: apenas ficam isentos de contribuir para as despesas os condóminos cujas fracções não são servidas por eles, como os do rés do chão, a menos que possuam algum arrumo no último piso ou na cave, no caso desta ser também servida por elevador, ou até se houver no último piso um terraço que possa ser usado por todos os condóminos”.
Ora nenhuma destas situações foi alegada ou provada nos presentes autos.
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Alega ainda o recorrente que o Regulamento do Condomínio, aprovado por Assembleia Geral de Condóminos, estabeleceu a responsabilidade dos AA pelas despesas com os elevadores.
Ficou provado que, desde pelo menos a Assembleia de Condóminos de 25/3/79 os condóminos deliberaram que as despesas com os elevadores seriam suportadas apenas pelos condóminos donos das fracções servidas por tais elevadores (2º a 7º andar).
Na Assembleia de condóminos de 20 e 26/5/2008 foi deliberado proceder à remodelação dos elevadores, mas não foi tomada qualquer deliberação no sentido de responsabilizar também os AA pelo pagamento das respectivas despesas.
Ou seja, até hoje manteve-se o deliberado em 25/3/79, que exclui os AA e demais condóminos do 1º andar do pagamento de despesas relativas aos elevadores.
Quanto ao Regulamento do Condomínio, aprovado por Assembleia Geral de Condóminos realizada em 24/4/2007, estabelece no seu art. 6º que são partes comuns do condomínio o solo, pilares e alicerces, telhados, terraços de cobertura, entrada do prédio, escadas, instalações gerais de água, electricidade e gás, elevadores.
No art. 8º refere-se que os condóminos estão obrigados, além do mais, a efectuarem o pagamento de outras despesas que sejam de sua responsabilidade.
Ora, isto nada acrescenta de útil no tocante às despesas com os elevadores, na medida em que os AA haviam sido expressamente dispensados do seu pagamento por Deliberação de Assembleia Geral e o Regulamento não determina que, doravante, passarão a comparticipar também de tais despesas.
Ninguém discute que os elevadores sejam partes comuns e é de resto como tal que são qualificados pelo art. 1424º do Código Civil. O que está em causa é a dispensa do pagamento das despesas relativas ao elevadores pelos condóminos proprietários de fracções não servidas por tais elevadores. E quanto a isto, o Regulamento nada acrescenta que ponha em causa a deliberação que já vem de 25/3/79 e que, de resto, está em consonância com o já citado art. 1424º nº 4 do Código Civil.
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Conclui-se assim que:
– Os autores, como condóminos donos de uma fracção situada no 1º andar do prédio, não estão obrigados ao pagamento das despesas com os elevadores que têm o seu ponto de início exactamente nesse 1º andar.
– Isto porque tais elevadores não servem a fracção dos autores que, obviamente, não os podem utilizar nem para sair nem para entrar no prédio e na fracção.
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Assim e pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 23 de Setembro de 2010
António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais