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EXECUÇÃO
CITAÇÃO
NULIDADE
FALTA DE CITAÇÃO
Sumário
1. Efectuada a citação em pessoa diversa do citando, a expedição da carta nos termos do art.º 241, do CPC, configura-se como uma formalidade complementar, confirmando a citação já oportuna e validamente celebrada na data em que o terceiro a recebeu, podendo a inobservância de tal formalidade importar na nulidade da citação, na medida em que possa ter prejudicado a defesa do citado. 2. Remetida a carta de citação para a residência constante de entidades oficiais, coincidente com a trazida aos autos pelo exequente, e tendo ali sido recebida pela executada, e nessa medida advertida do dever de pronta entrega, indemonstrada fica a nulidade da falta de citação, ainda que o citado já então não fosse casado com a executada, e não residisse na morada em causa. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I - Relatório
1. M veio interpor recurso do despacho que desatendeu a arguição da nulidade da falta da sua citação nos presentes autos de execução movidos por C.
2. Nas suas alegações formula as seguintes conclusões:
· O executado, ora recorrente, não foi validamente citado para a presente execução.
· A exequente não obstante ter conhecimento ao adquirir o crédito que o mesmo se mostrava accionado – não produziu a necessária habilitação tendo deixado que a acção judicial se extinguisse, nem ao executado foi dado conhecimento da cessão de créditos.
· A citação para a execução foi enviada ao executado por carta registada, para uma morada que não é a que consta do contrato, nem a residência do executado, pelo menos desde Agosto de 2003.
· A citação por carta registada não foi recebida pelo executado, mas pela sua ex-cônjuge, pelo que sendo feita em pessoa diversa do citando carecia de ser completada com o envio de cata registada com as informações impostas pelo art.º 241, do CPC.
· O executado não recebeu qualquer citação nem os documentos que a acompanhavam pelo que, só, interveio nos presentes autos após tomar conhecimento pela sua entidade patronal de que lhe iriam ser feitos descontos à ordem desta execução.
· O acto de citação foi rodeado pelo legislador das maiores cautelas de modo a prevenir dos danos irreparáveis que a falta ou falsa citação pode acarretar para a honra e património dos cidadãos, por isso estão previstas as formas de citação pessoal e edital.
· A citação quando pessoal pode ser presencial por mandatário judicial, por agente de execução, ou por entrega de carta registada pelos funcionários dos correios;
· A citação pessoal ainda pode ser feita em pessoa diversa do citando por entrega de carta regista a terceiro que tenha o dever de lha transmitir; mas esse dever decorre da lei.
· Nos casos expressamente previstos na lei, é equiparada à citação pessoal a efectuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento.
· Sempre que a entrega da carta registada para citação ocorra em pessoa diversa do citando a mesma só pode ter-se por realizada se completada pela expedição, no prazo de dois dias, de carta registada com as informações impostas pelo art.º 241 do CPC.
· A carta para citação não foi recebida nem pelo executado, nem por pessoa que tivesse o dever de lhe transmitir o conteúdo do acto.
· A carta de citação foi recebida por pessoa diversa do citando e não foi acompanhada pelo envio de carta registada “comunicando-lhe a data e o modo que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada” no prazo dos dois dias seguintes, ou mesmo posteriormente.
· A nulidade da falta de citação foi arguida tempestivamente porque feita pelo executado na primeira intervenção que teve nos autos.
· A douta decisão impugnada não fez uma correcta leitura dos facto nem aplicou o direito em conformidade com os preceitos invocados nos artigos 233, 235, 236 e 241, do CPC.
3. Nas contra-alegações apresentadas, o Exequente formulou, por sua vez, as seguintes conclusões:
ü O executado, ora recorrente, foi validamente citado para a presente execução.
ü Na impossibilidade de citação na morada contratual, a citação do executado foi efectuada, por carta registada, para a morada que à data constava das bases de dados da Segurança Social e do Registo Automóvel como residência do Executado.
ü A citação por carta registada foi recebida pela 1ª executada, L, sua ex-cônjuge.
ü Nos termos do disposto no n.º2, do art.º 236, do CPC, o terceiro que a recebe tem a obrigação legal de a entregar ao citando.
ü Os executados mantêm uma relação contratual, em virtude da celebração do contrato de mútuo celebrado objecto dos presentes autos.
ü A citação postal tem-se assim por efectuada, nos termos do disposto no art.º 241, do CPC, mesmo quanto o aviso de recepção haja sido assinado por terceiros.
ü A douta decisão recorrida não merece qualquer censura e fez uma correcta aplicação dos artigos 233, 235, 236 e 241, do CPC.
4. Cumpre apreciar e decidir.
* II – Enquadramento facto-jurídico
Como se sabe o objecto do recurso é definido pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, importando em conformidade decidir as questões[1] nelas colocadas, artigos 684.º, n.º 3, 660.º, n.º 2, e 713.º, todos do CPC[2], pelo que na sua necessária consideração a saber está, se como pretende o Executado, ora Recorrente, não foi o mesmo validamente citado para a execução, consubstanciando-se uma situação de nulidade de falta de citação pessoal e entrega de documentos, resultante da preterição das formalidades essenciais estabelecidas na alínea b) do n.º2, do art.º 233, n.º1 do art.º 235, n.º 2 e 4, do art.º 236 e art.º 241.
Com efeito, e insurgindo-se contra o decido que contrariamente entendeu, invoca que a citação foi remetida para uma morada que não consta do contrato, nem é a sua residência, sendo que a carta foi recebida não por si, mas pela sua ex-cônjuge, pelo que sendo a citação feita em pessoa diversa do citando carecia de ser completada com o envio de carta registada com as informações impostas pelo art.º 241.
Mais alega que podendo a citação pessoal ser feita em pessoa diversa do citando por entrega de carta registada a terceiro que tenha o dever de a transmitir, esse dever deve decorrer da lei, sendo que no caso em análise não foi recebida nem pelo executado, nem por pessoa que tivesse o dever de lhe transmitir o conteúdo do acto.
Na decisão sob recurso considerou-se que tendo o expediente de citação sido recebido na morada indicada na pesquisa informática efectuada, e assinado pela também executada L, não lograra o Executado demonstrar que não lhe era imputável o invocado desconhecimento do referido expediente de citação, mais se mencionando que sobre o mesmo impendia o dever de informar a C, cedente do crédito titulado pela exequente, da sua nova morada, porquanto é diferente da constante do contrato que celebrou com aquela, o que não invocara nem demonstrara.
Apreciando.
Como se sabe a citação é o acto pelo qual se dá a conhecer a alguém que contra ele foi deduzido determinado processo, chamando-o ao mesmo, pela primeira vez, para se defender, querendo, art.º 228, n.º1, sendo permitida a sua realização por via postal, com a entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção, equiparando-se, nos casos expressamente previstos na lei, à citação pessoal, a efectuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento, 233, n.º 1, 2, e 4.
Por sua vez, diz-nos o art.º 236, n.º 2, que no caso da citação de pessoa singular, a carta pode ser entregue, após a assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando, cabendo ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando, n.º 4.
Importa também referenciar, no quadro legal atendível, o disposto no art.º 241, na consideração de efectuada a citação em pessoa diversa do citando, nos termos que agora nos interessam do art.º 236, n.º2, prevendo o envio de uma carta registada ao citado, comunicando-lhe a data e o modo por que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada.
Saliente-se, por último, no concerne às causas de falta de citação que, na prática, se reconduzem a um único fundamento, isto é, à demonstração que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável, art.º 195, n.º1, e)[3], importando a inobservância das formalidades previstas na lei, por sua vez, a nulidade da citação, na medida em que a falta cometida possa ter prejudicado a defesa do citado, art.º 198, n.º1 e 4.
Vejamos o caso dos autos na consideração das ocorrências processuais.
Temos, assim que C veio deduzir execução para pagamento de quantia certa – dívida comercial, contra L indicada como moradora na C…., e M, indicado, também como residente na C….
Como Exequente, invocou que por contrato de cessão de créditos, celebrado em 21.07.1999, adquiriu a posição contratual de credora que a C detinha sobre os Executados no contrato de mútuo, mediante o qual lhes foi concedido um empréstimo no valor de 1.000.000$00, ficando convencionado que o crédito venceria juros e seria reembolsado em duas prestações, não tendo os Executados liquidado nenhuma delas, dando assim como título executivo um documento particular, designado de “Escrito Particular para Empréstimo”, assinado pelos Executados, assinatura essa reconhecida notarialmente.
Dos autos contam também as pesquisas efectuadas em 11.6.2008, junto da Segurança Social e do Registo Automóvel, relativamente ao Executado, sendo a morada deste indicada, na C….
Em 6 de Novembro de 2009 veio o Executado suscitar a sua falta de citação, alegando que tinha chegado ao seu conhecimento pela sua entidade patronal que lhe iriam ser feitos descontos no seu vencimento, com início nesse mês para pagamento da quantia exequenda, tendo apurado que a carta registada para citação fora enviada para um domicílio, C…, e o aviso de recepção assinado, em Agosto de 2008, pela Executada L. Acontece que se encontra divorciado da referida senhora desde 22 de Outubro de 2003, e desde Agosto de 2003, a C…, nos termos do contrato de comodato que junta, é morada exclusiva de L, enquanto que o seu domicílio passou a ser na P…, concluindo, que houve assim preterição de formalidades legais, que prejudicam de forma manifesta a sua defesa.
Junto o expediente relativo à citação do Recorrente, resulta a expedição de carta, mostrando-se assinado aviso de recepção por L, em 9.8.08, bem como assinalada quadrícula indicativa que a assinatura não foi efectuada pelo destinatário[4].
Aqui chegados, não se evidencia dos autos, com efeito, que tenha sido expedida a carta nos termos do art.º 241, sendo que tal missiva como formalidade complementar, não se traduz numa segunda citação, antes se configura como uma confirmação da citação já oportuna e validamente celebrada na data em que o terceiro a recebeu, no atendimento de uma situação em que se poderá presumir uma menor segurança e certeza no efectivo conhecimento, por parte do citado, dos elementos essenciais do acto[5].
Como formalidade legalmente prevista, a falta da sua observação podia determinar a nulidade da citação, na medida em que pudesse ter prejudicado a defesa do citado, se oportunamente arguida, uma vez que o respectivo conhecimento depende da reclamação dos interessados, art.º 202, isto é, e reportando-nos aos presentes autos, logo que o Recorrente nos mesmos teve intervenção, o que não resulta do enunciado, estando-lhe vedado, em sede do presente recurso invocar tal vício.
Não estando em causa nos presentes autos a inoponibilidade da alteração do domicílio convencionado, conforme o n.º 2 do art.º 195, quanto aos demais suscitado e que se prende essencialmente em saber se o desconhecimento invocado do acto não lhe é imputável, alegou o Apelante que não recebeu o título executivo e os demais documentos que acompanhavam o requerimento executivo, porque a sua morada há muito que não era a que foi tomada em consideração, não tendo a ex-mulher o dever de lhe transmitir o conteúdo do acto em referência.
Ora, se o Recorrente demonstrou não estar já casado com a também Executada e terceira pessoa que recebeu a carta, tendo juntado Atestado da Junta de Freguesia, e “contrato de comodato” do imóvel em referência, com vista a evidenciar que desde 2003 não residia na morada para onde foi remetida a carta, ressalta também do acima exposto que a tal carta foi enviada para a residência constante de entidades oficiais, coincidente até com a trazida aos autos pela Exequente, tendo ali sido recebida, pela Executada, e nessa medida advertida do dever de pronta entrega, sendo certo que não foi oportunamente alegado que tal advertência não tenha sido realizada, não estando desse modo a mesma Executada desonerada de assim proceder, devendo-o fazer, logo que possível, sob pena de incorrer em responsabilidade, nos termos equiparados ao litigante de má fé, art.º 236, n.º 1[6].
Em conformidade, não resulta evidenciado que o desconhecimento que possa ter advindo ao Recorrente do acto de citação, numa possível falta de comunicação pronta da mesma, por parte da Executada, não seja imputável àquele, sendo certo que a expedição para a morada em causa assentou em dados constantes dos autos, com respaldo oficial, relativamente aos quais o Executado não diligenciou em momento oportuno, com vista à respectiva actualização, tendo até presente o lapso de tempo decorrido, conforme o próprio apontou, inverificada resultando a pretendida nulidade da falta de citação.
Improcedem, deste modo, e na totalidade, as conclusões formuladas.
* III – DECISÃO
Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo Apelante.
*
Lisboa, 14 de Dezembro de 2010
Ana Resende
Dina Monteiro
Luís Espírito Santo
---------------------------------------------------------------------------------------- [1] O Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas também pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do CPC. [2] Diploma a que se fará referência, se nada mais for dito. [3] Cfr. Acórdão da RL, de 18.5.00, proc. n.º 031746, in www.dgsi.pt. [4] Por pessoa a quem for entregue a Carta a que se comprometeu após a devida advertência a entregá-la prontamente ao destinatário. [5] Cfr. Lopes do Rego, in Comentário ao Código de Processo Civil, I, vol. pag. 231. [6] Cfr. Lopes do Rego, obra referida, a fls. 222.