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CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
EXAME DE PESQUISA DE ÁLCOOL NO SANGUE
Sumário
I - A regra é que a detecção de álcool no sangue seja efectuada através de teste no ar expirado, efectuado com alcoolímetros. II - Excepcionalmente, a fiscalização faz-se através de análise de sangue, de que é recolhida uma amostra em estabelecimento público de saúde. III - Se não se provou que, o arguido tivesse invocado quaisquer dificuldades respiratórias que o incapacitassem de realizar o teste através do ar expirado, nem que o seu estado de saúde não o permitisse realizar, nem tal método foi sequer tentado, nem tal foi intenção dos agentes, não existiam fundamentos legais para o sujeitar a análise sanguínea, donde a ordem dada nesse sentido não tem relevância jurídica, não estando por isso o arguido obrigado a cumpri-la.
Texto Integral
Proc. n.º 1433/14.0PTAVR.P1
Acordam em Conferência no Tribunal da Relação do Porto
Relatório
Para julgamento em processo comum perante Tribunal Singular, o Ministério Publico
acusou:
- B..., divorciado, nascido a 27-04-1972, filho de C... e de D..., natural da freguesia de ..., concelho de Elvas e residente na Rua ..., n.º .., ..., Aveiro,
da prática de um crime de desobediência p.p. pelas disposições conjugadas dos artºs 152º, nº3, do Código da Estrada, artº 348º, al. a) e 69º, nº 1, al. c), estes últimos do Código Penal.
O arguido contestou alegando em resumo que:
- Os factos ocorreram logo a seguir a um grave acidente;
- O arguido tem fobia a agulhas e, á data, tinha fobia de ser submetido a qualquer cirurgia;
- O arguido não confiava no tratamento médico que lhe viesse a ser ministrado no Hospital ..., razão porque dele se ausentou e foi para casa cheio de dores.
- Familiares convenceram-no de que necessitava de ir a um Hospital, tendo-o transportado para ....
- Também abandonou este hospital, quando se apercebeu que teria de ser operado ao maxilar e quando se preparavam para lhe fazer exames sanguíneos.
- Só por acção de um médico amigo que o sossegou quanto á qualidade da equipa médica é que acedeu a ser operado, voltando ao Hospital a 25 de Outubro.
Procedeu-se a julgamento, com observância do legal formalismo.
A instância mantém a validade e regularidade de todos os seus pressupostos.
II - FUNDAMENTAÇÃO
1. Factos provados
Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:
1 - No dia 21 de outubro de 2014, cerca das 19h10, o arguido conduzia o motociclo de matricula ..-JO-.., pela Rua ..., em Aveiro, tendo nessa altura, o referido motociclo conduzido pelo arguido, sido interveniente em acidente de viação.
2 - Em virtude dos ferimentos sofridos, foi o arguido conduzido ao Hospital ..., para onde se deslocaram agentes da Policia de Segurança Publica, a fim de, para além do mais, submeter o arguido a exame qualitativo de pesquisa de álcool no sangue.
3 - Já nas instalações do Hospital ..., quando o agente E... informou o arguido de que deveria submeter-se ao dito exame qualitativo de pesquisa de álcool no sangue, o arguido, de imediato, recusou.
4 - Perante a recusa do arguido, o mesmo agente da PSP ordenou-lhe que realizasse o exame em causa, tendo advertido o mesmo de que, caso recusasse, incorreria na prática de um crime de desobediência.
5 - Porém, o arguido recusou submeter-se ao referido exame, não obstante a insistência do agente da PSP nesse sentido.
O arguido vive com a filha de 19 anos e com um irmão.
Está reformado da PSP, por invalidez, desde 2013. Tem uma reforma de 500 €. Faz serviços ocasionais de transporte.
Em virtude do acidente acima referido o arguido sofreu:
- fractura da sínfise mandibular direita;
- fractura de, pelo menos, dois arcos costais á direita;
- edema com dor à movimentação no joelho direito;
O arguido tem fobia de agulhas e, á data, tinha fobia de ser submetido a qualquer cirurgia.
Ausentou-se sem tratamento médico do Hospital ....
No dia seguinte, pelas 10h55m deu entrada nos serviços de urgência do Centro Hospitalar ....
Foi-lhe efectuado o diagnóstico das patologias supra descritas e quando percebeu que teria de ser operado ao maxilar, na altura em que se preparavam para lhe fazer exames sanguíneos, abandonou esse Hospital.
No dia 23 de Outubro, pelas 07h17m deu entrada no SU do Centro Hospitalar e Universitário de ..., com fortes dores tendo sido confirmada a fractura dos arcos costais e ministrada analgesia.
Finalmente em 24 ou 25 de Outubro, o arguido falou com o Dr. F..., médico e amigo e de confiança da família, em Tondela, que lhe explicou que não haveria outra solução que não fosse ser submetido á cirurgia maxilo-facial e o sossegou quanto á qualidade da equipa clínica que o havia atendido no Centro Hospitalar ....
No dia 25 de Outubro, pelas 09h19m volta ao Centro Hospitalar ... onde foi consultado e foi agendada cirurgia maxilo-facial que acabou por realizar no dia 27 de Outubro. Não se provou que:
A intenção dos agentes fosse fazer o exame referido em 2 por ar expirado.
O arguido soubesse que a ordem era legitima, tinha sido regularmente comunicada, por entidade competente e que, por isso, á mesma devia obediência,
O arguido agisse de modo livre, voluntário e consciente, com o propósito alcançado de não obedecer à ordem que lhe havia sido dirigida por aquele agente da PSP, bem sabendo que a mesma era legitima e lhe havia sido transmitida por autoridade competente.
Soubesse, ainda, que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
Motivação.
O tribunal fundou a sua convicção:
No CRC de fls. 12
No depoimento da testemunha E..., agente da PSP que depois, confirmando a matéria constante da acusação, relatando detalhadamente a forma como abordou o arguido, lhe pediu para fazer o teste de pesquisa de álcool e o alertou para o facto de a recusa o fazer incorrer na prática de um crime. Mais relatou a forma com este se recusou a fazer o teste. Especificou que foi chamado a um acidente, sendo que quando lá chegou o presumível condutor já não estava no local. Falou com ele no Hospital, sendo aí que ele se recusou a fazer o teste, mesmo depois de alertado para as consequências da sua recusa, afirmando não ser o condutor do veículo e ser por isso que se recusava a fazer o teste. Mais referiu que o arguido, ex-agente da PSP, estava consciente e lúcido e em condições físicas de fazer o sopro.
Depois igualmente a testemunha G..., igualmente agente da PSP. Relatou que também ele foi ao local de um acidente, sendo que o condutor do motociclo interveniente nesse acidente, já lá não estava. No entanto, segundo foi dito pela outra interveniente no acidente e pelos bombeiros que se encontravam no local e presenciaram o acidente (que se deu em frente ao respectivo quartel), o motociclo era tripulado apenas pelo seu condutor. Foram ao Hospital com a intenção de lhe fazer o teste. Para o caso de não conseguir fazer o teste através do ar expirado, levavam já, na carrinha, o kit para fazer o teste por recolha de sangue. Abordaram o arguido que estava a ser suturado a vários cortes no pescoço.
Disseram-lhe que tinha de fazer o teste mas este negou-se, dizendo que não era o condutor. Recusou-se mesmo depois de lhe dizerem que incorria na prática de um crime se não fizesse o teste.
Não sabe se conseguiria fazer o teste através de sopro em virtude das lesões que apresentava serem na zona do pescoço. Por essa razão, foram buscar o kit para fazer o teste através de recolha de sangue.
O arguido acabou por se ausentar do Hospital sem que lhe fosse dada alta médica, ainda com os fios e tubos que tinha ligados.
Nunca referiu ter medo de agulhas. Disse “a mim, ninguém me pica porque não sou o condutor”.
Depois também H..., igualmente agente da PSP. Disse que estava no Hospital a acompanhar um familiar, quando se apercebeu que dois colegas advertiam o arguido, que saía dos gabinetes médicos e se dirigia para o exterior, dizendo-lhe que tinha de fazer o teste de pesquisa de álcool no sangue sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência.
Foi ouvida também a testemunha I..., a outra interveniente no acidente e que confirmou que a sua viatura foi embatida por uma mota que trazia apenas o seu condutor. Este ficou ferido no chão, sangrando do pescoço. Foi de imediato socorrido pelos bombeiros que estavam no quartel que existe em frente ao local do acidente e que o transportaram para o hospital.
O seu depoimento foi confirmado pela testemunha J... que estava no local e presenciou o acidente.
Depuseram igualmente os bombeiros K..., L... e M... que se dirigiram de imediato ao local, ao ouvirem o estrondo do embate. O motociclo só trazia uma pessoa que estava estendida no chão. Fizeram a imobilização da vítima com colar cervical e transportaram-na ao hospital.
A testemunha M... disse ainda que a vítima estava agitada e desorientada, pedindo para não ser picada, pedido que endereçava á equipa médica. Não apresentava problemas respiratórios, sendo sua convicção que poderia fazer o teste de sopro para pesquisa de álcool no sangue. Ficou cerca de 5 minutos na sala de emergência, não se lembrando de ver os policias no local.
Depuseram ainda os enfermeiros N... e O..., enfermeiros que atenderam o arguido quando este chegou ao hospital.
O enfermeiro O..., o primeiro que contactou com o arguido, quando este entrou na sala de emergência, relatou que o mesmo estava consciente, sem problemas respiratórios, mas agitado, recusando o tratamento e dizendo á médica, quando lhe foi comunicado que lhe iria ser administrado soro, que não queria ser picado, recusando também fazer o teste de glicemia, através uma picada no dedo. Depois de confrontado com a necessidade de ser suturado á ferida no pescoço, ainda que relutante, acedeu ser suturado.
Quando chegou a policia, esta esteve a falar com o arguido, não sabendo o que disseram. Depois, recusou-se a fazer a recolha de sangue para pesquisa de álcool.
O arguido acabou por retirar o colar cervical, foi pelos seus próprios meios ao raio x e acabou por abandonar o hospital sem realizar os exames.
O enfermeiro N..., que foi chamado pelo colega perante a recusa do arguido quer ao tratamento quer a fazer os exames requeridos pela policia, confirmou o depoimento da anterior testemunha.
Ambos referiram que, aparentemente, o arguido poderia fazer o teste de pesquisa através do ar expirado, teste este que não foi tentado.
Finalmente, depois a testemunha F..., médico que consultou o arguido algumas vezes e que o viu após o acidente por este ter ido ao seu consultório. O mesmo apresentava uma deformidade na cara, aparentando fratura. O arguido vinha do Hospital ... e parecia desconfiado quanto à forma como estava a ser tratado. Aconselhou-o a voltar ao hospital, local onde poderia ser tratado. O seu papel foi convencê-lo que no hospital ... havia médicos competentes e que o tratariam bem. Acha que existia uma fobia à cirurgia. Não tem ideia de o arguido lhe falar em agulhas.
O arguido depois apenas no que se refere à sua situação pessoal.
O tribunal fundou ainda a sua convicção:
Na participação de acidente de fls. 5 e ss, no verbete de socorro/transporte de fls. 21, na declaração amigável de fls. 56, assinada pelo arguido.
Nos elementos clínicos juntos pelo arguido em sede de contestação, constantes de fls. 152 a 175. Os mesmos reportam-se a uma ida à urgência ao Centro Hospitalar de ... no dia seguinte ao acidente e os quais, para além de descreverem as lesões sofridas pelo arguido na altura do acidente, descrevem também o comportamento do arguido, no momento em que lhe foi proposto fazer análises sanguíneas e outros tratamentos abandonou o serviço de urgência. Os elementos clínicos juntos comprovam também que no dia 23 de Outubro o arguido foi ao Centro Hospitalar e Universitário ..., voltando no dia 25 de Outubro ao Hospital de ... onde acabou por ser tratado.
Analisada a prova produzida, resultou que o arguido estaria em condições de fazer o teste ao álcool através do ar expirado, pois que conforme foi relatado por bombeiros e enfermeiros o mesmo não apresentava problemas respiratórios e falava normalmente.
No entanto, o depoimento dos agentes P... e G... é contraditório quanto a saber se o arguido foi confrontado com a possibilidade de fazer o teste através do ar expirado.
Se o primeiro afirma que sim, sendo que o arguido se recusou a fazer este teste bem como o que depois lhe foi sugerido, por meio de recolha sanguínea, já o segundo afirmou que, quando viram que o arguido tinha uma ferida aberta no pescoço foram buscar o kit para recolha de sangue á viatura, duvidando que o arguido conseguisse fazer esse teste. Resultou do depoimento da testemunha G... (em geral mais coerente e isento, que o da anterior testemunha) que este apenas pode assegurar com certeza que o arguido se recusou a fazer o teste através do método de recolha sanguínea, já não quanto ao método do ar expirado.
Ora quanto à realização de testes através de recolha sanguínea resultou, quer dos elementos juntos pelo arguido em sede de contestação, quer da inquirição dos bombeiros e enfermeiros que contactaram o arguido no dia do acidente, que este estava muito agitado, não querendo fazer exames, demonstrando mesmo resistência a ser suturado á ferida aberta que tinha no pescoço. Resulta dos elementos clínicos juntos que o arguido não só abandonou o serviço de urgência em ..., recusando-se a fazer exames, como reiterou esse comportamento, no dia seguinte, no Hospital ..., quando foi confrontado com a necessidade de fazer análises sanguíneas. Conforme resultou do depoimento do médico ouvido, que conhece o arguido, a sua intervenção foi no sentido de convencer a fazer os tratamentos de que necessitava. Parece assim que, de facto, o arguido teria um medo especial à realização de exames e tratamento, incluindo aqueles que envolvessem o uso de agulhas.
É óbvio que esse medo não era absoluto, pois que, ainda que reticente, o arguido acabou por consentir ser suturado, assim como acabou por consentir na intervenção cirúrgica que se revelava necessária.
No entanto, esse medo, associado á natural perturbação causada pelo acidente e lesões sofridas, parece suficiente para afastar a intenção de desobedecer á ordem da polícia.
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- DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a acusação improcedente por não provada, e, em consequência absolvo o arguido B... da prática do crime de desobediência por que vinha acusado.
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Inconformado com esta decisão, dela veio o MP interpor recurso, por entender que os factos dados como não provados e relativos ao elemento subjectivo, deviam todos ser dados como provados, invocando erro notório na apreciação da prova nos termos do art.º 410º n.º 2 al. b) do CPP.
Veio assim, o MP invocar os vícios da decisão, com contradição entre a fundamentação e a decisão, pois fica-se por se saber se o arguido recusou com medo das agulhas ou por não ser o condutor. Pede a condenação do arguido.
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Nesta Relação, o Sr. PGA é de parecer que o recurso deve proceder.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Vejamos em primeiro lugar a matéria de facto dada como provado, na parte que aqui nos interessa: «1 - No dia 21 de outubro de 2014, cerca das 19h10, o arguido conduzia o motociclo de matricula ..-JO-.., pela Rua ..., em Aveiro, tendo nessa altura, o referido motociclo conduzido pelo arguido, sido interveniente em acidente de viação. 2 - Em virtude dos ferimentos sofridos, foi o arguido conduzido ao Hospital ..., para onde se deslocaram agentes da Policia de Segurança Publica, a fim de, para além do mais, submeter o arguido a exame qualitativo de pesquisa de álcool no sangue. 3 - Já nas instalações do Hospital ..., quando o agente E... informou o arguido de que deveria submeter-se ao dito exame qualitativo de pesquisa de álcool no sangue, o arguido, de imediato, recusou. 4 - Perante a recusa do arguido, o mesmo agente da PSP ordenou-lhe que realizasse o exame em causa, tendo advertido o mesmo de que, caso recusasse, incorreria na prática de um crime de desobediência. 5 - Porém, o arguido recusou submeter-se ao referido exame, não obstante a insistência do agente da PSP nesse sentido. O arguido tem fobia de agulhas e, á data, tinha fobia de ser submetido a qualquer cirurgia. ….quando percebeu que teria de ser operado ao maxilar, na altura emque se preparavam para lhe fazer exames sanguíneos, abandonou esse Hospital.
Não se provou que: A intenção dos agentes fosse fazer o exame referido em 2 por ar expirado.»
Na Motivação da decisão recorrida, reportando-se ao depoimento da testemunha E..., agente da PSP, que deu a ordem ao arguido para fazer o teste de pesquisa de álcool e o alertou para o facto de a recusa o fazer incorrer na prática de um crime, é referido «que o arguido, ex-agente da PSP, estava consciente e lúcido e em condições físicas de fazer o sopro.»
Por sua vez, também ali se escreve que a testemunha M... « disse ainda que a vítima estava agitada e desorientada, pedindo para não ser picada, pedido que endereçava á equipa médica. Não apresentava problemas respiratórios, sendo sua convicção que poderia fazer o teste de sopro para pesquisa de álcool no sangue.» Da mesma forma, o enfermeiro O..., o primeiro que contactou com o arguido, quando este entrou na sala de emergência, relatou que «o mesmo estava consciente, sem problemas respiratórios»,
O enfermeiro N..., que foi chamado pelo colega perante a recusa do arguido quer ao tratamento quer a fazer os exames requeridos pela policia, confirmou o depoimento da anterior testemunha. Ambos referiram que, aparentemente, o arguido poderia fazer o teste de pesquisa através do ar expirado, teste este que não foi tentado. «Analisada a prova produzida, resultou que o arguido estaria em condições de fazer o teste ao álcool através do ar expirado, pois que conforme foi relatado por bombeiros e enfermeiros o mesmo não apresentava problemas respiratórios e falava normalmente».
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Ora, dispõe o n.º 1 do art.º 153.º do Código da Estrada que o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.
Sendo o resultado positivo e sendo requerida a realização de contraprova, esta pode ser efectuada, de acordo com a vontade do examinando, ou através de alcoolímetro devidamente aprovado, ou através de análises sanguíneas (n.º 3 do mesmo artigo).
É, também, através de análises de sangue que se detecta o estado de influenciado pelo álcool quando não for possível a realização de prova por pesquisa de álcool no ar expirado (n.º 8, ainda do art.º 152.º do Código da Estrada).
O n.º 1 do art.º 158.º do Código da Estrada remete para regulamentação autónoma a definição dos meios e métodos a utilizar para a detecção e determinação da quantidade de álcool (a taxa de alcoolemia), regulamentação que, actualmente, consta da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o “Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas” (substituindo o Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro).
O artigo 1.º deste Regulamento estabelece o seguinte:
1 – A presença de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador qualitativo.
2 – A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue.
3 – A análise de sangue é efectuada quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo.
Resulta das citadas normas do Código da Estrada, e das normas do Regulamento de Fiscalização, que a regra é que a detecção de álcool no sangue seja efectuada através de teste ao ar expirado, efectuado com os alcoolímetros. Excepcionalmente, a fiscalização da condução sob influência do álcool faz-se através de análise de sangue, de que é recolhida uma amostra em estabelecimento público de saúde.
Ora, como resulta do que atrás se expôs, não se provou que o recorrente tivesse invocado quaisquer dificuldades respiratórias que o incapacitassem de realizar o referido teste através do ar expirado, não se tendo também provado que o seu estado de saúde não o permitisse realizar o teste nessas condições.
Assim sendo, não existiam quaisquer fundamentos legais para sujeitar o arguido a análise sanguínea, que corresponde ao outro modo de realização das provas legais para detecção do estado de influenciado pelo álcool, reservado, porém, para as situações de incapacidade física na realização do teste através do ar expirado, as quais se podem apurar, nos termos definidos na lei, de duas formas: ou após três tentativas consecutivas e infrutíferas de expelição de ar, ou quando as condições físicas do agente não lhe permitem a realização do dito teste.
Só após a comprovação de uma destas duas situações, é que haverá lugar à realização da análise sanguínea, pelo que, ao contrário do afirmado, a ordem para ser submetido a exame ao sangue, não tem relevância jurídica, por não se alicerçar, factualmente, no quadro para a mesma estabelecido pelo Artº 1 da Lei 18/07 de 17/05.
A legitimidade da ordem de sujeição a teste depende, pois, da circunstância de se dirigir a pessoa obrigada a realizar o teste de pesquisa de álcool.
Ora, é manifesto que o arguido não estava obrigado a fazer a fiscalização da condução sob influência do álcool através de análise de sangue, pois não se provou que não o pudesse fazer através de ar expirado, nem isso foi tentado, nem se provou ainda que fosse essa a intenção dos agentes(fazer através de ar expirado).
Assim, repetimos, a ordem para ser submetido a exame ao sangue, não tem relevância jurídica, por não se alicerçar, factualmente, no quadro para a mesma estabelecido pelo Artº 1 da Lei 18/07 de 17/05.
Pelo exposto, improcede o recurso interposto pelo MP, mantendo-se a absolvição do arguido, embora por fundamentos diferentes dos usados na decisão recorrida.