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TELECOMUNICAÇÕES MÓVEIS
PRESCRIÇÃO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário
I- A Lei nº 5/2004, de 10/2 no seu artigo 127, nº 1, alínea d), revogou o Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30/12 e no nº 2 dispôs expressamente que o serviço de telefone era excluído do âmbito de aplicação da Lei nº 23/96, de 26/7 e do Decreto-Lei nº 195/99, de 8/6, remetendo, deste modo, a prescrição para a lei geral, mais propriamente o artigo 310º, alínea g), do Código Civil, que fixa tal prescrição em 5 anos. II- As facturas relativas aos aludidos serviços no período em que foi aplicável a Lei 5/2004, prescrevem no prazo de 5 anos, não se encontrando abrangidas pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, nº 1/2010, publicado, na Iª Série do Diário da República, nº 14, de 21/1/2010. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
“A” – TELECOMUNICAÇÕES MÓVEIS, S.A., instaurou procedimento de injunção, contra “B” – COMÉRCIO DE EQUIPAMENTOS, LDª., pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 2.008,82, acrescida de € 145,92, de juros de mora vencidos, desde 5/12/2007 e o valor da taxa de justiça de € 24,00, alegando terem efectuado um contrato de prestação de serviços de telecomunicações móveis terrestres, não tendo a Ré procedido ao pagamento das facturas que indica.
Deduziu a Ré oposição por excepção e por impugnação, alegando que as facturas estão prescritas nos termos do artigo 10º, nº 1, da Lei nº 23/96, de 26/7, na redacção dada pela Lei nº 12/2008, de 26/2, que em seu entender se devia retroagir aquela data da entrada em vigor da Lei nº 23/96.
Foi proferido despacho saneador onde se conheceu da arguida excepção peremptória, julgando-a improcedente.
Inconformada, apelou a Ré, concluindo textualmente pela forma seguinte:
1. O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ nº 1/2010, publicado na I Série do Diário da República, nº 14, de 21 de Janeiro uniformizou jurisprudência no sentido de que “Nos termos do disposto na redacção originária do nº 1 do artigo 10º da Lei nº 23/96 de 26 de Julho, e no nº 4 do artigo 9º do Decreto-Lei nº 381-A/97 de 30 de Dezembro, o direito ao pagamento do preço de serviços de telefone móvel prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”.
2. Para além de uniformizador de jurisprudências, este Acórdão assume-se também como verdadeira norma jurídica de cariz interpretativo, como se alcança do realce posto na redacção do seu enquadramento e sentido teleológico, iniciada com a expressiva e sugestiva referência à “redacção originária” do nº 1 do artigo 10º da Lei 23/96, der 26 de Julho, como se já na data da publicação desta lei, fosse a sua redacção conforme a jurisprudência do Acórdão.
3. Assim retroagindo o Acórdão nº 1/2010, a sua força vinculativa a 26 de Julho de 1996, data da publicação da Lei 23/96.
4. Como verdadeira norma jurídica de natureza imperativa que é, tudo se passa como se a jurisprudência uniformizadora do Acórdão produza os seus efeitos desde a data da entrada em vigor da Lei 23/96, de 26/7, e da disposição interpretada do nº 1 do seu artigo 10º.
5. Não sendo aplicável à contagem do mesmo prazo de prescrição de seis meses, o disposto no nº 1 do artigo 297º do Código Civil, atenta pois a natureza inquestionavelmente interpretativa do próprio Acórdão Uniformizador, para cuja jurisprudência proclamada contribuiu de sobremaneira, como inequivocamente resulta dos fundamentos do mesmo Acórdão, a publicação da Lei 12/2008, de 26 de Fevereiro, também esta de inquestionável natureza interpretativa.
6. Sendo a Jurisprudência Uniformizadora do Acórdão do STJ de nº 1/2010, verdadeira norma jurídica vinculativa de aplicação geral e natureza interpretativa, a mesma tem aplicação inequívoca ao caso sob apreciação na Acção Especial de Cumprimento de Obrigações nº 323465/08.9YIPRT, pendente no 4º Juízo do Trib. De Peq. Instância Cível de Lisboa.
7. A decisão recorrida ao julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição invocada pela Ré ora recorrente, decidiu contra a jurisprudência uniformizadora do STJ no Acórdão nº 1/2010, publicado no D.R. – I Série de 21 de Janeiro de 2010, sendo consequentemente contrária ao nº 1 do artigo 10º da Lei nº 23/96, de 26/7, à Lei 12/2008, de 26/2 e artigo 13º, nº 1, do C.Civil.
Não foram apresentadas contra alegações.
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COLHIDOS OS VISTOS LEGAIS, CUMPRE DECIDIR.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, é questão a dirimir a de saber se o direito da Autora está ou não prescrito.
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Na 1ª instância foram considerados provados para a decisão desta questão, os seguintes factos:
a) A Autora é uma sociedade que presta serviços de comunicações electrónicas.
b) A Autora apresentou em 6/11/2008 requerimento de injunção para pagamento da quantia de € 2.008,82, acrescida de juros no valor de € 145,92 e de € 24,00 a título de taxa de justiça.
c) A Ré foi notificada para os termos da oposição em 18.11.2008.
d) As quantias peticionadas estão relacionadas com o (alegado) não pagamento de serviços de telecomunicações e estes deram origem a quatro facturas emitidas em 05.12.2007, 05.01.2008, 05.02.2008 e 05.03.2008, respectivamente nos valores de € 700,35, € 446,30, € 429,78 e € 432,39.
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A Apelada veio através do procedimento de injunção, peticionar, além do mais, o montante das facturas relativamente ao serviço móvel terrestre que prestou à Apelante e que constam de d) e que esta alegadamente não lhe teria pago, as quais se venceram respectivamente em 26/12/2007; 28/1/2008; 26/2/2008 e 26/3/2008.
O procedimento de injunção foi instaurado em 6/11/2008, pugnando a Apelante pela aplicação ao caso sub judice da Lei nº 23/96, de 26/7, face à interpretação que, em seu entender, resultará do Acórdão Uniformizador, proferido em 3/12/2009, em foi Relatora a Colenda Conselheira Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza, o qual foi publicado como o Acórdão Uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça, nº 1/2010, publicado, na Iª Série do Diário da República, nº 14, de 21/1/2010.
A Lei nº 23/96, de 26/7, veio consagrar no seu artigo 1º, a protecção do utente, estabelecendo as regras a que devem obedecer a prestação dos serviços públicos essenciais, definindo as alíneas a) a d), do nº 2, do aludido preceito, como serviços públicos essenciais os de fornecimento de água, de energia eléctrica e de telefone.
Por seu turno, o artigo 10º, da Lei 23/96, sob a epígrafe “Precrição e caducidade”, estipula logo no seu nº 1 que: “O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.”.
Ora, a alínea d), do nº 2, do artigo 1º, da Lei nº 23/96, de 26/7, ao referir-se ao serviço de telefone fá-lo em termos gerais, não especificando o serviço de telefone fixo ou o de telefone móvel, seja terrestre, seja marítimo, pelo que não deve o interprete distinguir onde a lei não o faz.
Para além do mencionado elemento literal, temos a par o elemento histórico, sabendo-se que na Proposta de Lei que antecedeu a Lei nº 23/06, de 26 de Julho – Nº 20/VII, publicada no Diário da Assembleia da República, II série-A, nº 33, de 4 de Abril de 1996 constava expressamente a expressão “serviço de telefone fixo” que foi, posteriormente, abolida, o que permite defender a aplicação do citado diploma às comunicações de telefone móvel.
Neste mesmo sentido, vejam-se, entre outros, os acórdãos da Relação de Lisboa de 20/06/2006, in proc. 4914/2006-7; de 27.09.2007, in proc. 4892/2007-2; de 20.05.2008, in proc. 2023/2008-7 e da Relação do Porto de 31.03.2008, in proc. 0850545, todos in www.dgsi.pt.
Acresce ainda, que com a publicação em 30/12/1997, do Decreto-Lei nº 381-A/97, que no seu artigo 1º define como objecto o regulamento do regime de acesso à actividade de operador de redes públicas de telecomunicações e de prestador de serviços de telecomunicações de uso público, veio este diploma no seu artigo 9º, consagrar a protecção dos utentes.
Nos termos do aludido artigo 9º, nº 4, do citado Decreto-Lei 381-A/97, o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação, dispondo o nº 5, deste mesmo preceito que tem-se por exigido o pagamento com a apresentação de cada factura.
Estes comandos legais vieram não só reafirmar os prazos de caducidade/prescrição, como estipulando ainda este último a data desde a qual deve ser contado tal prazo.
Acresce que da nova redacção dada à Lei nº 23/96, de 26/7, pela Lei nº 12/2008, de 26/2, passou a ficar consagrado no artigo 1º, nº 2, alínea d), a sua aplicabilidade ao serviço de comunicações electrónicas, o que passou, a nosso ver indubitavelmente, a incluir o serviço de comunicações móveis.
A nova redacção dada ao artigo 10º, estabeleceu, além do mais, que o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescrevia no prazo de seis meses após a sua prestação (nº 1) e que o prazo para a propositura da acção pelo prestador de serviços era de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos (nº 4).
O artigo 10º, nº 4, da Lei 23/96, de 26/7, veio a sofrer nova alteração, desta feita pela Lei nº 24/2008, de 2/4, consagrando-se que o prazo para a propositura da acção ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos.
O aludido Acórdão Uniformizador, veio estabelecer que: “Nos termos do disposto na redacção originária do nº 1 do artigo 10º da Lei nº 23/96, de 26 de Julho, e no nº 4 do artigo 9º do Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de Dezembro, o direito ao pagamento do preço dos serviços de telefone móvel prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.”.
Acontece, porém, que entre estas alterações todas, foi publicada a Lei nº 5/2004, de 10/2, que no seu artigo 127, nº 1, alínea d), revogou o Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30/12 e o nº 2 dispôs expressamente que o serviço de telefone era excluído do âmbito de aplicação da Lei nº 23/96, de 26/7 e do Decreto-Lei nº 195/99, de 8/6, remetendo, deste modo, a prescrição para a lei geral, mais propriamente o artigo 310º, alínea g), do Código Civil, que fixa tal prescrição em 5 anos.
Ora, era esta a lei vigente à data dos factos a que aludem os presentes autos, pelo que é esta a lei aplicável ao caso vertente e, nem mesmo o Acórdão Uniformizador, contraria esta posição.
Não se verifica pois, a arguida prescrição.
Aliás, em caso idêntico se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/1/2010, no processo nº 1088/05.3TVLSB.L1.S1, em que igualmente foi Relatora a citada Conselheira Maria dos Prazeres Beleza e em que também aborda a questão do dito Acórdão Uniformizador.
Neste circunstancialismo, improcedem as conclusões da Apelante.
Assim, face ao exposto, julga-se a apelação improcedente e, em consequência, confirma-se a douta sentença recorrida.
Custas pela Apelante.
Lisboa, 7 de Abril de 2011.
Relatora: Desembargadora Lúcia Celeste da Fonseca Sousa
Adjunto: Desembargador Luciano Farinha Alves
Adjunto: Desembargador João Carlos Ezagüy Martins