ACIDENTE DE TRABALHO
REVISÃO DA INCAPACIDADE
LEI APLICÁVEL
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário

Atentos o elemento histórico - evolução da regulamentação legal sobre a matéria -; o elemento sistemático – as leis interpretam-se umas às outras – e o elemento literal – sentido dos termos e sua correlação -, o teor da alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 352/2007, de 23.10, não se aplica aos incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão, porque inseridos na lei dos acidentes de trabalho, cujo regime expresso de aplicação no tempo é o estatuído na alínea a), do n.º 1, do artigo 6.º, do mesmo diploma: “As tabelas aprovadas pelo presente decreto-lei aplicam-se aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor.”.

Texto Integral

Proc. n.º 53/05.5TTPNF.4.P1
Origem: Comarca Porto Este.Penafiel. Instância Central.1.ªSec. Trabalho J2
Relator - Domingos Morais – R 693
Adjuntos: Paula Leal de Carvalho
Rui Penha

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. – Relatório
1.B…, sinistrado, patrocinado pelo M. Público, deduziu incidente de revisão da incapacidade (artigos 145.º e ss. CPT) contra Companhia de Seguros C…, S.A. com fundamento na modificação da capacidade de ganho, por agravamento da lesão sofrida no acidente de trabalho descrito nos autos.
2. - Por despacho de 2016.11.23, foi determinado que se procedesse a exame de revisão, tendo o respectivo perito médico considerado que “não existem elementos clínicos que permitam admitir um agravamento das sequelas, sendo de manter a IPP de 14,5% atribuída anteriormente.”.
3. - Requerido e realizado exame por junta médica, por maioria (peritos nomeados pelo tribunal e seguradora), foi considerado que “Mantém a IPP de 14,5% já atribuída nos autos”.
4. - De seguida, foi proferido despacho/decisão, nos seguintes termos:
Inexistindo fundamento que permita um entendimento diverso do explanado, por maioria, pelos Senhores peritos médicos a fls. 214, e não se afigurando necessária a realização de outras diligências, ao abrigo do disposto nos artigos 25º, n.º 1 da Lei n.º 100/97, de 13/09 e 145º, n.º 5 do Código de Processo do Trabalho, considero não haver qualquer modificação da capacidade de ganho do sinistrado, não se encontrando, por isso, verificado o condicionalismo a que o art. 25º, da Lei nº 100/97, de 13/09, subordina a revisão da incapacidade deste.
Pelo exposto, atento o que prescrevem os artigos 25º, da Lei 100/97 e o art. 145º, nº6, do C.P.T., decido manter inalterado o grau de incapacidade permanente parcial de 14,5% já fixado nestes autos ao sinistrado.
Sem custas, uma vez que o sinistrado delas está isento..
5. - O sinistrado, inconformado, interpôs recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
“I. A fixação da incapacidade pode sempre objecto de alteração, em sede de incidente de revisão de incapacidade, designadamente se se verificar o agravamento das lesões resultantes do acidente de trabalho sofrido, como claramente resulta do disposto no nº 3 do 140º do CPT.
II. Segundo Leite Ferreira (Código de Processo do Trabalho Anotado, 4ª edição, pag. 641) a “modificação da capacidade de ganho da vítima proveniente de agravamento, recaída ou melhoria da lesão ou doença não dá origem a uma incapacidade nova: opera, apenas, uma alteração da incapacidade preexistente pelo reconhecimento dum novo grau de incapacidade na incapacidade existente.
Quer dizer: a incapacidade mantém-se a mesma embora diferente na sua intensidade ou dimensão pela atribuição ou fixação de um novo grau ou índice de desvalorização”.
III. No que toca à fixação da incapacidade não impede a sua modificação em sede de incidente de revisão dessa mesma incapacidade, sob pena de se porem em causa os interesses de ordem pública subjacentes à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho, bem expressos no artigo 34º da LAT (Lei 100/97, de 13/9, aqui aplicável), sendo que o direito dos sinistrados à indemnização decorrente da incapacidade resultante do acidente de trabalho é, consequentemente, um direito indisponível.
IV. Assim, e nos termos do artigo 25.º da Lei 100/97, de 13/9, quando se verifique modificação da capacidade de ganho do sinistrado proveniente de agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de prótese ou ortótese, ou ainda de formação ou reconversão profissional, as prestações podem ser revistas e aumentadas, reduzidas ou extintas, de harmonia com a alteração verificada.
V. O sinistrado teve o acidente de trabalho em 22/06/2004, do qual resultou HD lombar, tendo sido submetido 3 vezes a operação cirúrgica, a última das quais com artrodese L5-S1.
VI. Como sequelas, o sinistrado apresenta raquialgia lombar residual (rigidez da coluna lombar por fixação cirúrgica) e ciatalgia crónica no território de L5 e S1 esquerda.
VII. Na Avaliação do dano corporal em direito de trabalho, elaborada pelo Dr. D…, Mestre em Medicina Legal, que procedeu ao cálculo, atribuiu uma IPP de 25,625%,
VIII. O sinistrado teve um agravamento das dores lombares com irradiação para os membros inferiores em situações de carga, apesar da medicação e dos tratamentos de fisioterapia que realiza regularmente, a dor irradia até à perna esquerda.
IX. O sinistrado, clinicamente apresenta lombalgia com rigidez marcada na flexão anterior do tronco, sem défices sensitivos ou motores aparentes, com hiporreflexia simétrica dos aquilinos e rotulianos, sem sinal de Lássegue, com dificuldade na marcha em calcanhares e pontos por agravamento da lombalgia.
X. Desde o acidente de trabalho o ora sinistrado nunca mais trabalhou, encontrasse de baixa médica desde Outubro de 2014, pelo que não recebe qualquer vencimento, estando incapacitado para o exercício da sua actividade profissional.
XI. O sinistrado toma todos os dias, de manhã e à noite, medicação – Doloron -, e realiza, pelo menos 2 vezes por ano, fisioterapia para mitigar as dores.
XII. O parecer da Junta Médica, enquanto prova pericial, não é vinculativo para o tribunal, estando o mesmo sujeito à regra da livre apreciação pelo juiz, atento o disposto nos artigos 389.º, do C. Civil, 489.º e 607.º, n.º 5, do C.P.C..
XIII. Perante a posição dos Senhores Peritos, deveria ter suscitado dúvidas na convicção do julgador, teria este que, oficiosamente ter requerido, a realização de outras diligências.
XIV. Não se mostrando obrigatoriamente o julgador vinculado aos resultados da Junta Médica, evidentemente face à total ausência de fundamentação nas respostas aos quesitos por parte dos Senhores Peritos, tendo apenas o perito médico do sinistrado fundamentado a sua discordância com o resultado da junta médica, deveria o mesmo ter decidido mostrar-se o sinistrado afectado de um grau de incapacidade permanente parcial (IPP) de 19,00%.
XV. Nos termos dos artigos 389° do Código Civil e 655.º n.º 1 do CPC, a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal e aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, actua aqui o princípio da livre apreciação pelo tribunal, a qual se baseia na sua prudente convicção sobre a prova produzida, isto é, em regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência.
XVI. Todavia, isto não quer dizer que o juiz pode fixar a força probatória das respostas dos peritos de forma arbitrária e discricionária, sendo certo que apenas significa que ele não está vinculado a quaisquer regras ou critérios legais.
XVII. Ora nos termos do nº 5, alínea a), das Condições Gerais da TNI, estipula-se que "sempre que se verifique perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava com carácter permanente, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo factor 1,5, se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho, ou tiver 50 anos ou mais."
XVIII. Não obstante, a aplicação da mencionada bonificação deve ser efectuada sempre que se verifique perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que o sinistrado ocupava com carácter permanente e desde que se verifique um dos seguintes requisitos: se a vítima não for reconvertível em relação ao seu posto de trabalho; ou que o sinistrado tenha mais de 50 anos.
XIX. Assim, salvo o devido respeito, discorda-se da decisão recorrida, por se entender que nada impede que às lesões por ele apresentadas sejam aplicados os factores correctivos previstos na instrução geral n.º 5 constante do preâmbulo da TNI e, nomeadamente, a aplicação do factor de 1,5 uma vez que se verificam os pressupostos previstos nas al. a) e b) da referida instrução, em especial o facto de o sinistrado ter mais de 50 anos de idade, o que só por si, constitui um fundamento para aplicação do referido factor.
XX. O sinistrado, nunca beneficiou do referido factor de bonificação, pelo que, deveria o Tribunal “a quo” ter aplicar agora o referido factor de bonificação.
XXI. O parecer da Junta Médica foi de manter a IPP de 14,5% - e que foi fixada na decisão recorrida, mantendo inalterado o grau permanente parcial - deve, pois, ser bonificada pelo factor 1,5, atribuindo ao Sinistrado a IPP de 16,00%.
XXII. Não o tendo feito, violou o Tribunal “a quo” a alínea a) do n.º 5 do Anexo I da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho ou Doenças Profissionais.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, Requer a V. Exas. se dignem dar provimento ao presente recurso, revogando a douta decisão recorrida e ordenando-se a realização de outras diligências que se revelem necessárias ou pertinentes, para que a final seja fixada a incapacidade ao Sinistrado;
Caso assim se não entenda, deverá ser revogada a douta decisão recorrida e, ser proferida outra que fixe a incapacidade do Sinistrado, em 19,00%;
Caso assim não se entenda – o que não se concede - deverá ser revogada a douta decisão, e ser proferida outra que considere o factor de bonificação referente à perda de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que o Apelante ocupava com carácter permanente, atribuindo ao Sinistrado a IPP de 16,00%, previsto na instrução geral n.º 5 constante do preâmbulo da TNI, com a consequente a correcção dos valores atribuídos a título de pensão anual vitalícia, assim se fazendo JUSTIÇA!”.
6. - A seguradora não contra-alegou.
7. - O Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido do provimento parcial do recurso, por aplicação do factor 1,5.
8. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II.Fundamentação de facto
1. - Com interesse, importa ainda consignar os seguintes factos:
1. O acidente de trabalho, descrito nos autos, ocorreu em 22.06.2004.
2. O sinistrado teve alta médica em 30.12.2004, apresentando como sequela raquialgia residual, com a IPP de 10%, em consequência de lombociatalgia esquerda com hérnia discal lombar.
3. O sinistrado nasceu em 07.06.1960.
4. Por despacho de 23.05.2014, foi fixada ao sinistrado a IPP de 12,5%, por agravamento, no âmbito do incidente de revisão de incapacidade, requerido em 24.01.2014.
5. Por despacho de 17.12.2015, foi fixada ao sinistrado a IPP de 14,5%, por agravamento, no âmbito do incidente de revisão de incapacidade, requerido em 06.07.2015.
6. Por requerimento de 18.11.2016, o sinistrado requereu novo exame de revisão de incapacidade, por agravamento, juntando “relatório médico”, subscrito pelo Dr. D…, que defende o aumento da IPP para 25,625%, descrevendo como sequelas: “Raquialgia lombar residual (rigidez da coluna lombar por fixação cirúrgica). Citalgia crónica no território de L5 esquerda e S1 esquerda”.
7. No auto de exame por junta médica, de 31.01.2017, “os peritos médicos, por maioria, Seguradora e Tribunal, mantiveram a IPP de 14.5%” e o perito médico indicado pelo sinistrado, Dr. D…, defendeu a IPP de 19,00%.
III. – Fundamentação de direito
1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho (CPT), e salvo questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da recorrente.
Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.
2. - Objecto do recurso:
Conforme resulta das conclusões do recurso, o recorrente requer que se ordene “a realização de outras diligências que se revelem necessárias ou pertinentes, para que a final seja fixada a incapacidade ao Sinistrado”; ou que lhe seja fixada “a IPP de 19.00%”; ou que se considere “o factor de bonificação referente à perda de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que o Apelante ocupava com carácter permanente, atribuindo ao Sinistrado a IPP de 16,00%, previsto na instrução geral n.º 5 constante do preâmbulo da TNI”.
3.Questões prévias:
- A realização de outras diligências de prova
- A legislação aplicável.
3.1.A realização de outras diligências de prova
Nos termos do artigo 145.º, n.º 2, do CPT - Revisão da incapacidade em juízo - “O pedido de revisão é deduzido em simples requerimento e deve ser fundamentado ou vir acompanhado de quesitos.”.
O sinistrado fundamentou o seu pedido de revisão juntando o “relatório médico” referido no ponto 6. dos factos provados e não requerendo qualquer outro meio de prova.
E o n.º 5 do citado normativo estipula:
Se alguma das partes não se conformar com o resultado da perícia, pode requerer, no prazo de 10 dias, perícia por junta médica nos termos previstos no n.º 2; se nenhuma das partes o requerer, pode a perícia ser ordenada pelo juiz, se a considerar indispensável para a boa decisão do incidente.”.
A perícia por junta médica, e só, foi requerida pelo sinistrado a fls. 207 dos autos, tendo indicado como perito médico, o Dr. D…, supra referenciado.
A possibilidade prevista no n.º 6 do mesmo normativo – “…, e efectuadas quaisquer diligências que se mostrem necessárias” – é dirigida ao juiz do processo para os casos que tal se justifique.
No caso dos autos, o Mmo Juiz da 1.ª instância entendeu que, face às duas peritagens, singular e colectiva, realizadas nos autos, “não se afigurava necessária a realização de outras diligências”.
Assim, para além de se poder entender que a questão ora colocada pelo sinistrado é uma questão nova, porque não submetida ao exame do Tribunal recorrido, logo não podendo ser conhecida pelo Tribunal de recurso, a pretensão do sinistrado recorrente também não procede.
Na verdade, se o Mmº. Juiz da 1.ª instância não usou do poder conferido pelo artigo 145.º, n.º 6, do CPT, é porque se considerou devidamente esclarecido.
Deste modo, neste particular, improcede a pretensão do recorrente.
3.2. A legislação aplicável.
Sobre esta mesma questão já nos pronunciámos no acórdão de 2017.01.30, por nós relatado, no proc. n.º 79/2007.4TTAVR.2.P1, nos seguintes termos:
“Estando provado que “O acidente de trabalho, descrito nos autos, ocorreu em 22.06.2004”, aplica-se, ao caso, o estatuído na Lei n.º 100/99, de 13.09, em vigor à data do acidente. [Revogada pela Lei n.º 98/2009, de 4.09, em vigor desde 2010.01.01, e aplicável aos acidentes de trabalho, ocorridos após essa data.].
Em 2004.06.22, vigorava a Tabela Nacional de Incapacidades, aprovada pela Lei n.º 341/93, de 30.09, a qual foi revogada pelo DL n.º 352/2007, de 23 de Outubro, em vigor desde 2008.01.01 – cf. artigo 7.º.
E o seu artigo 6.º - Norma de aplicação no tempo - estatui:
1 - As tabelas aprovadas pelo presente decreto-lei aplicam-se respectivamente:
a) Aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor;
b) Às doenças profissionais (…);
c) A todas as peritagens de danos corporais efectuadas após a sua entrada em vigor.”.
A questão que se coloca é a de saber se a alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 352/2007, de 23.10, se aplica, ou não, nos incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão, prevista no artigo 25.º - Revisão das prestações – da Lei n.º 100/99, de 13.09, e regulada nos artigos 145.º e segs. do CPT, apresentados a partir de 2008.01.01.
Esta mesma questão já foi decidida, nesta Secção Social, no acórdão de 2016.04.18, proferido no Processo n.º 722/06.2TTVFR.2.P1, no sentido da aplicação da alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 352/2007, de 23.10.
Com respeito, discordamos de tal entendimento, pelas razões que seguem.
– Resenha histórica.
Em toda a legislação que conhecemos (admitindo que possa haver mais) sobre acidentes de trabalho, a regra tem sido a da nova lei se aplicar, apenas, aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor.
Senão, vejamos:
A) - Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965:
- BASE LI (disposição revogatória) - “1. Esta lei entra em vigor com o decreto que a regulamentar e será aplicável:
a) Quanto aos acidentes de trabalho, aos que ocorrerem após aquela entrada em vigor”.
- O Decreto n.º 360/71, de 21 de Agosto, apenas estabeleceu regime transitório para a remição das pensões – cf. artigo 85.º - e não também para os incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão.
B) - Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro:
- Artigo 41.º - Produção de efeitos -:
“1- Esta lei produz efeitos à data da entrada em vigor do decreto-lei que a regulamentar e será aplicável:
a) Aos acidentes de trabalho que ocorrerem após aquela entrada em vigor;
2- O diploma regulamentar referido no número anterior estabelecerá o regime transitório, a aplicar:
a) À remição de pensões em pagamento, à data da sua entrada em vigor, e que digam respeito a incapacidades permanentes inferiores a 30% ou a pensões vitalícias de reduzido montante e às remições previstas no artigo 33.º, n.º 2;
b) Ao fundo existente no âmbito previsto no artigo 39.º.
3- A presente lei será regulamentada no prazo máximo de 180 dias a contar da sua publicação.”.
- O Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, apenas estabeleceu regime transitório para a remição das pensões - cf. artigo 74.º - e não também para os incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão.
C) - Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro:
Artigo 187.º - Norma de aplicação no tempo -:
“1 - O disposto no capítulo ii aplica-se a acidentes de trabalho ocorridos após a entrada em vigor da presente lei.”.
D) – O DL n.º 341/93, de 30 de Setembro, que publicou a Tabela Nacional de Incapacidades por acidentes de trabalho, estipulava no artigo 4.º: “A Tabela aprovada pelo presente diploma aplica-se aos acidentes ocorridos e às doenças profissionais manifestadas após a sua entrada em vigor.”.
– Novas tabelas
Pela 1.ª vez, o legislador publicou, num só diploma, “duas tabelas de avaliação de incapacidades, uma destinada a proteger os trabalhadores no domínio particular da sua actividade como tal, isto é, no âmbito do direito laboral, e outra direccionada para a reparação do dano em direito civil.”, como é assumido no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, isto é, a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais e Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil.
No mesmo preâmbulo, o legislador assume ainda que “a avaliação médico-legal do dano corporal, isto é, de alterações na integridade psico-física constitui matéria de particular importância, mas também de assinalável complexidade. (…).
Complexidade que resulta também da circunstância de serem necessariamente diferentes os parâmetros de dano a avaliar consoante o domínio do direito em que essa avaliação se processa, face aos distintos princípios jurídicos que os caracterizam. Assim sucede nomeadamente em termos das incapacidades a avaliar e valorizar. No direito laboral, por exemplo, está em causa a avaliação da incapacidade de trabalho resultante de acidente de trabalho ou doença profissional que determina perda da capacidade de ganho, enquanto que no âmbito do direito civil, e face ao princípio da reparação integral do dano nele vigente, se deve valorizar percentualmente a incapacidade permanente em geral, isto é, a incapacidade para os actos e gestos correntes do dia-a-dia, assinalando depois e suplementarmente o seu reflexo em termos da actividade profissional específica do examinando.”. (negritos nossos)
Mas a diferença não está só na existência de duas tabelas, mas também na terminologia utilizada nos dois ramos do direito: laboral e civil.
Na verdade, “dano corporal” é uma expressão, essencialmente, “civilista”, ao passo que, no âmbito dos acidentes de trabalho, a terminologia é “lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho” – cf. artigo 6.º da Lei n.º 100/97, de 30.09 – ou “prejuízo funcional” – cf. Instruções gerais, da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais.
Aliás, tanto o Decreto n.º 360/71, de 21.08, como o DL n.º 143/99, de 30 de Abril, dedicavam o artigo 2.º à “terminologia”, contendo a alínea b) deste último: ““lesão”: lesão, perturbação funcional ou doença, consequente a acidente de trabalho”.
De resto, em nenhuma das restantes alíneas daqueles artigos 2.º é contemplada a expressão “dano corporal”.
O artigo 9.º (Interpretação da lei) do Código Civil, dispõe:
1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”.
Ora, do supra exposto, facilmente se concluiu, atentos o elemento histórico - evolução da regulamentação legal sobre a matéria -; o elemento sistemáticoas leis interpretam-se umas às outras – e o elemento literalsentido dos termos e sua correlação -, que o teor da alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 352/2007, de 23.10, não se aplica aos incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão, porque inseridos na lei dos acidentes de trabalho, cujo regime expresso de aplicação no tempo é o estatuído na alínea a), do n.º 1, do artigo 6.º, do citado DL n.º 352/2007, de 23.10: “As tabelas aprovadas pelo presente decreto-lei aplicam-se aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor.”. “Tout court”” – fim de citação do acórdão datado de 2017.01.30 e por nós relatado.
É, pois, nosso entendimento que o teor da alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 352/2007, de 23.10, não se aplica aos incidentes de revisão da incapacidade ou da pensão, porque inseridos na lei dos acidentes de trabalho.
4. - A IPP de 19.00%.
O sinistrado, em alternativa, pretende que lhe seja fixada a IPP em 19.00%, com base no parecer do perito médico que indicou para a perícia por junta médica.
Como supra referido, para além de tal parecer não coincidir com o teor do relatório médico, junto com o requerimento de revisão de incapacidade (no qual era defendido o aumento da IPP para 25,625%), também não foi sufragado pela maioria dos peritos que subscreveram a peritagem por junta médica.
Assim, atenta a falta de elementos de prova consistentes para o efeito, improcede a alteração da IPP para 19,00%.
5.Do factor 1,5.
5.1. - Sobre a aplicação do factor 1.5, previsto no ponto 5. das instruções gerais da tabela nacional de incapacidades (TNI), publicada pela Lei n.º 341/93, de 30.09, já se pronunciou esta Secção Social em várias das suas vertentes, incluindo a que é suscitada nos presentes autos.
O mencionado ponto 5., alínea a) - Lei n.º 341/93, de 30.09 -, estatuía:
5 - Na determinação do valor final da incapacidade devem ser observadas as seguintes normas, para além e sem prejuízo das que são específicas de cada capítulo ou número:
a) Sempre que se verifique perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava com carácter permanente, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo factor 1,5, se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais”.
Ora, no acórdão, desta Secção Social, proferido no processo n.º 472/08.5TTVCT.P1, consignou-se:
“(…). Para que o referido factor seja aplicado necessário é que a) haja perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho e que b) a vítima não seja reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tenha 50 anos ou mais.
No caso dos autos há que verificar se estão preenchidos os pressupostos referidos em a) e 1.ª parte da al. b).
Segundo o laudo pericial, acolhido pela sentença recorrida, o sinistrado apresenta raquialgia residual com irradiação para o membro inferior direito e encontra-se limitado, de acordo com a IPP atribuída, para o exercício das suas funções de pedreiro. No entanto, não está provado, nem tão pouco resulta do laudo pericial que o sinistrado apresenta diminuição de função, e qual, inerente ou imprescindível ao desempenho da sua actividade de pedreiro.
E não se verificando o pressuposto referido em a) supra, fica prejudicado o conhecimento do pressuposto referido na 1.ª parte al. b) supra.”.
5.2. - No caso sub judice, o perito médico consignou no Auto de Exame Médico Revisão, de 2016.012.13:
“(…). Clinicamente apresenta lombalgia com rigidez marcada na flexão anterior do tronco, sem défices sensitivos ou motores aparentes, com hiporreflexia simétrica dos aquilianos e rotulianos, sem sinal de Lássegue, com dificuldade na marcha em calcanhares e pontas por agravamento da lombalgia.
O perito é de parecer não existem elementos clínicos que permitam admitir um agravamento das sequelas, sendo de manter a IPP de 14.5% atribuída anteriormente”.
Por sua vez, a junta médica, por maioria, respondeu aos quesitos:
1.º - As lesões sofridas pelo em consequência do acidente sofreram algum agravamento? – Não”.
2.º - Quais as sequelas permanentes que actualmente advêm para o sinistrado de tais lesões e os correspondentes artigos da T.N.I. em que devem ser enquadrados? – Mantém as sequelas já descritas no auto de Junta Médica a fls. 164 e a que correspondem os artigos lá descritos no verso”.
3. º - Qual o grau de incapacidade que actualmente afecta o sinistrado? – Mantém a IPP de 14.5% já atribuída nos autos.
O perito do sinistrado refere que após observação actual do sinistrado é de parecer que deve atribuir uma IPP de 19% (10% por rigidez e 10% por radiculalgia esquerda)”.
Ora, resulta destes dois meios de prova periciais, que o sinistrado apresenta “lombalgia com rigidez marcada na flexão anterior do tronco, sem défices sensitivos ou motores aparentes, com hiporreflexia simétrica dos aquilianos e rotulianos, sem sinal de Lássegue”, e não também diminuição de função, propriamente dita, e qual, inerente ou imprescindível ao desempenho da sua actividade de motorista de pesados, nos termos circunscritos no citado acórdão desta Secção Social (processo n.º 472/08.5TTVCT.P1).
E a prova da diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho da actividade profissional cabia ao sinistrado, o que não sucedeu nos autos.

Deste modo, outra solução não resta do que julgar o recurso improcedente e, em consequência, manter a decisão recorrida.
VI - Decisão
Atento o exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente e, em consequência, manter a decisão recorrida,
Sem custas, por isenção do sinistrado.

Porto, 2017.09.27
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha