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PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
MEDICAMENTO
PATENTE
Sumário
I - Para que seja decretada providência cautelar ao abrigo do disposto no artigo 338º- I do Código da Propriedade Industrial é necessário e suficiente que seja feita prova sumária da titularidade do direito de propriedade industrial ou da autorização para o utilizar e da violação actual ou iminente desse direito; II - Nos casos abrangidos por essa norma é desnecessária, por irrelevante, a prova da lesão resultante do periculum in mora . ( Da responsabilidade do Relator )
Texto Integral
EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, ACORDAM OS JUÍZES DESEMBARGADORES DA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
I – RELATÓRIO
Nº do processo: Recurso de Apelação no procedimento cautelar nº 3696/11.4T2SNT.L1
a) A ( …,S A) sociedade com sede em …., França e B ( …,S A ) , com sede em …., … , … , instauraram contra C ( …Farmacêutica, SA) com sede em …., em …, providência cautelar não especificada pedindo que, a final, fosse a requerida condenada:
- a suspender a comercialização do medicamento genérico Riluzol Generis, com este ou outro nome;
- a abster-se de fabricar, armazenar, importar, possuir, utilizar, promover ou introduzir no comércio o medicamento genérico Riluzol Generis ou quaisquer outros com o princípio activo Riluzol, que violem a patente europeia Nº …;
- a abster-se de vender ou ceder a terceiros as autorizações de Introdução no Mercado do medicamento Riluzol Generis, ou quaisquer outras que venham a ser aprovadas com o princípio activo Riluzol que violem a patente europeia Nº ….
Alegam, para tanto, e em síntese, que a segunda requerente é titular do direito exclusivo de importar e comercializar em Portugal o medicamento Rilutek, que tem como substância activa o Riluzol e relativamente ao qual a primeira requerente é titular de várias patentes, incluindo a patente europeia nº …, relativa ao tratamento da esclerose lateral amiotrófica através da aplicação de Riluzol.
Mais alegam que após a obtenção de uma autorização de introdução no Mercado (AIM) concedida pelo Infarmed, a requerida está a comercializar um produto designado “Riluzol Generis”, medicamento genérico cujo medicamento de referência é o “Rilutek”, objecto de protecção através da patente europeia …, em clara violação dos direitos das requerentes, causando-lhes avultados prejuízos.
b) Na oposição que apresentou a requerida alega que não existem no caso os pressupostos para o deferimento da providência, nomeadamente a urgência traduzida no chamado periculum in mora no decretamento da providência requerida, na medida em que o medicamento em causa está a ser comercializado há cerca de dois anos sem oposição das requerentes e ainda a nulidade da patente invocada, por ausência de inovação e insusceptibilidade de produção industrial.
Em sede de impugnação a requerida alega que as requerentes não têm o direito exclusivo de exploração comercial e industrial do Riluzol, sendo certo que o produto comercializado pela requerida não tem a mesma composição do descrito na patente invocada e que da comercialização levada a cabo pela requerida não resultam os danos alegados. Conclui alegando que o deferimento da providência lhe causará danos superiores aos benefícios que de tal decisão decorrem para as requerentes.
c) Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que, considerando que não se verificava urgência no acautelamento do invocado direito das requerentes, julgou improcedente o procedimento cautelar, absolvendo a requerida.
d) Inconformadas com o teor de tal decisão dela interpuseram recurso as requerentes, concluindo as respectivas alegações pela forma que assim se sintetiza:
1. As requerentes são titulares de um direito consubstanciado na patente europeia … que tem por objecto a aplicação de Riluzol no tratamento da LAS, traduzido em Portugal na comercialização pela segunda requerente do medicamento Rilutek®;
2. A sentença recorrida reconhece que o direito emergente da referida patente está a ser violado pela requerida na sequência da autorização pelo Infarmed de comercialização do medicamento “Riluzol Generis” cuja substância activa é o riluzol sendo o medicamento de referência o “Rilutek®”, sendo certo que tal comercialização decorre desde Maio de 2009.
3. A patente europeia … confere às requerentes o direito exclusivo de explorar a invenção e de impedir terceiros de actos incompatíveis com essa exploração;
4. No caso de violação já consumada de direitos protegidos por patente o artigo 338º-I do Código da Propriedade Industrial, aplicável a estes autos, para que seja decretada a providência requerida apenas se exige a prova da titularidade do direito a ser acautelado e a prova da sua violação;
5. Na decisão impugnada reconhece-se que no regime das providências não especificadas do Código da Propriedade Industrial não necessário provar a existência do “periculum in mora”, sendo incompreensível a decisão de dar relevância à circunstância de a providência ser intentada quase dois anos depois do início da comercialização do medicamento genérico que constância a violação do direito das requerentes.
6. Em coerência com a fundamentação da decisão impugnada o facto de as requerentes demorarem mais ou menos tempo a instaurar a providência não lhe retira qualquer fundamento, sendo certo, ainda assim e por outro lado, que as requerentes instauraram providência cautelar junto do Tribunal Administrativo Sul, visando pôr termos à violação, em que pediam a suspensão da eficácia da autorização de introdução no mercado (AIM) concedida à requerida.
7. Em seu entender a decisão impugnada viola o disposto no artigo 101º nº 1 e 2, 316º e 338º - I do Código da Propriedade Industrial e os artigos 17º e 62º da Constituição da República Portuguesa.
e) A requerida apresentou contra alegações em que, em síntese, defende a manutenção do decidido, alegando que:
1. A circunstância de a providência ter sido intentada dois anos após a alegada violação do direito impede o tribunal de considerar verificada a sua urgência e o periculum in mora;
2. A requerida comercializa o seu produto há mais de dois anos pelo que nada existe para acautelar provisoriamente de forma urgente;
3. Não consta dos factos provados que o medicamento genérico da requerida viole a patente das requerentes;
4. O artigo 338º - I do Código da Propriedade Industrial limita-se, no caso de a violação do direito estar em curso, a isentar o requerente da prova da lesão grave e dificilmente reparável do direito mas não do periculum in mora;
5. No caso de violação de patentes não tem aplicação a tutela constitucional inerente ao direito de propriedade.
f) Colhidos os vistos legais dos Exmº Juízes Desembargadores adjuntos, cumpre agora apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Os factos considerados na douta decisão impugnada são os seguintes:--
a) A requerente iniciou a sua actividade em 1974, sendo uma empresa do Grupo A…..
b) A SA…, enquanto grupo empresarial, dedica-se à actividade de investigação, produção e comercialização de novos medicamentos.
c) A SA…., investe, de forma regular, avultadas quantias com a investigação de novos produtos e está presente em mais de 100 países.
d) A segunda requerente B foi fundada em 1995 e emprega, actualmente, número não exactamente apurado de pessoas.
e) A segunda requerente B integra um grupo de empresas que ocupa o 4º lugar no ranking das empresas farmacêuticas em Portugal.
f) A segunda requerente B comercializa em Portugal o medicamento Rilutek®, objecto da patente europeia Nº …, com limite de vigência em 22 de Outubro de 2012, com base numa licença de exploração.
g) (Tal como consta do documento acima junto) Ao Rilutek® está atribuída a seguinte classificação farmacoterapêutica: "Medicamentos utilizados no tratamento sintomático da doença do neurónio motor".h) O medicamento Rilutek®, que tem como substância activa o Riluzol, destina-se ao tratamento de ALS (esclerose lateral amiotrófica).
i) O INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP concedeu à Requerida Autorização para Introdução no Mercado (AIM) para o medicamento genérico "Riluzol Generis", da Requerida.
j) Perante a concessão da AIM e subsequente atribuição de preço de venda ao público (PVP), a primeira requerente requereu, junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, providência cautelar destinada à suspensão de eficácia da AIM concedida à Requerida.
k) O Tribunal Central Administrativo Sul, em sede de recurso, decidiu pela não procedência da providência cautelar.
l) A requerida iniciou a comercialização do medicamento genérico “Riluzol Generis”, em Maio de 2009.
m) A requerente é titular de várias patentes relacionadas com o Riluzol, destacando-se a patente europeia Nº EP … com a aplicação de Riluzol para o tratamento de ALS (esclerose lateral amiotrófica), tendo esta patente a epígrafe "Aplicação do 2-amino-6-trifluorometoxibenzotiazol (riluzole) para obter um medicamento destinado ao tratamento das doenças do motoneurónio" – teor do documento junto pelas requerentes como n.º 3, que aqui se dá por reproduzido.
n) O Riluzole é o 2-amino-6-trifluorometoxi-benzotiazol com a fórmula:
e foi sintetizado de acordo com quanto se descreveu numa publicação de 1964, na URSS.
o) O Riluzole é portanto um produto químico conhecido.
p) A esclerose lateral amiotrófica (ALS) é uma doença do sistema nervoso, progressiva e fatal, caracterizada pela diminuição progressiva da força muscular e atrofia dos músculos voluntários do corpo, em razão da degeneração dos neurónios motores, tanto superiores como inferiores.
q) Na ALS com início bulbar, ou de forma bulbar, que correspondem a cerca de 25 % de todos os casos de ALS, os primeiros sintomas podem incluir dificuldade em falar de forma clara, ou em engolir, a perda de mobilidade da língua, e eventualmente dificuldades respiratórias em razão de fraqueza dos músculos intercostais que suportam a respiração.
r) Na maior parte dos casos os doentes sofrem de dificuldades respiratórias cada vez mais pronunciadas, sendo possível prolongar a sua vida por recurso a uma traqueotomia e a sistemas artificiais de respiração, e falecem devido a pneumonia ou por falha respiratória, em geral nos 3 a 5 anos após ser diagnosticada a doença, que afecta cerca de um em cada cem mil seres humanos.
s) A primeira requerente desenvolveu estudos da aplicabilidade do Riluzole ou de um seu sal aceitável do ponto de vista farmacêutico no fabrico de um medicamento para tratar a ALS, nomeadamente a ALS com início bulbar.
t) Em particular levou a cabo um primeiro estudo clínico duplamente aleatorizado, em comparação com um placebo, envolvendo 155 pacientes com ALS. O medicamento utilizado foram comprimidos contendo 50 mg de Riluzole, de que se administravam 2/dia.
u) Em resultado deste estudo, verificou-se estatisticamente que a administração do Riluzole prolongava a esperança média de vida dos pacientes, mais pronunciadamente no caso de ALS com início bulbar.
v) Tendo o Riluzole sido aprovado para o tratamento da ALS pela autoridade competente dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration, em Dezembro de 1995, após exame dos resultados de um estudo clínico semelhante ao anterior, mas muito maior, envolvendo 959 pacientes.
w) O medicamento de referência do medicamento genérico da requerida é o Rilutek®.
x) O Riluzol é comercializado pela requerida para o tratamento de ALS (esclerose lateral amiotrófica).
y) Uma parte do volume de vendas das Requerentes resultante das vendas do Rilutek® é reinvestida em I&D para o desenvolvimento de novos medicamentos.
z) Em Portugal, o medicamento Rilutek® representou, em 2008, € 1.561.508,00 (um milhão quinhentos e sessenta e um mil quinhentos e oito euros) de facturação, em 2009 as vendas foram de € 1.686.054,00 (um milhão seiscentos e oitenta e seis mil e cinquenta e quatro euros), sendo que em 2010, ainda sem os dados do último trimestre, as vendas foram de € 1.139.816,00 (um milhão cento e trinta e nove mil, oitocentos e dezasseis euros).
aa) O RILUZOL é um composto caído no domínio público.
bb) A C usa o riluzol em conjunto com sais farmacêuticos para “construir” o seu medicamento genérico.
ac) Mas utiliza sais que são diferentes daqueles que vêm utilizados nos exemplos A e B da patente, os únicos que são objecto de reivindicação de novidade, e concreto a reivindicação 5.
ad) Na produção do seu medicamento a C utiliza o riluzol, acompanhado de amido de milho pré gelificado, croscarmelose sódica, hidrogenofosfato de cálcio, esteareato de magnésio, sílica coloidal anidra, dióxido de titânio (E171), hipromelose e macrogol tudo conforme consta da cópia do certificado de autorização de introdução no mercado que aqui se dá por integralmente reproduzido (ver fls 146).
ae) Destes, só o estereato de magnésio é possível encontrar também nos exemplos A e B da patente.
af) A dosagem do estereato de magnésio só é igual no medicamento genérico e no exemplo A da patente, pois que no exemplo B a dosagem e diferente.
ag) O medicamento genérico também utiliza sílica coloidal anidra tal como o exemplo A da patente, mas não na mesma dosagem.
ah) A composição do medicamento genérico é diferente das composições indicadas nos exemplos A e B da patente.
ai) Embora o medicamento genérico e os exemplos A e B da patente usem a mesma dosagem de riluzol, tal é insignificante na medida em que a utilização do riluzol não está protegida por patente.
aj) O medicamento genérico não contém os mesmos excipientes que contém o medicamento das requerentes. O DIREITO
Importa agora apreciar do mérito da apelação, tendo em atenção o teor das conclusões atrás descritas.
Está em causa o mérito da sentença proferida nestes autos que considerou não haver urgência no decretamento da providência requerida na medida em que ela só foi requerida cerca de dois anos depois do início da violação do direito, com conhecimento das requerentes.
O “periculum in mora”, isto é, o risco da natural demora de uma decisão definitiva sobre a pretensão formulada ou a formular na acção de que a providência é dependência, justificativa de um decisão, provisória mas célere, impeditiva da verificação do dano a evitar não poderia ser tida por assente face ao comportamento das requerentes que aguardaram cerca de dois anos desde o início da violação do seu alegado direito até à sua instauração.
Em sede de alegações alegam as requerentes, porém, que no caso presente, o decretamento da providência requerida não depende do “periculum in mora” exigível na generalidade dos procedimentos cautelares previstos no Código de Processo Civil.
A questão central a decidir é, pois, a de saber se da matéria de facto apurada se pode extrair a conclusão de que se verificam todos os requisitos da providência requerida.
1. A presente apelação foi interposta de uma sentença proferida no âmbito de um procedimento cautelar instaurado ao abrigo do disposto no artigo 338º - I do Código da Propriedade Industrial.
O nº 1 do mencionado preceito tem a seguinte redacção:
“Sempre que haja violação ou fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial, pode o tribunal, a pedido do interessado, decretar as providências adequadas a: a) Inibir qualquer violação iminente; ou b) Proibir a continuação da violação”.
Acrescenta o nº 2 que “o Tribunal exige que o requerente fornaça os elementos de prova para demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial, ou que está autorizado a utilizá-lo e que se verifica ou está iminente uma violação”.
Por sua vez o artigo 339º do mesmo Código da Propriedade Industrial estabelece que “em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente secção, são subsidiariamente aplicáveis outras medidas e procedimentos previstos na lei, nomeadamente no Código de Processo Civil”.
2. Resulta do que vem de ser dito, e do cotejo das normas citadas com as normas reguladoras dos procedimentos cautelares comuns do Código de Processo Civil, que, para os casos de violação de direitos de propriedade industrial, o Código da Propriedade Industrial – cuja última redacção teve em conta a Directiva Comunitária 2004/48/CE, de 29 de Abril de 2004 – não se limita a traduzir o regime dos procedimentos cautelares comuns dos artigos 381º e seguintes do Código de Processo Civil.
A própria douta sentença impugnada salienta a especificidade do procedimento cautelar previsto no Código da Propriedade Industrial, afirmando que, apesar de também aqui, como no procedimento cautelar comum, se pretender evitar os prejuízos decorrentes da morosidade própria de uma acção judicial, ele era, quanto a este requisito, menos exigentes do que o regime geral.
Adianta-se ainda na douta sentença impugnada, de que o decretamento da providência requerida é independente de a lesão causar ou não lesão grave e dificilmente reparável, nos termos seguintes: “Assim e alargando o âmbito que existe nas providências cautelares comuns, o CPI admite que seja decretada uma providência cautelar, se houver violação de um direito de propriedade industrial ou se ocorrer fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável de um direito de propriedade industrial. Isso significa que em situações de efectiva violação, a lei basta-se com tal violação para tutelar cautelarmente o direito, sendo desnecessária a existência de periculum in mora – neste sentido defendeu António Santos Abrantes Geraldes, no CEJ, em 13 de Novembro de 2009, em intervenção precisamente subordinada ao tema “Tutela Cautelar da Propriedade Industrial”, posição que seguimos”. ([1])
3. Na verdade a inserção no Código da Propriedade Industrial de um específico regime de protecção cautelar resulta da clara intenção de conferir uma maior protecção aos direitos de propriedade industrial. Tal intenção de espacial protecção é de ter como especialmente relevante nos casos de violação já consumada de direitos.
Ora considerando que o objectivo central dessa protecção cautelar é sancionar de modo eficaz a violação de direitos, em especial nos casos de violação já consumada, não faz sentido fazer depender o seu decretamento da prova da verificação de um requisito suplementar qual seja o perigo da lesão decorrente da demora na decisão na acção principal.
Ou seja, como se pondera na douta sentença impugnada, é desnecessária no caso dos autos a prova da existência de periculum in mora.
4. Porém, na douta sentença impugnada, teve-se por impeditiva do decretamento da providência requerida a circunstância de a requerida ter iniciado a comercialização do seu produto medicamento genérico “Riluzol Generis” em Maio de 2009 e de só cerca de dois anos depois ter sido instaurada o presente procedimento, não tendo interposto qualquer providência cautelar junto dos tribunais competentes.
Tal decisão não pode manter-se, porque incompatível com o regime do procedimento cautelar previsto no artigo 338º-I do Código de Propriedade Industrial, atrás sumariamente caracterizado.
No contexto do presente procedimento cautelar é necessário e suficiente que o requerente efectue prova sumária da titularidade do direito que se arroga e da sua violação ou iminência de violação.
Ora não oferece dúvida que, como vem provado, a requerente é titular da patente europeia Nº EP … relativa à aplicação de Riluzol para o tratamento de ALS (esclerose lateral amiotrófica), tendo esta patente a epígrafe "Aplicação do 2-amino-6-trifluorometoxibenzotiazol (riluzole) para obter um medicamento destinado ao tratamento das doenças do motoneurónio" e que a segunda requerente comercializa em Portugal o medicamento Rilutek®, objecto da patente europeia Nº …, com limite de vigência em 22 de Outubro de 2012, com base numa licença de exploração. Ao Rilutek® está atribuída a seguinte classificação farmacoterapêutica: "Medicamentos utilizados no tratamento sintomático da doença do neurónio motor".
Também vem provado que o medicamento Rilutek®, que tem como substância activa o Riluzol e se destina ao tratamento de ALS (esclerose lateral amiotrófica) .
Mais vem provado que, na sequência da concessão de autorização de introdução no mercado a requerida iniciou a comercialização do medicamento “Riluzol Generis” em Maio de 2009, sendo que o medicamento de referência do medicamento genérico da requerida é o Rilutek® ([2]).
Ou seja, está indiciariamente provado que, enquanto se mantiver vigente a aludida patente, as requerentes têm direito à comercialização exclusiva do medicamento Rilutek®, que utiliza o Riluzol no tratamento das doenças do motoneurónio (ALS).
Mais está demonstrada a violação actual desse direito por parte da requerida ao comercializar, desde Maio de 2009, um medicamento genérico que fabrica e que, embora com excipientes diversos, utiliza a mesma substância química no tratamento da mesma doença.
5. Não há que ponderar nesta sede de procedimento cautelar a questão da nulidade da patente invocada pela requerida ao abrigo da qual as requerentes comercializam o Rilutek®, sendo certo que, como decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29 de Setembro de 2009 ([3]), o registo de uma patente faz presumir que esta reunia todos os requisitos legais para a sua concessão.
6. Estão, por isso, reunidos os requisitos de que depende o deferimento da providência requerida, importando revogar, em conformidade, a douta decisão que a julgou improcedente e proferir decisão que impeça a requerida e ora apelada de praticar quaisquer actos do comércio ou aproveitamento comercial do medicamento genérico “Riluzol Generis”, em que se traduz a violação actual ou iminente, do direito das requerentes (não está abrangida nesse conceito de violação iminente a proibição de venda ou cedência a terceiros de autorização de introdução no mercado que possam vir a ser aprovadas relativas a medicamentos contendo o princípio activo Riluzol por não haver quaisquer indícios de que elas venham a ser sequer requeridas).
7. Em conclusão, e sumariando a presente decisão nos termos e para efeito do disposto no artigo 713º nº 7 do Código de Processo Civil:
a) Para que seja decretada providência cautelar ao abrigo do disposto no artigo 338º-I do Código da Propriedade Industrial é necessário e suficiente que seja feita prova sumária da titularidade do direito de propriedade industrial ou da autorização para o utilizar e da violação actual ou iminente desse direito;
b) Nos casos abrangidos por essa norma é desnecessária, por irrelevante, a prova da lesão resultante do periculum in mora;
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III – DECISÃO
Por tudo quanto vem de ser exposto, decidem:
a) Julgar procedente a apelação;
b) Revogar a douta sentença impugnada;
c) Condenar a requerida e ora apelada C ( … Farmacêutica, SA) a suspender a comercialização do medicamento genérico “Riluzol Generis”, com este ou outro nome, a abster-se de fabricar, armazenar, importar, possuir, utilizar, promover ou introduzir no comércio o referido medicamento genérico, ou quaisquer outros com o princípio activo Riluzol, que violem a patente europeia Nº … e a abster-se de vender ou ceder a terceiros a autorização de introdução no mercado do medicamento “Riluzol Generis”.
Custas pela apelada
. Dactilografado e revisto pelo relator, sendo aposta uma rubrica digitalizada em cada uma das 11 páginas que constituem esta decisão.
Lisboa, 20 de Outubro de 2011
Manuel José Aguiar Pereira Gilberto Martinho dos Santos Jorge Maria Teresa Batalha Pires Soares
--------------------------------------------------------------------------------------- [1] O estudo em causa está publicado, entre outros sítios, na página da Internet do Tribunal da Relação de Lisboa (www.trl.mj.pt) ([2]) Medicamento de referência é um medicamento inovador que possui marca registada, com qualidade, eficácia terapêutica e segurança comprovados através de testes científicos, registado pelo órgão de vigilância sanitária no país. A sua principal função é servir de parâmetro para registos dos posteriores medicamentos similares e genéricos, quando sua patente expirar.
Medicamento genérico é um medicamento com a mesma substância activa, forma farmacêutica e dosagem e com a mesma indicação que o medicamento original de referência. Os seus custos são inferiores porque os fabricantes de genéricos, ao produzirem medicamentos após ter terminado o período de protecção da patente dos originais, não precisam investir em pesquisas e refazer os estudos clínicos que dão cobertura aos efeitos colaterais, que são os custos inerentes à investigação e descoberta de novos medicamentos, visto que estes estudos já foram realizados para a aprovação do medicamento pela indústria que primeiro obteve a patente. Assim, podem vender medicamentos genéricos com a mesma qualidade do original que detinha a patente a um preço mais baixo.
(Fonte: www.wikipedia.org) ([3]) Disponível em www.dgsi.pt