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CONTRATO DE TRABALHO
CADUCIDADE
REFORMA POR VELHICE OU INVALIDEZ
APOSENTAÇÃO ANTECIPADA
Sumário
I - Constitui fundamento da caducidade do contrato de trabalho a reforma do trabalhador por velhice ou invalidez – artigos 387º, al. c) do CT/2003 e 343º, al. c) do CT/2009. II - O trabalhador aposentado antecipadamente, por ter atingido determinada idade e anos de serviço – 55 anos de idade e 36 anos de serviço – não constitui fundamento de caducidade do contrato de trabalho. III - Por isso, os regimes de conversão do contrato de trabalho estabelecidos no artigo 392º do CT/2003 e no artigo 348º do CT/2009, não lhe são aplicáveis.
Texto Integral
Processo nº8866/16.6T8VNG.P1
Relatora: M. Fernanda Soares – 1481
Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais
Dra. Paula Leal Carvalho
Acordam no Tribunal da Relação do Porto I
B… instaurou, em 31.10.2016, na Comarca do Porto – Vila Nova de Gaia – Instância Central – 5ª Secção Trabalho – J3, acção emergente de contrato de trabalho contra C…, pedindo dever declarar-se a ilicitude do seu despedimento e a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de €7.328,75 de indemnização e €2.871,64 de diuturnidades.
Alega o Autor ter-se aposentado antecipadamente da função pública em Julho de 2004 por ter atingido os 55 anos de idade e 36 anos de serviço. Em 01.10.2004 foi admitido ao serviço do Réu para trabalhar sob as suas ordens e direcção e mediante remuneração, sendo que, à data da sua contratação, o Réu tinha conhecimento da sua situação de aposentado. O Réu comunicou ao Autor a caducidade do contrato de trabalho para 30.09.2016 invocando o disposto nos artigos 343º, al. a) e 348º, nºs.1 e 2 do CT, situação que configura um despedimento ilícito por não procedido de procedimento disciplinar nem invocação de justa causa, já que ao Autor não se aplicam os citados normativos legais.
Na audiência de partes não foi possível obter a conciliação das partes.
O Réu contestou alegando que atendendo à situação de reformado do Autor o mesmo foi admitido a termo certo sendo aplicável ao caso o determinado na clª55ª, nº4 do CCT publicado no BTE nº29 de 08.08.2015, pelo que a declaração de caducidade é válida, concluindo pela total improcedência da acção.
O Autor veio responder.
O Mmº. Juiz a quo, considerando possuir todos os elementos para conhecer do mérito da causa, ordenou a notificação das partes para, querendo, se pronunciarem. Ambas as partes vieram declarar nada ter a opor.
Em 14.02.2017 foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, declarou ilícito o despedimento do Autor e condenou o Réu a pagar-lhe uma indemnização em substituição da reintegração, que naquela data ascende ao valor de €7.995,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da sentença e até integral pagamento.
O Réu veio recorrer pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por acórdão que determine a licitude do despedimento e julgue a acção totalmente improcedente, concluindo do seguinte modo: 1. O Tribunal defende a inaplicabilidade do regime previsto no artigo 348º do CT ao caso em apreço «desde logo porque o entendimento contrário não tem qualquer suporte literal no texto da lei». 2. É precisamente a letra da lei – sentido dos termos e sua correlação – o ponto de partida que leva o Réu a sustentar a aplicabilidade do artigo 348º do CT ao caso concreto. 3. Resulta da própria epígrafe do preceito legal que não se trata de atender ao momento da contratação, mas antes ao momento da conversão do contrato de trabalho celebrado entre o Autor e o Réu em contrato a termo. 4. Embora a letra da lei seja o ponto de partida, sempre será necessária uma tarefa de interligação que escapa ao domínio literal. 5. Em última análise e quanto à aplicabilidade no tempo das normas sempre esta conversão funcionaria como um novo contrato. 6. É o novo instrumento de regulamentação colectiva – CCT entre a D… e a FNE publicado no BTE nº29 de 08.08.2015 – que permite aplicar o artigo 348º do CT ao caso dos autos. 7. Relativamente a esta questão defendeu o Tribunal a quo que este CCT apenas teria «eficácia ex nunca e já não ex tunc, em conformidade, aliás, com o princípio da aplicação das leis no tempo, consagrado no artigo 12º, nº1 do Código Civil (…) Ou seja, esta nova disposição incluída na convenção colectiva de trabalho de 2014 apenas se aplica aos contratos que foram celebrados posteriormente à sua entrada em vigor, e já não àqueles que nessa data se encontrassem em plena vigência. Como tal, e ao contrário do que é defendido pelo Réu, não é possível com base nesta norma prevista no artigo 55ª, nº4 da redacção de 2014 da convenção colectiva de trabalho aplicável, presumir que o contrato de trabalho com o Autor foi desde logo «ab initio» celebrado ao abrigo do artigo 392º do CT/2003». 8. Não é este o entendimento do apelante. 9. E isto por força dos artigos 1º – que define o âmbito de aplicação da convenção colectiva – e 3º – que consagra o princípio do tratamento mais favorável – da convenção colectiva e 1º e 4º do CT. 10. Daqui resulta que a convenção colectiva de trabalho tem eficácia ex tunc, por força destas disposições legais, o que significa que o regime previsto no artigo 348º do CT se aplica aos contratos de trabalho celebrados ab initio com trabalhadores já reformados. 11. Informou o Réu o Autor, tendo este tomado conhecimento, à data da sua contratação, da sua especial condição de reformado/aposentado. 12. Termos em que a caducidade invocada é legal e aplicável ao caso. 13. O despedimento não é ilícito nem há necessidade de invocação por justa causa. 14. Não se trata de alteração de regime, mas de aplicabilidade desse regime à reforma de trabalhadores de outros estabelecimentos de ensino, o que significa uma interpretação diferente da jurisprudência a coberto de IRCT. 15. Para além do espírito da norma o novo IRCT expressamente prevê a respectiva aplicação. 16. Refere o Tribunal a quo que a norma ínsita no IRCT sempre estaria ferida de nulidade em virtude da imperatividade do vertido no artigo 339º do CT. 17. O artigo 339º do CT determina a imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho previsto no artigo 348º, ou seja, por caducidade. 18. É com base nos artigos 3º e 339º do CT que a sentença recorrida se baseia para determinar a inaplicabilidade do IRCT. 19. Em momento algum o IRCT – clª55ª – afasta ou altera o regime da caducidade previsto no artigo 348º do CT. 20. Tal cláusula 55ª respeita a imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho. 21. O IRCT vem apenas aplicar aos contratos celebrados ab initio com trabalhadores reformados o regime da caducidade previsto no artigo 348º quanto à sua “conversão em contrato a termo e quanto ao facto de não ser necessária a sua redução a escrito”.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação, citando o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20.10.2010, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Admitido o recurso e corridos os vistos cumpre decidir.
* * * II
Matéria de facto dada como provada e a ter em conta na decisão do recurso. A) O Réu tem por objectivo o ensino em todos os níveis, desde o Básico ao Secundário e Científico-Tecnológico, em regime de autonomia pedagógica. B) O Réu é associado da D…. C) Em Julho de 2004, quanto tinha 55 anos de idade e 36 anos de serviço, o Autor aposentou-se da função pública. D) No dia 01.10.2004 o Réu contratou o Autor para, sob as suas ordens, direcção e autoridade, prestar as seguintes funções: colaborar com os trabalhadores docentes, dando apoio não docente; vigiar os alunos nos intervalos lectivos e nas salas de aula, sempre que necessário; acompanhar os alunos em transportes, refeições, recreios, passeios e visitas de estudo; vigiar os espaços do colégio; controlar as entradas e saídas; assegurar o asseio das instalações. E) Aquando do mencionado em D), o Réu tinha conhecimento que o Autor se encontrava aposentado. F) Em contrapartida do mencionado em D), o Réu pagava ao Autor uma retribuição base mensal que, em Setembro de 2016, era de €615,00. G) O Réu remeteu ao Autor uma carta, junta a folhas 10 dos autos, datada de 08.07.2016, através da qual, entre outras coisas, lhe comunicou: (…) “a Instituição irá pôr termo ao contrato de trabalho com V. Ex.ª por caducidade nos termos dos artigos 343º a) e 348º, nº1 e 2 do Código do Trabalho. Atento o período de aviso prévio de 60 dias e data da contratação a 01.10.2004, a cessação produzirá efeitos a 30.09.2016”. H) Ao longo da vigência do contrato de trabalho, o Réu nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de diuturnidades.
* * * III Do objecto do recurso. Da caducidade do contrato de trabalho do Autor.
Na sentença recorrida, acolhendo a posição defendida por Júlio Gomes, em Direito do Trabalho, volume I, páginas 932 e 933, escreveu-se o seguinte: (…) “Defendo a inaplicabilidade do regime previsto no artigo 392º do Código do Trabalho de 2003 (artigo 348º do Código do Trabalho de 2009) à celebração de novos contratos de trabalho com cidadãos reformados. Desde logo, porque o entendimento contrário não tem qualquer suporte literal no texto da lei. Quer porque não resulta, minimamente, do teor dos próprios artigos 392º e 348º de ambos os diplomas; quer ainda porque tal situação não se encontra prevista nos artigos 129º, nº3 do Código do Trabalho de 2003 e 140º, nº4 do Código do Trabalho de 2009, no âmbito das situações em que é permitida a contratação a termo certo, independentemente da verificação concreta das necessidades temporárias que o empregador tenha de satisfazer” (…).
O apelante discorda apresentando os seguintes argumentos: O Tribunal defende a inaplicabilidade do regime previsto no artigo 348º do CT ao caso em apreço «desde logo porque o entendimento contrário não tem qualquer suporte literal no texto da lei». É precisamente a letra da lei – sentido dos termos e sua correlação – o ponto de partida que leva o Réu a sustentar a aplicabilidade do artigo 348º do CT ao caso concreto. Resulta da própria epígrafe do preceito legal que não se trata de atender ao momento da contratação, mas antes ao momento da conversão do contrato de trabalho celebrado entre o Autor e o Réu em contrato a termo. Embora a letra da lei seja o ponto de partida, sempre será necessária uma tarefa de interligação que escapa ao domínio literal. Em última análise e quanto à aplicabilidade no tempo das normas sempre esta conversão funcionaria como um novo contrato.
Que dizer? Se deve considerar-se que a contratação do Autor pelo Réu, devido à sua situação de aposentado, foi a termo certo.
À data da contratação do Autor – Outubro de 2004 – estava em vigor o CT/2003.
Determinava o artigo 387º, al. c) do referido Código que “O contrato de trabalho caduca nos termos gerais, nomeadamente: com a reforma do trabalhador por velhice ou invalidez”, sendo que, e sem prejuízo do aí consignado “1. A permanência do trabalhador ao serviço decorridos 30 dias sobre o conhecimento, por ambas as partes, da sua reforma por velhice determina a aposição ao contrato de um termo resolutivo. 2. O contrato previsto no número anterior fica sujeito, com as necessárias adaptações, ao regime definido neste Código para o contrato a termo resolutivo, ressalvadas as seguintes especificidades: a) É dispensada a redução do contrato a escrito; b) O contrato vigora pelo prazo de seis meses, sendo renovável por períodos iguais e sucessivos, sem sujeição a limites máximos; c) A caducidade do contrato fica sujeita a aviso prévio de 60 dias, se for da iniciativa do empregador, ou de 15 dias, se a iniciativa pertencer ao trabalhador; d) A caducidade não determina o pagamento de qualquer compensação ao trabalhador” (…) – artigo 392º do CT/2003.
Decorre da conjugação dos referidos artigos que só a reforma por força da idade está abrangida pelo disposto no artigo 392º do CT/2003. Acresce que o regime aí previsto apenas se aplica aos trabalhadores que permaneçam na mesma empresa após a reforma por velhice e já não aos trabalhadores que na mesma situação [reformados por velhice] celebram um contrato de trabalho com outro empregador. É o que resulta do teor literal do citado artigo.
Neste sentido é o acórdão desta Secção Social de 28.05.2007, publicado em www.dgsi.pt relatado pelo saudoso Desembargador Ferreira da Costa e subscrito pelo aqui 1ºadjunto, cujo sumário é o seguinte: “Nos termos do artigo 5º da LCCT e actual artigo 392º, nº1 do Código do Trabalho «a permanência do trabalhador ao serviço decorridos 30 dias sobre o conhecimento, por ambas as partes, da sua reforma por velhice» fica sujeito ao regime do contrato a termo certo, com algumas excepções expressamente previstas na lei. Este regime, isto é as excepções previstas na lei, não é contudo aplicável ao um trabalhador que, na mesma situação, celebra «ex novo», um contrato de trabalho, que fica deste modo sujeito ao regime geral da contratação a termo, sendo nulo o termo aposto no contrato com a invocação do referido artigo 5º da LCCT”.
Igual posição foi defendida no acórdão do TRL de 01.10.2008, publicado em www.dgsi.pt e relatado pelo Desembargador José Ferreira, e cujo sumário passamos a citar: “O estatuto de reformado obtido por um trabalhador ao serviço de uma instituição (empresarial ou não), não constitui, por si só, circunstância impeditiva da celebração de um contrato de trabalho com uma empresa distinta, assim como não é impeditivo de que essa contratação se concretize sem a aposição de termo ou por tempo indeterminado”.
No mesmo sentido é o acórdão do STJ de 27.05.2010, publicado em www.dgsi.pt, relatado pelo Conselheiro Sousa Grandão e cujo sumário, na parte que interessa, é o seguinte: “O regime estabelecido no artigo 392º, nº1 e nº2 do CT, apenas tem aplicação para as situações em que o trabalhador se mantém vinculado à entidade patronal quando atinge a idade da reforma por velhice. Sendo as pensões de velhice acumuláveis com rendimentos de trabalho, nada impede a eventual contratação de trabalhadores reformados, ficando o respectivo vínculo sujeito, sem ressalvas ou restrições, aos princípios gerais da contratação, designadamente à contratação sem termo. Contudo, logo que o trabalhador atinja os 70 anos de idade sem que o contrato caduque, o mesmo converte-se em contrato a termo de seis meses”.
Em suma: o artigo 392º do CT/2003 apenas se aplica ao trabalhador reformado por velhice a trabalhar na empresa e não àquele que está reformado por velhice e vai trabalhar para uma empresa, na medida em que o legislador quis «libertar» a empresa das garantias de estabilidade de que goza o trabalhador, que entretanto se reformou por velhice, mas não viu necessidade de levar essa protecção às empresas que contratam trabalhadores reformados.
Por isso, e admitindo, por hipótese, que o Autor, à data da sua contratação, se encontrava reformado por velhice, esse facto não determina a obrigatoriedade de o Réu o contratar mediante contrato de trabalho a termo certo.
Mas, e salvo o devido respeito, afigura-se-nos que ao Autor não se aplica o artigo 392º do CT/2003 já que ele está reformado antecipadamente [por ter atingido 55 anos de idade e 36 anos de serviço]. Ora, a reforma antecipada não está incluída nas causas de caducidade do contrato de trabalho [o artigo 387º, al. c) do CT/2003 apenas indica como fundamento de caducidade do contrato de trabalho a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez].
Deste modo, se conclui pela improcedência da pretensão do apelante. A aplicação do nº4 da clª56ª da Convenção Colectiva de Trabalho – BTE nº30 de 15.08.2014 – em detrimento do estabelecido no artigo 348º do CT/2009.
Na sentença recorrida analisou-se ainda o teor da clª55ª da convenção colectiva aplicável às partes, onde se determina no seu nº4 o seguinte: “À contratação de trabalhadores reformados ou aposentados aplica-se o regime legal de conversão em contrato a termos após a reforma ou idade de 70 anos”. Relativamente a tal cláusula o Mmº. Juiz a quo deixou consignado o seguinte: (…) “na falta de qualquer outro elemento interpretativo, nomeadamente teleológico ou sistemático, da «ratio» desta norma convencional, o Tribunal apenas pode ater-se à interpretação literal da mesma. Nesse âmbito, é efectivamente possível concluir que foi pretensão dos outorgantes estipular que o regime de conversão em contrato a termo previsto no artigo 348º do Código do Trabalho é aplicável à celebração «ab initio» de contratos de trabalhos com trabalhadores que se encontrem nas situações concretas previstas naquela norma” (…) “Com efeito, essa é a conclusão lógica da opção pela utilização da expressão «À contratação dos trabalhadores reformados ou aposentados», que remete para o acto de contratar e não para a manutenção de contratos prévios. Face a este circunstancialismo, será então de considerar como válida a actuação do Réu? Salvo melhor entendimento, a minha resposta a esta questão é necessariamente negativa” (…) “Em primeiro lugar, porque importa ter em consideração o disposto no artigo 339º, nº1 do Código do Trabalho, nos termos do qual o regime estabelecido naquele diploma relativo à cessação do contrato de trabalho não pode ser afastado por instrumento de regulação colectiva. Assim sendo, tendo o artigo 348º do Código do Trabalho natureza imperativa, e sendo entendimento deste Tribunal que o regime previsto no mesmo não pode ser aplicável à celebração «ab initio» de contratos de trabalho, então esta regra não pode ser afastada através de instrumento de regulação colectiva, designadamente de Convenção Colectiva de Trabalho” (…) acrescentando ainda que “a norma prevista no nº4 da clª55ª do CCT aplicável apenas ter sido introduzida no mesmo aquando da revisão de 2014” (…) “quando o contrato de trabalho do Autor vigorava já há dez anos. Ora, inexistindo qualquer elementos que permita concluir o contrário, então terá obrigatoriamente de se considerar que esta nova norma apenas tem eficácia «ex nunc» e já não «ex tunc», em conformidade, aliás, com o princípio geral da aplicação das leis no tempo, consagrado no artigo 12º, nº1 do C. Civil. Ou seja, esta nova disposição incluída na Convenção Colectiva de Trabalho de 2014 apenas se aplica aos contratos que foram celebrados posteriormente à sua entrada em vigor, e já não àqueles que nessa data se encontrassem em plena vigência. Como tal, e ao contrário do que é defendido pelo Réu, não é possível com base nesta norma prevista no artigo 55º, nº4, da redacção de 2014 da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável, presumir que o contrato de trabalho com o Autor foi desde logo «ab initio» celebrado ao abrigo do disposto no artigo 392º do CT de 2003” (…)
O apelante discordaargumentado que é o novo instrumento de regulamentação colectiva – CCT entre a D… e a FNE publicado no BTE nº29 de 08.08.2015 – que permite aplicar o artigo 348º do CT ao caso dos autos. Relativamente a esta questão defendeu o Tribunal a quo que este CCT apenas teria «eficácia ex nunca e já não ex tunc (…) Ou seja, esta nova disposição incluída na convenção colectiva de trabalho de 2014 apenas se aplica aos contratos que foram celebrados posteriormente à sua entrada em vigor, e já não àqueles que nessa data se encontrassem em plena vigência. Como tal, e ao contrário do que é defendido pelo Réu, não é possível com base nesta norma prevista no artigo 55ª, nº4 da redacção de 2014 da convenção colectiva de trabalho aplicável, presumir que o contrato de trabalho com o Autor foi desde logo «ab initio» celebrado ao abrigo do artigo 392º do CT/2003». Não é este o entendimento do apelante. E isto por força dos artigos 1º – que define o âmbito de aplicação da convenção colectiva – e 3º – que consagra o princípio do tratamento mais favorável – da convenção colectiva e 1º e 4º do CT. Daqui resulta que a convenção colectiva de trabalho tem eficácia ex tunc por força destas disposições legais, o que significa que o regime previsto no artigo 348º do CT se aplica aos contratos de trabalho celebrados ab initio com trabalhadores já reformados. Termos em que a caducidade invocada é legal e aplicável ao caso. Não se trata de alteração de regime, mas de aplicabilidade desse regime à reforma de trabalhadores de outros estabelecimentos de ensino, o que significa uma interpretação diferente da jurisprudência a coberto de IRCT. Para além do espírito da norma o novo IRCT expressamente prevê a respectiva aplicação. Refere o Tribunal a quo que a norma ínsita no IRCT sempre estaria ferida de nulidade em virtude da imperatividade do vertido no artigo 339º do CT. O artigo 339º do CT determina a imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho previsto no artigo 348º, ou seja, por caducidade. É com base nos artigos 3º e 339º do CT que a sentença recorrida se baseia para determinar a inaplicabilidade do IRCT. Em momento algum o IRCT – clª55ª – afasta ou altera o regime da caducidade previsto no artigo 348º do CT. Tal cláusula 55ª respeita a imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho. O IRCT vem apenas aplicar aos contratos celebrados ab initio com trabalhadores reformados o regime da caducidade previsto no artigo 348º quanto à sua “conversão em contrato a termo e quanto ao facto de não ser necessária a sua redução a escrito”. Vejamos então.
Sob a epígrafe “Conversão em contrato a termo após reforma por velhice ou idade de 70 anos” diz o artigo 348º do CT/2009 o seguinte: “1. Considera-se a termo o contrato de trabalho de trabalhador que permaneça ao serviço decorridos 30 dias sobre o conhecimento, por ambas as partes, da sua reforma por velhice. 2. No caso previsto no número anterior, o contrato fica sujeito ao regime definido neste Código para o contrato a termo resolutivo, com as necessárias adaptações e as seguintes especificidades: a) É dispensada a redução do contrato a escrito; b) O contrato vigora pelo prazo de 6 meses, renovando-se por períodos iguais e sucessivos, sem sujeição a limites máximos; c) A caducidade do contrato fica sujeita a aviso prévio de 60 ou 15 dias, consoante a iniciativa pertença ao empregador ou ao trabalhador” (…).
Como já atrás referimos os regimes estabelecidos nos artigos 387º, al. c) e 392º do CT/2003, e nos artigos 343º, al. c) e 348º do CT/2009, não são aplicáveis ao Autor por ele não estar aposentado por força da idade/velhice. Mas avancemos.
As partes estão de acordo que às relações laborais se aplica a convenção colectiva de trabalho celebrada entre a D… – e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos de Educação e outros, publicada no BTE nº30 de 15.08.2004 e alterações posteriores publicadas no BTE nº11, de 22.03.2007, nº30 de 15.08.2011, nº30 de 15.08.2014 e nº29 de 08.08.2015.
Encontra-se junto aos autos o CCT – Revisão Global – publicado no BTE nº30 de 15.08.2014 e ainda a alteração – Revisão Global – publicada no BTE nº29 de 08.08.2015.
Na cláusula 56ª, nº4 do CCT publicado no BTE nº30 de 15.08.2014 – sob a epígrafe “Casos Especiais de Caducidade” – consta o seguinte: “À contratação de trabalhadores reformados ou aposentados aplica-se o regime legal de conversão em contrato a termo após reforma por velhice ou idade de 70 anos” [corresponde à clª55ª, nº4 do CCT publicado no BTE nº29 de 08.08.2015].
Como muito bem refere o Mmº. Juiz a quo, tal cláusula, ao contrário do artigo 348º do CT/2009 reporta-se à contratação de trabalhador reformado por velhice e contratado para trabalhar, tendo sido introduzida aquando da revisão do contrato colectivo em 2014.
A referida cláusula estabeleceu regime diferente do CT. E tal será admissível, atento o carácter imperativo das normas que regem a cessação do contrato de trabalho?
O artigo 339º do CT/2009 – sob a epígrafe “Imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho” – estabelece o seguinte: “1. O regime estabelecido no presente capítulo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por contrato, salvo o disposto nos números seguintes ou em outra disposição legal. 2. Os critérios de definição de indemnizações, os prazos de procedimento e de aviso prévio consagrados neste capítulo podem ser regulados por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. 3. Os valores de indemnizações podem, dentro dos limites deste Código, ser regulados por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho”. Por sua vez o artigo 478º, nº1, al. a) do CT/2009 prescreve que “O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho não pode contrariar norma legal imperativa”.
Ora, como decorre do artigo 339º do CT/2009, a matéria relativa à cessação do contrato de trabalho, constitui um regime imperativo absoluto com excepção das matérias referidas nos nºs.2 e 3 do citado artigo.
Por isso, não poderia a referida convenção colectiva estabelecer diferentes formas de conversão do contrato daquelas que estão estabelecidas no artigo 348º do CT/2009 já que este regula, expressamente, a caducidade do contrato de trabalho resultante da conversão do contrato de trabalho por tempo indeterminado em contrato de trabalho a termo nas situações aí expressamente indicadas.
E tal proibição determina a nulidade do nº4 da referida cláusula por violação expressa do determinado nos artigos 339º e 478º, nº1, al. a), ambos do CT/2009 – artigo 7º, nº2 da Lei preambular que aprovou o CT/2009.
Mas mesmo que assim não fosse entendido outro argumento determina a não aplicação da referida cláusula.
No artigo 478º, nº1, al. c) do CT/2009 o instrumento de regulamentação colectiva de trabalho não pode “Conferir eficácia retroactiva a qualquer cláusula que não seja de natureza pecuniária”.
A «eventual» conversão do contrato de trabalho do Autor teria de reportar-se obrigatoriamente à data da sua celebração – 01.10.2004 – na medida em que nessa data ele já estava aposentado e o Réu era sabor de tal situação.
Pois bem, na data de 01.10.2004 a clª56ª, nº4 ainda não estava em vigor, e a mesma – por força do artigo 478º, nº1, al. c) do CT/2009 – não pode ter eficácia retroactiva, ou seja, quando surge a clª56ª, nº4 do CCT o contrato de trabalho do Autor já vigorava há 10 anos.
Em suma: ainda que por fundamentos não totalmente coincidentes a sentença tem de manter-se. Termos em que se julga a apelação improcedente e se confirma a decisão recorrida.
* * *
Custas da apelação a cargo do apelante.
* * *
Porto, 26.10.2017
Fernanda Soares
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho