TÉCNICO OFICIAL DE CONTAS
DEVER DE INFORMAR
RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL
SEGURO DE GRUPO
Sumário

1. Faz parte das funções do técnico oficial de contas o dever de informar o cliente sobre a possibilidade de optar por um regime tributário mais favorável.
2. Havendo omissão desse dever, o risco dos respectivos danos está coberto pelo seguro colectivo de responsabilidade profissional celebrado pela Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas e a seguradora.
( Da responsabilidade da Relatora)

Texto Integral

Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO.

A intentou a presente acção declarativa com processo sumário contra B ( Companhia de Seguros…..,SA) , alegando, em síntese, que é técnica oficial de contas inscrita na Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, tendo esta celebrado com a ré um seguro colectivo de responsabilidade civil profissional, garantindo as indemnizações resultantes de danos patrimoniais provenientes de actos ou omissões cometidos durante o exercício da actividade de TOC, tal como aconteceu com a autora, que omitiu a informação à sua cliente C ( …., Lda) de que tinha o ónus de comunicar à Administração Fiscal até 31 de Março de 2002 a opção pelo regime geral de tributação, pelo que não tendo a sua cliente efectuado essa comunicação, foi tributada mais gravosamente pelo regime simplificado, com o prejuízo de 3 025,69 euros, quantia que a autora lhe pagou, mas não tendo a respectiva participação do sinistro sido aceite pela ré, que se recusou a pagar o referido valor à autora, invocando que os factos participados não se integravam na actividade profissional desta.
Concluiu pedindo a condenação da ré a considerar incluído no “âmbito de cobertura” do seguro de responsabilidade civil profissional os danos patrimoniais causados à cliente da segurada autora, bem como a pagar-lhe a quantia de 3 025,69 euros, acrescida de juros de mora.
A ré contestou impugnando os factos alegados na petição inicial relativos à actividade da autora e aos danos sofridos e alegando que a invocada omissão de informação à cliente da autora não constitui um ilícito profissional da autora, competindo o exercício da opção pelo regime geral de tributação ao próprio contribuinte e não ao seu TOC, que está apenas obrigado à execução correcta da contabilidade e não ao aconselhamento do cliente, pelo que a cobertura do contrato de seguro não abrange os danos invocados, para além de que o pagamento que a autora tenha feito à sua cliente corresponde a um acordo ou assunção de obrigação e não matéria de responsabilidade extracontratual, estando expressamente excluída das coberturas do contrato de seguro.
Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido.
Saneados os autos com dispensa da condensação, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar-lhe a quantia de 2 723,12 euros acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva aplicável aos juros civis, contados desde a propositura da acção e até integral pagamento.
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Inconformada, a ré interpôs recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
A recorrente alegou, formulando as seguintes conclusões:
a) 1ª questão – Da matéria de facto dada como provada não se pode extrair que a autora estivesse obrigada para como seu cliente a exercer qualquer opção ou sequer a aconselhar o exercício de uma opção ligada ao regime de tributação a que este último ficaria submetido.
b) As decisões dos nossos Tribunais Superiores têm assentado no pressuposto de que entre o dito TOC e o seu cliente foi acordada a prestação de serviços de consultoria fiscal e que aquele técnico se comprometeu também a entregar junto da Administração Fiscal a competente declaração de opção.
c) Embora não se prescinda do entendimento que a seguir se defende, repisa-se o que ressalta da Jurisprudência analisada: o técnico oficial de contas pode exercer funções de consultoria (e outras como entrega de declarações fiscais) desde que acordado com o cliente.
d) Ora, da matéria de facto dada como provada e da aplicação dos preceitos legais, o que se pode concluir é, apenas só, que a autora era técnica oficial de contas da C e, como tal, nos termos do art. 6º do Estatuto os Técnicos Oficiais de Contas” (Decreto-Lei nº452/1999 de 5 de Novembro, entretanto alterado e republicado pelo Decreto-Lei nº310/2009, de 26 de Outubro), apenas se pode ter vinculado às obrigações constantes do nº1 do mencionado preceito, uma vez que, como vem sendo entendido nos nossos Tribunais, o restante conteúdo é opcional.
e) O conteúdo da obrigação que possa ter sido assumida pela autora perante o seu cliente apenas pode ter sido única e exclusivamente planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade, assumir a responsabilidade técnica nas áreas contabilísticas e fiscais e assinar conjuntamente com os seus clientes as declarações fiscais e demonstrações financeiras e seus anexos: planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade e assumir a responsabilidade pela regularidade técnica.
f) E assinar declarações, demonstrações financeiras e anexos conjuntamente com o cliente.
g) Exercer uma opção por um determinado regime de tributação ou aconselhar esse exercício nada tem a ver com responsabilidade pela regularidade técnica nem com assinar declarações, demonstrações financeiras e anexos conjuntamente com o cliente.
h) Não se provou que a autora se tivesse comprometido perante os clientes com qualquer outro tipo de prestação de serviços.
i) Nem o apregoado dever de aconselhar e agir pode resultar da boa fé na execução dos contratos: isso seria elevar o padrão de exigibilidade da conduta do devedor a um patamar que não é suportável pelo grau de apreciação de um bom pai de família.
j) Não corresponde à boa fé exigir de um devedor que desempenhe a sua obrigação com um grau de exigência superior ao da normalidade: é arbitrário supor que um médico consultado sobe um problema de tensão arterial deva aconselhar o seu paciente sobre problemas e exposição solar, assim como não é exigível que um advogado, consultado sobre um problema sucessório de um seu cliente, aconselhe este sobre questões laborais.
k) A menos, claro, que para isso tenha sido solicitado: o que não é o caso destes autos, onde não se prova que a autora tenha sido solicitada para prestar aconselhamento a exercer uma opção em nome o seu cliente.
l) Invocar a boa fé constitui, salvo o devido respeito, uma via perfeitamente arbitrária e aleatória.
m) Logo a autora não estava obrigada a agir ou a aconselhar a agir num ou noutro sentido de conformação do regime de tributação.
n) 2ª questão – A sentença em recurso desconsiderou erradamente – o que se afirma com o devido respeito – os factos provados nos nºs 17 e 18 do seu relatório.
o) Com efeito, tal matéria foi alegada pela autora como “enquadramento” da sua actuação, não podendo deixar de valer como complemento ou desenvolvimento de outros factos por si alegados.
p) E tais fatos servem para “enquadrar” e “explicar” o modo de actuação da autora, o que não pode deixar de ter o significado de ser a própria autora quem relatou o que sucedeu no caso sub judice.
q) Se assim é – como não pode deixar de ser – evidente se torna que tais factos não são abstractos nem genéricos: são pertinentes ao caso concreto.
r) E como tal deve ser ponderado o que se provou: é que a autora elaborou e assinou conjuntamente com o seu cliente declaração de início de actividade, onde foram estimados para o primeiro ano de actividade proveitos superiores a 149 639,37 euros.
s) E ficou convencida de que o facto de naquela declaração se ter colocado uma cruz na quadrícula da opção pelo regime geral seria suficiente para assegurar a que o contribuinte/cliente permaneceria naquele regime por um período de três exercícios, nos termos do art.º 53º, nº8 do CIRC.
t) Porém, os proveitos desse cliente, relativos ao primeiro ano de actividade (2001), ficaram aquém dos proveitos estimados e indicados na declaração de início de actividade.
u) Contudo, isso não obrigava a que tivesse de ser apresentada nova opção e, como tal, a autora não tinha de o fazer, nem violou qualquer dever por não o ter feito: é que, nos termos do disposto o nº7 do art. 53º do CIRC (inicialmente art. 46º-A), a opção pode realizar-se na declaração de início de actividade.
v) E sendo realizado nessa declaração de início de actividade, é válida por um período de três exercícios (inicialmente, cinco): nº8 do citado preceito.
w) “Deve por isso ter-se por ilegal a tributação do sujeito passivo pelo regime simplificado efectuado pela AF que desconsiderou a opção infringindo assim o nº1 do artigo 53 do CIRC, sendo que nos termos do nº8 do mesmo preceito essa opção é válida pelo período de três exercícios” – Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, 2ª Secção de 03-07-2008, in www.dgsi.pt.
x) Não resulta da situação de facto dos autos, quando interpretada por aquela forma, que a autora tenha incumprido o dever de actuação conscienciosa e diligente previsto na alínea a) do nº1 do art. 54º do ETOC, o que vale dizer, que tenha incorrido, por acção ou omissão, em ilícito contratual.
y) O que equivale a dizer que o contrato de seguro dos autos não pode permitir a cobertura destas situações em que não existe dever de indemnizar para a autora.
z) 3ª questão: Há ainda que ponderar a apropriação ilícita que está a ser permitida nestes autos pois o contrato de seguro não pode cobrir os eventos que o autor alegou nem estes eventos são susceptíveis de serem reconduzidos a um “erro profissional” do técnico oficial de contas.
aa) Nos termos do artigo 2º, nº1, das Condições Gerais da Apólice dos autos “O presente contrato tem por objecto a garantia da responsabilidade extracontratual que, ao abrigo da lei civil, seja imputável ao segurado, na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referidas nas respectivas Condições Especiais e Particulares”.
bb) Nos termos do ponto 3 das Condições Particulares do contrato de seguro dos autos, estão cobertas “as indemnizações que legalmente sejam exigíveis ao Segurado, em consequência de danos patrimoniais causados a Clientes e ou Terceiros, desde que resultem de actos ou missões cometidos durante o exercício a actividade de Técnico Oficial de Contas”.
cc) Por outro lado, o nº4 das condições especiais do contrato de seguro dos autos que prevê que prevê que “para além das exclusões referidas nas Condições Gerais, fica ainda excluída a responsabilidade: (…) por danos resultantes da prática de actos e/ou exercício de actividade profissional, para os quais o Segurado não esteja legalmente habilitado”.
dd) Assim, a apólice dos autos não abrange qualquer responsabilidade decorrente da prática de qualquer acto ou exercício de qualquer actividade que não se enquadre na actividade a que, por lei, os técnicos oficiais de contas estão habilitados a exercer, o que nos leva a ter de determinar os riscos decorrentes do exercício da profissão para a qual o técnico oficial de contas esteja habilitado e à análise das funções legalmente consagradas no art. 6º do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas.
ee) Do art. 6º do “ECTOC” resulta claro que o cerne e conteúdo fundamental da actividade a que os técnicos oficiais de contas estão habilitados a prosseguir está concentrado na alínea a) do citado preceito.
ff) Tudo gira à volta de “planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada” – note-se: planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade.
gg) É de execução da contabilidade que se trata e de tudo quanto tenha a ver com planificar, organizar e coordenar essa tarefa de execução.
hh) No elenco das funções legalmente atribuídas aos técnicos oficiais de contas enquadra-se apenas e só tudo o que tem a ver com organização e arquivo de documentos contabilísticos e fiscais, classificação de documentos e seu lançamento nos respectivos livros contabilísticos e no sistema informático e apuramento de impostos a pagar, ao que se acrescenta a planificação da execução dessa actividade com prestação de consultoria nessa área.
ii) Não lhe cabe proceder ao exercício de opções de natureza jurídico – fiscal ou ao aconselhamento dessa natureza.
jj) O entendimento de que aos técnicos oficiais de contas é permitido o exercício da actividade aconselhamento jurídico – fiscal representa a primeira apropriação que aqui se denuncia: é que a questão que se discute nestes autos (opção o conselho de opção por um ou outro regime de tributação) envolve uma actividade de aconselhamento jurídico – fiscal, pois trata-se aqui de emitir um juízo opinativo para fundamentar uma resolução da administração tributária que pressupõe a interpretação e aplicação de normas jurídicas.
kk) Porém, ao contrário do que o autor pretende neste processo, a responsabilidade que está a pretender assacar a si próprio é uma responsabilidade que se enquadra, não na actividade dos “TOC”, mas na dos advogados e solicitadores habituados à prática de actos jurídicos e à consulta jurídica – fiscal, reservada a estes profissionais os termos da Lei 49/2004, de 24 de Agosto (cfr. também os artigos 53º e 56º do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pelo Decreto-Lei nº84/84, de 16 de Março e pela Lei nº15/2005, de 26 de Janeiro e o artigo 358º, b) do Código Penal).
ll) É por esta mesma razão que o art. 3º, nº2 do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas dispõe que “os técnicos Oficiais de Contas devem eximir-se da prática de actos que não sejam da sua competência profissional ou quando os mesmos, nos termos da lei, sejam da competência de outros profissionais”.
mm) Este mesmo entendimento foi consagrado no Parecer nº E-57/04, emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados, de 17 de Dezembro de 2004 (acessível em www.oa.pt, “pareceres do conselho geral”): “Os pareceres elaborados pelos técnicos oficiais de contas em matéria fiscal, bem como a preparação, elaboração, auxílio e entrega de reclamações de actos tributários, conexos com a profissão, sendo estas assinadas pelos respectivos sujeitos passivos, constituem actos próprios dos advogados e solicitadores”.
nn) Existe ainda uma ideia – simplista e errada, a nosso ver – de que o técnico oficial de contas “devendo servir mais que fazer contas”, está obrigado a invadir outras áreas da gestão económico-financeira e do planeamento fiscal das empresas (e empresários) seus clientes.
oo) Há que recordar o regime legal: a opção por um ou outro dos regimes de tributação, grosso modo, deve ser feita até 31 de Março de cada ano (art. 28º do CIRC).
pp) Ora, essa opção tem a ver com o volume de negócios (proveitos e despesas) gerados em cada ano, bem podendo suceder que o dito “regime simplificado” seja mais favorável que o dito “regime geral de tributação pelo lucro tributável”.
qq) Mas, a 31 de Março de cada ano é impossível a qualquer pessoa que não seja o próprio empresário/contribuinte prever qual vai ser a evolução da sua actividade.
rr) O facto é que o técnico oficial de contas não está obrigado a prever esta evolução e a assumir este risco – até porque não tem habilitações académicas e profissionais para tanto.
ss) Essa previsão, típica da actividade do empresário, cai no domínio da gestão económica e financeira e do planeamento fiscal da empresa: não cabe ao técnico oficial de contas, que é responsável apenas pela boa execução da contabilidade.
tt) Este é um problema de cultura e mentalidade que parece querer implantar-se em alguns sectores da nossa sociedade e que leva a desresponsabilizar-se o empresário e contribuinte, encarando-o como parte fraca ou verdadeiro néscio em assuntos cruciais da vida da sua empresa e levando a considerar que o contabilista (rectius, técnico oficial de contas) tem de fazer mais que as simples contas.
uu) Há que rebater esta visão arcaica e pouco consentânea com a especialização das actividades e profissões que caracteriza as sociedades modernas e avançadas, por forma a não se permitir esta invasão de terrenos das actividades de outros profissionais.
vv) Nas funções de um técnico oficial de contas cabe a responsabilidade pela planificação e organização da execução da contabilidade e a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações fiscais (isto é, a comunicação ao Estado dos factos tributários ou com repercussão na situação tributária do contribuinte).
ww) Não cabe nessas funções o exercício de faculdades e direitos e não cabe a planificação do regime fiscal ou consultadoria nessa área que envolve pura consultadoria no plano do direito fiscal.
xx) Como foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em acórdão datado de 30 de Outubro de 2008 (Apelação nº563702, 2ª Secção) e relatado pelo Juiz Desembargador Borges Carneiro (acessível em www.dgsi.pt):
O seguro profissional obrigatório não garante uma actividade contratada entre um contribuinte e um técnico oficial de contas, em termos de se obrigar a prestar-lhe consultadoria na área do direito fiscal, pois o que lhe compete é planificar, organizar e coordenar a execução da sua contabilidade ou prestar-lhe funções de consultadoria nessa área. Tais funções de consultadoria dos T.O.C. são relativas à planificação, organização e execução da contabilidade e não a consultadoria na área fiscal, isto é, a opção por um determinado regime de tributação”.
yy) E, com mais actualidade, foi adoptada pelo Acórdão do Tribunal de Coimbra, de 24 de Março de 2009, nos seguintes termos:
“Em primeiro lugar, exceptuados os casos previstos no nº3 do artigo 31º do CIRS, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro (sem relação com o caso dos autos), a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, com base na contabilidade, de sujeitos passivos cujo volume de vendas não tivesse atingido valor superior a 30 000 000$00 não constituía um dever. Era apenas uma faculdade.
Em segundo lugar, o nº4 do artigo 31º do Código do IRS, na redacção que lhe foi dada pelo art. 1º da Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro, ao dispor que a opção a que se refere o nº2 (isto é, a opção pela contabilidade organizada) deve ser formulada pelos sujeitos passivos, na declaração de início de actividade (alínea a)) ou até ao fim do mês de Março do ano em que pretende utilizar a contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento mediante a apresentação de uma declaração de alterações (alínea b)) não consente quaisquer dúvidas quanto à pessoa com legitimidade para fazer a opção pelo regime da contabilidade organizada: era o autor, pois era ele o sujeito passivo do imposto.
Em terceiro lugar, nem do artigo 6º nem do artigo 52º do Estatuto dos técnicos Oficiais de Contas decorria para a 2ª Interveniente, caso fosse técnica oficial de contas do autor, o dever de optar pelo regime de contabilidade organizada. O artigo 6º diz respeito às funções dos técnicos oficiais de contas; o artigo 52º trata dos deveres gerais a que estão sujeitos estes profissionais. Nenhum segmento destas normas aponta no sentido de que cabe aos técnicos oficiais de contas o dever de optarem pela contabilidade organizada na determinação dos rendimentos profissionais e empresariais dos seus clientes, sujeitos passivos do imposto. Não havendo lei ou negócio jurídico que impusessem à 2ª Interveniente o dever de optar pelo regime da contabilidade organizada, é seguro que o facto de ela não ter feito essa opção não a constituiria na obrigação de reparar os danos daí resultantes, casos eles existissem.” – com sublinhados da responsabilidade da apelante.
zz) Desta forma foi também decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 24 de Setembro de 2009, relatado pelo Exmo Snr Desembargador José Ferraz (3ª Secção, Processo nº 3035/07.9 TBPVZ.P1), foi decidido que:
“Por outro lado, também não parece consentir dúvidas que é o contribuinte que tem a faculdade (e legitimidade) de fazer a opção. O contribuinte ou seu representante legal, como um acto de gestão e de planeamento da sua empresa.”
“Portanto que são os sujeitos passivos do imposto a quem cabe exercer a faculdade. Em nenhum passo da lei (tributária ou do estatuto dos TOC`s) se coloca (como não poderia colocar-se) o exercício dessa faculdade a cargo dos Técnicos Oficiais de Contas.”
“Ora, o assumir a responsabilidade técnica pelas áreas contabilística e fiscal não implica, necessariamente, a obrigação de entrega da dita declaração (que é do sujeito passivo e não do TOC) nas finanças.”
Desse leque de atribuições, não ressalta a de conselheiro fiscal, a fazer recair sobre o TOC o dever de informar o cliente e opinar sobre as melhores e escolha das melhores opções fiscais da empresa, maxime, tomando decisões (como seria a de optar por este ou aquele “regime” fiscal) pelo sujeito passivo e para este vinculativas.”
“A actividade do TOC centra-se nos procedimentos, na regular elaboração das contas, do eu não decorre alguma obrigação de aconselhamento o planeamento fiscal da empresa. Por outro lado, o facto de o TOC poder desempenhar funções de consultadoria na área da sua (do TOC) formação (nº2 , al. a)), relaciona-se essa consultadoria com as actividades mencionadas na al. a) do nº1 (é essencialmente essa a área da sua formação) e não com outras actividades como a do direito fiscal (na qualidade de TOC, entenda-se).”
“Em nenhum passo se diz que o TOC é (ou pode ser) um consultor fiscal, obrigando-se a emitir parecer (e pelas melhores soluções) no planeamento fiscal da empresa ou a tomar decisões nessa área.”
“A actividade do TOC concentra-se nas funções de “planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento” de modo que as contas e as declarações fiscais que elabora, assina e apresenta estejam regulares, regularidade essa que não decore da escolha deste ou aquele regime de determinação do rendimento tributável mas da observância das regras dos planos oficiais de contas e conexas, já que lhe compete assumir a responsabilidade técnica nas áreas contabilística e fiscal (a regular execução das contas e das declarações fiscais necessárias à liquidação dos impostos sobre o rendimento). Ora estas unções não têm que ver nem dependem da escolha de determinado regime fiscal.”
aaa) E também pelo Tribunal da Relação de Guimarães, com o acórdão datado de 3 de Novembro de 2009, proferido no âmbito da apelação nº4810/6.7 TBBCL.G1, da 2ª Secção Cível – junta-se aqui cópia por se desconhecer se se encontra ou não publicado.
bbb) E também a recente evolução legislativa de que se deu conta no corpo das alegações, que tem de ser analisada em face da lei de autorização legislativa (Lei nº 97/2009, de 3 de Setembro) permite concluir pela justeza deste entendimento: é que, como se pode ler por esta lei de autorização, o governo ficou autorizado a legislar no sentido de “clarificar as funções dos técnicos oficiais de contas no sentido de aquelas passarem a enquadrar”: (…) “que as funções de consultoria atribuídas aos técnicos oficiais de contas se referem a matérias contabilísticas, fiscais e relacionadas com a segurança social”.
ccc) Assim, o novo art. 6º do Estatuto dos técnicos oficiais de contas passou a abranger “funções de consultoria nas áreas da contabilidade, da fiscalidade e da segurança social”.
ddd) Houve uma evolução, passando a prever-se o que antes não se poderia considerar previsto e aquilo que agora podemos ler na al. a) do nº2 do art. 6º (assim como na al. d) do nº1 e b) do nº2) é o reconhecimento do que não existia e o reconhecimento do que não existia corresponde à razão da aqui apelante.
eee) Repisa-se o entendimento do legislador: clarificar as funções dos técnicos oficiais de contas no sentido de aquelas passarem a enquadrar.
fff) Nem contra o que se acaba de alegar pode valer o disposto no art. 11º do “Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas” pois, como resulta facilmente da leitura do mesmo preceito, só existe dever de informar relativamente a condicionalismos de ordem legal relacionados exclusivamente com o exercício da profissão: O dever de informar pressupõe, por isso, que estejamos a falar de condicionalismos que afectam o exercício da profissão do técnico oficial de contas, não de condicionalismos legais que possam afectar os clientes destes.
ggg) De qualquer das formas, também o art. 11º do novo “Código Deontológico” saído da recente alteração legislativa confirma este entendimento: é que caiu a alínea c) que previa justamente aquela citada obrigação.
hhh) 4ª questão – invoca-se aqui que não está provado o nexo de causalidade entre o facto (omissão da autora) e os danos do seu cliente – o acréscimo de imposto por ele pago ao fisco – em termos de se poder afirmar que os danos foram uma consequência directa, necessária ou provável da dita omissão da autora.
iii) Na verdade, não está provado – nem alegado – que o cliente da autora, sabendo da possibilidade de opção, optaria por esse regime de contabilidade organizada.
jjj) Segue-se aqui o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Julho de 2009 eu, por não se encontrar publicado, é também aqui junto.
kkk) O presente recurso deve ser julgado procedente e revogada a decisão recorrida, pois assim o impõem a boa interpretação e aplicação do art. 6º do estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, Lei nº 97/2009, de 3 de Setembro, a Lei nº 49/2004, de 24 de Agosto e também os artigos 53º e 56º do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março e pela Lei nº 15/2005, de 26 de Janeiro, que foram incorrectamente aplicados e consequentemente violados pela decisão recorrida, com o que farão V. Exas a mais nobre e elevada JUSTIÇA!!!
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Não foram apresentadas contra-alegações e a questão a decidir consiste na definição das funções da autora quer na qualidade de TOC, quer no contrato celebrado com a sua cliente e do âmbito da cobertura do contrato de seguro.
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FACTOS.
Os factos considerados provados pela sentença recorrida são os seguintes:
1. A autora é técnica oficial de contas, com o nº 0000 e inscrita na Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas.
2. A Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas foi tomadora numa apólice da ré com o nº... cobrindo, durante o período de 1 de Julho de 2003 a 27 de Março de 2004, os riscos de responsabilidade civil profissional dos técnicos oficiais de contas inscritos naquela Câmara, no exercício das suas funções, nos termos do nº4 do artº 52º do Decreto-Lei nº454/99, de 5 de Novembro.
3. Para o período de 10 de Novembro de 2000 a 30 de Junho de 2003 vigorou, na seguradora ré, a apólice nº 00/42.205, com o mesmo objecto.
4. As citadas apólices, nos termos constantes de fls 14 e segs e 139 e segs, cobriam um capital máximo por sinistro e por ano de 50 000,00 euros, por aderente, com uma franquia de 10% do valor da indemnização, no mínimo de 49,88 euros
5. Segurado, para efeito das referidas apólices, é o “técnico oficial de contas, inscrito na Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, cuja obrigação de subscrição deste seguro se encontra estabelecida pelo nº4 do artº 52º do ECTOC.”
6. O artº 2º, nº1 da Condições Gerais das apólices dispõe que: “O presente contrato tem por objecto a garantia da responsabilidade extracontratual que ao abrigo da lei civil, seja imputável ao segurado, na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referidas nas respectivas Condições Especiais e Particulares.”
7. O âmbito de cobertura das apólices compreende “as indemnizações que legalmente sejam exigíveis ao Segurado, em consequência de danos patrimoniais causados a clientes e ou terceiros, desde que resultem de actos ou omissões cometidas durante o exercício da actividade de Técnico Oficial de Contas” (cfr nº3 das Condições Particulares).
8. Estão excluídos das apólices os danos “decorrentes de acordo ou contrato particular, na medida em que a responsabilidade que daí resulte exceda a que o segurado estaria obrigado na ausência de tal acordo ou contrato” (al. l), do nº1 do artº 4º das Condições Gerais).
9. Nos termos do artº 20º, nº2, a) das Condições Gerais das referidas apólices, “O tomador do seguro ou o segurado não poderão também, sob pena de responderem por perdas e danos: a) Abonar extrajudicialmente a indemnização reclamada sem autorização escrita da seguradora (…)”.
10. A autora é a TOC responsável pela contabilidade da empresa C com o NIPC 00000000000 , desde 15-05-2001.
11. A autora não informou a C do ónus de comunicar à Administração Fiscal, até 31 de Março de 2002, que pretendia optar pelo denominado regime geral de determinação do lucro tributável porque reunia os pressupostos legais para o efeito.
12. A C não apresentou declaração de alteração exercendo a opção pelo regime geral de tributação até 31 de Março de 2002 porque a autora não preparou tal declaração.
13. Em consequência dessa omissão, referida nos Pontos 11. e 12., o IRC devido pela C , no âmbito do regime simplificado, acresceu 3 025,69 euros relativamente ao exercício de 2002.
14. Tal diferença não teria ocorrido se a C , informada do ónus referido em 11, o tivesse exercido.
15. A autora após ter sido contactada pela C a informar do prejuízo referido em 13 que lhe adveio na sequência da falta de opção pelo regime geral de tributação, assumiu a sua responsabilidade e procedeu ao pagamento à C daquele valor de 3 025,69 euros que esta liquidou aos Serviços da Fazenda Pública.
16. Posteriormente, reclamou a autora junto da ré o ressarcimento do valor de 3 025,69 euros, que esta declinou, referindo que “os factos participados não se enquadram no âmbito daquela actividade (de TOC)”.
17. Muitos TOC, inclusivamente a autora, elaboraram e assinaram conjuntamente com os seus clientes declarações de início de actividade, onde foram estimados para o primeiro ano de actividade proveitos superiores s 149 629,37 euros.
18. E ficaram convencidos, como ficou a autora, de que o facto de naquela declaração se ter colocado uma cruz na quadrícula da opção pelo regime geral seria suficiente para assegurar a que o contribuinte/cliente permaneceria naquele regime por um período de três exercícios, nos termos do artº 53º, nº8 do CIRC.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO.
Ficou provado que entre a Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas e a ora ré foi celebrado um contrato de seguro colectivo, mediante o qual esta assumiria os riscos da responsabilidade civil profissional dos TOC inscritos naquela câmara.
Por outro lado, provou-se que a autora, TOC inscrita na referida câmara, é responsável pela contabilidade da sociedade C e que esta, por falta de informação da autora, não comunicou à Administração Fiscal a opção pelo regime geral de tributação até 31/03/2002, período em que vigorava contrato de seguro acima mencionado, tendo por isso pago um valor de imposto superior àquele que teria pago se tivesse sido feita tal comunicação.
Haverá então que definir a natureza do contrato celebrado entre a autora e a C , em ordem a concluir se aquela incumpriu as suas funções, de forma a causar prejuízo a esta e se essa responsabilidade civil está abrangida pela apólice contratada pela ré.
Ao tornar-se responsável pela contabilidade da C , a autora celebrou com esta sociedade um contrato de prestação de serviços previsto no artigo 1154º do CC, por força do qual ficou obrigada a prestar-lhe um serviço, sendo que, nos termos gerais de direito e da boa fé, previstos nomeadamente no artigo 762º do CC, estava vinculada a executar esse trabalho com lealdade e visando obter um resultado que correspondesse o mais possível ás expectativas da contra parte.
No que diz respeito às concretas funções do TOC, dispõe o artigo 6º do Estatuto da Câmara dos TOC – contido no DL 452/99 de 5/11, aplicável aos autos na versão anterior às alterações introduzidas pelo DL 310/2009 de 26/10 – que:
Nº1- São atribuídas aos técnicos oficiais de contas as seguintes funções:
a) Planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada, segundo os planos de contas oficialmente aplicáveis, respeitando as normas legais e os princípios contabilísticos vigentes, bem como as demais entidades obrigadas, mediante portaria do Ministro das Finanças, a dispor de técnicos oficiais de contas.
b) Assumir a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal, das entidades referidas na alínea anterior.
c) Assinar conjuntamente com o representante legal das entidades referidas na alínea a), as respectivas declarações fiscais, as demonstrações financeiras e seus anexos, fazendo prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Câmara, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos.
Nº2- Compete ainda aos técnicos oficiais de contas o exercício de:
a) Funções de consultadoria, nas áreas da respectiva formação.
b) Quaisquer outras funções definidas por lei, adequadas ao exercício das respectivas funções, designadamente as de perito nomeado pelos tribunais ou outras entidades publicas ou privadas.
Por outro lado e por força das alterações introduzidas no CIRC e no CIRS pelas leis 30-G/2000 de 29/12 e 109-B/2001 de 27/12, o regime simplificado de tributação, vigorando ao lado do regime geral da contabilidade organizada aplicar-se-ia automaticamente em relação a contribuintes que tivessem um total de proveitos inferior a 149 639,37 euros, salvo se optassem pelo regime geral de determinação do lucro tributável, opção que deveria ser formalizada até ao fim do mês de Março do ano em que o contribuinte pretendesse organizar a contabilidade (artigos 53º, 110º, 111º do CIRC e 28º do CIRS).
Deste modo, no ano de 2002, a sociedade C , para optar pelo regime geral de determinação tributável teria de o ter declarado até 31 de Março de 2002.
Ora, a autora não informou a C de que poderia optar pelo regime geral de tributação uma vez que reunia os pressupostos legais para o efeito e que, para tanto, o teria de comunicar à Administração Fiscal até 31/03/2002, pelo que não foi feita esta declaração e, em consequência, a referida sociedade suportou de IRC o valor de acrescido de 3 025,69 euros no âmbito do regime simplificado.
Alega a ré que a opção pelo regime de tributação cabe ao contribuinte e não ao TOC e que o aconselhamento jurídico-fiscal está fora das suas atribuições e fora da cobertura do seguro contratado.
A favor desta tese já se pronunciaram algumas decisões jurisprudenciais, como os acórdãos da RL 16/07/2009 e 30/10/2008, da RP de 13/10/2010, todos em www.dgsi.pt.
Contudo, em sentido contrário, de que compete ao TOC informar o seu cliente sobre os condicionalismos legais da escolha do regime de tributação e de que os danos causados pela omissão desta informação estão cobertos pelo seguro, pronunciaram-se os acórdãos da RL 30/11/2006, da RP de 21/10/2010 e 12/02/2008, também em www.dgsi.pt e tem-se pronunciado uniformemente o STJ nos acórdãos 21/08/2008, 9/10/2008, 21/06/2011 e 15/12/2011, todos publicados no mesmo site.
Parece-nos mais correcta esta segunda tese, que foi a seguida na sentença recorrida.
Desde logo a prestação de consultadoria pelo TOC está prevista no artigo 6º nº2 a) do Estatuto da Câmara dos TOC, cabendo esta nas suas funções, desde que dentro da área da sua actividade, como é o caso da planificação, organização e coordenação da contabilidade.
Para além disso, é indiscutível que cabe ao contribuinte e não ao TOC a opção pelo regime de tributação; mas para escolher o regime que lhe é mais conveniente, o contribuinte tem de estar esclarecido.
E é precisamente para ficar esclarecido que, nos termos do artigo 3º do DL 452/99, os contribuintes sujeitos aos impostos sobre o rendimento que tenham contabilidade organizada são obrigados a dispor de TOC.
Assim, o TOC não escolhe o regime, mas está obrigado a prestar ao contribuinte os esclarecimentos necessários para que este exerça a sua escolha.
Tal obrigação decorre do já citado artigo 6º nº1 a) do Estatuto da Câmara dos TOC, pois a actividade de planificação, organização e coordenação aí prevista não pode ser seriamente executada se não houver um informação global de todas as alternativas facultadas ao contribuinte e de quais as vantagens de cada uma.
A obrigação do TOC de prestar este tipo de informação decorre ainda dos artigos 2º do Código Deontológico dos TOC, segundo o qual estes devem adaptar a aplicação das leis e princípios contabilísticos à situação concreta das entidades a quem prestam serviços e 11º do mesmo código, que lhes impõe a obrigação de informar as entidades onde exercem funções, nomeadamente dos condicionalismos legais susceptíveis de os afectar.
Todos estes deveres de informação sempre teriam de subsistir mesmo não estando previstas funções de consultoria.
A obrigação legal de dispor de um TOC existe devido à especificidade da matéria em causa, que pode ser de difícil apreensão para o cidadão comum, mesmo para aquele ao qual é imposto o dever de contabilidade organizada, visando-se deste modo, com a intervenção do técnico, evitar erros e omissões por parte dos contribuintes e optimizar a sua situação fiscal.
Por isso e perante a expectativa do contribuinte de vir a usufruir da assistência de um técnico que o esclareça sobre os condicionalismos legais que o possam afectar, é exigível a este que preste tais informações e, não o fazendo, tem de se considerar que não foi cumprida a sua obrigação contratual, sob pena de, se assim não se entender, permitir-se a execução da prestação em violação do dever de boa fé previsto no artigo 762º do CC.
Parece-nos irrelevante o argumento da ré de que a autora, à semelhança do que aconteceu com muitos outros TOC, ao elaborar e assinar declaração de início de actividade onde foram estimados proveitos superiores a 149 639,37 euros, estivesse convencida de que o facto de se ter optado pelo regime geral seria suficiente para assegurar que o contribuinte permaneceria nesse regime por um período de três exercícios, uma vez que tal convencimento constitui ele próprio uma falha na execução da sua prestação.
Conclui-se, portanto, que a autora, ao não prestar a informação em causa à sociedade C , cumpriu defeituosamente a sua prestação, pelo que ficou responsável pelos danos que lhe causou, nos termos do artigo 5º do Código Deontológico dos TOC e, tratando-se de responsabilidade contratual, também nos termos do artigo 798º do CC, presumindo-se a sua culpa de acordo com o artigo 799º do mesmo código.
Nos termos dos artigos 562º e seguintes do CC, os prejuízos por que a autora ficou responsável correspondem à mencionada quantia de 3 025,69 euros, que a C teve de pagar por virtude de ter ficado enquadrada no regime simplificado de tributação.
Mais uma vez não tem razão a ré quando alega que não se provou o nexo causal, pois este decorre claramente dos factos provados nos pontos 11 a 14, que são suficientes para demonstrar a causalidade, nada mais sendo necessário provar (cfr neste sentido os acima citados acórdãos do STJ de 21/06/2011 e de 15/12/2011).
Face ao contrato de seguro celebrado ao abrigo do artigo 52º nº4 do Estatuto da Câmara dos TOC entre esta a Câmara e a ré, esta é responsável pelo ressarcimento destes prejuízos (deduzida a franquia), abrangendo a cobertura todos os actos ou omissões cometidos no exercício das suas funções e prevendo o artigo 7º do referido estatuto as várias formas de exercício da actividade de TOC, entre as quais a execução de prestação no âmbito de um contrato.
Com efeito e nos termos já expostos, a omissão de informação aqui em discussão estava dentro das funções da autora como TOC e, portanto, no âmbito da cobertura do seguro.
Improcedem, pois, as alegações da apelante.
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DECISÃO.
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
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Custas pela apelante.

Lisboa, 12 de Janeiro de 2011

Maria Teresa Pardal
Tomé Ramião
Jerónimo Freitas