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HONORÁRIOS
Sumário
I - De harmonia com os critérios normativos a que se alude no art.100º, do EOA, o que releva para efeitos de fixação de honorários, não é tanto o tempo efectivamente despendido pelo mandatário, mas o que seria razoável despender. Por outras palavras: interessa ponderar o que um profissional do foro, em idênticas circunstâncias, e usando de diligência normal, gastaria para executar as mesmas tarefas; II - Os juros a que se refere o art.1167º, al. c), do CC, são juros compensatórios (e não moratórios) destinados a remunerar o mandatário por uma privação de capital que não lhe era exigível que suportasse; 3. Na acção de honorários, os juros de mora são devidos desde a data em que a mandante recebe a nota de honorários. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
1. A., advogada, propôs a presente acção declarativa sob a forma sumária, contra B... C… e D., todos identificados nos autos, pedindo a condenação das rés a pagar-lhe a quantia global de EUR 5.500,00 correspondente a honorários e despesas, bem como juros de mora, vencidos desde a data de recebimento da nota de honorários e vincendos, até integral cumprimento.
2. A acção foi contestada, tendo as rés alegado, em síntese, que as rés C… e D...são partes ilegítimas e, ainda, que o crédito reclamado já prescreveu. Mais alegaram que a nota de honorários enviada pela autora não corresponde ao acordado entre as partes, não aceitando a prestação de todos os serviços constantes daquela.
3. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que condenou as rés, solidariamente, a pagar à autora as quantias de EUR 4.875,00, a titulo de honorários, e de EUR 7,80, a título de despesas, bem como os respectivos juros moratórios, à taxa legal, vencidos desde a data do recebimento da nota de honorários e vincendos, até efectivo cumprimento.
4. Inconformadas, apelam as rés e, em conclusão, dizem:
“1.ª Vem o presente recurso interposto pelas Rés da sentença proferida pela M.mª Juíza a quo de fls. 551 a 560 na parte que decide a acção parcialmente procedente, porque parcialmente provada, e, em consequência, condena as Rés solidariamente a pagar à Autora a quantia, a titulo de honorários, de € 4.875,00, a que acrescem os juros moratórios, à taxa legal, contados desde a data da nota de honorários até efectivo e integral pagamento;
2.ª Com efeito, as Recorrentes, salvo o devido respeito, não concordam com a forma de apreciação da prova, notoriamente errada, sendo que a Mm.ª Juíza a quo não fez igualmente uma correcta aplicação do direito, como passam a expor;
3.ª A fls. 553 da decisão de que se recorre, o Tribunal a quo deu como provados os factos constantes dos pontos 4, 5 e 6, da douta sentença, nomeadamente: Ponto 4. “A 9 de Novembro de 2007 a Ré B…recebeu a nota de honorários remetida pela autora e constante de fls. 138 a 143, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido”; Ponto 5. “Entre Agosto de 2005 e Abril de 2007 a Autora realizou os serviços discriminados na nota de honorários remetida à Ré”, e Ponto 6. “A Autora despendeu no serviço descrito na nota de honorários 65 horas de trabalho”.
4.ª Conforme consta da diligência de resposta à matéria de facto de fls. 395 a 403, nomeadamente fls. 397, dos autos, “a convicção do Tribunal foi adquirida com base na apreciação crítica, conjugada e concatenada, das declarações de parte, do depoimento das testemunhas e dos documentos juntos aos autos”.
5.ª Assim, e em síntese, o tribunal a quo esclareceu que:
a) As Rés colocaram em causa quer a prestação de serviços, conforme constante na nota de honorários, quer a qualificação dos mesmos;
b) Juntou a Autora profusa documentação da qual resulta a realização de telefonemas vários com as partes envolvidas e bem ainda cópias de faxes recebidos e enviados no âmbito das discussões/conversas inerentes ao inventário e questões conexas;
c) Que as testemunhas da Autora revelaram um conhecimento quanto aos serviços prestados pela Autora a favor das Rés, conhecimentos baseados no acompanhamento dos assuntos, revelando-se depoimentos globalmente isentos de contradições, pelo que foram tidos em consideração, embora considerasse o depoimento da testemunha V.. e AQ.. algo lento e o depoimento da testemunha … exacerbado;
d) Quanto às testemunhas das Rés, a sua credibilidade mostrou-se dúbia porque não demonstraram em concreto qualquer conhecimento credível e relevante para os autos, sem mais explicações, e
e) Assim, a análise conjunta da documentação junta aos autos, dos depoimentos das testemunhas e com as declarações de parte ”…possibilitou a prova da realização dos serviços constantes da nota de honorários remetida pela Autora às Rés e junta a fls. 139 a 143 dos autos”, resultando também que “o número de horas de trabalho envolvidas (65) não é desproporcionado à quantidade de assuntos envolvidos. Repare-se que, para quase dois anos de serviço, estamos a falar em menos de três dias completos de trabalho!”
6.ª Na motivação da decisão de facto da douta sentença, a Mm.ª Juíza a quo decide que (cf. sentença de fls. 558 e 559 dos autos):
a) Face aos factos da causa, “…não existindo razão por parte das Rés para o não pagamento integral da factura, a sua conduta viola o disposto nos art. 406.º, n.º 1 e 762.º, n.º 1 do Código Civil, segundo os quais os contratos devem ser pontualmente cumpridos e o devedor cumpre a sua obrigação quando realiza a prestação a que se vinculou.”, Motivo pelo qual a Autora tem direito a receber das Rés o pagamento da quantia peticionada e constante da nota de honorários (cuja contabilização pressupõe a consideração de 65 horas de trabalho);
b) “…. e tendo em conta os serviços de advocacia prestados ( e considerados provados) verifica-se, não obstante, que o preço cobrado à hora – e impugnado – se mostra elevado e incompatível com os referidos enunciados legais”, motivo pelo qual, uma vez que não houve ajuste entre as partes, considera-se justo e adequado o valor de € 75,00 por hora, alicerçando a sua apreciação nos critérios orientadores estabelecidos no art. 65.º, n.º 1 do Estatuto da Ordem dos Advogados (DL n.º 84/84, de 16 de Março) e no art. 1158.º, n.º 2 do CC, e
c) Com base nos art. 804.º, n.º 1, 805.º, n.º 2, al. a) e 806.º, n.º 1, todos do CC, estabelece que a Autora tem direito a receber juros moratórios, desde a data de vencimento da nota de honorários que deverão se calculados enquanto juros civis nos termos do art. 559.º do CC.
7.ª Nos termos do disposto nos art. 685.º-A, n.ºs 1 e 2 e 685.º-B o recurso interposto para este Venerando Tribunal visa a reapreciação de parte da matéria de facto apontada na sentença como provada e erro na determinação das normas jurídicas aplicáveis.
8.ª Por isso, e porque os principais “erros” da sentença resultam, da falta de apreciação correcta da matéria provada, o presente recurso que versa matéria de facto e de direito tem contudo, inevitavelmente, por “grosso” de fundamento o erro notório na apreciação da prova, nomeadamente da matéria alegada no ponto 6. dos factos provados (cf. fls. 553 da douta sentença).
9.ª O Tribunal a quo não avaliou devidamente a matéria de facto, dando uma decisão contrária ao que os elementos de prova documental dos autos dispõem, e que à luz de uma singela interpretação do cidadão comum/ “bom pai de família” teriam outra valorização, a qual se esperava efectivamente da parte da Mm.ª Juíza a quo;
10.ª A sentença recorrida decidiu como facto provado o seguinte: “A Autora despendeu no serviço descrito na nota de honorários 65 horas de trabalho” (cf.. ponto 6. a fls. 553 dos autos), matéria que, salvo melhor opinião de V. Exa., não é sustentada pela prova carreada para aos autos e dele constante, nomeadamente a prova documental, sendo certo que para a convicção da prova concreta do mesmo a Mm.ª Juíza a quo não faz referência ao depoimento de nenhuma testemunha (cf.. fls. 395 a 403 dos autos);
11.ª Mais, o Tribunal a quo não fez uma apreciação crítica e equitativa do facto que deu como provado, e isto porque não valorou correctamente, como deveria, o tempo despendido na prestação de serviços constante da nota de honorários dada como provada.
12.ª Conforme já referido, a fls. 553 da decisão de que se recorre, o Tribunal a quo deu como provados os factos constantes dos pontos 4., 5. e 6. da matéria de facto da douta sentença.
13.ª Da nota de honorários de fls. 138 a 143 resulta, desde logo, que a Autora não faz qualquer referência ao tempo gasto com os serviços prestados, nomeadamente 65h, e não apresentou qualquer definição de critérios ou discriminação de custos por serviço, como era sua obrigação de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados e legislação em vigor, nomeadamente a Portaria n.º 240/2000, de 3 de Maio.
14.ª O Estatuto da Ordem dos Advogados (E.O.A.), no seu art. 95.º estipula - 1 – “Nas relações com o cliente, são ainda deveres do advogado: a) Dar a sua opinião conscienciosa sobre o merecimento do direito ou pretensão que o cliente invoca, assim como prestar, sempre que lhe for solicitado, informação sobre o andamento das questões que lhe forem confiadas, sobre os critérios que utiliza na fixação dos seus honorários, indicando, sempre que possível, o seu montante total aproximado, e ainda sobre a possibilidade e a forma de obter apoio judiciário; “ e no art. 100.º- “1 - Os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa. 2 - Na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respectiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados. 3 - Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais.”
15.ª Para além do regime constante do E.O.A., a Portaria n.º 240/2000, de 3 de Maio impõe aos Advogados a obrigação de dar a conhecer ao cliente o conteúdo do n.º 1 do art. 65.º (à altura dos factos art. 100.º), bem como o valor cobrado por cada hora de trabalho - “…dê indicação aos clientes ou potenciais clientes dos honorários previsíveis que se propõe cobrar-lhes em face dos serviços solicitados, identificando expressamente, além do valor máximo e mínimo da sua hora de trabalho, as regras previstas no n.º 1 do artigo 65.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março …”
16.ª E ainda o Regulamento dos Laudos de Honorários, Regulamento n.º 40/2005 da OA (2.ª série), de 29 de Abril de 2005,diz:
3 - A conta deve enumerar e discriminar os serviços prestados.
4 - Os honorários devem ser separados das despesas e encargos, sendo todos os valores especificados e datados.
17.ª Dado que a Autora, na nota de honorários apresentada, nunca discriminou os valores dos honorários nem estabeleceu nenhum valor/hora, parece óbvio às ora Recorrentes que os honorários pretendidos pela Autora não se referiram ao tempo de trabalho realizado, mas constituíram uma percentagem do valor recebido na herança (15% de € 36.464.040€ = € 5.490.60), valor este que a própria Autora menciona na nota de honorários (cf. fls. 143 dos autos), o que nunca foi acordado previamente entre Mandantes e Mandatária, e até como se retira do teor do documentos junto aos autos a fls. 222;
18.ª A nota de honorários de fls. 138 a 143, bem como a correspondência trocada entre a 1ª Ré e a Autora provam que esta nunca definiu qualquer critério para justificar o montante cobrado, como era sua obrigação e lhe foi solicitado (cf.. fls. 144 e 222 dos autos).
19.ª Por outro lado, pela análise dos serviços constantes da nota de honorários referenciada de fls. 138 a 143 dos autos, constata-se que os mesmos são compostos por 26 telefonemas, 4 cartas, 1 e-mail, 4 faxes, elaboração de 7 documentos, nomeadamente 2 procurações e 5 requerimentos, e 3 deslocações, 2 ao Tribunal de Família e Menores de Lisboa e 1 a Faro para a realização de uma escritura de um imóvel (que na nota de honorários a Autora não identificada o tempo de trabalho útil/efectivo prestado) e análise/leitura de documentos;
20.ª Assim, de acordo com o que a Autora apresentou na sua nota de honorários temos 39 minutos de telefonemas (cf.. fls. 352 a 357 dos autos), e da análise dos documentos elaborados, constata-se que todos os requerimentos revelam um texto convencional e normalizado que não requereu nenhuma elaboração mental, raciocínio ou criatividade e que na totalidade não constituem duas páginas A4, de texto convencional e normalizado (cf.. fls. 39 e 40, 65 a 68, 94/98, 100 e 101 dos autos);
21.ª No final da nota de honorários aparece uma referência vaga e indiscriminada a reuniões e telefonemas diversos para a cliente, atendimento de telefonemas dos Advogados da cabeça de casal, dactilografia e estudo do processo;
22.ª É necessário assinalar que todas as questões inerentes e necessárias à partilha foram resolvidas no espaço de 4 meses, entre Setembro e Dezembro de 2005 (habilitação de herdeiros e relação de bens – 17/10/2005; contrato de arrendamento – 21/10/2005, e contrato promessa de compra e venda – 30/12/2005), e todas elaboradas e realizadas pelo advogado da cabeça de casal, conforme se retira da análise dos documentos de fls. 43, 45 a 47, 48 e 49, 50 a 53, 58 e 60 a 62 dos autos;
23.ª O tempo decorrido não resultou de nenhuma complexidade do processo mas apenas e tão só do prazo decorrido entre a promessa de venda do imóvel e a realização da escritura;
24.ª Conclui o Tribunal a quo pela realização dos serviços prestados na nota de honorários “Como já se referiu, a A. juntou profusa documentação aos autos que instrui a sua actuação, razão pela qual que, coadjuvada com o depoimento das testemunhas e, repete-se, com as declarações de parte (onde salvo diferente tipo de interpretação ou qualificação da actuação da Autora, acabaram por demonstrar, por si só, a realização de diligências juridicamente e burocraticamente necessárias à concretização do intento final: a partilha de bens) possibilitou a prova da realização dos serviços constantes da nota de honorários remetida pela Autora às Rés. e junta a fls. 139 a 143.”;
25.ª De que forma é que a “profusa” documentação determinou ou provou a realização dos serviços referenciados e como quantifica as 65 horas no trabalho realizado é que o Tribunal a quo não explica/fundamenta; a “profusa” que o tribunal refere, privilegiando a quantidade em detrimento da qualidade e natureza dos documentos, não pode fundamentar tal conclusão;
26.ª As Rés nunca negaram que a Autora lhes prestou serviços; a classificação de tempo de trabalho que o tribunal lhes atribui é que não é sustentada pelas provas documentadas nos autos;
27.ª Da “profusa” documentação apresentada pela Autora o que se constata é que a maioria não resulta de nenhum trabalho realizado pela mesma (mas sim pelo M.I. Mandatário da parte contrária), facto que já foi demonstrado e será melhor apreciado em função do tempo gasto, que o Tribunal a quo considerou adequado, mesmo não tendo sido definido pela Autora na nota de honorários a fls. 139 a 143;
28.ª O Tribunal a quo não pode prescindir, em nome da justiça, de uma análise mais aprofundada dos documentos, à luz de uma racionalidade e razoabilidade mínimas;
29.ª Mais, o Tribunal a quo diz que as testemunhas da Autora são consideradas credíveis apesar de considerar o depoimento da testemunha V... lenta (cf.. fls. 398 dos autos), o que significa insegura, sem certeza do que diz, e de A... exacerbado (cf.. fls. 400 dos autos), o que verdadeiramente é o contrário de credível já que exacerbado quer dizer exagerado e, por isso, desligado da realidade;
30.ª No registo das comunicações efectuadas, fornecido como prova pela Autora, o total dos telefonemas são 7 telefonemas para o Tribunal de Família e Menores de Lisboa, que no seu conjunto tiveram a duração aproximada de 19 minutos, e 14 telefonemas para o Sr. Dr. …, que no seu conjunto tiveram a duração aproximada de 20 minutos, tudo num total de 21 telefonemas que duraram 39 minutos (cf.. fls. 352 a 357 dos autos);
31.ª Não é assim compreensível a observação do tribunal no que respeita ao montante de horas (65), pois o Tribunal a quo não enumera, nem elenca os assuntos envolvidos, considerando porém que os mesmos não são desproporcionados ao número de horas alegado pela Autora, dizendo que não são desproporcionados porque “Repare-se que, para quase dois anos de serviço, estamos a falar em menos de três dias completos de
trabalho!”(cf.. fls. 400 dos autos);
32.ª Ora, consideram as Recorrentes que já foi demonstrado que a Autora não prestou 2 anos de serviço, pois o trabalho realizado nos 20 meses em questão não foi constante, e em determinados meses, foi escasso, como se retira da nota de honorários; mais, 65 horas de trabalho são, de acordo com a definição horária do Código do Trabalho, cerca de 9 dias de trabalho, e não 3 como afirma a Mm.ª Juíza a quo;
33.ª Fica, no entanto, registado que a percepção do Tribunal a quo é a de que o trabalho desenvolvido corresponde aproximadamente a 3 dias (aliás incompletos) de trabalho – o que corresponde à percepção das Requerentes de cerca de 21h de trabalho, o que até se constata do laudo de honorários emitido pela Ordem dos Advogados e junto aos autos a fls. 509 a 516 quando refere: “Da nota de honorários apresentada e da resposta da Requerente não se vislumbra uma discriminação do tempo gasto em cada tarefa – excepção feita ao dia de deslocação ao Algarve, em que aferindo a hora de partida e a de chegada computamos 15 horas, sendo que o remanescente terá sido apurado por recapitulação e calculo aproximado. Tendo em conta as actividades referidas pela advogada estamos em crer que a actividade anterior a essa deslocação…. não são tanto adequadas ao dispêndio de 50 horas de trabalho efectivo como pretendido pela requerida, mas antes a 25 horas de trabalho efectivo…, que julgamos adequado.”(cf.. fls. 515 dos autos);
34.ª Por outro lado, o Tribunal a quo fundamenta a determinação do montante dos honorários nos termos do art. 65.º, n.º 1 do DL n.º 84/84, de 16 de Março, decreto-lei este revogado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro e cujo teor do anterior art. 65º tem texto diverso do que se encontra em vigor, nomeadamente o art. 100.º;
35.ª Diz o tribunal a quo, na douta sentença, que “…o preço cobrado à hora – e impugnado – se mostra elevado e incompatível com os referidos enunciados legais” (cf.. fls. 558 dos autos);
36.ª Parte assim o tribunal de um “preço cobrado à hora” cujo valor não se encontra provado pelo tribunal na matéria dada como provada, sendo certo que na nota de honorários de fls. 138 a 143 nada é referido pela Autora nesse sentido;
37.ª Mais, o tribunal a quo considera que € 5.500,00 “são elevados e incompatíveis com os enunciados legais” (cf.. fls. 558 dos autos), mas depois condena no pagamento de € 4.875,00 como sendo um valor justo e compatível, estabelecendo, assim, e salvo o devido respeito, uma conclusão absolutamente incompatível com os princípios subjacentes a qualquer escala de valores;
38.ª Por outro lado o juízo de equidade (palavra que significa igualdade de direitos para ambas as partes) definido pelo Tribunal a quo não se compreende, pois o Tribunal resolve o litigio salientando na sentença proferida os direitos da A. (“tem direito a receber”), mas esquecendo os seus deveres (pois nunca refere a sua obrigação de cumprir com os preceitos estabelecido nos art. 95.º e 100.º do E.O.A. (e não no art.65.º do DL 84/8, de 16 de Março) e na Portaria 240/2000, de 3 de Maio ou no art. 1161.º do C.C.;
39.ª Já quanto às Rés salienta os seus deveres (“têm obrigação de pagar”) mas omite por completo os seus direitos, até mesmo quando lhes dá razão (“os honorários são elevados e incompatíveis com os enunciados legais”) (cf.. fls. 558 dos autos) mas, ainda assim, não têm razão para não pagar!;
40.ª Em conclusão, as Requerentes alegam que: as Rés sempre declararam que queriam pagar (prova de que as Rés queriam pagar é o facto de a 1.ª Ré ter pedido um laudo à O.A – cf.. ponto 8, fls. 553 dos autos); porém, discordaram do montante apresentado e pediram à Autora que discriminasse os serviços (e bem diz o Tribunal) que esta estava obrigada a dar, mas nunca deu (para este facto nunca o tribunal a quo tomou posição!).
41.ª Quanto à decisão sobre o início da contagem da mora dos juros civis devidos pela conta de honorários, vejamos: contestaram as Rés o valor apresentado e pedido pela Autora para pagamento dos serviços realizados;
42.ª Prova desta situação é o facto provado sob o ponto 8: “a Ré ... solicitou em 20.06.2008, um laudo à Ordem dos Advogados que corre termos pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados, com o número de processo .../2008-CS/L, no qual, até à presente data, ainda não foi proferida decisão final.”(cf.. fls. 553 dos autos);
43.ª A final, decidiu a Mm.ª Juíza do tribunal a quo que a 09/11/2007 a Ré ... recebeu a nota de honorários remetida pela Autora e constante de fls. 138 a 143, não tendo as Rés liquidado qualquer valor por conta dos serviços prestados pela Autora (cf.. pontos 4. e 9. dos Factos Provados, fls. 553 dos autos), e condena as Rés a pagar à Autora a quantia de € 4.875,00, a que acresce juros moratórios, à taxa legal, contados desde a data da nota de honorários até efectivo e integral fundamento, fundamentando os juros como civis e calculados nos termos dos art. 559.º, 805.º, n.ºs 1 e 2, al. a) e 806.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código Civil;
44.ª Ora, salvo melhor opinião de V. Exa. a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo fez uma errada aplicação do direito no que respeita ao início para a contagem dos juros de mora civis devidos;
45.ª Vejamos: A indemnização correspondente ao não cumprimento da obrigação contratual pecuniária vigora, em regra, independentemente dos danos efectivamente causados ao credor, nos juros legais a contar da constituição em mora do respectivo devedor (cf. art. 806.º, n.ºs 1 e 2 do C.C.);
46.ª Se é certo que a mora constitui um atraso culposo do devedor no cumprimento da obrigação, quando por causa que lhe seja imputável não realiza a prestação no tempo devido, a referida situação de mora já não se verifica no caso da obrigação incumprida ser ilíquida (cf. 1.ª parte do n.º 3 do art. 805.º do C.C.);
47.ª Tal iliquidez, traduzida no facto de o montante da obrigação a satisfazer pelo devedor não estar ainda apurado, determina a inexistência de culpa daquele no atraso no cumprimento da prestação, a menos que a referida iliquidez decorra de causa que lhe seja imputável, caso em que cessa, então, a regra legal;
48.ª Porém no caso do contrato de mandato o legislador apenas contemplou a incidência de juros moratórios, a cargo do mandante relativamente às despesas feitas pelo mandatário, por estes considerarem indispensáveis no exercício das suas atribuições (cf.. art. 468.º, n.º 1 e 1167.º, al. c) do C.C.), nada estabelecendo quanto a qualquer indemnização de igual natureza no que respeita aos honorários a satisfazer pelo mandante ao mandatário (cf.. art. 470.º e 1167.º, al. b) do C.C.);
49.ª Pelo exposto, entendem as Apelantes que a referida indemnização não é líquida, uma vez que quer a lei quer as partes, não fixaram antecipadamente o seu montante ou o critério da sua determinação – o que é confirmado pela Mm.ª Juíza a quo na sentença quando refere “…não houve ajuste entre as partes…” (cf.. fls. 559 dos autos) – não bastando, em tal situação, para haver mora, que o respectivo devedor seja interpelo para o cumprimento da obrigação;
50.ª Por outro lado, não age culposamente o devedor que se recusa a pagar uma quantia que ache elevado – o que até é confirmado pela Mm.ª Juíza a quo na sentença de que se recorre (cf.. fls. 558) -, como é a hipótese dos autos em cujos honorários foram apenas fixados pelo mandatário no final;
51.ª Com efeito, embora o montante referente aos serviços prestados às Rés, ora Apelantes, se tenha tornado líquido ou especifico para a Autora, através da sua notificação àquelas, tal liquidez não se comunica à obrigação correspondente à retribuição do contrato de mandato celebrado, já que, em tal circunstância, estamos perante um crédito do mandatário apenas por si determinado, sem qualquer sujeição a critérios legais, pelo que é compreensível que seja divergente o juízo do devedor/mandante sobre a forma de cálculo utilizada pelo credor/mandatário para a sua liquidação e, consequentemente, legitimo de ser questionado por parte do mandante o montante discricionariamente exigido pelo mandatário como correspondente à sua retribuição;
52.ª Assim e uma vez que tal liquidez se concretiza com a decisão judicial, devidamente transitada em julgado, proferida sobre o pedido de pagamento dos honorários devidos ao mandatário, onde necessariamente terá de haver lugar à prévia determinação dos mesmos – que a Mm.ª Juíza a quo até determinou em montante inferior ao peticionado - não faz qualquer sentido, salvo melhor opinião de V. Exas., dar como inicio da contagem dos juros de mora peticionados pela Autora a data da recepção pela Ré ... da nota de honorários daquela;
53.ª Em conclusão, apesar de ter havido interpelação da Autora às Rés para pagamento dos honorários, que não foram aceites, somente com a decisão judicial de concretização do pagamento dos honorários (e até em montante inferior ao peticionado como é o caso dos presentes autos), transitada em julgado, serão os juros de mora civis devidos a partir desta decisão (cf. douto Ac. de Apelação da RP de 03/05/2001 (por unanimidade) no âmbito do processo n.º 0130212 em www.dgsi.pt);
54.ª Assim, e fundamentalmente, reafirma-se: encontra-se provado que os serviços prestados estão explanados na nota de honorários e fls. 138 a 143 dos autos;
55.ª Nos termos do art. 5.º do Regulamento dos Laudos de Honorários do Estatuto da Ordem dos Advogados (Regulamento n.º 40/2005 da OA (2.ª série), de 29 de Abril de 2005/ Ordem dos Advogados), a conta de honorários deve enumerar e descriminar os serviços prestados, sendo todos os valores datados e especificados; [1]
56.ª Pela análise do teor da nota de honorários de fls. 138 a 143 dos autos, não podem as Recorrentes deixar de ter em consideração a “normal” actividade que a Autora teve nos autos, onde, como mandatária apenas leu/analisou documentos, fez algumas reuniões e telefonemas (26), elaborou cartas (4), enviou 1 e-mail e faxes (4), as poucas deslocações que fez ao Tribunal de Família e Menores de Lisboa (2), os 5 requerimentos que fez e muito simples, sem a mínima complexidade, e uma deslocação a Faro, Algarve, onde terá de ser calculado o tempo de acordo com o trabalho efectivamente/útil prestado;
57.º Na mesma nota de honorários a Autora não apresentou o valor/hora dos seus serviços nem o tempo dispendido com cada um dos assuntos tratados que elencou;
58.ª Analisando os honorários fixados à luz das regras do art. 100.º, n.º 3 do E.O.A., há que observar a este respeito que a dificuldade do assunto, o grau de criatividade intelectual da prestação e o tempo gasto, referidos naquela disposição, são sem dúvida os mais decisivos, pois reflectem a complexidade da causa e o esforço dispendido pelo advogado;
59.ª Quanto à valoração do critério do “tempo útil” há que considerar o tempo útil de actividade diariamente desenvolvida, ou seja, o tempo gasto tem de corresponder ao trabalho efectivamente desenvolvido (cf.António Arnaud, em “Iniciação à Advocacia”, 5.ª ed. Coimbra Editora, 2000); quanto à valoração da “dificuldade do assunto” tem-se por acima da média, não tanto pela dificuldade especifica do campo de interpretação e aplicação do direito – embora sem a excluir -, mas mais na medida em que se tratou de tratamento de causa a exigir a experiência e saber no domínio das relações negociais em presença, conjugados no jogo das regras jurídicas atinentes e agilidade na coordenação de acções, e quanto à “importância do serviço” prestado atender-se-á essencialmente ao trabalho intelectual consubstanciado no esforço despendido para a satisfatória resolução do problema jurídico no interesse do constituinte e na seriedade com que esse problema é tratado;
60.ª Assim, deveria o Tribunal a quo ter usado um critério de equidade, que tem a sua dinâmica na conjugação e interligação de todos os elementos relevantes disponíveis nos autos, nomeadamente os documentais, à luz da experiência comum de vida, do “bonus pater famílias”, da realidade e razão das coisas, do justo equilíbrio e da serena ponderação e bom senso que o julgador usará com a larga margem de discricionariedade que a lei lhe confere;
61.ª Em suma, a Mm.ª Juíza a quo não explicou, nem justificou as horas necessárias e que foram dispendidas com as diligências efectuadas pela Autora e descritas na nota de honorários, nem demonstrou que tenham sido efectuadas diligências que não fossem normais na resolução do assunto em questão;
62.ª Factos que são “atestados” pelo laudo emitido pela Ordem dos Advogados e junto aos autos a fls. 509 a 516 quando afirma: “Da nota de honorários apresentada e da resposta da Requerente não se vislumbra uma discriminação do tempo gasto em cada tarefa…. Tendo em conta as actividades referidas pela advogada estamos em crer que a actividade anterior a essa deslocação (conferências com a cliente; telefonemas para a parte contrária; telefonemas e faxes de/ e para os sucessivos mandatários da parte contrária; recepção e análise de documentação, designadamente do testamento, relação de bens, contrato de arrendamento, contrato-promessa de compra e venda do imóvel e proposta de partilha; propositura de procedimento para autorização da venda do imóvel pela filha, então menor da requerente, que implicou deslocações e telefonemas para respectivo tribunal e a elaboração de 3 requerimentos adicionais para indicação do parente mais próximo, da relação de bens da herança e da não existência de inventário pendente e para a extinção da instância; …. não são tanto adequadas ao dispêndio de 50 horas de trabalho efectivo como pretendido pela requerida, mas antes a 25 horas de trabalho efectivo, …., que julgamos adequado.”(cf. fls. 515 dos autos);
63.ª Embora sujeito ao geral e comum principio da livre apreciação do tribunal (art. 389.º do C.C., 611.º e 655.º, n.º 1 do C.P.C.), não pode negar-se ao laudo de honorários o valor informativo próprio de qualquer perícia, nem arredar-se o respeito e atenção que deve merecer, dada a especial qualificação de quem o emite (cf. Ac. STJ, Secção Cível (Afonso M Correia), de 27 de Abril de 2006, Proc. 845/06, em CJ T II, 2006);
64.ª Por outro lado, apesar de ter havido interpelação da Autora às Rés para pagamento dos honorários, que não foram aceites, somente com a decisão judicial de concretização do pagamento dos honorários (e até em montante inferior ao peticionado como é o caso dos presentes autos), transitada em julgado, serão os juros de mora civis devidos a partir desta decisão (cf.. douto Ac. de Apelação da RP de 03/05/2001 (por unanimidade) no âmbito do processo n.º 0130212 em www.dgsi.pt);
65.ª Nos termos expostos, que V. Exas. melhor e doutamente suprirão, deve ser admitido, e a final provido o presente recurso, porquanto a sentença recorrida fez uma errada apreciação da prova ao determinar, face, e fundamentalmente, à prova documental existente nos autos, que a Autora despendeu no serviço descrito na nota de honorários remetida à Ré ... 65 horas de trabalho, e sem fundamentar correcta e de forma lógica a sua decisão e errando nas normas jurídicas aplicadas quando não decidiu conforme o disposto nas normas constantes dos art. 805.º, n.º 3, 1.ª parte, 470.º e 1167.º, alínea b), todos do Código Civil no que respeita ao prazo de contagem dos juros de mora devidos.”
5. Nas contra-alegações, pugna-se pela manutenção da sentença.
6. Cumpre apreciar e decidir as seguintes questões:
- Alteração da decisão de facto;
- Fixação de honorários.
- Saber se os juros apenas são devidos desde a data da sentença.
7. É a seguinte a factualidade dada como provada:
1. A Autora é advogada, fazendo da advocacia profissão habitual e lucrativa.
2. A Ré B… é mãe das Rés C… e D… (nascida a 17.04.1985) e …(nascida a 26.01.1989).
3. Em finais de Julho de 2005, a Ré B… contactou a Autora para esta tratar da partilha da herança deixada por óbito de AM….falecido em 16 de Julho de 2005 e de que eram herdeiras as Rés C… e D…e o cônjuge do falecido E….
4. A 9 de Novembro de 2007 a Ré B… recebeu a nota de honorários remetida pela Autora e constante de fls. 138 a 143, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
5. Entre Agosto de 2005 e Abril de 2007 a Autora realizou os serviços discriminados na nota de honorários remetida à Ré.
6. A Autora despendeu no serviço descrito na nota de honorários 65 horas de trabalho.
7. A Autora despendeu EUR 7,80, em despesas de correio.
8. A Ré B… solicitou em 20.06.2008, um laudo à Ordem dos Advogados que corre termos pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados, com o número de Processo .../2008-CS/L, no qual, até à presente data, ainda não foi proferida decisão final.
9. As Rés não liquidaram qualquer valor por conta dos serviços prestados pela Autora.
8. Do recurso de facto:
O art. 685º-B, do CPC estabelece que “quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
Quais os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida (e, caso a prova tenha sido gravada e seja possível a identificação precisa dos depoimentos, deve indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sob pena de imediata rejeição).
Ora, as apelantes limitam-se a indicar os pontos de facto que consideram incorrectamente julgados (os pontos 4, 5 e 6) e a manifestar divergências sobre a valoração da prova levada a cabo pelo tribunal recorrido, sem contudo apontarem em concreto (como se exige na al. b), do nº1 e no nº2, do art. 685º-B, do CPC) quais os meios probatórios que justificam – ponto por ponto - a alteração da decisão de facto, bem como o sentido dessa alteração.
Por seu turno, ao contrário do que alegam, a decisão de facto está devidamente motivada, com indicação minuciosa e extensa análise crítica dos diversos elementos probatórios que a suportam (designadamente quanto aos depoimentos de parte, prestados por B… e D…., aos testemunhos de E… ML e AQ….e à prova documental junta aos autos).
É, assim, patente que a matéria de facto não foi impugnada nos termos legalmente prescritos, pelo que se impõe – sem mais – a rejeição do recurso de facto.
9. Na presente acção, a autora pede a condenação das rés a pagar-lhe, a título de honorários e despesas, a quantia de EUR 5.500,00, acrescida de juros de mora, pelos serviços prestados às rés, discriminados na nota de honorários e despesas de fls. 138-143 destes autos, no período compreendido entre Agosto de 2005 a Abril de 2007, no âmbito de um contrato de mandato forense.
O contrato de mandato forense rege-se pelas disposições comuns do contrato de mandato civil contidas nos artigos 1157.º e ss. do Código Civil e ainda pelas disposições especiais constantes dos artigos 62.º e 92.º a 102.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro.
No caso específico da advocacia, o mandato conferido a advogados presume-se naturalmente oneroso (art. 1158º, nº1, CC).
In casu, a obrigação de pagar a retribuição que ao caso competir, bem como as despesas feitas (art. 1167º, als. b) e c), do CC) nem sequer é posta em causa pelas rés, que apenas divergem quanto ao seu montante.
Vejamos, pois.
Em caso de onerosidade do mandato, a retribuição é estabelecida, em primeiro lugar, com base no acordo das partes. Se este faltar, aplicar-se-ão as tarifas profissionais e, na falta destas, a situação será regulada pelos usos e, apenas se mais nenhum critério for aplicável, haverá que recorrer aos juízos de equidade (art. 1158º, nº2, do CC).
Em relação aos advogados, há ainda que ter em conta as regras constantes do art. 100º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei 15/2005, de 26 de Janeiro [2], em que se estabelece que “os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa” (nº1), cabendo ao advogado, na falta de convenção prévia reduzida a escrito, fixar ele mesmo os honorários, em conta enviada ao cliente com discriminação dos serviços prestados (nº2). Nessa fixação, “deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais” (nº3).
Deste quadro normativo resulta que a fixação de honorários implica a emissão de um juízo discricionário, “não no sentido que se dá à palavra no contencioso administrativo (cf. Freitas do Amaral, in "Direito Administrativo", II, 105 e segs.), antes no sentido civilístico que muito tem a ver com a boa fé que impregna toda a relação contratual e com os inevitáveis poderes do juiz no procedimento das normas contendo conceitos indeterminados pois,, para além da ponderação dos factores aludidos no Estatuto da Ordem dos Advogados, impõe que se atente no laudo da Ordem, se o houver, e se considerem juízos de equidade” (cf. Acórdão do STJ de 02-10-2008, JusNet 3782/2008, também disponível in www.dgsi.pt).
Na verdade, a lei não estabelece qualquer método decisório ou critério legal, antes consagra critérios ou parâmetros referenciais de carácter deontológico/estatutário a serem observados pelos advogados na fixação dos honorários respectivos (Ac do STJ de 1/3/2007 - P. 07A119 (JusNet 774/2007) - in www.dgsi.pt).
Deve, assim, considerar-se a especificidade do trabalho desenvolvido, o tempo despendido, o grau de exigência e dificuldade técnica concretizados em cada caso. Mas, para além disso, devem ser considerados, em termos de decisão equitativa, os custos fixos de um escritório. Menor relevância terá o «resultado obtido», uma vez que a obrigação a que se encontra adstrito o advogado é, essencialmente, uma obrigação de meios e não de resultado – cf. Moitinho de Almeida, Responsabilidade Civil dos Advogados, 1985, pág. 23.
Na acção de honorários, é usual solicitar-se um “laudo” à Ordem dos Advogados, o qual reveste a natureza de “parecer”, destinado a esclarecer o julgador e que, como tal, se encontra sujeito à sua livre apreciação (v., neste sentido, entre muitos outros, o Ac do STJ de 20/1/2010 - P. 2173/06.0TVPRT.P1.S1).
Não obstante, sendo elaborados por profissionais do foro, é manifesto que não se lhes pode negar a autoridade de quem tem um conhecimento específico sobre a matéria, susceptível de aferir, com elevado grau, da razoabilidade e adequação do valor constante da nota de honorários.[3]
No caso concreto, resulta dos factos provados (cf. pontos 4, 5 e 6) que a autora, no período compreendido entre Agosto de 2005 e Abril de 2007, realizou os serviços discriminados na nota de honorários junta a fls, 138-143 e desembolsou também EUR 7,80, em despesas de correio.
A prestação de serviços teve em vista a partilha dos bens que compunham o acervo hereditário de familiar das rés e da sua viúva. [4]
Como decorre dos factos provados, as partes, inicialmente, terão previsto instaurar um processo e inventário e, com essa finalidade, a autora chegou a elaborar o respectivo requerimento inicial. Porém, os interessados acabaram por chegar a acordo, tornando desnecessário recorrer à via judicial. Procedeu-se, então, à venda (extrajudicial) de um imóvel que integrava a herança do “de cujus”. Para tanto, foi instaurada, previamente, uma acção para autorização de venda do dito imóvel (uma vez que uma das herdeiras, ora ré, era à data de menor idade), a qual terminou com a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, logo que aquela atingiu a maioridade.
Para atingir os fins visados com o patrocínio, a autora realizou as tarefas discriminadas na nota de honorários e que, no essencial, se reconduzem a: telefonemas vários; elaboração de requerimentos avulsos; elaboração do requerimento inicial do inventário, bem como da petição inicial da acção de autorização para venda de bem de menor; minuta de procurações; análise de documentos; reuniões com as clientes; duas deslocações ao Tribunal de Família e Menores de Lisboa para entregar peça processual e para saber do estado do processo; deslocação a Faro e Olhão, para reunião com o advogado de uma das interessadas e para a outorga da escritura de compra e venda.
Com os elementos disponíveis nos autos, e sem pretender, minimamente, menosprezar o trabalho desenvolvido pela Exma. advogada, cremos ser indiscutível que a actividade realizada, na sua globalidade, não é de molde a justificar um significativo estudo e esforço intelectual.
Com efeito, estão em causa institutos de reduzida complexidade, cujos contornos estão completamente consolidados na doutrina e na jurisprudência, e em que, além do mais, a autora pôde contar com a colaboração de colegas (com quem manteve os contactos discriminados na nota de honorários) e de profissionais de outros ramos do direito, designadamente para a preparação e outorga da escritura pública de compra e venda do imóvel.
No que toca ao “tempo despendido”, que é, como já se disse, um dos elementos a ter em conta na fixação de honorários, vem provado que a autora despendeu 65 horas de trabalho. Fazendo, porém, apelo aos critérios normativos a que se alude no supracitado art.100º, do EOA, o que releva, não será tanto o tempo efectivamente despendido pelo mandatário, mas o que seria razoável despender. Por outras palavras: interessa ponderar o que um profissional do foro, em idênticas circunstâncias, e usando de diligência normal, gastaria para executar as mesmas tarefas.
Nesta conformidade, atendendo à escassez de elementos de facto que permitam um adequado preenchimento e densificação da «fattispecie» normativa [5] e ao (diminuto) grau de dificuldade das tarefas realizadas parece-nos ser claramente excessivo o tempo despendido pela autora. Somos assim levados a concluir, com decisivo recurso a juízos equitativos, que, usando de normal diligência, as actividades referidas deveriamter sido concluídas com um dispêndio de tempo inferior que não poderia ter ultrapassado as 50 horas de trabalho efectivo.
No que toca ao valor/hora tido em conta na sentença recorrida (isto é, EUR 75,00),[6] inexistindo elementos que permitam fundadamente considerá-lo inadequado (isto é, susceptível de extravasar os pressupostos de «discricionariedade» que é reconhecida nesta matéria), é de manter tal juízo.
Consequentemente, considerando todos os parâmetros atrás referidos, devem os honorários ser fixados em EUR 3.500,00.
10. Juros de mora
10.1. Sustentam as apelantes que, no caso do mandato, o legislador apenas contemplou a incidência de juros moratórios, a cargo do mandante relativamente às despesas feitas pelo mandatário (art. 1167.º, al. c) do C.C.), nada estabelecendo quanto a qualquer indemnização de igual natureza no que respeita aos honorários a satisfazer pelo mandante ao mandatário (art. 1167.º, al. b) do C.C.).
Sem razão.
Na verdade, as apelantes incorrem num erro conceptual: confundem juros moratórios com juros compensatórios.
Ora, os juros a que se refere o art.1167º, al. c), do CC, são juros compensatórios destinados a remunerar o mandatário por uma privação de capital que não lhe era exigível que suportasse. [7]
Nada obsta, portanto, à peticionada condenação em juros de mora.
10.2. Sustentam, também, as apelantes, que, sendo o crédito ilíquido, os juros de mora só são devidos a partir da sentença que procedeu à sua liquidação.
Não lhes reconhecemos razão.
Com efeito:
Estamos no domínio da responsabilidade contratual.
Nos termos do art. 804º, do CC, os juros de mora destinam-se a reparar os danos causados ao credor pelo retardamento (culposo) da prestação que era devida.
Porém, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor - art. 805º, nº3, 1ª parte , do C.C.
Diz-se ilíquida a obrigação cuja existência é certa, mas cujo montante não está ainda fixado.
In casu, a autora enviou a nota de honorários às rés, que a receberam, em 9/11/2007.
Com esta interpelação, a autora liquidou a obrigação, a cujo cumprimento as rés se encontram adstritas. O seu montante pode ter sido – como foi – contestado pelas rés, mas isso não gera iliquidez da dívida.
Desta forma, a sentença que condena as rés a pagar determinada quantia não liquida a obrigação, apenas fixa o quantum devido pelas rés (cf., neste sentido, o ac. do STJ de 27 Abr. 2006, Processo 845/06, JusNet 7906/2006).
Por conseguinte, tal como se decidiu na sentença recorrida, os juros de mora são devidos desde a data do recebimento da nota de honorários.
11. Nestes termos, concedendo parcial provimento ao recurso, acorda-se em condenar as rés, solidariamente, a pagar à autora, a título de honorários, a quantia de EUR 3.500,00, acrescida de EUR 7,80, a título de despesas, bem como os juros moratórios, à taxa legal, vencidos desde 9/11/2007 e vincendos, até integral pagamento.
Custas na proporção do decaimento.
Lisboa, 19.06.2012
Maria do Rosário Morgado
Rosa Maria Ribeiro Coelho
Mara Amélia Ribeiro
------------------------------------------------------------------------------------------------------------ [2] O Tribunal a quo, por lapso manifesto, apoia-se no DL n.º 84/84, de 16 de Março sem ter em conta que este diploma legal foi revogado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro. [3] Estes pareceres, ao abrigo do disposto no art. 525º, do CPC, podem ser juntos nos tribunais de 1ª instância em qualquer estado do processo, pelo que, no caso em apreço, muito embora tenha sido junto aos autos, já depois do encerramento da discussão da causa, mas antes da prolação da sentença, nada obstava - ao contrário do que entendeu a 1ª instância – que fosse tido em consideração. [4] E não de um processo do foro laboral como, por lapso, se escreveu na sentença. [5] Tenha-se presente a natureza essencialmente conclusiva do ponto 6, dos factos provados, bem como a circunstância de a autora nem sequer ter descriminado o tempo gasto em cada uma das actividades descritas na nota de honorários (ao contrário do que impõe o art. 5.º do Regulamento dos Laudos de Honorários do Estatuto da Ordem dos Advogados (Regulamento n.º 40/2005 da OA (2.ª série), de 29 de Abril de 2005). [6] Inferior ao sugerido no laudo da OA e ao peticionado pela autora, mas com o qual esta, não obstante, se conformou. [7] cf. Menezes leitão, Direito das Obrigações, Vol. III, 6ª edição, 446; Pires de Lima e A. Varela, CC anotado, II, 726 e Januário Gomes, Contrato de Mandato, 1990, 111.