NOTIFICAÇÃO ELECTRÓNICA
PRESUNÇÃO JURIS TANTUM
Sumário

I -O artº 21º-A nº5 da Portaria 114/2008 de 06 de Fevereiro consagra uma mera presunção iuris tantum, passível de ilisão nos termos previstos no nº6 do artº 254º do CPC, segundo o qual as presunções da notificação electrónicas só podem ser ilididas pelo próprio mandatário notificado, provando que não foram efectuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida , por razões que não lhe são imputáveis e para tanto não servindo o critério da leitura efectiva, por tal desiderato se não encontrar elencado no texto legal.

Texto Integral

- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães –

I.RELATÓRIO
Nos presentes autos de embargos de executado propostos por JM, J e M, por apenso à execução n.º 3821/09.5TNNF-B, os Embargantes apresentaram incidente prévio que consta de fls. 35 e sgs., onde, em síntese, alegam não terem recebido a notificação para pagamento de multa relativa aos embargos apresentados e cuja falta de pagamento motivou o indeferimento liminar da referida
oposição.
Mais alegam que apesar do sistema constar o registo que o ficheiro foi lido, tal se deve a falso positivo, ou seja, consta que o ficheiro tenha sido lido e recebido pelo Mandatários sem que tal tivesse ocorrido.
Concluem pela falta de notificação do despacho que os condenou no pagamento da multa pela apresentação dos embargos.
Como prova do incidente apresentam:
A indicação de uma testemunha
Requerem ao ITIJ indicações que descrevem.
Procedeu-se à inquirição da testemunha arrolada pelos Embargantes e foram produzidos os demais meios de prova requeridos.
No final foi proferida decisão que terminou com o seguinte dispositivo:
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente por não provado o incidente, pela
falta de notificação do despacho que determinou o pagamento da multa, deduzido pelos
Embargantes JM, J e M.
Custas do incidente pelos Embargantes fixando-se a taxa de justiça em duas UC's.

Descontentes com esta decisão os embargantes apresentam recurso que terminam com as seguintes conclusões:

A- A decisão em causa não considerou, para efeitos de prova que não se logrou estabelecer nos autos que o endereço IP identificado no programa CITIUS corresponde ao endereço atribuído ao mandatário da Recorrente; E tal facto, porque documentalmente estabelecido, deveria ter sido dado como provado;
B- A decisão em causa não atentou ao regime legal em vigor ao tempo da prática do acto, nomeadamente, não atentou que, em Dezembro de 2012, ainda não estava vigente o actual Código de Processo Civil, que apenas entrou em vigor em 1 de Setembro de 2013, por força do disposto na Lei n.º 41/2013 de 26 de Junho Ut Art.º .8º, não estando assim em vigor os Arts. 132º e 248 na actual redacção do Cód. De Proc. Civil, mas sim a redacção do Art.º 254º do CPC, e em particular o regime do Art.º 254º n.º 6 referente às transmissões electrónicas de dados, na medida em que a Portaria n.º 114/2008 não alterou o regime do Dec.-Lei n.º 290-D/99;
C- Não obstante o IGFEJ ter informado que na área reservada de login do mandatário da Recorrente, existe a informação de que com o uso do login do mandatário, foi acedida a notificação, não foi possivel estabelecer que o IP utilizado para o efeito, corresponde ao mandatário da Recorrente;
D- O mandatário da Recorrente juntou aos autos documento contendo a comprovação de diversas questões referentes a problemas do funcionamento das notificações no âmbito do funcionamento do programas CITIUS;
E- É facto de conhecimento comum, e notório, a existência de Keyloggers Trojans, ou seja, virus concebidos para aceder e localizar binómios utilizador/palavra passe, sendo frequente a apropriação deste tipo de dados;
F- O sistema CITIUS, não se enquadra no conceito de equipamento de comunicação que assegure a efectiva recepção de comunicação enviada por documento electrónico, na medida em que, o sistema não regista o equipamento electrónico a que a mensagem se dirige, não tendo assim a força probatória prevista no Artº 6º do Dec.-Lei n.º 290-D/99 de 2 de Agosto, nem tendo registo de autenticação por via de chave pública; Por tal facto não vale, nos termos e para efeitos do disposto no Art.º 6º do Dec.-Lei n.º 290-D/99 de 2 de Agosto como transmissão electrónica de dados;
G- Com efeito, apenas o envio de peças processuais para o sistema por parte dos mandatários tem o registo de chave pública e privada e aposição de assinatura digital do advogado, emitindo o sistema um registo de recepção, e de identificação de assinatura do mandatário, o que não sucede com as comunicações do acto judicial colocado na área reservada;
H- A colocação em área reservada das notificações, não corresponde ao envio a que se reporta o Art.º 6º do regime jurídico das comunicações electrónicas, não representando assim uma comunicação electrónica de dados;
I- Ilide a presunção do Art.º 254º n.º 6 do Cód. de Proc. Civil ao tempo em vigor, a ausência de prova de que o IP de acesso a dada notificação, não pertence ao mandatário a que esta se destina
J- A final, a decisão deve ter-se ainda por nula, por omissão da prestação de prova que foi requerida pela Recorrente, e devidamente deferida, mas a que o IGFEJ não deu resposta, nomeadamente, se ocorre o registo da assinatura do mandatário no momento de acesso, bem como se processa a recepção de mensagens pelo destinatário, e os respectivos ficheiros de leitura e de comprovação de entrega;

Termos em que, deve ao presente recurso ser concedido provimento e em conformidade, revogada a douta decisão proferida nos presentes autos, como é de J U S T I Ç A

Não temos conhecimento da existência de contra-alegações

O recurso foi recebido como de apelação com efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.
Tudo visto, cumpre decidir.
Como consabido, são as conclusões extraídas pelos recorrentes da sua motivação que definem o objecto do recurso e bem assim os poderes de cognição do tribunal ad quem.
O que se questiona no caso em apreço prende-se em saber se se:
. a sentença é nula por omissão de prestação da prova;
.se deve manter-se a decisão recorrida ou se deve ser substituída por outra nos termos pedidos em sede recursória.

*

II.FUNDAMENTAÇÃO
OS Factos:

Na decisão recorrida foram considerados assentes para a boa decisão da causa os seguintes factos:
1- Foi enviado ao I.L. Mandatário dos Embargados a notificação com a ref.ª n.º
571893 do despacho que determinou que os mesmos procedessem ao pagamento da
multa em falta;
2- A notificação referida em 1 foi depositada na área de notificações electrónicas do Citius - Mandatários em 03-12-2012, 09:42:22, encontrando-se marcada como lida em 03-12-2012, às 15:30:56;
3- O IGFEJ não tem conhecimento da existência de erro relativamente ao facto
das notificações estarem marcadas como lidas mas não o serem efectivamente.
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Nada mais se apurou com interesse para a presente decisão, nomeadamente que:
1 - Os Embargantes não terem recebido a notificação para pagamento de multa
relativa aos embargos apresentados.
2 - Apesar do sistema constar o registo que o ficheiro foi lido, tal se deve a falso
positivo, ou seja, consta que o ficheiro tenha sido lido e recebido pelo Mandatários sem que tal tivesse ocorrido.

O Direito:
Da nulidade da sentença
Os Recorrentes alegam que a decisão deve ter-se por nula, por omissão da prestação de prova que foi requerida pela Recorrente, e devidamente deferida, mas a que o IGFEJ não deu resposta, nomeadamente, se ocorre o registo da assinatura do mandatário no momento de acesso, bem como se processa a recepção de mensagens pelo destinatário, e os respectivos ficheiros de leitura e de comprovação de entrega- conclusão J.
As nulidades de julgamento fundadas em omissão, devem ser invocadas em sede de recurso, tal como decorre do artigo 668º n.º 4 do CPC.
Constata-se, porém que a eventual omissão apontada pelos Recorrentes não respeita à sentença, mas sim a anterior acto processual que carecia de ser arguida atempadamente para poder ser conhecida.
De efeito, as nulidades processuais derivadas da omissão de acto que a lei prescreva devem ser arguidas perante o juiz pelos interessados nos termos dos artigos 196º e 197º do NCPC/ ao tempo artºs 202º e 203º do CPC [cf. neste sentido Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código do Processo Civil” em anotação ao artigo 627º do CPC, 2ª ed., p. 24].
Nesta perspetiva o caminho seguido deveria ter sido o da arguição da nulidade por via do artigo 205º/actual 199º do CPC que porque não incluída em nenhuma das previstas no artigo 206º n.ºs 1 e 2, deveria ter sido deduzida no prazo de 10 dias após o conhecimento da mesma – artigo 149º nº 1 do CPC.
E depois do decidido, sim, a interposição do recurso ao abrigo das normas gerais de recurso- artºs 627º e sgs do CPC.
Não tendo sido seguido este caminho é extemporânea a arguição da nulidade.

Da impugnação da matéria de facto
1 — Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes- artº 640 do CPC.
Da leitura das alegações do recurso interposto resulta manifesta a discor­dância dos recorrentes quando à decisão sobre a matéria de facto dizendo que: “A decisão em causa não considerou, para efeitos de prova que não se logrou estabelecer nos autos que o endereço IP identificado no programa CITIUS corresponde ao endereço atribuído ao mandatário da Recorrente; E tal facto, porque documentalmente estabelecido, deveria ter sido dado como provado”
Assim, no corpo das alegações e conclusões os Recorrentes deram satisfação à exigência contida no n.º 1, a), do artigo acima transcrito.
No que respeita à indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo os Recor­rentes invocam a prova documental.
Ora requerendo a análise de docu­mentos que não concretizam – e são muitos os que constam dos autos pois a apreciação do incidente em apreço iniciou-se no ano de 2012 e terminou em 2017- os recorrentes não cumprem o ónus de especi­ficação imposto pelo n.º 2, b), do art.º 640º do Novo C. P. Civil.
Acresce dizer que não só a factualidade em causa é irrelevante pelos motivos que melhor resultarão expostos na apreciação do demais do recurso, como o ónus da prova da mesma compete aos recorrentes que a alegaram no processo e se comprometeram a juntar o respectivo documento (ver acta de fls. 87- audiência de julgamento de 28.04.2014) e nada juntaram.

Da Solução Jurídica
O essencial da controvérsia aqui em causa radica na questão de se saber exactamente a data em que se consideram notificados os apelantes da decisão que indeferiu liminarmente por falta de pagamento de multa da oposição deduzida nos autos e de despachos anteriores a esta decisão
Pois bem.
São várias as notificações aqui questionadas. Tais notificações estão documentadas a fls. 26,27,30 e 32 dos autos, realizadas no sistema informático CITIUS, com datas de 25.10.2012; 03.12.2012 (esta para efectuarem o pagamento da multa considerada em falta e devida nos termos do artº 145 nº5 do CPC) e de 27.03.2013.
Ocorrendo, contudo, que o contexto processual apurado revela e no que respeita a esta ultima notificação que se encontra marcada como lida em 03.12.2012 15.30:56 (nº 2 dos F.P).
Vejamos então. Tratam-se de notificações por transmissão electrónica de dados e realizadas através do sistema informático CITIUS.
Nelas se contém certificada a data da respectiva elaboração e estão dirigidas ao mandatário constituído dos apelantes.
A tramitação electrónica dos processos, a que começou por se referir a Lei nº 14/2006, de 26 de Abril, aditando ao Código de Processo Civil o artigo 138º-A, veio também a ser tratada pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto. Além disso, e em regulamentação da matéria, veio a ser publicada a Portaria nº 114/2008, de 6 de Fevereiro, entretanto objecto de sucessivas alterações, a mais relevante das quais, porventura, introduzida pela Portaria nº 1538/2008, de 30 Dezembro.
Entretanto, o regime geral de que as notificações às partes em processos pendentes são feitas na pessoa dos seus mandatários judiciais (artigo 253º, nº 1, do Código de Processo Civil) manteve-se; bem como a presunção de que a notificação postal se considera feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja (artigo 254º, nºs 1 e 3). Porém, com a implementação do projecto CITIUS, visando criar condições para uma tramitação processual mais célere através da utilização de sistemas informáticos, houve necessidade de proceder a alguns ajustamentos.
Na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 303/2007, o artigo 254º, nº 2, do Código de Processo Civil, veio prevenir a notificação aos mandatários das partes, nos termos definidos na portaria prevista no nº 1 do artigo 138º-A. Acrescentando o nº 5, do mesmo artigo, que a notificação por transmissão electrónica de dados se presume feita na data da expedição. E o seu nº 6, que as presunções estabelecidas só podem ser ilididas pelo notificado provando que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis.
De seu lado, o artigo 21º-A, da Portaria nº 114/2008, nesta introduzido pela Portaria nº 1538/2008, veio estabelecer, ao que agora importa considerar, e sob a epígrafe “notificações electrónicas”:
«1 – As notificações por transmissão electrónica de dados são realizadas através do sistema informático CITIUS, que assegura automaticamente a sua disponibilização e consulta no endereço electrónico http://citius.tribunaisnet.mj.pt.
2- Quando as notificações sejam realizadas por transmissão electrónica de dados, não há lugar a notificações por qualquer outro meio
4 – As notificações às partes em processos pendentes são realizadas por transmissão electrónica de dados, na pessoa do seu mandatário ...
5 – O sistema informático CITIUS assegura a certificação da data de elaboração da notificação, presumindo-se feita a expedição no terceiro dia posterior ao da elaboração, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o final do prazo termine em dia não útil.
Assim, antes da entrada em vigor do Novo C. P. Civil, para efeitos de determinação das datas das notificações electrónicas, existiam duas presunções:
1ª – a contida no art.º 254º, n.º 5, do C. P. Civil de que a notificação por transmissão electrónica de dados se presume feita na data da expedição e,
2ª – a contida no n.º 5 do art.º 21º-A da Portaria 1538/2008, de 30 de dezembro, que presume que a expedição é feita no terceiro dia posterior ao da elaboração da notificação, ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o final do prazo termine em dia não útil.
No que respeita a notificações dispõe o art.º 248º do Novo C. P. Civil:
Os mandatários são notificados nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º, devendo o sistema informático certificar a data da elabora­ção da notificação, presumindo-se esta feita no 3.º dia posterior ao da elaboração ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja.
Esta disposição, universalizando o regime da notificação electrónica, incorpora a presunção que constava do nº 5 do art.º 21º-A da Portaria nº 114/2008, de 6 de Fevereiro, nada resultando da mesma que a notificação se considere ou presuma efectuada no dia em que o correio electrónico for lido, mas tão somente que a mesma se considera efectuada no 3º dia posterior ao da sua elaboração no sistema informático.
Pelo facto da lei não ter estabelecido a forma da ilisão desta presunção – tanto no Novo C. P. Civil, como na Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, que regulamenta a tramitação electrónica dos processos, na sequência da revogação da Portaria 114/2008, não se pode concluir que a legitimidade para tal pertence a qualquer uma das partes ou ao tribunal.
Note-se que os normativos, que aqui são os aplicáveis e até os actuais não fazem qualquer alusão à leitura do documento, mas apenas à sua elaboração e à sua expedição.
Essa leitura, no caso efectuada a 03.12.2012 15.30:56 não tem a virtualidade de ilidir a presunção de conhecimento no terceiro dia útil seguinte; é que, como se disse, é uma presunção que apenas pelo notificado pode ser ilidida, provando ele que não foi efectuada a notificação ou que ocorreu em data posterior à presumida; e para tanto não servindo o critério da leitura efectiva, por tal desiderato se não encontrar elencado no texto legal.
Mais – se o dia da leitura marcasse a data da notificação, esvaziadas de conteúdo ficariam os normativos dos artigos 254º do Código de Processo Civil e da Portaria nº 1538/2008, o que não é o caso- neste sentido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo nº 86/05.1 TBRSD.P1. S1 com data de 19.01.2012 (relator Ex Sr Conselheiro Granja da Fonseca).
Assim, exigindo a lei que as presunções da notificação só podem ser ilididas pelo próprio mandatário provando que não foram efectuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis, não podendo essa elisão ser efectuada pelo critério da leitura da peça processual percebe-se a apontada irrelevância do apuramento do IP que efectuou a leitura e mesmo até se esta foi efectuada.
Também esta ilisão da presunção de notificação não pode ser levada a cabo por qualquer tipo de prova (por ex. documentos contendo a comprovação de diversas questões referentes a problemas do funcionamento das notificações no âmbito do funcionamento dos programas CITIUS reportadas a datas e anos anteriores). Nomeadamente não pode ser um mero documento particular interno que pode destruir a força probatória que deve ser ligada a um documento oficial – que tem a força probatória de um documento autêntico, nos moldes do artº 371 nº1 do CPC- como é o emanado do Citius. Principalmente quando esse sistema confirma ou atesta que a notificação foi disponibilizada e como lida em determinado momento. Só a demonstração de que tal atestação é material ou ideologicamente falsa, ou eventualmente decorre de um erro do próprio Citius, parece poder ter impacto bastante para destruir o seu efeito, que é o de se ter a notificação por efectuada- neste sentido acórdão da Relação de Coimbra proferido no processo nº 4054/07.0TBLRA.Ci disponível i www.dgsi.pt.
No caso em apreço, não obstante todos os esforços do Tribunal que deferiu todas as diligências probatórias requeridas pelos recorrentes a verdade é que se apurou que foi enviado ao I.L. Mandatário dos Embargados a notificação com a ref.ª n.º 571893 do despacho que determinou que os mesmos procedessem ao pagamento da multa em falta;
A notificação referida em 1 foi depositada na área de notificações electrónicas do Citius - Mandatários em 03-12-2012, 09:42:22, encontrando-se marcada como lida em 03-12-2012, às 15:30:56; - F.P nº 1 e 2.
É certo que não ocorre o envio da notificação para o endereço electrónico.
É que o já descrito artº 21.º-A da Portaria n.º 114/2008, de 06 de Fevereiro estabeleceu uma arquitectura de notificações digitais não assente em qualquer envio de conteúdos mas no depósito de dados electrónicos numa página de Internet, em http://citius.tribunaisnet.mj.pt – cf. respectivo n.º 1;
O sistema informático CITIUS – que corresponde à denominação oficial dessa arquitectura garante, aí e por essa via, exclusivamente, a disponibilização automática e consulta dos conteúdos que por tal sistema se visam transmitir.
Os destinatários da informação não a recebem, assim, realmente, antes têm que assumir a iniciativa de a ela aceder, de alguma forma prevendo a possibilidade da sua disponibilização.
Tais utilizadores são, para o efeito, sujeitos a um prévio processo de registo sendo que, só após o mesmo, nos termos do estabelecido no n.º 3 do art. 4.º da referida Portaria, lhes «são entregues os elementos secretos, pessoais e intransmissíveis que permitem o acesso à área reservada do sistema informático CITIUS».
Esta metodologia, assumida no pioneiro sistema de desmaterialização processual luso, não gera contactos imediatos pois se bem que a informação seja de imediato disponibilizada, nada garante que a mesma seja também de imediato acedida, antes dependendo das rotinas, agendas e métodos de trabalho dos destinatários.
Sob um tal contexto – caracterizado por a informação ser enviada para o exterior sem se saber quando atingiu o destinatário – o legislador decidiu estabelecer um prazo de compensação das assimetrias de contacto com a informação, ou seja, um lapso em que ficicionou o «toque» com o receptor da comunicação.
Por assim ser é que o n.º 5 do referenciado art. 21.º-A veio estatuir que: «O sistema informático CITIUS assegura a certificação da data de elaboração da notificação, presumindo-se feita a expedição no terceiro dia posterior ao da elaboração, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o final do prazo termine em dia não útil».
Este prazo tem, consequentemente, natureza idêntica ao correspondente à chamada «dilação postal» erigida pelo n.º 3 do art. 1.º do DL 121/76, de 11.03 – aí, procurava-se, homogeneizar e produzir certeza e segurança face à heterogeneidade e assimetria temporal da distribuição postal; no novel regime, pretende-se atingir os mesmos objectivos;
Mas com esta metodologia não deixa de existir uma relação directa entre notificante e notificado, e devido à certeza e eficácia dos seus instrumentos (software/hardware) implica uma transmissão de dados muito mais célere (automática e instantânea) e fidedigna.
Decorrentemente do exposto, concluímos que não foi operada a ilisão da presunção da notificação assim se mantendo a decisão recorrida ainda que com fundamentos diferentes.
Improcede, assim, a presente apelação, com custas pelos recorrentes que ficaram vencidos na (s) sua pretensão (ões) (artº 527º nº1 e 2 do CPC).

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Sumariando.
I -O artº 21º-A nº5 da Portaria 114/2008 de 06 de Fevereiro consagra uma mera presunção iuris tantum, passível de ilisão nos termos previstos no nº6 do artº 254º do CPC, segundo o qual as presunções da notificação electrónicas só podem ser ilididas pelo próprio mandatário notificado, provando que não foram efectuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida , por razões que não lhe são imputáveis e para tanto não servindo o critério da leitura efectiva, por tal desiderato se não encontrar elencado no texto legal.

III. DECISÃO

Termos em que se acorda, na confirmação da decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Notifique.
Guimarães, 22 de Junho de 2017
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

(Maria Purificação Carvalho)
(Maria dos Anjos Melo Nogueira)
(José Cravo)

1 - Relator: Maria Purificação Carvalho
Adjuntos: Desembargadora Maria dos Anjos Melo Nogueira
Desembargador José Cravo