PRESTAÇÃO SUPLEMENTAR POR PESSOA A CARGO
SUBSÍDIO POR ELEVADA INCAPACIDADE PERMANENTE
REQUISITOS
IMPOSSIBILIDADE
MERA DIFICULDADE
Sumário

I - A prestação suplementar por pessoa a cargo prevista no art. 48º, nº 3, al. a) e o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente a que se reporta o art. 67º, ambos da Lei 98/2009, são devidos em caso de conversão da ITA em IPA por via do art. 22º da mesma.
II - Constitui requisito necessário da atribuição de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa a que se reporta o art. 53º da Lei 98/2009 que o sinistrado não possa, por si só, prover à satisfação das suas necessidades básicas, pelo que, provando-se apenas que o sinistrado tem dificuldade na execução das tarefas necessárias, tal não se mostra suficiente a essa atribuição.
III - A aplicabilidade do fator de bonificação de 1,5 previsto no º 5 das Instruções Gerais da TNI não é incompatível com a IPATH.

Texto Integral

Processo nº 425/14.4TTPNF.P1
Relatora: Paula Leal de Carvalho (Reg. 1025)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

Participado acidente de trabalho em que figura como sinistrado (A.) B... e entidade responsável C..., SA por aquele sofrido aos 07.03.2013, realizou-se, na fase conciliatória do processo, exame médico singular e tentativa de conciliação, na qual, o A. declarou ter sido vítima, no mencionado dia, de um acidente de trabalho ao serviço da empregadora D..., Ldª, auferindo a retribuição anual de €800,00 x 14 + €133,10 x 11, cuja responsabilidade se encontrava transferida para a Ré e, de acordo com o mencionado exame que lhe atribuiu o coeficiente de desvalorização de 100% (IPA) a partir de 07.09. 2015, data em que se completaram 30 meses após o acidente, reclamou o pagamento da “pensão anual, vitalícia e atualizável de €10.131,28”, acrescida da prestação de 10% por familiar a cargo (relativamente a filha menor) no montante de €1.266,44, bem como a prestação suplementar para assistência a 3ª pessoa, no valor mensal de €416,14 a partir de 08.09.2015, o subsídio de elevada incapacidade permanente de €5.533,70€ e 25,00€ a título de despesas de deslocação. Tal tentativa frustrou-se por a Ré, tendo embora aceite a existência e caracterização do acidente como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre o mesmo e as lesões, a retribuição declarada e transferida e o pagamento das despesas de transporte, ter no entanto discordado do grau de incapacidade atribuído no exame médico singular, não aceitando também a necessidade de auxílio de 3º pessoa, bem como o acréscimo da pensão por familiar a cargo.

O A., patrocinado pelo Ministério Público, apresentou petição inicial, reafirmando e reclamando, em síntese, o já acima referido (salvo quanto às despesas de transporte, tendo reclamado, na p.i., €16,00), designadamente que, em consequência das lesões sofridas no acidente, ficou a padecer de uma IPA (100%) a partir de 07.09.2015, data em que se completaram 30 meses após o acidente. Para além do referido, reclamou ainda juros de mora vencidos (estes no montante de €357,70) e vincendos até integral pagamento.

A Ré contestou alegando, em síntese, que: a data da alta definitiva é aos 07.04.2016, data a partir da qual o A. ficou afetado da IPP de 24,4%, com IPATH; não aceita a necessidade de auxílio de 3ª pessoa e, considerando o grau de incapacidade, a prestação por familiar a cargo não é legalmente devida. Requereu exame por junta médica e apresentou quesitos.

Após prévia audição das partes, ao que deram o seu acordo, foi pelo Tribunal a quo considerado que, em causa nos autos, estavam questões “de índole marcadamente técnica, questões médicas, para as quais em última instância estão habilitados para responder os Senhores Peritos Médicos”, havendo sido determinado, por apelo ao princípio da adequação formal e ao dever de gestão processual, que “os presentes autos seguem os seus termos com a realização de uma perícia médica ao sinistrado, por junta médica a realizar nos próprios autos.”.

Realizado, aos 29.06.2016, com continuação aos 16.11.2016, exame por junta médica, conforme respetivos autos, entenderam os Srs. Peritos médicos, por unanimidade: como data da consolidação das lesões, a de 07.04.2016; que o sinistrado se encontra afetado da IPP de 0,265 com IPATH; que não carece de auxílio de 3ª pessoa.

Foi, pelo Mmº Juiz, designada data para uma tentativa de conciliação, a qual se frustrou por “divergência quanto ao peticionado pelo autor relativamente ao período de 07-09- 2015 a 7-04-2016.”, na sequência do que foi determinado pelo Mmº Juiz o prosseguimento da ação, com a notificação das partes para apresentação de meios de prova “quanto à questão e matéria que ainda se mostra controvertida” e com a realização de audiência de discussão e julgamento.

Realizada a audiência de julgamento (com produção de prova testemunhal), foi, após, aos 08.03.2017, proferida sentença, que decidiu da matéria de facto e julgou a ação nos seguintes termos:
“Pelo exposto, e sem necessidade de ulteriores considerações, julgo a presente acção parcialmente procedente e em consequência:
A) Decido que o sinistrado B..., no dia 07 de Março de 2013 sofreu um acidente de trabalho, em consequência do qual sofreu uma incapacidade permanente de 100% desde 07.09.2015 até 07.04.2016;
A1) Condeno a Ré C..., S.A. a pagar ao Autor B... a pensão anual de €10.131,28 com início a 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, bem como os proporcionais do subsídio de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 dessa pensão;
A2) Condeno a Ré C..., S.A. a pagar ao Autor B... a prestação a cargo relativamente à filha do autor, E... no valor de €1.266,44, com início a 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, a ser paga nos mesmos moldes da pensão referida em A1), bem como os proporcionais do subsídio de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 dessa prestação;
A3) Condeno a Ré C..., S.A. a pagar ao Autor B... a quantia de €5.533,70 referente a subsídio de elevada incapacidade permanente relativo à incapacidade permanente absoluta para qualquer trabalho entre 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016;
A4) Condeno a Ré B..., S.A. a pagar ao Autor B... a prestação suplementar por assistência de terceira pessoa na quantia máxima de €5.533,70, com início a 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, correspondendo cada montante mensal a 1/14 da aludida quantia máxima de €5.533,70, bem como os proporcionais do subsídio de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 dessa quantia máxima;
A5) Condeno a Ré C..., S.A. a pagar ao Autor B... os respectivos juros de mora à taxa legal sobre as quantias supra aludidas, desde as respectivas datas de vencimento até integral pagamento;
B) Decido que o sinistrado B... em consequência do acidente de trabalho referido em A) passou a sofrer, a partir de 07.04.2016 de uma desvalorização permanente parcial para o trabalho de 0,265 com IPATH (IPP de 26,50% com IPATH);
B1) Em consequência, condeno a Seguradora C..., S.A. a pagar ao sinistrado B... uma pensão anual, actualizável e vitalícia no valor de €7.003,25 (sete mil e três euros e vinte e cinco cêntimos), devida a partir de 08 de Abril de 2016, a ser paga mensalmente até ao 3º dia de cada mês e no seu domicílio, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, acrescida de subsídios de férias e de Natal, no valor de 1/14 cada da pensão anual, a serem pagos nos meses de Junho e Novembro de cada ano, respectivamente, bem como dos juros de mora desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento;
B2) condeno a Seguradora C..., S.A. a pagar ao sinistrado B... a quantia de €4.313,52 (quatro mil trezentos e treze euros e cinquenta e dois cêntimos) referente a subsídio de elevada incapacidade permanente relativo à incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, acrescida dos juros legais de mora desde a data de vencimento até integral pagamento;
B3) condeno a Seguradora C..., S.A. a pagar ao sinistrado B... a quantia de €16,00, a título de despesas com deslocações a Tribunal e ao Gabinete Médico-Legal de Penafiel, acrescida de juros de mora á taxa legal desde 05-11-2015 até integral e efectivo pagamento.
B4) condeno a Seguradora C..., S.A. a prestar e a manter o tratamento e acompanhamento do sinistrado B... nos serviços clínicos da seguradora por medicina dentária decorrente do traumatismo dentário referido no auto de exame de junta médica de fls.189 a 191.
C) Absolvo a Seguradora C..., S.A. do demais contra si peticionado na presente acção.

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Custas e despesas a cargo da Seguradora, incluindo os encargos com os exames realizados -artigo 17º, nº8, do RCP.
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Valor da causa: €119.630,34 (artigo 120º do Código do Processo do Trabalho).”.

O A. apresentou pedido de reforma da sentença, para tanto alegando que:
Do ponto B) do segmento decisório resulta que o A. ficou, a partir de 07.04.2016, a padecer de IPATH (com IPP de 26,5%), pelo que lhe deve ser aplicado o fator de bonificação de 1,5 previsto no nº 5 das Instruções Gerais da TNI, em consequência do que o grau de IPP deverá ser fixado, a partir dessa data, em 39,75% e a pensão anual e vitalícia ser corrigida para o valor de €7.338,85 já que, na sentença, não foi tido em conta o mencionado fator.
No ponto A3) do segmento decisório foi a Ré condenada a pagar-lhe o subsídio de elevada incapacidade permanente relativo à incapacidade permanente absoluta para qualquer trabalho entre 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, no montante de €5.533,70 e, no ponto B2) do mesmo, foi a Ré condenada a pagar-lhe tal subsídio referente à incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, no montante de €4.313,52, acrescida dos juros legais de mora desde a data de vencimento até integral pagamento. Tendo em conta que o mencionado subsídio consubstancia uma prestação única, deverá ser eliminada a condenação constante do ponto B2).

A Ré veio recorrer da sentença tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Decorridos 18 meses após o acidente, se o sinistrado ainda não estiver curado, deve ser submetido a exame pelo perito médico do tribunal, a fim de ser- lhe ser atribuído um grau de incapacidade permanente, que poderá ser igual ou não ao grau de Incapacidade temporária que lhe tenha sido atribuído pela entidade responsável.
2. Seguidamente, o Ministério Público promoverá a tentativa de conciliação, seguindo-se os demais termos do art. 108.º e seguintes do CPT a, fixada a incapacidade e o montante da pensão (por acordo das partes ou por decisão do juiz) a situação só poderá ser alterada por via do incidente de revisão.
3. Assim, a conversão da incapacidade temporária em incapacidade permanente não é automática, pelo menos relativamente ao grau de incapacidade; sendo este o que vier a ser fixado pelo perito médico do tribunal, na referida reavaliação, se as partes estiverem de acordo com o laudo do perito ou será o que vier a ser fixado pelo juiz, após a eventual realização de junta médica, se alguma das partes não concordar com aquele laudo.
4. No caso concreto, a perícia médica a que o Sinistrado foi submetido à data de 05/11/2015 limitou-se a converter em permanente a incapacidade temporária do Sinistrado, decorridos que estavam 18 meses; sendo certo que, o Sinistrado encontrava-se, ainda, num quadro clínico evolutivo, sem que houvesse sido alcançada a consolidação das lesões.
5. Não pode o grau de incapacidade assim atribuído ter-se por definitivo e somente passível de alteração através de um incidente de revisão, pois que esta conversão da incapacidade foi imediatamente seguida da marcação de tentativa de conciliação, que culminou na realização de um exame por junta médica.
6. Em sede de Junta Médica, veio, efectivamente, a ser unanimemente considerado que o Sinistrado se encontra afectado de uma IPATH de 26,5%, desde a data da consolidação das suas sequelas, ocorrida a 07/04/2016, não necessitando de auxílio de terceira pessoa.
7. Não se tendo confirmado uma situação de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho do Sinistrado - nos termos em que o exige a al. a) do n.º 3 do artigo 48.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro - jamais seria devida a prestação a cargo relativamente à filha do Autor, devendo a condenação da al. A2) da douta Sentença recorrida ser eliminada.
8. Não se tendo confirmado uma situação de necessidade de auxílio de terceira pessoa por parte do Sinistrado, jamais seria devida a prestação suplementar por assistência de terceira pessoa, devendo a condenação da al. A4) da douta Sentença recorrida ser eliminada.
9. No que concerne ao subsídio de elevada incapacidade permanente relativo à incapacidade permanente absoluta para qualquer trabalho entre 08/0912015 e 07/04/2016, na mesma medida, há que operar uma interpretação restritiva da leitura do disposto no artigo 67.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, no sentido de somente se poder considerar uma incapacidade permanente de carácter duradouro e definitivo, o que manifestamente não ocorrerá na situação, como a dos autos, em que foi fixada IPA ao Autor com carácter temporário [de 07/09/2015 a 07/04/2016] e apenas porque havia completado dezoito meses consecutivos com incapacidade temporária.
10. Acresce que, tendo a ora Recorrente sido simultaneamente condenada no pagamento de um subsídio de elevada Incapacidade permanente relativo à incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual do Sinistrado, tal situação configura uma manifesta duplicação de dano, na medida em que este subsídio constitui uma prestação única; devendo a condenação da al.. A3) da douta Sentença recorrida ser eliminada.
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas. Mui doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, alterando-se parcialmente a Douta Sentença Recorrida, fazendo-se assim a costumada justiça.

A Ré não respondeu ao pedido de reforma da sentença formulado pelo A.

Aos 06.04.2017 foi proferida decisão que, deferindo o pedido de reforma da sentença, a reformou nos seguintes termos:
- Alteraram-se as als. B) e B1) do segmento decisório da sentença, que passaram a ter a seguinte redação:
“B) Decido que o sinistrado B... em consequência do acidente de trabalho referido em A) passou a sofrer, a partir de 07.04.2016 de uma desvalorização permanente parcial para o trabalho de 39,75% (= 26,5 % x 1.5) com IPATH (IPP de 39,75% com IPATH);”
“B1) Em consequência, condeno a Seguradora C..., S.A. a pagar ao sinistrado B... uma pensão anual, actualizável e vitalícia no valor de €7.338,85 (sete mil trezentos e trinta e oito euros e oitenta e cinco cêntimos), devida a partir de 08 de Abril de 2016, a ser paga mensalmente até ao 3º dia de cada mês e no seu domicílio, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, acrescida de subsídios de férias e de Natal, no valor de 1/14 cada da pensão anual, a serem pagos nos meses de Junho e Novembro de cada ano, respectivamente, bem como dos juros de mora desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento;”
- Eliminou-se a condenação constante do ponto B2) do segmento decisório constante da sentença.
- Alterou-se o valor da ação para €120.105,83.

O A. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
1)- A conversão da incapacidade temporária em incapacidade permanente por força do disposto no artigo 22° da Lei 98/2009, de 4 de Setembro tem os mesmos efeitos e consequências da alta por consolidação médico-legal das lesões;
2)- Tanto mais que a incapacidade convertida não é uma incapacidade ficcionada mas antes corresponde a uma real incapacidade que afeta o sinistrado no momento dessa conversão;
3)- Inexistindo preceito legal que permita tratar de forma diferente as duas situações;
3)- Tendo o autor sido considerado numa situação de IPA após o decurso de 30 meses consecutivos desde a ocorrência do acidente tem o direito à pensão e demais prestações decorrentes dessa situação de IPA;
4)- Pelo que tendo o autor um familiar a cargo, tem o mesmo direito à pensão acrescida de 10% da retribuição desde a data da conversão da incapacidade até ao momento em que por consolidação médico-legal das lesões lhe foi atribuída incapacidade diferente da IPA;
5)- Bem como à prestação suplementar para assistência de terceira pessoa enquanto dela necessitou;
6)- E ao subsídio de elevada incapacidade permanente calculado de acordo Com a situação de IPA e que se, tratando-se de prestação única, se venceu no dia seguinte à conversão da incapacidade temporária em incapacidade permanente;
7)- Pelo que o recurso deverá improceder.

A Ré Seguradora, atenta a decisão de reforma da sentença acima referida, veio requerer o alargamento do âmbito do recurso, tendo formulado as seguintes conclusões:

A Ré Seguradora, atenta a decisão de reforma da sentença acima referida, veio requerer o alargamento do âmbito do recurso, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Ante a atribuição de uma IPATH ao Sinistrado, não deverá aplicar-se a bonificação de 1,5% sobre a IPP pré-estabelecida.
2. A bonificação tem como pressuposto a perda ou diminuição de função Inerente ou Imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que o sinistrado ocupava habitualmente em momento anterior à ocorrência do acidente.
3. A existência de uma IPATH, pressupõe que o Sinistrado, em consequência das lesões que sofreu, não poderá mais exercer a actividade que desempenhava à data do acidente.
4. Na senda da jurisprudência superior, o factor de bonificação de 1,5 apenas deve ser atribuído quando o Sinistrado não está afectado por IPATH, uma vez que esse factor visa compensar o sinistrado que apenas padece de uma IPP e continua a exercer a sua actividade profissional mas com esforço acrescido, atentas as sequelas de que padece decorrentes do acidente de trabalho.
5. No caso do sinistrado estar afectado de IPATH, não há margem para aplicação do factor de bonificação, porquanto se pressupõe que o mesmo está 100% Incapaz de desempenhar a actividade profissional habitual.
6. A aplicação da bonificação prevista na alínea a) do ponto 5 do Anexo I da TNI não é congruente o facto da Recorrente padecer de uma Incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, sob pena de estar a desconsiderar-se o princípio que subjaz à diferenciação entre a IPATH e IPP.
7. Tanto o factor de bonificação como o subsídio de elevada incapacidade destinam-se a colmatar os efeitos da Incapacidade absoluta do Sinistrado para exercer a profissão habitual que desempenhava à data do acidente, por conseguinte, em caso de cumulação das duas prestações, o ora Recorrido seria duplamente compensado pela mesma situação.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito, que V. Exas. Mui doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a Douta Sentença recorrida, e consequentemente absolvendo-se parcialmente a Ré do pedido, fazendo-se assim A
(...)

O A. contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso.

Não foi emitido parecer dado o A. ser patrocinado pelo MP.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Matéria de facto provada
Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade:
“1.1. O Autor nasceu a 1 de Maio de 1969, na freguesia ..., Penafiel, conforme assento de nascimento junto a fls.22.
1.2. O autor foi admitido ao serviço da sociedade “D..., Lda”, com sede em ..., Penafiel, há cerca de trinta anos, obrigando-se a partir dessa data, mediante retribuição, a prestar as funções de pedreiro sob as ordens, direcção e fiscalização daquela sociedade.
1.3. O A. tem uma filha, E..., nascida a 9 de Abril de 1999, solteira, conforme o assento de nascimento junto a fls.95, que com ele vivia e vive em comunhão de mesa e habitação.
1.4. No dia 7 de Março de 2013, cerca das 16 horas, em ..., Penafiel, o autor sofreu um acidente,
1.5. Quando no exercício das suas funções, por ordens e instruções do empregador, estava em cima do balde de uma máquina industrial a efectuar furos na pedra para introduzir pólvora, escorregou e caiu.
1.6. Na data do acidente o autor auferia a retribuição base anual de 800,00€ x 14, acrescida de 133,10€ x 11 a título de subsídio de refeição.
1.7. A sociedade “D..., Lda” dedica-se á extracção de granito.
1.8. E tinha a sua responsabilidade decorrente de acidentes de trabalho em que fosse interveniente o autor transferida para a ré mediante contrato de seguro titulado pela apólice nº64/......, cuja cópia se encontra junta aos autos a fls.19 e seguintes.
1.9. Em consequência do acidente referido o autor sofreu traumatismo dos membros inferiores.
1.10. Submetido a perícia médica no gabinete médico-legal e forense do Tâmega, conforme documento de fls.88 e seguintes, a perita médica considerou que, em consequência directa e necessária daquelas lesões resultou para o autor instabilidade emocional, condicionada pela falta de eficiência pessoal e profissional, e pela necessidade do apoio de 3ª pessoa, radiculalgia residual, com paresia dos membros inferiores, especialmente à esquerda e com necessidade de colete de contenção lombar; alterações de disfunção sexual.
1.11. Do acidente resultou para o autor incapacidade temporária absoluta (correspondente ao período durante o qual o autor esteve totalmente impedido de realizar a sua actividade profissional) desde 8.03.13 até 7.9.15.
1.12. As sequelas referidas em 1.10., por sua vez, determinaram para o autor, de forma directa e necessária, uma incapacidade permanente absoluta de 100% desde 7.09.2015, data em que se completaram 30 meses após o acidente, até 07-04-2016, data da consolidação das lesões.
1.13. Bem como dificuldade em efectuar todas as actividades diárias, nomeadamente tratar da higiene pessoal, vestir-se, calçar-se e fazer pequenos esforços sem o apoio de terceira pessoa, até 07-04-2016.
1.14. Pelo período de incapacidade temporária referido em 1.11. a ré pagou ao autor a quantia de 22.550,90 €.
1.15. Na fase conciliatória do processo o autor teve de se deslocar uma vez ao GML e uma vez a este Tribunal, no que gastou a quantia de €16.
1.16. No dia 17 de Março de 2016 realizou-se tentativa de conciliação tendo o A. concordado com o grau de incapacidade atribuído pela perita médica do GML, reclamando o pagamento da pensão anual, vitalícia e actualizável de 10.131,28€, devida a partir de 8 de Setembro de 2015, acrescida da prestação por familiar a cargo relativamente a sua filha E... no valor de 1.266,44€, bem como a quantia de 5.553,70€ relativa a subsídio de elevada incapacidade permanente, a quantia de 5.533,70€ de prestação suplementar por assistência a terceira pessoa e a quantia de 16€ relativa a despesas de deslocação ao GML e a este Tribunal.
1.17. A ré aceitou a existência e caracterização do acidente como de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente e a transferência da responsabilidade relativa à retribuição de 800,00€ x 14 + 133,10€ x 11, tendo ainda a ré aceite o pagamento das despesas de deslocação ao Tribunal e GML, mas não aceitou o grau de incapacidade atribuído pela perita médica do GML, nem a necessidade de assistência de terceira pessoa, nem a prestação por familiar a cargo.
1.18. Frustrando-se assim a conciliação.
1.19. Requerida a junta médica, realizou-se a mesma, a fls.157 a 159 e a fls.189 a 191, tendo os Srs. Peritos médicos nela intervenientes, por unanimidade e após observação do sinistrado, que o sinistrado em consequência do referido acidente ocorrido no dia 07/03/2013 sofreu traumatismo lombar, não apresentando paresia dos membros inferiores na presente data; que o sinistrado consegue estar sentado e deambular sem apoio externo; que o sinistrado apresenta duas cicatrizes na região lombar, a maior mediana e a menor paramediana esquerda, rigidez na mobilidade da coluna lombar, sobretudo na flexão anterior; sem amiotrofias nos membros inferiores; reflexos aquilianos simétricos; diminuição da força de extensão do hallux e pé esquerdo; Lasegue e Bragard negativos; que o sinistrado não se encontra curado, sob o ponto de vista médico-legal, mas sim na situação de consolidação das lesões sofridas; que a data de consolidação das lesões é a de 07-04-2016; o examinado mantém tratamentos de medicina dentária da responsabilidade da seguradora; que dessas lesões resultaram sequelas que determinaram uma IPP de 26,5% e com uma situação de incapacidade permanente para o trabalho habitual do examinado e que o sinistrado não necessita do auxílio de terceira pessoa, no estado clínico actual.
1.20. A ré seguradora aceita que o sinistrado encontra-se incapaz para o seu trabalho habitual.”
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Importa esclarecer que a afirmação, constante do ponto 1.19 dos factos provados em que se diz “que o sinistrado não se encontra curado, sob o ponto de vista médico-legal, mas sim na situação de consolidação das lesões sofridas; que a data de consolidação das lesões é a de 07-04-2016” corresponde à resposta que foi dada pela Junta Médica ao quesito 7º formulado pela Ré, com o seguinte teor: “Está o sinistrado curado das lesões decorrentes do evento ocorrido no dia 07/03/2013?Em caso afirmativo, qual a data da cura dessas lesões?”
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III. Do Direito

1. Nos termos do disposto nos arts 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º nº 2 al. a) do CPT, as conclusões formuladas pelos recorrentes delimitam o objeto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Assim, tendo em conta as conclusões do recurso, bem como as constantes da ampliação do objeto do recurso, são as seguintes as questões suscitadas pela Recorrente:
- Prestação suplementar por pessoa (filha) a cargo;
- Prestação suplementar para assistência de terceira pessoa;
- Subsídio de elevada incapacidade;
- Inaplicabilidade do fator de bonificação de 1,5 [esta suscitada na ampliação do âmbito do recurso].

2. Previamente à apreciação das mencionadas questões há que deixar consignado o que se segue.

2.1. O A. foi vítima de um acidente de trabalho ocorrido aos 07.03.2013 que lhe causaram lesões determinantes:
- desde essa data (07.03.2013) a 07.09.2015, de ITA, sendo que, nesta data, se completou 30 meses (e não 18 meses como refere a Recorrente);
- o Sr. perito médico singular, considerando ter-se, nessa data, 07.09.2015, completado 30 meses sobre a data do acidente, atribuiu ao A. uma incapacidade permanente de 100%, do que discordou a Recorrente, na sequência do que, realizado exame por junta médica, foi considerada como data da consolidação das lesões a de 07.04.2016 e, a partir desta data, considerou o A. afetado de IPATH com uma IPP de 26,5%.
- Nos pontos 1.11. e 1.12 dos factos dados como provados na sentença deu-se como provado que:
“1.11. Do acidente resultou para o autor incapacidade temporária absoluta (correspondente ao período durante o qual o autor esteve totalmente impedido de realizar a sua actividade profissional) desde 8.03.13 até 7.9.15.
1.12. As sequelas referidas em 1.10., por sua vez, determinaram para o autor, de forma directa e necessária, uma incapacidade permanente absoluta de 100% desde 7.09.2015, data em que se completaram 30 meses após o acidente, até 07-04-2016, data da consolidação das lesões.”.
A Recorrente não impugnou o mencionado ponto 1.12. dos factos provados (nem qualquer outro), sendo que não faz referência à sua impugnação, nem concretamente ao citado ponto, nem indica qualquer meio de prova que sustentasse diferente decisão, nem indica diferente resposta que, em seu entender, devesse porventura ser dada (art. 640º, nº 1, do CPC/2013).
Está pois assente, e são esses os pressupostos a ter em conta para as questões suscitadas no recurso, que:
- no período de 07.03.2013 a 07.04. 2015, o A. esteve em situação de ITA;
- Nesta data, 07.09.2015, perfez-se 30 meses sobre a data do acidente, tendo o A., desde o dia imediato (08.09.2015) até 07.04.2016, estado em situação de IPA;
- A partir de 08.04.2016, dia imediato à data da consolidação das lesões (“alta definitiva”), o A. passou a estar afetado de IPATH (com 26,5% ou 39,75% de IPP consoante se aplique, ou não, o fator de bonificação de 1,5, questão que adiante se apreciará.

2.2. Na decisão de reforma da sentença, foi a mesma reformada no que se reporta à condenação no pagamento do subsídio de elevada incapacidade referente à situação de IPATH (mantendo-se o subsídio decorrente da situação de IPA), pelo que não se verifica a questão, invocada pela Recorrente, de duplicação da condenação.
Mas, diz ainda a Recorrente que, só em situação de incapacidade permanente duradoura e definitiva, é que o mesmo é devido, o que não era o caso relativamente ao período de 08.09.2015 a 07.04.2016, questão que será adiante apreciada.

3. Do subsídio de elevada incapacidade

Entende a Recorrente, em síntese, que a atribuição do referido subsídio depende da cura clínica do sinistrado, não sendo de o atribuir quando a incapacidade permanente (absoluta ou igual ou superior a 70%) decorre tão-só da conversão da incapacidade temporária em permanente por via do disposto no art. 22º da Lei 98/2009, de 04.09.
Vejamos.
Dispõe o art. 67º da citada Lei 98/2009, que o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente destina-se a compensar o sinistrado com incapacidade permanente absoluta ou com incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70%, pela perda ou elevada redução permanente da sua capacidade de trabalho ou de ganho resultante do acidente, situações essas que conferem o direito ao mencionado subsídio nos montantes indicados nos nºs 2, 3 ou 4 do mesmo consoante, respetivamente, se trate de IPA, de IPATH ou de IPP superior a 70%.
E, por sua vez, de harmonia com o art. 22.º, da citada Lei: “1. A incapacidade temporária converte-se em permanente decorridos 18 meses consecutivos, devendo o perito médico do tribunal reavaliar o respectivo grau de incapacidade. 2. Verificando-se que ao sinistrado está a ser prestado o tratamento clínico necessário, o Ministério Público pode prorrogar o prazo fixado no número anterior, até ao máximo de 30 meses, a requerimento da entidade responsável e ou do sinistrado", disposição esta similar à que já constava do art. 42º do DL 143/99, de 30.04.
Em caso de conversão, pelo decurso do referido período, da incapacidade temporária em permanente, determina o mencionado preceito que o perito médico do tribunal reavalie o grau de incapacidade, pelo que a fixação do grau de incapacidade permanente não é automático, tanto mais que poderão as partes discordar do resultado dessa avaliação e requerer exame por junta médica. E, em caso de conversão, ela produzirá os mesmos efeitos da alta clínica.
Como diz Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico Anotado, 2ª Edição, a p. 225, a propósito do anterior art. 42º do DL 143/99, mas que mantém atualidade, com a referida conversão procura-se evitar o protelamento excessivo da atribuição de pensões e tem-se em vista salvaguardar os direitos do sinistrado perante demoras excessivas do tratamento.
Perante tal desiderato, e não distinguindo o art. 67º da L. 100/97 entre incapacidade permanente resultante, ou não, de conversão, afigura-se-nos que onde o legislador não distingue, não deverá também o intérprete fazê-lo.
No sentido da atribuição do subsídio de elevada incapacidade nas situações de conversão da incapacidade temporária em permanente, vejam-se os Acórdãos desta Relação de 08.03.04 e de 19.04.2004, in www.dgsi.pt (Processos nºs 0344546 e 0411917), não se vendo razão que justifique alteração do entendimento aí preconizado.
No mesmo sentido, cfr. Acórdãos da Relação de Lisboa, de 15-12-2004, no processo n.º 1074/2005-4 e de 14/09/2016 nº19741/12.3T2SNT.L1-4 e da Relação de Évora, de 14-02-2012, no processo n.º 0411917, publicados em http://www.dgsi.pt), citados na sentença recorrida.

Ora, no caso, o A., aos 07.03.2013, foi vítima de um acidente de trabalho que lhe provocou lesões determinantes de ITA até 07.09.2015, data esta em que completou 30 meses (e não 18 meses, como diz a Recorrente), pelo que, e não se encontrando ainda curado, foi a sua referida incapacidade, conforme exame médico singular e por via do citado art. 22º, convertida em incapacidade permanente absoluta (IPA) com efeitos a partir de tal data.
Diga-se que não colhe o argumento da Recorrente de que, tendo discordado do referido laudo, requereu exame por junta médica, que considerou o sinistrado afetado de IPATH com uma IPP de 26,5% a partir de 07.04.2016, data em que fixou a consolidação das lesões, ou seja, em que lhe atribuiu alta definitiva.
Com efeito, assim foi. Mas acontece que a junta médica não fixou a data da consolidação médico-legal das lesões aos 07.09.2015, mas sim aos 07.04.2016, donde decorre que, entre 07.09.2015 e 07.04.2016, o A. esteve em situação de IPA (100%), este o coeficiente de desvalorização arbitrado pelo perito médico singular e que não foi alterado pela junta médica.
Aliás, e como já acima referido, do nº 1.11. da matéria de facto provada decorre que ““1.11. Do acidente resultou para o autor incapacidade temporária absoluta (correspondente ao período durante o qual o autor esteve totalmente impedido de realizar a sua actividade profissional) desde 8.03.13 até 7.9.15.”, ponto este que não foi impugnado pela Recorrente e que se tem como assente.
E tendo a junta médica fixado a data da alta definitiva aos 07.04.2016 e considerado que, a partir desta data, o A. se encontrava afetado da IPATH com uma IPP de 26,5%, como e bem se diz na sentença não há necessidade de qualquer incidente de revisão “porquanto a data de consolidação das lesões foi fixada ainda na pendência destes autos, com a consequente alteração do grau de incapacidade de acordo com a avaliação das sequelas, agora consolidadas.”.
O que acontece é que, por virtude da referida IPA (e ainda que, posteriormente, lhe tinha sido, com efeitos a partir de 07.04.2016, fixada outra incapacidade permanente - IPATH com IPP de 26,5%), o A., aos 07.09.2015, adquiriu o direito ao subsídio de elevada incapacidade permanente, não colidindo a posterior alteração do grau de incapacidade com o referido direito.
Consigna-se ainda que, mesmo em caso de IPATH o referido subsídio seria devido, residindo a diferença, unicamente, no seu montante. De todo o modo, no caso e pelo referido, o montante do subsídio é o previsto no art. 67º, nº 2.
Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso.

4. Da prestação suplementar por pessoa (filha) a cargo

Dispõe o art. 48º, nº 3, al. a), da Lei 98/2009 que se o sinistrado ficar afetado por incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, tem direito à pensão anual e vitalícia igual ou superior a 80% da retribuição, acrescida de 10% desta por cada pessoa a cargo, até ao limite da retribuição.
As considerações tecidas no ponto antecedente são também aplicáveis à questão ora em apreço.
O A., conforme decorre do nº 1.3. da matéria de facto provada “tem uma filha, E..., nascida a 9 de Abril de 1999, solteira, conforme o assento de nascimento junto a fls.95, que com ele vivia e vive em comunhão de mesa e habitação.”.
Ora, assim sendo, no período compreendido entre 08.09.2015 a 07.04.2016, em que o A. esteve em situação de IPA, tem direito ao acréscimo de 10% previsto no art. 48º, nº 3, al. a) da LAT.
Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso.

5. Da prestação suplementar para assistência de terceira pessoa

Na sentença recorrida condenou-se a Ré a pagar ao A. “a prestação suplementar por assistência de terceira pessoa na quantia máxima de €5.533,70, com início a 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, correspondendo cada montante mensal a 1/14 da aludida quantia máxima de €5.533,70, bem como os proporcionais do subsídio de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 dessa quantia máxima”.

Dispõe o art. 53º da Lei 98/2009 que: “1. A prestação suplementar da pensão destina -se a compensar os encargos com assistência de terceira pessoa em face da situação de dependência em que se encontre ou venha a encontrar o sinistrado por incapacidade permanente para o trabalho, em consequência de lesão resultante de acidente. 2. A atribuição da prestação suplementar depende de o sinistrado não poder, por si só, prover à satisfação das suas necessidades básicas diárias, carecendo de assistência permanente de terceira pessoa. 3. O familiar do sinistrado que lhe preste assistência permanente é equiparado a terceira pessoa. 4. (…). 5. Para efeitos do n.º 2, são considerados, nomeadamente, os actos relativos a cuidados de higiene pessoal, alimentação e locomoção. 6. (...)”.
Tendo em conta o que se disse no ponto III.3., cujas considerações são também aplicáveis a propósito da prestação ora em causa, as circunstâncias de a IPA, no período de 08.09.2015 a 07.04.2016, ter resultado da conversão prevista no art. 22º e de, após 07.04.2016, o A. ter ficado afetado de IPATH não impedem a atribuição de tal direito no que se reporta ao período em causa.
Porém, constitui requisito necessário à atribuição dessa prestação que o sinistrado não possa, por si só, prover à satisfação das suas necessidades básicas, carecendo de assistência permanente de terceira pessoa, sendo que ónus da prova de tal impossibilidade impende sobre o sinistrado.
No caso provou-se, conforme ponto 1.13. dos factos provados, que o A. tem “dificuldade em efectuar todas as actividades diárias, nomeadamente tratar da higiene pessoal, vestir-se, calçar-se e fazer pequenos esforços sem o apoio de terceira pessoa, até 07-04-2016.”. [sublinhado nosso]
A norma em causa parece exigir a impossibilidade de realização das tarefas, mas não já e apenas a dificuldade na execução das mesmas, sendo que dos factos provados não decorre essa impossibilidade, mas apenas a dificuldade da sua realização, o que não se nos afigura ser suficiente no sentido dessa atribuição, para além de que essa “dificuldade” não se encontra suficientemente caracterizada na matéria de facto provada, mormente de tal forma que pudéssemos concluir no sentido de que consubstanciaria, não apenas uma mera dificuldade, mas sim uma verdadeira impossibilidade de realização das tarefas em causa.
Afigura-se-nos, assim e nesta parte, que procedem as conclusões do recurso.

6. Da inaplicabilidade do fator de bonificação de 1,5 [questão suscitada na ampliação do âmbito do recurso]

Entende a Recorrente que a aplicação do fator de bonificação não é cumulável com a atribuição da IPATH e cita jurisprudência desta Relação de 2006.
Esta questão suscitou-se durante algum tempo com respostas divergentes por parte da jurisprudência das Relações.
Acontece, porém, que a jurisprudência citada pela Recorrente se encontra desatualizada e ultrapassada[1], não apenas face à jurisprudência do STJ uniforme e reiterada no sentido de que nada impede tal cumulação [2], como também face ao Acórdão do STJ nº 10/2014, de 28.05.2014, in DR, I Série, de 30.06.2014, que uniformizou jurisprudência no sentido de que «[a] expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.», referindo-se, a dado passo da sua fundamentação, que:
Pode, assim, afirmar-se que um trabalhador que foi vítima de um acidente de trabalho é reconvertido em relação ao posto de trabalho que tinha antes do acidente quando o pode retomar, apesar das limitações funcionais de que seja portador em consequência do acidente sofrido.
Quando esse regresso não seja possível, quando essa retoma não seja possível, o trabalhador não é susceptível de reconversão nesse posto de trabalho. (…).
(…). Adite-se que na linha da jurisprudência definida nesta secção[…] os casos de IPATH são situações típicas de não reconvertibilidade do sinistrado em relação ao seu anterior posto de trabalho. (…)
Do transcrito decorre, pois, que não existe incompatibilidade entre a atribuição de IPATH e do fator de bonificação, sendo aquela uma das situações típicas em que, precisamente, deverá ser atribuído tal fator. Mais decorre que a irreconvertibilidade no posto de trabalho é a consequência ou corolário inevitável da incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.
Assim, nesta parte, e sem necessidade de considerações adicionais, improcede o recurso.
***
IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em:
A. Conceder parcial provimento ao recurso, em consequência do que se revoga a sentença recorrida na parte em que condenou a Recorrente, C..., SA, a pagar ao Recorrido, B...,a prestação suplementar por assistência de terceira pessoa na quantia máxima de €5.533,70, com início a 8 de Setembro de 2015 e até 07/04/2016, correspondendo cada montante mensal a 1/14 da aludida quantia máxima de €5.533,70, bem como os proporcionais do subsídio de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 dessa quantia máxima”, nesta parte se absolvendo a Recorrente do referido pedido.
B. No mais impugnado, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas da ação e do recurso pela Ré/Recorrente na proporção do seu decaimento, sendo que, relativamente à proporção em que o A./Recorrido decaiu este, que seria responsável pelas custas, se encontra isento (art. 4º, nº 1, al. h), do RCP).

Porto, 04.12.2017
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
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[1] Cfr. Paula Leal de carvalho, “A incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e o fator de bonificação de 1,5 – Questões práticas, in Prontuário do Direito do Trabalho”, 2017-I, Centro de Estudos Judiciários, pág. 89/90.
[2] Cfr., por todos, Acórdãos do STJ de 19.03.2009, Proc. 08S3920, de 29.03.2012, Proc. 307/09.1TTCTB.C1.S1, e de 05.03.2013, Proc. 270/03.2TTVFX.1.L1.S1, in www.dgsi.pt