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CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
Sumário
I – Num contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, o direito à remuneração do mediador existe mesmo que não se concretize o negócio desde que a não concretização se deva a causa imputável ao cliente. II - Mas o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, ou seja, a prática dos actos adequados a conseguir a concretização do negócio visado com a mediação. III - Portanto, é necessário que os factos provados permitam estabelecer um nexo causal entre a actividade que foi desenvolvida pela mediadora e a concretização do negócio visado pela mediação. IV - Em suma, tem de ficar demonstrado que a mediadora praticou os actos necessários à concretização do negócio entre o seu cliente e o terceiro interessado e que, só por culpa do cliente, o negócio não se concretizou por intermédio da mediadora. (AC)
Texto Parcial
Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I – Relatório
F – Sociedade de Mediação Imobiliária SA instaurou acção declarativa sob a forma de processo sumário contra Pedro e Marta, pedindo que os RR sejam condenados a pagar-lhe a quantia de 15.750 € em virtude do incumprimento do contrato celebrado.
Alegou, em síntese:
- no exercício da sua actividade de mediação imobiliária, celebrou com os RR, em 06/02/2008, um contrato tendo em vista a venda da fracção autónoma de que os RR eram proprietários, tendo sido convencionado o regime de exclusividade, pelo que na sua vigência só a A. poderia promover o negócio de venda;
- foi convencionado que se a A. lograsse obter pessoa interessada que adquirisse a fracção, os RR pagariam uma comissão fixada em 15.750 € mais IVA;
- os RR violaram a cláusula de exclusividade pois na vigência do contrato venderam, por si, o imóvel a uma pessoa angariada pela A., pelo que tem esta direito à remuneração no valor de 15.750 €.
Contestaram os RR, pugnando pela improcedência da acção, invocando, em resumo:
- apesar da cláusula de exclusividade, a A, através do seu mediador, disse que se tratava de mero pró-forma e que podiam continuar a promover livremente a venda da fracção;
- os RR sabem hoje, por se terem ido informar para se defender neste processo, que a compradora viu a casa em Agosto de 2009, mas por indicação da mediadora do BCC e do seu agente Bruno;
- os RR receberam a proposta de compra através do agente Bruno por conta da compradora;
- a decisão da compradora não decorreu de qualquer acção promocional da A.;
- o contrato deve ser anulado pois foi celebrado pelo R. marido com a convicção de que não implicava qualquer limitação à sua capacidade para vender directamente o imóvel e a A sabia da essencialidade desse requisito para os RR;
- o contrato está sujeito ao regime das cláusulas contratuais gerais, tendo sido violado o dever de informação sobre a cláusula de exclusividade pois a A. sabia que os RR pretendiam e consideravam essencial poder continuar a promover directamente a venda da casa, devendo tal cláusula ser excluída do contrato;
- coloca-se a dúvida de saber se a A. peticiona o valor de 15.750 € a título de remuneração ou de indemnização.
Concluem dizendo que deve:
- considerar-se o contrato de mediação inválido, por anulabilidade fundada em erro do R. marido (art. 247º e 289º/1 do CC); ou
- considerar-se a cláusula de exclusividade da mediadora excluída do contrato de mediação (art. 5º, 6º e 8-a) e b) do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais); ou
- considerar-se que inexistem no caso vertente os pressupostos legais da responsabilidade civil, ou
- considerar-se que a A. não adquiriu o direito à comissão por não se verificarem os requisitos previstos no art. 18º do DL 211/2004 de 20/8.
A A. respondeu à contestação dizendo, no essencial:
- o contrato foi livremente assinado pelo R. marido e este foi devidamente esclarecido quanto aos seus termos, pelo que os RR não poderiam ficar convencidos de que poderiam continuar a promover a venda do imóvel;
- esclarece que o valor peticionado é devido a título de indemnização pelo incumprimento da cláusula de exclusividade, pois caso os RR não tivessem incumprido, a venda ter-se-ia concretizado por intermédio da A. e, consequentemente, teria esta recebido a quantia de 15.750 €.
Realizada a audiência de discussão e julgamento e dadas as respostas à base instrutória, foi proferida sentença em que se condenou o réu Pedro a pagar à Autora a quantia de 15.750 € e absolveu do pedido a Ré Marta.
Inconformado, apelou o Réu, e alegando, formulou as seguintes conclusões:
a) A douta sentença considera provado que o R. ora recorrente aceitou que os serviços da recorrida fossem prestados em regime de exclusividade (v. resposta aos quesitos n.º 4 e nº 5 da Base Instrutória e sentença recorrida, ponto 3.1., Fundamentos de Facto, alíneas 9 e 10), baseando-se na letra do contrato e no testemunho de Joana e José, angariadores da recorrida.
b) A testemunha Joana não acompanhou a assinatura do contrato nem a sua execução, nada sabendo sobre este contrato em concreto, não conhecendo sequer o R.
c) A testemunha José, refere que este manifestou desconforto com o regime de exclusividade, mas que este correspondia à política contratual da (…).
d) A testemunha do recorrente, Alexandre, afirmou que a (…) trabalha com todos os regimes de negócio incluindo o de contratos abertos, criando assim justificada dúvida sobre este assunto.
e) A credibilidade das testemunhas Joana e José merece devida ponderação tendo em conta que, se o recorrente for definitivamente condenado, ambos repartirão entre si a respectiva comissão de mediação, como de resto afirmaram expressamente.
f) Outrossim com o facto de a 1ª instância ter dado como provado que os compradores e nomeadamente, a compradora mulher, Ana, tenha obtido conhecimento da fracção em venda através da recorrida e/ou que a recorrida tenha promovido a aproximação dos compradores ao recorrente (v. resposta aos quesitos n.º 10, 14 e 23 da Base Instrutória e sentença recorrida, ponto 3.1., Fundamentos de Facto, alíneas 26, 32 e 38). Aqui a sentença recorrida faz tábua rasa dos depoimentos dos compradores, em particular do depoimento da compradora Ana, sem qualquer interesse directo ou indirecto no resultado da lide e intervenientes directos nos factos (porque por eles pessoalmente vividos) o que não pode merecer desconsideração.
g) Acresce que ao condenar o recorrente a pagar a quantia peticionada pela recorrida a título de indemnização por incumprimento contratual a douta sentença desconsidera o facto de que não existe responsabilidade civil sem prejuízos. Ora a recorrida não demonstrou que tenha tido prejuízos. Nem a existência de prejuízos faz parte da base instrutória. Violou assim a douta sentença recorrida o artigo 798º CC, e bem assim o princípio geral de responsabilidade civil vertido no artigo 483.º CC.
Termos em que deve a resposta aos quesitos 4, 5, 10, 14, 23 e 39 ser alterada e como consequência directa a douta sentença recorrida ser anulada e substituída por outra que absolva o R. do pedido assim se fazendo Justiça.
A A. contra-alegou, defendendo a confirmação da sentença.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 684º nº 3 e 685º-A nº 1 e 660º nº 2 do CPC), pelo que as questões a decidir são estas:
- se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto
- se o R. se constituiu na obrigação de pagar à A. a quantia de 15.750 €
III – Fundamentação
A) Na sentença recorrida vem dado como provado:
1) A Autora é uma sociedade que se dedica à mediação imobiliária - cfr. alínea A) dos Factos Assentes.
2) Os RR foram proprietários da fracção autónoma designada pelas letras “AA” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n° ..., freguesia de ..., sita na Rua ..., lote (…), em ... - cfr. alínea B) dos Factos Assentes.
3) Os RR começaram a publicitar a sua intenção de venda do imóvel identificado em 2) através da afixação, em Setembro de 2007, de uma placa indicativa na fachada do edifício - cfr. alínea F) dos Factos Assentes.
4) Por os angariadores da Autora terem visto a placa aludida em 3), José, agente da A. contactou os RR, através do telefone que constava da placa, propondo-lhes agenciar a venda - cfr. alínea G) dos Factos Assentes.
5) O Réu marido assinou um acordo denominado contrato de mediação, datado de 15 de Janeiro de 2008, que foi também assinado pela A. e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido - cfr. alínea H) dos Factos Assentes.
6) O acordo aludido em 5) inclui uma cláusula em que se estabelece que a mediadora é contratada em regime de exclusividade - cfr. alínea 1) dos Factos Assentes.
7) No exercício da sua actividade, a Autora celebrou um acordo escrito denominado “contrato de mediação imobiliária” com o Réu, em 06 de Fevereiro de 2008 - cfr. resposta positiva ao quesito 10 da Base Instrutória
8) Através do qual, a Autora se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra da fracção aludida em 2), pelo preço de 31 5.000,00€ - cfr. resposta positiva ao quesito 2° da Base Instrutória.
9) Desenvolvendo para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características do imóvel - cfr. resposta positiva ao quesito 3° da Base Instrutória.
10) No âmbito do acordo aludido em 7), o Réu aceitou que os serviços da Autora aludidos em 9) fossem prestados em regime de exclusividade - cfr. resposta positiva ao quesito 4° da Base Instrutória. (impugnado)
11) Tendo as partes acordado que apenas a Autora teria o direito de promover a venda da fracção identificada em 2), pertencente ao Réu, durante o respectivo prazo de vigência - cfr. resposta positiva ao quesito 5° da Base Instrutória. (impugnado)
12) Como remuneração, as partes acordaram no pagamento de 15.750,00€ pelo Réu à Autora caso esta lograsse obter pessoa interessada que adquirisse a fracção do Réu aludida em 2) - cfr. resposta positiva ao quesito 6° da Base Instrutória.
13) O contrato de mediação imobiliária foi celebrado pelo prazo de 6 meses contados a partir da data da sua celebração - cfr. resposta positiva ao quesito 7° da Base Instrutória.
14) Renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias relativamente ao seu termo - cfr. resposta positiva ao quesito 8° da Base Instrutória.
15) Os Réus continuaram a promover a venda, mesmo depois da assinatura do acordo aludido em 5) - cfr. resposta positiva ao quesito 30° da Base Instrutória.
16) Tendo mantido a placa inicial aludida em 3), que nunca foi retirada nem substituída por uma da Autora — cfr. resposta positiva ao quesito 31º da Base Instrutória.
17) A Autora, através dos seus angariadores imobiliários, efectuou as diligências que estiveram ao seu alcance para promover a venda do imóvel identificado em 2) - cfr. resposta ao quesito 17º da Base Instrutória.
18) Os RR aceitaram a proposta da Autora para que a sua casa integrasse a Bolsa de Permutas da (…) - cfr. resposta positiva ao quesito 35º da Base Instrutória.
19) Com o objectivo de acelerar a transacção da mesma - cfr. resposta positiva ao quesito 36º da Base Instrutória.
20) Mas nunca lhes foi apresentada qualquer sugestão de negócio - cfr. resposta positiva ao quesito 36° (repetido) da Base Instrutória.
21) Entre 15 de Janeiro de 2008 e 26 de Agosto de 2009, a Autora promoveu as seguintes visitas à casa:
- 11 de Fevereiro de 2008: visita com 2 clientes, um dos quais já era habitante no BCC, outro pretendia ver casas em Benfica - cfr. resposta ao quesito 33º da Base Instrutória.
22) ... 26 de Junho de 2008: visita com uma senhora, empregada do ... que trabalhava nos EUA e que pretendia regressar a Portugal - cfr. resposta positiva ao quesito 34º da Base Instrutória.
23) A compradora da fracção, Ana, procurou os serviços da Autora com o objectivo de adquirir um imóvel para habitação em ... - cfr. resposta positiva ao quesito 11º da Base Instrutória.
24) Ana estabeleceu inúmeros contactos com a Autora com o objectivo mencionado - cfr. resposta positiva ao quesito 12º da Base Instrutória.
25) Tendo sido realizadas por esta diversas visitas a imóveis - cfr. resposta positiva ao quesito 13º da Base Instrutória.
26) No âmbito das relações comerciais existentes entre a Autora e Ana, esta obteve conhecimento da promoção de venda da fracção em apreço - cfr. resposta positiva ao quesito 14° da Base Instrutória. (impugnado)
27) Em 16.07.2009, a angariadora imobiliária da Autora, Joana, enviou um e-mail à compradora Ana, a pedido desta, com a indicação de alguns imóveis, correspondentes ao que por esta era pretendido, para que escolhesse quais os que pretendia visitar quando chegasse a Portugal, uma vez que, naquela data, se encontrava a residir no estrangeiro - cfr. resposta positiva ao quesito 18° da Base Instrutória.
28) Desde essa data, inúmeros foram os e-mails trocados entre ambas, no sentido de Ana encontrar uma casa em Portugal, país onde iria passar a residir a partir de Agosto de 2009 - cfr. resposta positiva ao quesito 19° da Base Instrutória.
29) Foram realizadas diversas visitas a imóveis, tanto em Lisboa como em ..., todas promovidas pela angariadora Joana - cfr. resposta positiva ao quesito 20° da Base Instrutória.
30) No dia 12.08.2009, Joana enviou um e-mail à compradora Ana, indicando o endereço electrónico onde esta poderia consultar o imóvel então propriedade dos RR, informando-a, de que caso esta estivesse interessada no mesmo, poderia ser agendada uma visita para o dia 17.08.2009, às 11:30 - cfr. resposta positiva ao quesito 21º da Base Instrutória.
31) A angariadora identificou o imóvel em causa com a referência www.....pt/120151082 - cfr. resposta positiva ao quesito 22º da Base Instrutória.
32) A Autora promoveu a aproximação da compradora Ana aos RR - cfr. resposta positiva ao quesito 23° da Base Instrutória. (impugnado)
33) Ana viu o imóvel identificado em 2), em Agosto de 2009 - cfr. resposta positiva ao quesito 38° da Base Instrutória.
34) Ana viu o imóvel identificado em 2) com a mediadora do BCC - cfr. resposta ao quesito 39° da Base Instrutória.
35) O que fez com o agente Bruno, da mediadora do BCC, que Ana também contactara - cfr. resposta positiva ao quesito 40° da Base Instrutória.
36) O Réu enviou à A., que recebeu, uma carta datada de 26 de Agosto de 2009, com o seguinte teor: “Assunto: Cessação contrato de angariação para imóvel ID:120151082-1/Exmo. Senhor José, na sequência dos nossos contactos venho por este meio solicitar a cessação do contrato de angariação relativo ao imóvel ID:120151082-1, sito no empreendimento ... Clube de ..., Rua (…), .... Gostaria de lhe agradecer pessoalmente toda a simpatia e esforço desenvolvido na promoção e angariação de potenciais compradores para o referido imóvel Grato pelo serviço prestado (...)” - cfr. alínea E) dos Factos Assentes.
37) O Réu celebrou contrato (verbal) de alienação/aquisição da fracção autónoma identificada em 2) com Ana – cfr resposta ao quesito 9º da Base Instrutória.
38) A qual obteve conhecimento de que tal fracção se encontrava para venda, bem como das respectivas características e condições de venda, através da promoção imobiliária realizada pela Autora - cfr. resposta positiva ao quesito 10º da Base Instrutória. (impugnado)
39) Viria Ana a adquirir o imóvel identificado em 2) aos RR, sem que estes dessem conhecimento à Autora - cfr resposta positiva ao quesito 25° da Base Instrutória.
40) Pelo que, foi com surpresa que a Autora constatou que a fracção havia sido vendida a Ana, sem a intervenção e conhecimento da primeira - cfr. resposta positiva ao quesito 16° da Base Instrutória.
41) A Autora tomou conhecimento através do e-mail enviado pela compradora à angariadora, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, em 28.08.2009, que havia comprado o imóvel em causa - cfr resposta positiva ao quesito 26º da Base Instrutória.
42) Tendo a compradora, no âmbito da mesma comunicação agradecido a “ajuda e profissionalismo” à angariadora da Autora para encontrar a sua casa - cfr. resposta positiva ao quesito 27º da Base Instrutória.
43) Os RR receberam a proposta de compra da fracção identificada em 2) através do agente Bruno, por conta de Ana – cfr resposta positiva ao quesito 41º da Base Instrutória.
44) A Autora, em 15 de Setembro de 2009, enviou uma carta registada com aviso de recepção aos RR solicitando aos mesmos o pagamento de uma indemnização à Autora pelo incumprimento do contrato de mediação imobiliária correspondente ao fixado como comissão no valor de € 15.750,00 - cfr. alínea 1) dos Factos Assentes.
45) Os RR não procederam ao pagamento da indemnização solicitada pela Autora através da carta aludida em 44) - cfr, alínea L) dos Factos Assentes.
46) Em 06.11.2009, os RR celebraram escritura pública de Permuta e Mútuo com Hipoteca com a sociedade M - Sociedade de Construções, Lda, na qual a sociedade M - Sociedade de Construções, Lda, declarou permutar com os RR uma fracção autónoma, melhor identificada na mesma escritura, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, tendo estes, por sua vez, declarado aceitar a permuta por troca com a fracção identificada em 2) - cfr. alínea C) dos Factos Assentes.
47) Em 06 de Novembro de 2009, foi celebrada escritura de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca entre sociedade M - Sociedade de Construções, Lda e Ana, na qual aquela declarou vender a Ana e ao seu marido Carlos, a fracção identificada em 2), da qual consta que “o presente contrato foi objecto de intervenção da sociedade mediadora I - Sociedade de Medicação Imobiliária, Lda, titular da licença nº 873-A M - cfr. alínea D) dos Factos Assentes.
B) Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
(…)
Em consequência, alteram-se as respostas aos artigos 10º, 14º e 23º da base instrutória, para «Não provado» e eliminam-se os pontos 26º, 32º e 38º da matéria de facto dada como provada na sentença.
C) O Direito
Em 06/02/2008 foi celebrado um contrato de mediação imobiliária entre apelante e apelada, nos termos do documento de fls. 22/23 (doc. 2 junto com a petição inicial).
Atenta a data da sua celebração, ao contrato de mediação imobiliária dos autos, aplica-se o regime consagrado no DL 211/2004 de 20/8.
O art. 2º desse diploma estabelece, na parte que ora interessa:
«1 – A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização do negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel.
2 – A actividade de mediação imobiliária consubstancia-se no desenvolvimento de:
a) Acções de prospecção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelo cliente;
b) Acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretende realizar negócio jurídico, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões.
(…)
4 – Para efeitos do disposto no presente artigo, considera-se:
a) «Interessado» o terceiro angariado pela empresa de mediação, desde que esse terceiro venha a concretizar o negócio visado pelo contrato de mediação;
b) «Cliente», a pessoa singular ou colectiva que celebra o contrato de mediação imobiliária com a empresa.
(…)».
Preceitua o art. 19º que o contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita e dele constam, obrigatoriamente os elementos aí mencionados, entre os quais as condições de remuneração; e se o contrato for omisso quando ao respectivo prazo de duração, considera-se o mesmo celebrado por um período de seis meses.
Decorre ainda desse artigo que as partes sujeitar o contrato a regime de exclusividade, prescrevendo:
«(…)
4 – Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência.
5 – A consagração do regime de exclusividade, quando exista, terá de constar expressamente do contrato de mediação imobiliária.
(…)».
Na cláusula 4ª do contrato celebrado entre o apelante e a apelada lê-se:
«1 – O Segundo Contratante contrata a Mediadora em regime de exclusividade.
2 – O regime de exclusividade previsto no presente contrato implica que só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação imobiliária durante o respectivo período de vigência.».
Além disso, está provado que no âmbito desse contrato «o Réu aceitou que os serviços da Autora aludidos em 9) fossem prestados em regime de exclusividade», «Tendo as partes acordado que apenas a Autora teria o direito de promover a venda da fracção identificada em 2) pertencente ao Réu, durante o respectivo prazo de vigência».
Por outro lado, resultaram não provados os art. 28º e 29º da base instrutória em que se perguntava: «O Sr José disse ao R. marido que o acordo aludido em H) era um mero pró-forma, que se tratava de um contrato pré-impresso, imposto pela (…)?», «… e que os RR podiam continuar a promover a venda da sua casa livremente, como vinham fazendo?».
Portanto, o apelante contratou a apelada em regime de exclusividade.
Sobre o prazo de duração do contrato foi estabelecido que «tem uma validade de 6 (seis) meses contados a partir da data da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo».
Por carta datada de 26/8/2009 o apelante comunicou à apelada: «venho por este meio solicitar a cessação do contrato de angariação relativo ao imóvel (…)».
Visto que o contrato foi celebrado em 06/02/2008 e foi sendo sucessivamente renovado, a última renovação ocorreu em 07/08/2009 (art. 279º al c) do Código Civil). Por isso, a denúncia só podia operar validamente no termo dessa renovação, ou seja, às 24h00 do dia 06/02/2010.
Mas em 06/11/2009, através de escritura pública de permuta com a sociedade M o apelante e mulher transmitiram para esta o seu direito de propriedade sobre a fracção autónoma a que se refere o contrato de mediação imobiliária e por sua vez, a M vendeu a dita fracção autónoma a Ana e marido Carlos, constando na escritura de compra e venda que «o presente contrato foi objecto de intervenção da sociedade mediadora I – Sociedade de Mediação Imobiliária Lda».
Significa que o apelante transmitiu o seu direito de propriedade sobre essa fracção autónoma desrespeitando o regime de exclusividade convencionado no contrato de mediação imobiliária e incorrendo por isso, em incumprimento contratual.
Coloca-se então a questão de saber se tem a apelada direito a receber a peticionada quantia de 15.750 € correspondente à remuneração.
Convém esclarecer, antes de mais, que essa quantia resulta da aplicação da percentagem de 5% sobre o valor de 315.000 €.
Através da cláusula 2ª do contrato de mediação imobiliária a mediadora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra pelo preço de 315.000 €. Mas na cláusula 5ª estipulou-se que a remuneração da mediadora seria de 5% «calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado».
Ora, sendo o preço declarado nas referidas escrituras de permuta e de compra e venda de 292.500 € (cfr doc. de fls. 35 a 54 juntos com a petição inicial), a percentagem de 5% corresponde a 14.625 € e não ao valor peticionado.
Vejamos então se é devida a quantia de 14.625 € à apelada.
O art. 18º do DL 211/2004 prescreve, na parte que ora interessa:
«1 – A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior:
a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação mobiliária celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa, tendo esta direito a remuneração.
(…)».
Assim, num contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, o direito à remuneração do mediador existe mesmo que não se concretize o negócio desde que a não concretização se deva a causa imputável ao cliente.
Mas o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, ou seja, a prática dos actos adequados a conseguir a concretização do negócio visado com a mediação. Portanto, é necessário que os factos provados sejam aptos a que se estabeleça um nexo causal entre a actividade que foi desenvolvida pela mediadora e a concretização do negócio visado pela mediação. Em suma, tem de ficar demonstrado que a mediadora praticou os actos necessários à concretização do negócio entre o seu cliente e o terceiro interessado e que, só por culpa do cliente, o negócio não se concretizou (neste sentido, cfr Ac do STJ de 29/4/2003, Proc. 03A918), Ac do STJ de 3/4/2008 – Proc. O7B4498), Ac da RL de 24/5/2011 – Proc. 11231/08.5TMSNT.L1-6), Ac da RL de 14/6/2012 – Proc. 4620/05.9YXLSB.L1-6, Ac da RL de 4/10/2012 – Proc. 6916/10.9TBOER.L1-2), todos consultáveis em www.dgsi.pt.
De harmonia com o disposto no art. 342º nº 1 do Código Civil. «Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado». Por isso, cabia à apelada alegar e provar a factualidade que permitisse estabelecer o nexo causal entre a actividade que desenvolveu e o negócio que veio a ser concretizado com intervenção de outra sociedade de mediação imobiliária.
Nesta acção veio sustentar a apelada que foi devido às suas diligências de promoção do imóvel que os compradores tomaram conhecimento do mesmo e que a compradora Ana chegou a manifestar-lhe interesse na sua compra.
Provou-se: que a apelada, através dos seus angariadores imobiliários efectuou as diligências que estiveram ao seu alcance para promover a venda desse imóvel; que a compradora Ana viu esse imóvel em Agosto de 2009 com a mediadora do BCC, o que fez com Bruno, agente desta mediadora, que ela também contactara.
Provou-se também: no dia 12.08.2009, Joana, angariadora imobiliária da apelada, enviou um e-mail a Ana, indicando o endereço electrónico onde esta poderia consultar o imóvel então propriedade do apelado, informando-a, de que caso esta estivesse interessada no mesmo, poderia ser agendada uma visita para o dia 17.08.2009, às 11:30; nesse e-mail a angariadora identificou o imóvel em causa com a referência www.....pt/120151082.
Mas, em resultado da alteração das respostas aos art. 10º, 14º e 23º da base instrutória e consequente eliminação dos pontos 26, 32 e 38 da matéria de facto, não está provado que «No âmbito das relações comerciais existentes entre a Autora e Ana, esta obteve conhecimento da promoção da fracção em apreço», que «A Autora promoveu a aproximação da compradora Ana aos RR», e que «A qual teve conhecimento de que tal fracção se encontrava para venda, bem como das respectivas características e condições de venda, através da promoção imobiliária realizada pela Autora». Lembremos que na apreciação da impugnação relativa à matéria de facto quanto a estes factos referimos que nem o e-mail de 12/8/2009 (doc. 5 de fls. 30) nem o print que faz a descrição do imóvel com o título «Detalhes do imóvel» (doc. 6 de fls. 31 e 32) indicam a morada do imóvel e nem a testemunha Joana a indicou à compradora Ana.
Concluímos, assim, que a apelada não provou os factos necessários à demonstração de que foi ela que angariou os compradores Ana e Carlos com os quais veio a ser concretizado o negócio.
Portanto, apesar do manifesto incumprimento contratual por parte do apelante ao violar o regime de exclusividade, não tem a apelada direito à remuneração.
De referir ainda o seguinte.
Na petição inicial a apelada refere-se tanto a remuneração como a indemnização; na resposta à contestação esclarece que o valor peticionado é devido a título de indemnização pelo incumprimento da cláusula de exclusividade; e na contra-alegação diz que o valor de 15.750 € é-lhe devido a título de indemnização em face do incumprimento da cláusula de exclusividade, pois caso o apelante não tivesse cumprido as suas obrigações, teria a apelada recebido aquela quantias a título de remuneração.
Porém, o que o art. 18º do DL 211/2004 consagra é o direito à remuneração e não o direito a indemnização.
Sobre a obrigação de indemnização, prescreve o art. 562º do Código Civil: «Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação».
Não tendo a autora provado os factos necessários à procedência do pedido de condenação do réu no pagamento da remuneração, apenas lhe assistiria o direito de ser indemnizada pelo seu interesse contratual negativo, ou seja, pelos prejuízos que sofreu para cumprir a sua prestação, designadamente as despesas com publicidade e visitas com clientes ao referido imóvel, mas que não foram sequer alegados (neste sentido, cfr os citado Ac do STJ de 29/4/2003 e Ac da RL de 4/10/2012 e também o Ac da RE de 8/7/201 – Proc. 214/08 – in www.dgsi.pt).
Nestes termos, procede a apelação.
IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se procedente a apelação e revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou o apelado, absolvendo-se o réu/apelado do pedido.
Custas pela apelada.
Lisboa, 22 de Novembro de 2012
Anabela Calafate
Ana de Azeredo Coelho
Tomé Ramião