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INSOLVÊNCIA IMINENTE
INSOLVÊNCIA ACTUAL
LEGITIMIDADE ACTIVA
PRESUNÇÕES
AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO
Sumário
1. A situação de insolvência consiste, como resulta do n.º 1 do artigo 3.º do CIRE, na impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas. 2. A lei admitiu dois importantes ajustamentos a esta noção: o primeiro, equiparando a situação de insolvência iminente à situação de insolvência actual como fundamento de apresentação à insolvência, permitindo assim ao devedor proceder à abertura do processo no caso de insolvência iminente, mediante a sua apresentação à falência; e o segundo restrito às pessoas colectivas e patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma directa ou indirecta, considerando-os insolventes quando o respectivo passivo seja manifestamente superior ao activo, mesmo que não tenham manifestado a insusceptibilidade de satisfazer pontualmente os respectivos compromissos – cfr. artigo 3º, nºs 4 e 2, respectivamente. 3. Quando o pedido de declaração de insolvência não é formulado pelo devedor, a legitimidade activa (ad substantiam) está condicionada à verificação de alguma das situações elencadas nas alíneas a) a h) do nº1 do artigo 20º do CIRE. 4. A verificação de um destes factos indicia que o devedor pode estar em situação de insolvência, ou seja, são “factos-índice”, que estabelecem meras presunções do estado de insolvência, podendo por isso o devedor ilidir esta presunção, provando que, não obstante a ocorrência de um ou mais desses factos, a situação de insolvência não se verifica (artigo 350.º do C.Civil). 5. Assim, quando a insolvência é requerida por qualquer das pessoas referidas no artigo 20.º do CIRE, o requerido pode impedir a declaração de insolvência por uma de duas vias: demonstrando que não se verifica qualquer dos invocados “factos índice”, ou demonstrando que, não obstante a ocorrência desse(s) facto(s), não se verifica, no caso concreto, a situação de insolvência. 6. É através desses “factos – índice” que, normalmente, a situação de insolvência se manifesta ou se exterioriza, pelo que a verificação de qualquer um deles permite presumir a situação de insolvência do devedor e é condição necessária para a iniciativa processual de certos sujeitos, nomeadamente dos responsáveis legais pelas dívidas do devedor, dos credores e do Ministério Público. 7. Por isso, há que averiguar previamente se os factos dados como provados fazem presumir a insolvência; na afirmativa terá de se averiguar se essa presunção foi ilidida. 8. O n.º 1 do artigo 684.º-A do CPC, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 39/95, veio admitir a ampliação do âmbito do recurso, a requerimento do recorrido, quando se verifique mais de um fundamento (quer da acção, quer da defesa), permitindo que o tribunal “ad quem” conheça do fundamento (ou fundamentos) em que a parte vencedora decaiu, caso venha a julgar procedente o recurso interposto por quem ficou vencido. 9. Esta solução está condicionada, em articulação com os princípios do dispositivo e da auto-responsabilidade das partes, à respectiva alegação, a título subsidiário, pela parte vencedora, não se justificando o conhecimento do recurso quando a sua eventual procedência não possa ter efeito útil no processo.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.
I
“C Lda.”, pessoa colectiva nº…, com sede no L…, intentou a presente acção declarativa com processo especial na qual requereu a declaração de insolvência de “E…”, pessoa colectiva nº…, com sede na Rua ….
Para tanto alegou que:
- Celebrou com o requerido vários contratos de subempreitada, relativos à obra da refinaria da G….
- Emitiu e enviou ao Requerido as facturas correspondentes a trabalhos realizados, no valor global de €1.050.680,49, que o requerido não pagou.
- Em 30 de Novembro de 2011 o requerido confessou ser devedor da quantia de €1.050.680,49, que acordou pagar em 4 prestações mensais e sucessivas, mas na data prevista para pagamento da terceira prestação – 25.2.2012 – o requerido nada pagou, ficando em dívida a quantia de €501.861,67.
- Porque os trabalhos de subempreitada executados pela requerente continuaram em curso, deram origem a facturas já vencidas, no montante de €103.110,41 e ainda não vencidas no total de €160.648,05;
- Por contrato de cessão de créditos datado de 3.2.2012, a requerente aceitou da agrupada En…., parte dos créditos que esta detinha sobre o Requerido, no valor global de €1.684.777,07.
- Há largos meses que o requerido cessou todos os pagamentos às sociedades suas agrupadas, bem como a todos os demais credores.
- Deixou de ter crédito junto da Banca, devendo às instituições bancárias montante superior a €30.000.000,00 e a fornecedores a quantia aproximada de €20.000.000,00.
- Tem actualmente um passivo total a rondar os €50.000.000,00 e, como activo, tem apenas os créditos resultantes da obra em curso na G….
- O A… não consegue adquirir materiais que lhe permitam finalizar a obra;
- A obra vai dar um prejuízo a rondar os €20.000.000,00;
- O prazo contratual previsto para a sua conclusão encontra-se ultrapassado, por factos imputáveis ao próprio A….
*
Citada, a requerida deduziu oposição, na qual alegou, em síntese, que:
- A Requerente não é, nesta data, credora do A…, uma vez que as quantias que lhe eram devidas por força do contrato de subempreitada celebrado entre ambos, no montante de €501.861,60, e referidas no acordo de regularização e confissão de dívida, estão integralmente liquidadas;
- Os restantes créditos invocados pela Requerente, no montante global de €1.684.777,07, não são devidos, porque o contrato de subempreitada celebrado previa que o subempreiteiro E.., só seria ressarcido do valor pelos trabalhos efectuados se e na medida em que o A… recebesse o seu pagamento do Dono da Obra, pelos mesmos trabalhos, o que ainda não sucedeu;
- A obrigação era condicionada, tendo as partes acordado a inexigibilidade da prestação enquanto não se verificasse a condição, pelo que o crédito supostamente cedido não era exigível e não se achava vencido;
- O crédito alegadamente cedido não era passível de cessão, face às específicas exigências acordadas, estando a prestação intimamente ligada à pessoa do credor;
- O cessionário conhecia ou não podia desconhecer aquelas concretas cláusulas;
- O exercício de um suposto direito de crédito da requerente, na qualidade de alegada cessionária, atenta contra o princípio da boa fé, pois o suposto cessionário conhecia a sujeição dos créditos ao princípio do “back-to-back”;
- A admitir-se a validade da pretendida cessão, a mesma consubstanciaria inequivocamente uma situação de favorecimento de credores da E... ... e uma alteração inadmissível da graduação de créditos;
- Ao intentar a acção especial de insolvência, sem antes ter tentado cobrar o seu crédito pelos meios comuns, a requerente pressiona de forma abusiva e intolerável o A…, ficando assim também demonstrada a actuação abusiva no recurso à acção de insolvência;
- A requerente não alega factos consubstanciadores da suspensão generalizada de pagamentos;
- O A… encontra-se a pagar pontualmente as suas dívidas para com os Bancos com quem tem contratos de financiamento;
- Quando o A…. verificou dificuldades de tesouraria, negociou acordos de pagamento com os seus fornecedores, que cumpre pontualmente;
- Inexistem dívidas fiscais;
- O A… não tem trabalhadores, nem obrigações para com a Segurança Social;
- A Empreitada prossegue o seu curso normal, não se encontrando parada, tendo já sido facturado o trabalho realizado que consubstancia 65% do valor total, faltando assim cerca de 35% do valor referido;
- Nas contas do A… relativas ao exercício de 2011, o passivo era de €58.695.246,86 e o passivo de €56.473.013,86, sendo € 9.120.150,70 de dívidas a empresas agrupadas.
*
Foi realizada audiência de discussão e julgamento.
Seguidamente foi proferida a sentença:
Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgando a presente acção integralmente improcedente, absolvo o requerido E…, do pedido de declaração de insolvência contra ele formulado por C….
Dela recorreu a requerente, formulando as seguintes conclusões:
I – Os depoimentos de parte de ambos os administradores do A…, conjugados com o depoimento da testemunha Ma.., impunham ao Tribunal considerasse PROVADA a matéria de facto constante do ponto 3º da base instrutória, cuja alteração da decisão nesse sentido se requer.
II – Tem para si a recorrente que o depoimento da testemunha F…, conjugado com o teor do documento n.º 9 junto pelo requerido com a sua oposição, devidamente articulado com os factos constantes das várias alíneas da matéria assente, determinam ao Tribunal um especial dever de cuidado na análise da matéria de facto constante do item 17º da base instrutória, decidindo como NÃO PROVADO, fA... à ausência de prova documental do pagamento da 1ª prestação, o cumprimento do mencionado acordo.
III – Na resposta à matéria de facto dos pontos 29º, 30º e 31º da base instrutória, o Tribunal considerou PROVADO que nas contas relativas ao exercício de 2011 o requerido apresenta o passivo de € 56.473.013,86 e o activo de € 58.695.246,86, para em sede de fundamentação considerar que estão correctas as contas apresentadas.
IV – Ao fazê-lo, incorre em nulidade da decisão sobre a matéria de facto, aqui expressamente arguida, nos termos previstos no art.º 668º, n.º 1, alínea c), “ex vi” do art.º 653º, n.º 2 “in fine”, ambos do CPC.
V- Caso se entenda – no que se não concede - que ao responder como respondeu, o Tribunal deu como provada a correcção das contas, deverá esse Venerando Tribunal “ad quem” considerar aquela matéria NÃO PROVADA, o que desde já se requer.
VI – Efectivamente, os depoimentos das testemunhas M..., Ma... e F..., conjugado com o teor das contas relativas ao exercício de 2011 apresentados pelo A.., impõem ao Tribunal a consideração de que os valores ali inscritos não estão correctos, dando-se como NÃO PROVADA a matéria de facto vertida nos pontos 29º, 30º e 31º da base instrutória.
VII - Não o fazendo, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, impondo-se a sua modificação.
VIII – Do depoimento de parte do administrador F…, extrai-se que o A… muito cedo teve conhecimento que a obra não iria dar resultado positivo, havendo necessidade de suprimentos, e que actualmente o A… tem prejuízos que terão de ser suportados pelas agrupadas.
IX – Não obstante essa consciência, do teor das contas conjugado com os depoimentos das testemunhas M. e F., resulta que o A... durante o ano de 2010, ainda pagou às agrupadas mais de 16 milhões de euros.
X – O A... não consegue pagar a dívida às agrupadas, na ordem dos largos milhões de euros e tem dívida vencida e não paga a fornecedores e não faz prova de se encontrar a cumprir com todos os seus financiadores.
XI – Dos documentos juntos autos, conjugados com a prova testemunhal, é manifesta a ausência no A... de activo disponível para pagar dívida vencida, tendo recorrido a adiantamentos do Dono da Obra para pagar a subempreiteiros.
XII – O passivo do A... está a aumentar sem correspondência no activo, situação que o A... não pode reverter face à especial natureza do seu objecto.
XIII – Encontra-se assim provado o facto – índice da insolvência do requerido constante do art.º 20º, n.º 1, alínea b) do CIRE, que este não conseguiu contrariar com a prova da sua solvência.
XIV - Tendo a requerente provado ser credora do requerido pela quantia de € 1.684.777,07, e constituindo este crédito, pelo seu montante e demais circunstâncias do incumprimento, um facto – índice presuntivo da situação de insolvência, não contrariada pelo A..., deverá a peticionada declaração de insolvência ser decretada.
XV - Ao decidir em sentido diverso do exposto na presente alegação, a Sentença recorrida violou o disposto no art.º 668º, n.º 1, alínea c), “ex vi” do art.º 653º, n.º 2, ambos do CPC e nos art.ºs 20º, n.º 1, alínea b) e 30º, n.º 4 do CIRE.
E termina dizendo que deverá conceder-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que decrete a insolvência do requerido A....
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A apelada alegou e requereu a ampliação do objecto do recurso nos termos do artigo 684.º-A do CPC.
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Em contra-alegações, concluiu a apelada, em síntese:
1. A decisão sobre a matéria de facto proferida nos presentes autos não merece censura: a prova produzida nos presentes autos, quando sujeita a uma análise crítica, nos termos do artigo 653º, nº2 do CPC, aponta no sentido do que ficou decidido pelo Tribunal “a quo”.
2. A decisão sobre os quesitos 29º e 30º, que os deu como provados, restringindo a sua formulação inicial, não está eivada de qualquer nulidade. Nem o artigo 668º, nº1, al. c) do CPC é aplicável à decisão sobre a matéria de facto, nem a Apelante logrou demonstrar a verificação de alguma das circunstâncias previstas no artigo 653º, nº 4 do CPC.
3. Do balanço do Apelado junto aos autos decorre – conforme se deu como provado – que, em 2011, este apresentava um passivo de € 56.473.013,86 e um activo de €58.695.246,86 e a Apelante não apresentou qualquer prova da qual se pudesse extrair o contrário do que resulta dos documentos de prestação de contas do Apelado.
4. Nos termos da alínea g) do nº1 do artigo 20º do CIRE, só é facto-índice da insolvência, cuja alegação e prova incumbia à Apelante, a manifesta superioridade do passivo face ao activo. Se nada se provar – como não se provou – a esse respeito não se pode concluir pela insolvência do Apelado.
5. Por tudo quanto se disse no que respeita às contas e à presunção que delas resulta, nos termos do artigo 44º do Código Comercial, também a resposta dada ao quesito 31º deve ser mantida – a Apelada não logrou produzir prova que infirmasse o que resulta das contas.
6. Ademais da prova documental carreada para os autos pelo Apelado confirma o que resulta das contas: no final de 2011 eram devidos € 4.066.268,06 pelo Apelado à agrupada E. Engenharias S.A. – dos quais € 985.204,47 resultaram de serviços prestados por esta àquele em 2011; e os restantes €3.081.063,59 resultaram da incorporação, na agrupada E. Engenharias S.A, de uma sociedade do grupo E… que era credora do Apelado por aquele montante.
7. Tendo o ora Apelado decaído no fundamento relativo à validade e exigibilidade do crédito cedido na cessão de créditos celebrada entre a Recorrente e a En…. pretende agora, a título subsidiário, que esse fundamento seja reapreciado, nos termos do nº1 do artigo 684º-A do CPC.
8. Andou mal a douta Sentença ao afirmar que o crédito cedido se encontra vencido e é certo, líquido e exigível, pois a cláusula 6ª do contrato de subempreitada – que impõe o princípio “back-to-back” na relação empreiteiro-subempreiteiro – é aplicável em detrimento da sua cláusula 5ª – que estabelece um prazo de 60 dias para o vencimento das facturas emitidas.
9. A cláusula “back-to-back”é frequentemente mencionada nos termos do contrato, resulta já da própria relação entre o A... e a En…, sua agrupada, e resulta ainda dos usos das empreitadas, que frequentemente recorrem a estas cláusulas.
10. Deste modo, o pagamento do valor em dívida pelo Recorrido só é devido à E…, subempreiteira, aquando do pagamento do dono da obra, no contrato de empreitada. Não tendo esse pagamento sido verificado (cf. Ponto 30 da fundamentação de facto) não pode o crédito cedido considerar-se vencido e, portanto, exigível.
11. Não se considerando vencido e exigível, o cedente, a En…, não poderia ter disposto de um crédito que ainda não existe, tornando o contrato que serve de base à transmissão, a dação pro solvendo, sem causa jurídica, e portanto, inválida e ineficaz (artigos 578º, nº1 e 585º, ambos do Código Civil).
12. Ainda que se viesse a admitir a validade da cessão, o que se rejeita, mas se considera por mera cautela, esta seria uma cessão de créditos sujeita a condição suspensiva (artigo 270 e seg. do Código Civil).
13. A Apelante não logrou demonstrar, sequer, a existência da obrigação de que se diz credora, pelo que não tenha legitimidade para requerer a insolvência do Apelado. Por assim não tendo decidido, o Tribunal violou o disposto no artigo 20º, nº1, do CIRE.
14. Os factos com base nos quais a Apelante se insurge contra a sentença recorrida e agora pretende a sua substituição não foram alegados nem provados nos autos, pelo que o Tribunal ad quem não pode considerá-los, sob pena de violação do disposto no artigo 664º do CPC.
15. Era à Alegada que cumpria alegar e provar factos susceptíveis de serem subsumidos nalgumas das alíneas do nº1 do artigo 20º do CIRE, o que, porém, não fez.
16. Da prova coligida nos autos não resultou que o Apelado se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.
17. Antes resultou que este cumpre pontualmente as suas obrigações.
18. Também não resultaram provados quaisquer factos que pudessem preencher a hipótese legal do artigo 20º, nº1, al. b) do CIRE.
19. Por sua vez, o Apelado logrou demonstrar que cumpre pontualmente as suas obrigações, facto que obsta à declaração de insolvência com base no facto-índice previsto no artigo 20º, nº1 al. b) o CIRE (cf. Artigo 30º, nº2 do mesmo código), pelo que deve a decisão recorrida ser confirmada.
II
Com interesse para a decisão da causa, vêm provados os seguintes factos:
1. E….encontra-se matriculado na Conservatória do Registo Comercial de … (alínea A) da matéria assente).
2. O requerido tem por objecto social realização pelas agrupadas de todos os actos materiais e jurídicos necessários à execução da empreitada de concepção, fornecimento, fabrico, construção, montagem, inspecção, comissionamento, ensaios e manutenção da central de cogeração da refinaria do Porto (alínea B) da matéria assente).
3. São sociedades agrupadas E…com participação no capital de 51% e E. Engenharias, SA, pessoa colectiva n…., com participação no capital de 49% (alínea C) da matéria assente).
4. À data da propositura da acção eram membros efectivos do Conselho de Administração D.., F… (alínea D) da matéria assente).
5. A requerente dedica-se, além do mais, à actividade de mecânica geral em tubagens e soldadura e à realização de obras de construção civil e de engenharia civil (alínea E) da matéria assente).
6. No âmbito do seu escopo social, a requerente celebrou com o requerido vários contratos de subempreitada relativos à obra da refinaria da G.. (alínea F) da matéria assente).
7. Na sequência dessas relações comerciais, a requerente emitiu e enviou ao requerido as facturas correspondentes a trabalhos realizados, identificadas a fls. 32 a 34 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido (alínea G) da matéria assente).
8. O requerido recebeu e aceitou tais facturas (alínea H) da matéria assente).
9. O requerido não procedeu ao pagamento das facturas identificadas a fls. 32 a 34 dos autos, nas datas de vencimento (alínea I) da matéria assente).
10. Em 30 de Novembro de 2011 a requerente e o requerido subscreveram um acordo de regularização e confissão de dívida, conforme cópia de fls.38 a 44, cujo teor se dá aqui por reproduzido (alínea J) da matéria assente).
11. Nos termos desse acordo, além do mais, o requerido confessou-se devedor da quantia de €1.050.680,49 (alínea L) da matéria assente).
12. (…) Que se comprometeu a pagar em 4 prestações mensais e sucessivas com os valores e vencimento nas datas seguintes:
- 1ª € 226.932,12 – 15/12/2011
- 2ª € 321.886,70 – 25/01/2012
- 3ª € 260.635,33 – 25/02/2012
- 4ª € 241.226,33 – 25/03/2012 (alínea M) da matéria assente).
13. Os trabalhos de subempreitada executados pela requerente na obra de que o A... é adjudicatário, continuaram em curso (alínea N) da matéria assente).
14. E deram origem às facturas identificadas a fls.45 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido (alínea O) da matéria assente).
15. Tais facturas foram emitidas e entregues ao requerido, que as recebeu e aceitou (alínea P) da matéria assente).
16. Ainda não facturados, foram já realizados pela requerente trabalhos correspondentes a 10% do contrato se subempreitada, no valor de €290.000,00 (alínea Q) da matéria assente).
17. (…) E trabalhos extras realizados, correspondentes a €14.666,88 (alínea R) da matéria assente).
18. A requerente e En…, celebraram o designado “Contrato de cessão de créditos”, datado de 3/2/2012, conforme cópia de fls. 49 a 51, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (alínea S) da matéria assente).
19. Nos termos desse acordo, E…. declarou ceder à requerente créditos sobre o A... aqui requerido, no valor global de €1.684.777,07, referentes à factura n.º 1100401581/2011, datada de 31/5/2011, no montante de €1.124.442 e à factura nº 1100401582, datada de 31/5/2011, até ao montante de €560.335,07 (alínea T) da matéria assente).
20. As referidas facturas correspondem aos 14º e 15º Termos de Pagamento da Divisão de Tarefas da subempreitada de “For…”, inerentes à empreitada referida em B) supra, nos termos do contrato de subempreitada de 20 de Julho de 2009, celebrado entre E… e o requerido, conforme cópia que se mostra a fls.54 a 64 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido (alínea U) da matéria assente).
21. Por carta registada e com A/R, datada de 6.2.2012, enviada em 9.2.2012 e recebida em 10.2.2012, a E… notificou o A... da cessão e solicitou o pagamento do montante de €1.684.777,07 (alíneas V), X) e Z) da matéria assente).
22. Por carta datada de 1.3.2012, recebida pelo requerido em 5.3.2012, a requerente solicitou ao A... requerido o pagamento do montante de €1.684.777,07 (alínea AA) da matéria assente).
23. O requerido remeteu à requerente o cheque n.º..., no valor de €611.022,33, sacado sobre a conta 0000..., junto do Banco, titulada por E. E. SA, para pagamento das facturas referidas em G) (alínea BB) da matéria assente).
24. A requerente enviou ao requerido o e-mail datada de 3.4.2012, cuja cópia se mostra a fls. 176 a 178, cujo teor se dá por reproduzido (alínea CC) da matéria assente).
25. Em 30 de Dezembro de 2008 foi celebrado entre a Portcogeração, S.A. e o consórcio formado pelas empresas E… e E. Engenharias, o contrato de Empreitada… e Prestação… (assente por acordo em audiência de julgamento.
26. O referido contrato tem como objecto “a concepção, fornecimento, fabrico, construção, montagem, inspecção, comissionamento, ensaios e manutenção por 15 anos da Central…., baseada em duas Unidades de Cogeração com turbina a gás, utilizando como combustível gás natural e Fuel-gás, e tendo a potência total máxima, aos terminais do alternador, compreendida entre 80MW e 90 MW” (assente por acordo em audiência de julgamento).
27. Em 12 de Outubro de 2009 foi celebrado o contrato de cessão da posição contratual entre a Por… S.A., a E... e a E. Engenharias, SA, nos termos do qual a posição de Empreiteiro, detida pelo Consórcio no Contrato de Empreitada, foi cedida ao A... requerido (assente por acordo em audiência de julgamento).
28. O requerido cessou todos os pagamentos às sociedades suas agrupadas, devidos por trabalhos realizados para o A... na obra da refinaria do Porto (resposta ao quesito 1º).
29. As facturas n.º4643 e seguintes, indicadas na al. O) tinham vencimento a 90 dias (resposta ao quesito 11º).
30. O requerido não recebeu da Por…, SA o pagamento dos trabalhos a que respeita o contrato de subempreitada, datado de 20 de Julho de 2009, celebrado entre En…. e o requerido (resposta ao quesito 12º).
31. A E… SA, a E… Engenharias, SA e o requerido, celebraram o acordo datado de 20.12.2011, cuja cópia se mostra a fls. 288 a 292 (resposta ao quesito 13º).
32. A requerente tinha conhecimento que o requerido apenas pagaria às agrupadas, designadamente à En…, quando recebesse do dono da obra o pagamento dos correspondentes trabalhos, o que apenas aconteceria perto do termo final da obra (resposta ao quesito 14º).
33. Os contratos de financiamento celebrados com o Banco.., SA estão a ser cumpridos (resposta ao quesito 15º).
34. O requerido negociou com a T… um acordo de pagamento, que se encontra a cumprir (resposta aos quesitos 16º e 17º).
35. O requerido tem a sua situação tributária regularizada (resposta ao quesito 18º).
36. O Requerido tem sede num imóvel da agrupada E... S.A., que lho entregou para o usar sem pagamento de qualquer contrapartida (resposta ao quesito 19º).
37. O requerido não deve qualquer quantia a título de rendas de instalações onde exerce actividade (resposta ao quesito 20º).
38. O requerido não tem trabalhadores (resposta ao quesito 21º).
39. A E…Engenharia SA efectuou suprimentos ao A... correspondentes aos documentos de fls. 174 e 298 a 320 (resposta ao quesito 22º).
40. Valor utilizado pelo requerido pagar, designadamente, à requerente (resposta ao quesito 23º).
41. Foram concluídos todos os trabalhos de montagem eléctrica e mecânica a realizar na empreitada referida em B) (resposta ao quesito 24º).
42. (…) Tendo-se iniciado, no final do ano passado, as actividades relativas ao funcionamento dos equipamentos da Central de Cogeração que foi construída (resposta ao quesito 25º).
43. (…) Seguindo-se a fase de testes e de ensaios da referida Central de Cogeração (resposta ao quesito 26º).
44. Os trabalhos da Empreitada decorrem sem qualquer interrupção na execução por parte dos subempreiteiros (resposta ao quesito 27º).
45. Foi facturado o trabalho realizado na empreitada correspondente a 65% do valor total do Contrato de Empreitada (resposta ao quesito 28º).
46. Nas contas relativas ao exercício de 2011 o requerido apresenta o passivo de €56.473.013,86 e o activo de €58.695.246,86 (resposta aos quesitos 29º e 30º).
47. Relativamente ao exercício de 2011, o requerido apresentava no passivo dívidas à E.. Engenharias, SA, no valor de €4.066.268,06, à En…, S.A., no valor de €4.781.647,92 e à AT.., no valor de €272.234,72 (resposta aos quesitos 31º a 33º).
48. As entidades AT… e E… - E. Cogeração do Porto, Agrupamento.. integram as empresas do grupo EfA... (facto aditado após o julgamento, em resposta aos quesitos).
III
A apelante pugna pela revogação da sentença, essencialmente por dois motivos: - por, em seu entender, terem sido julgados incorrectamente os n.º 3, 17, 29, 30 e 31 da matéria de facto (arguindo a nulidade dessa decisão no que diz respeito aos n.º 29 e 30); - por se ter considerado que não se encontra preenchido qualquer facto-indice da situação de insolvência.
Vejamos a questão relativa à alteração da matéria de facto.
1. O presente processo foi instaurado em 2012, pelo que é aplicável o CPC na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, em vigor desde 01.01.2008.
Estipula o artigo 685º-B, sob a epígrafe «o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto»: “1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no nº. 2 do artigo 522º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. 3. (…) 4. (…) 5.(…)»
Por sua vez, o indicado n.º 2 do artigo 522.º-C determina: [q]uando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos.
Esta matéria vinha regulada de forma semelhante no artigo 690.º-A do CPC antes da reforma de 2007.
Pode ler-se no preâmbulo do Decreto-lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, que aditou o artigo em análise: «[a] consagração desta nova garantia (duplo grau de jurisdição em matéria de facto) das partes no processo civil implica naturalmente a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso é à respectiva fundamentação».
Em anotação a este artigo escreve LOPES DO REGO[1]: «Este preceito, aditado pelo DL n.º 39/95, vem estabelecer um particular ónus de alegação e fundamentação a cargo do recorrente que impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto. Tal solução é justificada no preâmbulo daquele diploma legal: “a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso».
E resulta do n.º 1 do artigo em análise (art. 685.º-B, com a redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto) que o recorrente tem de proceder obrigatoriamente a estas especificações, sob pena de rejeição do recurso nesta parte.
In casu foi dado cumprimento a estas disposições legais.
Entretanto na apreciação desta matéria, em conformidade com o regime vigente dos recursos, não cabe ao tribunal ad quem, em sede de impugnação da decisão de facto, proceder a um novo julgamento propriamente dito, mas apenas sindicar os alegados erros de julgamento da 1ª instância sob os pontos de facto questionados, mediante a reapreciação das provas produzidas no âmbito dos segmentos da decisão de facto impugnados, tomando por base dessa reapreciação o teor das alegações recorrente e do recorrido e ainda, mesmo que oficiosamente, dos elementos probatórios que serviram de fundamento à decisão recorrida sobre os pontos da matéria de facto em causa, nos termos definidos prescritos no artigo 712.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, do CPC.
No acórdão desta Relação, de 15/02/2011, proferido no processo nº 3334/08.2TJLSB.L1-1, foi ponderado a este respeito: Efectivamente, «a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no art. 655º, nº 1, do CPC: “o juiz aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção A...rca de cada facto”) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição. «Por conseguinte, quer relativamente aos factos provados quer quanto aos factos não provados, deve o tribunal justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (art. 655º do CPC), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos, achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos particulares, etc.» «Nesta perspectiva, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção».
2. Pretende a apelante que sejam alteradas as respostas dadas aos artigos 3, 17, 29, 30 e 31.
2.1. O n.º 3 tinha a seguinte redacção: O A... tem como único activo os créditos resultantes da obra em curso na G?
E foi respondido: “Não provado”.
Com a seguinte fundamentação: “O facto não resulta provado porque foi declarado pela testemunha M.., que além do valor contratado pela obra foram contabilizados valores decorrentes de refacturação a fornecedores resultantes de gastos que o A... suportou não sendo da sua responsabilidade e efectuou pagamentos que não lhe eram devidos”.
A apelante entende que deve ser respondido “provado” pelas razões constantes de fls. 624 a 627, designadamente, com fundamento no depoimento de parte do administrador da requeria, J.., que declarou: “confirma que o único activo do A... são os créditos resultantes da obra para a G…, uma vez que o mesmo foi constituído para a realização dessa mesma obra”.
O apelado defende que deve ser mantida a resposta dada, nomeadamente, porque, por um lado, nem todos os créditos inscritos no activo do apelado “resultam da obra da G.. (…): uns resultam da obra, ou melhor dizendo, da empreitada; outros resultam de fornecimentos defeituosos; e, por outro lado, face aos depoimentos de um administrador do A..., Engº.., e da testemunha M.….
Trata-se de um facto cuja prova compete à requerente. Na dúvida, não poderá ser dado como provado.
Ora, pelo que fica dito, há que reconhecer que os depoimentos prestados em audiência de julgamento não são coincidentes, pelo que nos parece que não se justifica alteração da resposta dada ao artigo 3 da BI, tendo sobretudo em consideração o que foi dito supra (III-1).
2.2. Vejamos agora a resposta dada ao artigo 17 da BI, que tinha a seguinte redacção na sequência do artigo 16 (aos quais foi respondido em conjunto): O requerido negociou com a T… um acordo de pagamento, que “se encontra a cumprir”.
Não há dúvida de que está assente que o requerido negociou com a T… um acordo de pagamento; o que se pergunta é se esse acordo está a ser cumprido, e foi respondido “provado”, com a seguinte fundamentação: consideram-se provados, pois a testemunha F.., presidente do Conselho de Administração da T.... confirmou uma renegociação, com o requerido, ocorrida em Outubro de ou Novembro de 2011, em virtude deste estar com dificuldades de pagamento dos valores devidos àquela sociedade, acordo este que está ser cumprido. Estes factos foram igualmente confirmados pela testemunha F….
Entretanto, a apelante tece doutas considerações a este respeito e termia dizendo que deve ser respondido “não provado”.
Pelo contrário, o apelado defende que, com base nos depoimentos das testemunhas que refere, deve ser mantida a resposta dada.
Mau grado as razões invocadas pela apelante entende-se que deve ser mantida a reposta dada, tendo em consideração a aduzida fundamentação.
2.3. Vejamos as respostas dadas aos artigos 29, 30 e 31, que tinham a seguinte redacção:
29 e 30 – Relativamente ao exercício de 2011, o requerido apresentou o passivo de €56.473.013,86 e o activo de €58.695.246,86?
31-Relativamente ao exercício de 2011, o requerido apresentava no passivo uma dívida à EfA...c, no valor de €4.066.268,06?
Relacionado com este estão os quesitos 32 e 33 que tinham a seguinte redacção (na sequência do quesito 31): (…) à E… no valor de €4.781.647,92? E à AT…- S.A., no valor de €272.234,72?
E foi respondido: - Aos quesitos 29 e 30: Nas contas relativas ao exercício de 2011 o requerido apresenta o passivo de €56.473.013,86 e o activo de €58.695.246,86. - Aos quesitos 31 a 33: Relativamente ao exercício de 2011, o requerido apresentava no passivo dívidas à EfA… Engenharias, SA, no valor de €4.066.268,06, à E.. S.A., no valor de €4.781.647,92 e à AT..., no valor de €272.234,72.
Portanto, aos artigos 29 e 30 foi respondido restritivamente, ou seja, não foi dado como provado que, relativamente ao exercício de 2011, o requerido apresentava no passivo uma dívida de…; mas apenas que, “nas contas relativas ao exercício de 2011 o requerido apresenta o passivo de…”.
Relativamente aos artigos 29 e 30 foi dada a seguinte fundamentação: a resposta a estes quesitos tem por base o que resulta do balanço em 31/12/2011, constante de fls. 378 dos autos, no qual foram inscritas as verbas em causa a título de activo e passivo. Esclarece-se que “pese embora em sede de audiência de julgamento tenha sido questionada a correcção das contas, concretamente no que se refere às verbas contabilizadas a título de activo e passivo, o Tribunal não é uma instância a quem compete a verificação e certificação das contas. Por essa razão, temos como certo o que dos documentos consta, não podendo, apenas por via de depoimentos de técnicos da área contabilística, concluir que estão incorrectos os valores contabilizados, pois tal conclusão, apenas após uma perícia contabilística poderia ser alcançada.”
Na resposta aos artigos 31 a 33 foi dada fundamentação que segue: para responder a estes quesitos o tribu. … e ainda ao que resulta do balancete de fornecedores de fls. 324 e ss., concretamente fls. 325, onde estão inscritas dívidas àquelas sociedades e ainda á AT… SA. A testemunha M... explicou que esses valores poderiam ser aí encontrados e confrontado com o documento identificou-os.
2.4 Entretanto, a apelante argui a nulidade da decisão sobre a matéria de facto relativa aos quesitos 29 e 30, dizendo:
Na resposta à matéria constante dos quesitos 29º e 30º considerou o Tribunal estar “provado que nas contas relativas ao exercício de 2011 o requerido apresenta um passivo de € 56.473.013,86 e o activo de € 58.695.246,86.”
Não se coloca em crise que nas contas do A... relativamente ao exercício de 2011, se encontra apresentado o activo e passivo que o Tribunal considerou na sua resposta à matéria de facto, como se infere da expressão supra transcrita.
O que importa, isso sim, é saber se o passivo e activo do A..., naquela data de 31/12/2011, era aquele efectivamente apresentado, ou seja, se o A... tinha realmente aquele passivo e se tinha realmente aquele activo, apresentados, tudo reportado a uma determinada data – final do exercício 2011.
A resposta dada aos quesitos é insuficiente para a prova da correcção dos elementos ali constantes, na medida em que o ali perguntado é se eram aqueles os valores que o A... apresentava naquele momento, no sentido da sua correspondência com a realidade, ou seja, se estão correctos, ao passo que a resposta do Tribunal se restringiu à conclusão de que está provado que nas contas (palavras que restritivamente aditou à formulação inicial dos quesitos) relativas ao exercício de 2011 o A... apresenta aqueles valores.
Em todo o caso, o Tribunal recorrido, na fundamentação da resposta à matéria de facto, escreveu que “temos como certo o que dos documentos consta”, donde parece resultar que, afinal, considerou como correctos os valores apresentados nas contas, o que representa nulidade da mesma resposta, assim expressamente arguida, uma vez que a decisão se encontra em oposição com os respectivos fundamentos: enquanto ali se respondeu, restringindo o questionado, que foram aqueles os valores apresentados nas contas, aqui se consideram correctos esses mesmos valores apresentados – art.º 668º, n.º 1, alínea c), “ex vi” do art.º 653º, n.º 2 “in fine”, ambos do CPC.
E a diferença é boa de ver: uma coisa são os valores apresentados nas contas, outra, diversa, é a correcção ou conformidade desses valores.
O apelado defende que não se verifica arguida nulidade.
Também a Mª Juíza se pronunciou nos seguintes termos: Indefere-se a requerida declaração de nulidade não alegando desde logo a recorrente qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, mas sim alegadamente entre a decisão sobre a matéria de facto e os fundamentos da decisão final, o que veda aplicação do disposto no artigo 668.º, n.º 1 al. c) do CPC, que prevê a existência de oposição entre a decisão final e a motivação dessa mesma decisão.
Conhecendo.
Nos termos do n.º 1, alínea c) do artigo 668.º do CPC, é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão. Esta disposição legal é também aplicável aos despachos.
À primeira vista parece haver, com efeito, contradição entre as respostas dadas aos quesitos 29 e 30 e a respectiva fundamentação, uma vez que, por um lado foi respondido restritivamente, ou seja, não se deu como provado que o passivo e o activo eram o que constava dos quesitos e, por outro, referiu-se na fundamentação: “temos como certo o que dos documentos consta”. Parece assim resultar que, afinal, se considerou como correctos os valores apresentados nas contas, no sentido de que era aquele o activo e o passivo.
A matéria foi alegada pelo apelado nos artigos 202 a 204 a contestação pela seguinte forma: Nas contas de A..., relativas ao exercício de 2011 o passivo registado era inferior ao activo em €2.222.233,00 (202). O activo era, naquela data, de €58.695.246,86 e o passivo de €56.473.013,86 (203). Ou seja, o passivo registado era inferior em mais de 4% ao activo (204).
Pretendia-se, pois, provar que o “passivo registado” era inferior ao activo.
Os quesitos não foram formulados nos precisos termos em que a matéria foi alegada, pois nesta já se fazia referência ao que constava “nas contas “ do A..., pelo que, as respostas dadas vieram, de algum, modo, repor o que constava da matéria alegada. A fundamentação terá sido no sentido de que, fA... ao que constava dos documentos juntos (no artigo 202 da contestação remete-se para o balanço do A... em 31.12.2011) não havia razões para pôr em causa os valores apresentados. Mas só seria assim se fosse tomado em consideração o que constava dos documentos juntos aos autos.
Mas há que concluir que não foi dado como provado que, quer o activo, quer o passivo, eram os que tinham sido alegados; apenas se provou que esses valores eram os que constavam das contas do A....
Não se verifica, pois, a arguida nulidade.
2.5 O apelante diz que, não obstante, «caso se entenda (…) que ao responder como respondeu, o Tribunal deu como provada a correcção/conformidade das contas, pretende então a aqui requerente demonstrar o manifesto erro de julgamento, pelo que deverá esse Tribunal “ad quem” considerar aquela matéria não provada».
Vejamos então se se justifica a alteração das respostas dadas aos artigos 29, 30 e 31 da BI.
A apelante tece a este propósito tão extensas quão doutas considerações. Sucede, porém, que a generalidade dos depoimentos transcritos pouco ou nada tem que ver com a matéria destes quesitos.
Como vimos, aos quesitos 29 e 30 foi respondido restritivamente, remetendo-se aqui para o que foi dito sobre a arguida nulidade. E da fundamentação da resposta a estes artigos da BI colhe-se que a mesma teve por base “o que resulta do balanço em 31/12/2011, constante de fls. 378 dos autos, no qual foram inscritas as verbas em causa a título de activo e passivo”.
Consequentemente, tendo em atenção a resposta restritiva aos artigos 29 e 30, não vemos qualquer razão para ser alterada a resposta dada com base nos depoimentos das testemunhas transcritos pela requerente.
E o mesmo se decide em relação à resposta dada ao quesito 31.
2.6. Estamos no domínio da convicção probatória, sendo certo que o artigo 396º do C. Civil consagra o princípio da liberdade de apreciação da força probatória dos depoimentos das testemunhas. O que significa que o tribunal julga segundo a sua consciência ou segundo a convicção que formou, através da influência que no seu espírito exerceram as provas produzidas, avaliadas segundo o seu juízo e a sua experiência (cfr. o art.º 655º do CPC). Ora, no caso em apreço, tendo este Tribunal procedido à leitura dos depoimentos prestados na audiência de julgamento e à análise dos documentos constantes do processo, constata-se não haver elementos que permitam justificar a alteração das respostas dadas pelo do julgador de 1ª instância.
IV
Tendo em consideração a matéria de facto assente, vejamos a questão de direito.
Determina o artigo 3º, nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) [2], aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/04 de 18 de Março, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 200/04 de 18 de Agosto: «[é] considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas». E o nº 2 do mesmo preceito estatui que, no caso de o devedor ser uma pessoa colectiva ou património autónomo por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, directa ou indirectamente, é também considerado insolvente «quando o seu passivo seja manifestamente superior ao seu activo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis».
A situação de insolvência consiste, pois, como resulta desta disposição normativa, na impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas.
A lei admitiu dois importantes ajustamentos a esta noção: o primeiro, equiparando a situação de insolvência iminente à situação de insolvência actual como fundamento de apresentação à insolvência, permitindo assim ao devedor proceder à abertura do processo no caso de insolvência iminente, mediante a sua apresentação à falência; e o segundo restrito às pessoas colectivas e patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma directa ou indirecta, considerando-os insolventes quando o respectivo passivo seja manifestamente superior ao activo, mesmo que não tenham manifestado a insusceptibilidade de satisfazer pontualmente os respectivos compromissos – cfr. art.º. 3º, nºs 4 e 2, respectivamente.
Quando, como no caso presente, o pedido de declaração de insolvência não é formulado pelo devedor, a legitimidade activa (ad substantiam) é condicionada pela verificação de alguma das situações elencadas nas alíneas a) a h) do nº1 do art.º. 20º: - suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas – al. a); - falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações – al. b); - fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor, ou abandono do local em que a empresa tem a sede ou exerce a sua principal actividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo – al. c); - dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constituição fictícia de créditos – al. d); - insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente em processo executivo movido contra o devedor – al. e); - incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos (art. 218º nº1, al. a) e nº2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa) – al. f); - incumprimento generalizado, nos últimos seis meses de dívidas tributárias, contribuições e quotizações para a segurança social, dívidas emergentes de contrato de trabalho, ou da sua cessação ou violação, rendas de qualquer tipo de locação, prestações do preço da compra ou de empréstimo garantido por hipoteca, relativamente a local em que o devedor realize a sua actividade ou tenha a sua sede ou residência - al. g); - sendo o devedor pessoa colectiva ou património autónomo, por cujas dívidas nenhuma pessoa individual responda pessoal e ilimitadamente, manifesta superioridade do passivo sobre o activo segundo o último balanço aprovado, ou atraso superior a nove meses na aprovação e depósito das contas, se a tanto estiver legalmente obrigado – al. h).
A verificação de um destes factos indicia que o devedor pode estar em situação de insolvência, ou seja, de não estar em situação de poder cumprir as obrigações vencidas. Trata-se de “factos-índice” que estabelecem meras presunções do estado de insolvência, pelo que admitem prova em contrário (artigo 350.º do CC). Mas, para verificação dessa presunção é necessário que o requerente alega e prove os factos que a ela conduzem.
Assim, quando a insolvência é requerida por qualquer das pessoas referidas no artigo 20.º, o requerido pode impedir a declaração de insolvência por uma de duas vias: demonstrando que não se verifica qualquer dos invocados “factos índice”, ou demonstrando que, não obstante a ocorrência desse(s) facto(s), não se verifica, no caso concreto, a situação de insolvência.
A este propósito foi referido no acórdão desta Relação, de 05.05.2011, proferido no processo n.º 219/10.6TBCDV-A.L1-2 (disponível em WWW.dgsi.pt):
«A insolvência é, em geral, a impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas. Assim, no CIRE, consoante resulta do seu artº 3, a situação de insolvência consiste na impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas - sendo que as pessoas colectivas e os patrimónios autónomos são genericamente (embora com excepções) considerados insolventes, também, quando o seu passivo seja manifestamente superior ao activo.
Vem sendo entendido, todavia, que para caracterizar a insolvência, a impossibilidade de cumprimento não tem de abranger todas as obrigações assumidas pelo insolvente e vencidas, sendo o que verdadeiramente releva para a insolvência é a insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento evidenciam aimpotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. Como destacam Carvalho Fernandes e João Labareda ([3]) “pode até suceder que a não satisfação de um pequeno número de obrigações ou até de uma única indicie, só por si, a penúria do devedor, característica da sua insolvência, do mesmo modo que o facto de continuar a honrar um número quantitativamente significativo pode não ser suficiente para fundar saúde financeira bastante”.
Já no art. 20, n.º 1, do CIRE se prescreve: «A declaração de insolvência de um devedor pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados, verificando-se algum dos seguintes factos:
a) Suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas;
b) Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade do devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações; (…)
Trata-se dos chamados factos-índices ou presuntivos da insolvência “tendo precisamente em conta a circunstância de, pela experiência da vida, manifestarem a insusceptibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações, que é a pedra de toque do instituto”.
Consoante salienta Catarina Serra “os factos enunciados na norma do nº 1 do art. 20º são indícios ou sintomas da situação de insolvência (factos-índice). É através deles que, normalmente, a situação de insolvência se manifesta ou se exterioriza. Por isso, a verificação de qualquer um deles permite presumir a situação de insolvência do devedor e é condição necessária para a iniciativa processual de certos sujeitos, nomeadamente dos responsáveis legais pelas dívidas do devedor, dos credores e do Ministério Público. Mas o devedor pode sempre ilidir esta presunção, provando que, não obstante a ocorrência de um ou mais factos do tipo enunciado, a situação de insolvência não se verifica…O único pressuposto objectivo da declaração de insolvência não deixa, assim, de ser a situação de insolvência (cfr. Art. 3.º), sendo os factos-índice meros fundamentos necessários mas não suficientes do requerimento da declaração de insolvência do devedor”.
Parece-nos ser de seguir a doutrina expendida neste douto acórdão.
Na douta sentença começou por se afirmar: a questão que se coloca neste processo é a de saber se deve ser declarada a insolvência do requerente, questão que passa pela determinação da situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas e/ou da existência de um passivo manifestamente superior ao activo.
Depois foram feitas considerações várias sobre os artigos 3.º e 20.º do CIRE.
Seguidamente foi dito que a requerente fundamentou o pedido de insolvência alegando, por um lado, que era credora do requerido e que este não lhe pagou, tal como não pagava à generalidade dos fornecedores e à banca. E, por outro lado, que o requerido tem um activo inferior ao passivo, não tendo meios de, com a sua actividade, gerar liquidez para efectuar os pagamentos devidos.
Foi então apreciada a questão relativa à invocada existência do crédito que o requerido contesta, tendo sido decidido: Assim, e nesta parte, entendemos que a requerente não demonstrou ser titular de qualquer crédito certo, liquido, exigível e não pago à data do pedido de declaração de insolvência decorrente de trabalhos realizados e facturados.
E logo a seguir foi ponderado: «No entanto, a requerente invoca ainda a titularidade de um crédito no valor de €1.684.777,07, que adquiriu por cessão de créditos celebrada com a E. Gestão de Projectos de Engenharia, S.A., em 3.2.2012. O requerido contesta a validade da cessão e a exigibilidade do crédito. Com relevo para apreciar esta questão importa atentar nos seguintes factos: - Em 30 de Dezembro de 2008, foi celebrado entre a P… e o consórcio formado pelas empresas E.. e Ef.. Engenharias, SA, o contrato de Empreitada de Construção da Central de Cogeração na Refinaria de…. e Prestação de Serviços de… (assente por acordo em audiência de julgamento). - O referido contrato tem como objecto “a concepção, fornecimento, fabrico, construção, montagem, inspecção, comissionamento, ensaios e manutenção por 15 anos da Central de Cogeração na Refinaria de…, baseada em duas Unidades de Cogeração com turbina a gás, utilizando como combustível gás natural e Fuel-gás, e tendo a potência total máxima, aos terminais do alternador, compreendida entre 80MW e 90 MW” (assente por acordo em audiência de julgamento). - Em 12 de Outubro de 2009 foi celebrado o contrato de cessão da posição contratual entre a P.., S.A., a E… e a Ef.. Engenharias, SA, nos termos do qual a posição de Empreiteiro, detida pelo Consórcio no Contrato de Empreitada, foi cedida ao A... requerido. - A requerente e E.. S.A., celebraram o designado contrato de cessão de créditos, datado de 3.2.2012, cuja cópia se mostra junta a fls. 49 a 51 dos autos (alínea S) da matéria assente). - Nos termos desse acordo, E.. S.A., declarou ceder à requerente créditos sobre o A... aqui requerido, no valor global de €1.684.777,07, referentes à factura n.º 1100401581/2011, datada de 31.5.2011, no montante de €1.124.442 e à factura nº 1100401582, datada de 31.5.2011, até ao montante de €560.335,07 (alínea T) da matéria assente). - As referidas facturas correspondem aos 14º e 15º Termos de Pagamento da Divisão de Tarefas da subempreitada de “Fornecimento de…”, inerentes à empreitada referida em B) da matéria de facto assente, nos termos do contrato de subempreitada de 20 de Julho de 2009, celebrado entre E… S.A. e o requerido, conforme cópia de fls.54 a 64 dos autos (alínea U) da matéria assente). - Por carta registada e com A/R, datada de 6.2.2012, enviada em 9.2.2012, e recebida em 10.2.2012, a E.. notificou o A... da cessão e para regularizar o montante de €1.684.777,07 à requerente (alínea V) da matéria assente). - Por carta datada de 1.3.2012, recebida pelo requerido em 5.3.2012, a requerente solicitou o pagamento do montante de €1.684.777,07 (alínea AA) da matéria assente). - O requerido não recebeu da P.., SA o pagamento dos trabalhos a que respeita o contrato de subempreitada, datado de 20 de Julho de 2009, celebrado entre En… – Gestão de Projectos… S.A. e o requerido (resposta ao quesito 12º). - A requerente tinha conhecimento que o requerido apenas pagaria às agrupadas, designadamente à E…, quando recebesse do dono da obra o pagamento dos correspondentes trabalhos, o que apenas aconteceria perto do termo final da obra (resposta ao quesito 14º). Tendo em conta esta factualidade está provada a celebração de uma cessão e créditos entre a requerente e a E….».
Mas, tal como se considerou na sentença, o que Importava era saber se a cessão de créditos é valida e se o crédito subjacente é exigível.
E foi salientado a esse respeito: «Consequentemente, entendemos que não assiste razão ao requerido, quando defende a não cedibilidade do crédito. Questão diversa é a de saber se o crédito é exigível pela cessionária (ora requerente).
(…) Tendo em conta tudo o que se acabou de explicar, a conclusão impõe-se, o crédito cedido é exigível e o seu pagamento foi solicitado pela requerente ao requerido por carta registada e com A/R, datada de 6.2.2012, enviada em 9.2.2012 e recebida em 10.02.2012, e ainda por carta datada de 1.3.2012, recebida pelo requerido em 5.3.2012.
(…) Tudo visto, podemos dizer que a requerente alegou e provou ser credora do requerido». Concluiu-se, assim, na douta sentença que a requerente alegou e provou ser credora do requerido e que o crédito é exigível. E depois foi referido: «[a]qui chegados, temos agora que averiguar se foram provados factos suficientes para integrar a previsão de um dos índices de insolvência previstos no nº1, do art. 20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Analisada a factualidade invocada pela requerente dúvidas não restam que os únicos factos-índice que podem estar em causa são os previstos nas alíneas a) e b) daquele normativo. Ora, quanto à suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas do requerido é óbvio que não ficou demonstrada. A requerente alegou, mas não provou, que o requerido tem dívidas a instituições bancárias, e a outros credores, pelo que, produzida a prova, a única dívida demonstrada é a que supra se referiu, para com a requerente. Assim, excluída fica a subsunção à previsão da alínea a)[3]. Teremos factualidade suficiente para considerar preenchida a alínea b) da mesma norma? É certo que temos apurada uma dívida de valor avultado para com a requerente. Importa atentar que o seu pagamento apenas foi solicitado em Fevereiro do corrente ano, pelo que a longevidade do incumprimento não é aqui um factor relevante. Temos também que considerar que o não pagamento tem, além do mais, por base o entendimento, nestes autos defendido pelo requerido, que a obrigação não é exigível. Que outros factos demonstrou a requerente que, conjugados com a existência da dívida para consigo, permitam concluir pela impossibilidade do requerido satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações? Nenhum, dizemos nós. Efectivamente, a requerente alegou, mas não logrou provar que o requerido tem um passivo de €50.000.000,00; tem como único activo os créditos resultantes da obra em curso na G…; os fornecedores dos materiais para a obra exigem garantias bancárias para continuar a fornecer material, que o requerido não prestou; a obra encontra-se parada, por falta de materiais e a Banca não concede crédito ao requerido. É certo que ficou provado que o requerido cessou os pagamentos para com as agrupadas. Mas estas não são as suas únicas credoras. Este facto, isolado, nenhuma conclusão permite. Pelo contrário, o requerido demonstrou que os contratos de financiamento celebrados com o Banco…, SA estão a ser cumpridos; negociou com um fornecedor um acordo de pagamento, que se encontra a cumprir; tem a sua situação tributária regularizada; tem sede num imóvel da agrupada En…, que lho entregou para o usar sem pagamento de qualquer contrapartida, não devendo qualquer quantia a título de rendas de instalações onde exerce actividade; não tem trabalhadores; concluiu todos os trabalhos de montagem eléctrica e mecânica a realizar na empreitada, tendo-se iniciado, no final do ano passado, as actividades relativas ao funcionamento dos equipamentos da Central de Cogeração que foi construída, seguindo-se a fase de testes e de ensaios, decorrendo os trabalhos sem qualquer interrupção na execução por parte dos subempreiteiros. (…) Ou seja, o requerido provou que não se verifica qualquer das situações previstas na alínea g) do art.20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e demonstrou ainda que o seu activo era no final de 2011, contabilisticamente superior ao passivo, sendo que ainda tem a receber 35% do valor da empreitada, que totaliza cerca de €32.000.000,00. Portanto, o requerido demonstra que tem um activo superior ao passivo. Ora, para se concluir pela situação de insolvência necessário seria que se demonstrasse a existência de uma situação enquadrável nos artigos 3.º e 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o que não se verifica. FA... ao exposto, não poderá ser decretada a insolvência requerida».
V
Como é sabido, é pelas conclusões que se determinam o âmbito e os limites do recurso (artigo 684.º, n.º 3, do CPC).
1. A apelante restringe o recurso ao fundamento a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º. De resto, isso mesmo foi esclarecido no início das suas alegações ao afirmar que os temas fulcrais deixados à apreciação deste Tribunal «reconduzem-se aos de saber se o não pagamento, pelo A..., da dívida para com a requerente no montante de € 1.684.777,07, constitui a verificação de um facto- índice presuntivo da insolvência e, quando assim seja, se o requerido fez prova da sua solvência, como lhe compete».
Sob o capítulo II das alegações de recurso, relativas à “verificação do facto-índice de insolvência prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE”, defende a apelante que são muitos e múltiplos os factos reveladores da impossibilidade de cumprimento das obrigações por parte do A..., elencando alguns factos que, em seu entender, “embora só por si não provem a insolvência do requerido, presumem-na”.
E conclui, «em jeito de síntese, que tendo a requerente provado ser credora do requerido pela quantia de € 1.684.777,07, que o não pagou, e constituindo este crédito, pelo seu montante e demais circunstâncias do incumprimento, um facto-índice presuntivo da situação de insolvência do A..., que este não logrou contrariar, deverá a peticionada declaração de insolvência ser decretada, com as legais consequências.»
Por sua vez, o apelado disse, em síntese: Era à apelante que cumpria alegar e provar factos susceptíveis de serem subsumidos nalgumas das alíneas do nº1 do artigo 20º do CIRE, o que, porém, não fez. Da prova coligida não resultou que o apelado se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, antes resultando que cumpre pontualmente as suas obrigações. Por sua vez, o apelado logrou demonstrar que cumpre pontualmente as suas obrigações, facto que obsta à declaração de insolvência com base no facto-índice previsto no artigo 20º, nº1, pelo que deve a decisão recorrida ser confirmada.
Vejamos.
De acordo com o referido facto-índice, a insolvência de um devedor pode ser requerida verificando-se nomeadamente, “falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações – alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º.
Assim, para a verificação deste facto-índice é necessário que o requerente alegue e prove:
- A falta de cumprimento de uma ou mais obrigações;
- As circunstâncias do incumprimento dessa ou dessas obrigações que revelem a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.
Estes factos, só por si podem não provar a insolvência da requerida. Mas basta que a presumam. É que, neste caso, compete ao devedor ilidir a presunção. «Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tiram de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido» (artigo 349.º do CC)
Por isso, há que averiguar previamente se os factos dados como provados fazem presumir a insolvência; na afirmativa terá de se averiguar se essa presunção foi ilidida.
2. Concorda-se, no essencial, com o teor da sentença, designadamente com o segmento que foi transcrito. Mas convém esclarecer que, como oportunamente foi dito, não se provou que o activo era superior ao passivo. O que se provou foi que o A... “nas contas relativas ao exercício de 2011 apresentou o passivo de €56.473.013,86 e o activo de €58.695.246,86, o que é sensivelmente diferente.
No entanto, o apelante diz que existem nos autos vários factos reveladores da impossibilidade de cumprimento das obrigações por parte do A..., designadamente: a) Da prova produzida resulta que a obra está praticamente pronta, faltando apenas alguns pormenores, pelo que a capacidade de pagar a obra realizada, corresponderá à medida do cumprimento das obrigações do A.... Ora, do depoimento de parte do administrador do A..., Eng.º F.., ficamos a saber que em finais de 2009, princípios de 2010, o A... percebeu claramente que a obra não iria ter resultado positivo, sendo necessários suprimentos por parte das sociedades agrupadas. (…) Apesar na anunciada necessidade de suprimentos, ficou demonstrado que as sociedades agrupadas, até 31/12/2011, não fizeram quaisquer suprimentos ao A..., tendo-o apenas feito já no ano de 2012, no montante correspondente aos documentos de fls. 174 e 298 a 320 dos autos, no montante aproximado de 1 milhão 350 mil euros. b) O A... detém uma única obra, para a realização da qual foi constituído e que se esgota com a sua conclusão, tendo como únicos créditos os resultantes dessa obra. O mesmo é dizer que a sua situação líquida final ficará necessária e definitivamente condicionada pelo resultado da própria obra, uma vez que não terá a possibilidade de a reverter futuramente, com a realização de outras obras. Se a obra der prejuízo, será forçosamente negativo o resultado líquido do A..., e vice-versa. Nas palavras do identificado administrador, “Pensamos que temos alguns prejuízos que as agrupadas vão ter que suportar, mas penso que não ascenderão a esses valores, nem pouco mais ou menos”. Isto é, mesmo com a inclusão no activo a 31/12/2011 de cerca de 10 milhões de acréscimos não reconhecidos pelo Dono da Obra, bem assim como a inclusão da totalidade do valor contratualmente devido sem que a mesma esteja acabada, aquele administrador confessa expressamente que a obra tem prejuízo efectivo. Acresce que se encontra provado que o A... deixou de pagar às sociedades agrupadas os seus pacotes privativos, que são suas credoras em largos milhões de euros, em montante não concretamente apurado, mas que na alegação do próprio requerido ascende a mais de 9 milhões de euros (cerca de 10% do valor da obra), e que o A... requerido reconhece não poder pagar. c) O A... inscreveu no activo a totalidade do valor da obra contratado, acrescido de um rédito não reconhecido pelo Dono da Obra, constituindo a soma dos dois, o valor máximo recebível. Vejamos agora o passivo: Desde 31/12/2011 até agora o passivo tem vindo a aumentar exponencialmente sem correspondência no activo. Através do depoimento da testemunha F… (T..), ficamos a saber que a dívida do requerido para com aquele fornecedor, a 31/12/2011, era de cerca de 1 milhão e 400 mil euros, e que agora está em 3 milhões e 200 mil euros. A própria requerente C.., já realizou trabalhos, ainda não facturados, correspondentes a 10% do seu contrato de subempreitada, no valor de € 290.000,00 – alínea Q) dos factos assentes. Todos os fornecedores deverão ter ainda para facturar valores nunca inferiores a 10% dos seus contratos, o que representa um acréscimo mínimo do passivo em mais 9,5 milhões de euros. d) Todos os pagamentos a fornecedores documentados nos autos, inclusive o valor de 611 mil euros pago à requerente já na pendência do presente processo, foram feitos pela agrupada Ef…, facto demonstrativo da falta de activo disponível para o pagamento das obrigações do A.... Outro tanto, O A... tem vários financiadores (cfr. 130º e 144º da oposição) e apenas fez prova do cumprimento dos contratos celebrados com o Banco... e) A obra parou várias vezes devido a falta de pagamentos, nomeadamente em final de Novembro de 2011 (Doc. 1 junto com a oposição), e esteve na iminência de nova paragem pelo mesmo motivo, no final de Dezembro de 2011 (Doc.6 junto com a oposição), e tem um atraso de 394 dias, sendo mais que certa aplicação de multas contratuais por parte da Galp.
A apelante reconhece que “tudo isto não prova a insolvência do requerido”, mas que a presumem.
3. Vejamos cada uma das alíneas referidas e pela mesma ordem[4].
Mas há que começar por dizer que a apelante invoca factos que não foram dados como provados e os depoimentos de testemunhas para justificar certas afirmações que faz. A verdade é que o juiz, conforme preceituado no n.º 2 do artigo 264.º do CPC, apenas pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa.
Ora, in casu, não se verifica qualquer das excepções previstas, pelo que apenas poderemos ter em conta os factos provados.
a) – Em relação a esta alínea há que dizer que a apelante não pode invocar nesta sede o depoimento de testemunhas para prova de factos não alegados e/ou não provados na altura própria. Mas, salvo melhor opinião não se vê que esses mesmos factos possam revelar qualquer indício de insolvência do requerido
Não foi alegado e muito menos provado que a requerido tinha necessidade de suprimentos. De qualquer forma tratar-se-ia de um facto que não revelaria a eventual impossibilidade de o recorrido poder cumprir as obrigações vencidas.
b) O facto de o A... apenas ter uma única obra (o que não foi provado), só por si não constituiria qualquer indício do estado de insolvência. Mas acrescenta a apelante que a sua situação líquida final ficará necessária e definitivamente condicionada pelo resultado da própria obra, uma vez que não terá a possibilidade de a reverter futuramente, com a realização de outras obras e se a obra der prejuízo, será forçosamente negativo o resultado líquido do A..., e vice-versa.
Trata-se, contudo, de mera previsões e não de factos que possas indiciar a insolvência do requerido.
A requerente também alegou: como activo, o A... tem apenas os créditos resultantes da obra em curso na G... Mas em resposta ao artigo 3 da BI este facto foi dado como “não provado”.
Por outro lado, há que ter em conta que a pretensa “inclusão no activo a 31/12/2011 de cerca de 10 milhões de acréscimos não reconhecidos pelo Dono da Obra, bem assim como a inclusão da totalidade do valor contratualmente devido sem que a mesma esteja acabada” não consta da matéria de facto provada.
c) Não vemos que da factualidade constante desta alínea possa resultar qualquer indício do estado de insolvência do requerido. De resto, por um lado, não está demonstrado que o passivo é superior ao activo e, por outro, não está em causa o fundamento a que alude a alínea h) do n.º 1 do artigo 20.º.
d) Não é exactamente essa a matéria de facto que vem provada. O que se provou foi que a EF… efectuou suprimentos ao A..., valor que foi utilizado pelo requerido para pagar, designadamente, à requerente (resposta os artigo 22 e 23 da BI). A verdade é que, conforme reconhece a apelante, “todos os pagamentos a fornecedores documentados nos autos, inclusive o valor de 611 mil euros pago à requerente já na pendência do presente processo”.
É certo que esse facto pode ser demonstrativo da falta de activo disponível para o pagamento das obrigações do A.... Mas não constitui índice da situação de insolvência.
Também não se encontra provado nos autos que o A... tem vários financiadores e que apenas fez prova do cumprimento dos contratos celebrados com o Banco.
e) Não está provado que a obra parou várias vezes devido a falta de pagamentos, nem se vê que isso resulte do doc. 1 junto com a oposição.
No artigo 6 da BI perguntava-se: «a obra encontra-se parada, por falta de materiais? E foi respondido: “não provado”.
4. Há, pois, que concluir que nenhum dos alegados “factos-índice” faz presumir a situação de insolvência do requerido. No entanto, sempre se acrescentará, tal como foi feito na sentença recorrida: o requerido demonstrou que os contratos de financiamento celebrados com o Banco.., SA estão a ser cumpridos; negociou com um fornecedor um acordo de pagamento, que se encontra a cumprir; tem a sua situação tributária regularizada; não tem trabalhadores; concluiu todos os trabalhos de montagem eléctrica e mecânica a realizar na empreitada, tendo-se iniciado, no final do ano passado, as actividades relativas ao funcionamento dos equipamentos da Central de Cogeração que foi construída, seguindo-se a fase de testes e de ensaios, decorrendo os trabalhos sem qualquer interrupção na execução por parte dos subempreiteiros.
Nesta conformidade, há que confirmar a sentença recorrida.
VI
Como dissemos, o requerido pretende interpor recurso ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 684.º-A do CPC.
A apelante defende que o recurso não deve ser recebido ou, caso assim se não entenda, dever ser julgado improcedente.
Vejamos.
1. A requerente alega ser credora do requerido por várias dívidas, nomeadamente dizendo que é titular de um crédito sobre o requerido, no valor de 1.684.777,07 euros, por lhe ter sido cedido por EN…
Como diz o requerido, há que distinguir em dois blocos diferentes os créditos invocados pela requerente, a saber:
- Em primeiro lugar os créditos resultantes de trabalhos prestados pela requerente ao A..., no âmbito da empreitada e por força do contrato de subempreitada celebrado entre a requerente e o A....
- em segundo lugar o invocado crédito emergente do contrato de cessão de créditos.
Na sentença foi decidido em relação ao primeiro: Assim, e nesta parte, entendemos que a requerente não demonstrou ser titular de qualquer crédito certo, liquido, exigível e não pago à data do pedido de declaração de insolvência decorrente de trabalhos realizados e facturados.
E em relação ao crédito cedido (2º) foi dito:
«Tendo em conta tudo o que se acabou de explicar, a conclusão impõe-se, o crédito cedido é exigível e o seu pagamento foi solicitado pela requerente ao requerido por carta registada e com A/R, datada de 6.2.2012, enviada em 9.2.2012 e recebida em 10.02.2012, e ainda por carta datada de 1.3.2012, recebida pelo requerido em 5.3.2012.
(…) Tudo visto, podemos dizer que a requerente alegou e provou ser credora do requerido». Concluiu-se, assim, na douta sentença que a requerente alegou e provou ser credora do requerido, e que o crédito é exigível.
Apesar disso, não foi decretada a insolvência, pelas razões supra referidas, nomeadamente da parte que foi transcrita e muito particularmente porque: «…Ou seja, o requerido provou que não se verifica qualquer das situações previstas na alínea g) do art.20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e demonstrou ainda que o seu activo era no final de 2011, contabilisticamente superior ao passivo, sendo que ainda tem a receber 35% do valor da empreitada, que totaliza cerca de €32.000.000,00. (…) Ora, para se concluir pela situação de insolvência necessário seria que se demonstrasse a existência de uma situação enquadrável nos artigos 3.º e 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o que não se verifica»
Neste recurso, na parte final das alegações diz a apelante “em jeito de síntese”:… tendo a requerente provado ser credora do requerido pela quantia de € 1.684.777,07, que o não pagou, e constituindo este crédito, pelo seu montante e demais circunstâncias do incumprimento, um facto-índice presuntivo da situação de insolvência do A..., que este não logrou contrariar, deverá a peticionada declaração de insolvência ser decretada, com as legais consequências.
2. Pelo que ficou dito nos capítulos anteriores, a sentença terá de ser confirmada, ou seja, não vai ser decretada a insolvência.
Entretanto, o requerido pretende interpor recurso ao abrigo do disposto no n.º 1 artigo 684.º-A do CPC, que tem a seguinte redacção: «No caso de pluralidade de fundamentos da acção e da defesa, o tribunal de recurso conhecerá do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respectiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação».
Como vimos, a requerente invocou, além do mais, ser titular de um crédito sobre o requerido em virtude de um contrato de cessão de crédito celebrado com um devedor do A....
A sentença, embora tenha considerado válida a cessão do crédito, não decretou a insolvência. Ou seja: concluiu-se na douta sentença que a requerente alegou e provou ser credora do requerido e que o crédito é exigível. Mas não foi decretada a insolvência e, por isso, o requerido não podia interpor recurso.
Porém, o requerido diz que “mal andou a sentença” “ao considerar o contrato de cessão de créditos celebrado entre a apelante e a EN… válido e o seu crédito certo, líquido e exigível”. E, como decaiu quanto a esse fundamento, interpôs recurso ao abrigo daquela disposição legal.
Os fundamentos alegados são, no essencial, os constantes dos nºs 7, 8, 11 e 12 das conclusões que ficaram transcritas.
3. Parece-nos, contudo, que não se justifica que se conheça do objecto do recurso, pois a decisão a proferir não poderá ter qualquer influência na decisão da causa, nem a mesma admite, em princípio, recurso (artigo 14.º do CIRE).
A requerente alega ter um crédito sobre o requerido em virtude de lhe ter sido cedido nos termos referidos.
O A... requere então que “se considere a cessão de créditos inválida, por padecer de nulidade, nos termos dos artigos 280.º, n.º 1, e 294.º, ambos do CPC e, por conseguinte, que se considere a ora apelante parte ilegítima na presente acção” por não preencher os termos do artigo 20.º, n.º 1, do CIRE.
Salvo melhor opinião, a legitimidade da requerente não pode ser posta em causa, pois, por um lado, foram invocados outros fundamentos e, por outro, nos termos do n.º 3 do artigo 26.º do CPC, a requerente é sujeita da relação controvertida tal como a configura, ou seja, alega ser credora do requerido pelos fundamentos que invoca; não se provando esse crédito, não é declarada a insolvência.
Qualquer que fosse a decisão a proferir sobre este recurso, não produziria qualquer efeito sobre a decisão a tomar, ou seja, sobre a (não)declaração da insolvência.
O n.º 1 do artigo 684.º-A, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 39/95, veio admitir a ampliação do âmbito do recurso, a requerimento do recorrido, quando se verifique mais de um fundamento (quer da acção, quer da defesa), permitindo que o tribunal “ad quem” conheça do fundamento (ou fundamentos) em que a parte vencedora decaiu, caso venha a julgar procedente o recurso interposto por quem ficou vencido. Com a dita alteração legislativa resolveu-se uma questão que vinha sendo discutida, no sentido de saber se, nestes casos, a parte vencedora podia recorrer.
Resulta, pois, daquela disposição normativa que, no caso de pluralidade de fundamentos, quer da acção, quer da defesa, o tribunal de recurso conhecerá do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira…, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
Entretanto, esta solução está condicionada, em articulação com os princípios dispositivo e da auto-responsabilidade das partes, à respectiva alegação, a título subsidiário, pela parte vencedora. Por isso, verificados aqueles pressupostos, a parte recorrida poderá suscitar a reapreciação da questão; «e deverá fazê-lo naturalmente a título subsidiário, prevenindo a necessidade de tal questão ser reapreciada, o que ocorrerá no caso de o recurso interposto pela contraparte vir a ser julgado procedente…[5]»
Na sentença sob recurso não foi atendida a argumentação/fundamentação do requerido, mas também não foi atendido o pedido da requerente, ou seja, não foi decretada a insolvência. A verdade é que, quanto a esse fundamento, o requerido ficou vencido.
Estabelece o artigo 1.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)[6], sob a epígrafe «Finalidade do processo de insolvência»: «[o] processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência, que nomeadamente se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente».
No caso sub judice não foi decretada a insolvência, e a sentença vai ser confirmada.
Não se vê, pois, que tenha qualquer interessa para o requerido ver apreciada esta questão, uma vez que a decisão a tomar apenas produziria efeitos dentro do processo. E, como se disse, estes seriam nulos.
Nesta conformidade, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto pelo requerido ao abrigo do disposto no artigo 684.º-A do CPC.
**
Por todo o exposto julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela requerente.
Lisboa, 18 de Dezembro de 2012.
José David Pimentel Marcos
Tomé Gomes
Maria do Rosário Morgado.
---------------------------------------------------------------------------------------- [1]Comentário ao Código de Processo Civil, vol. I, Almedina, 2004, págs. 584/585. [2] Diploma do qual são as disposições legais a citar, sem indicação doutra origem. [3] O que já não vem posto em causa neste recurso. [4] A numeração é nossa; os outros factos, e não referidos, não têm qualquer interesse ou pura e simplesmente não se encontram provados ou nem sequer foram alegados. [5] LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2ª edição, 2004, Almedina, pág. 574.