CONTRA-ORDENAÇÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA
PRAZO
NOTIFICAÇÃO
Sumário

I - O prazo de 10 dias para pagamento da taxa de justiça, prevista no artº 8º nº8 do RCP conta-se as partir da notificação do despacho que recebe a impugnação judicial e na sua sequencia designa dia para julgamento ou determina que a decisão seja proferida por despacho.
II - Sendo omitido esse pagamento, a secretaria deve notificar o interessado para proceder em 10 dia são seu pagamento acrescido de multa, nos termos do artº 642º CPP em vi artº 41º RGCO e artº 4º CPP.

Texto Integral

Processo n.º 1345/17.6Y2MTS.P1

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO
No recurso de contraordenação n.º1345/17.6Y2MTS do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal de Matosinhos, J2, por decisão proferida em 29/9/2017, foi julgado deserto o recurso, pelo não pagamento da taxa de justiça, e declarada extinta a instância nos termos do art.63.º, n.º1, do RGCOC.
Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões (transcrição):
1 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferia nestes autos que julga deserto o recurso e declara extinta a instância, nos termos do disposto no artº 63º nº 1 do RGCOC.
2 - Visa o presente recurso apreciar duas questões;
a) – Se o pagamento da taxa de justiça devida nos termos do disposto no artº8º nºs 7 e 8 do RCP pode ser paga no prazo de 10 dias após a designação da data definitiva para a audiência de discussão de julgamento.
b) – E, se a falta de pagamento da taxa de justiça pelo recorrente, implica que o Tribunal o notifique para o efeito.
3 - O prazo para pagamento da taxa de justiça devida nos termos do disposto no artº 8º do RCP contar-se a partida da notificação da data definitiva para a realização da audiência de julgamento.
4 - E, no caso sob apreciação no dia 19 de Setembro ainda não se encontrava esgotado aquele prazo, sendo permitido o recorrente o pagamento da taxa de justiça devida.
5 - Mas, caso assim não se entenda, deve o recorrente ser notificado pela secção de processos para liquidar a taxa de justiça acrescida de multa nos termos do disposto no artº 642º do CPC e 4º do CPP:
6 - Não pode considerar-se deserto o recurso sem que o recorrente seja notificado para proceder ao pagamento acrescido da respetiva multa.
7 - A decisão recorrida faz errada interpretação e aplicação das normas supra identificadas e do disposto no artº 8º nº 4 do RCP.
Termos em que, pelas razões aqui aduzidas, deve conceder-se provimento a presente recurso e revogada a decisão que considerou deserto o presente recurso, substituindo-o por outro que determine como tempestivo o pagamento efetuado pelo recorrente no dia da realização da audiência de julgamento ou, caso assim se não entenda, seja ordenada a notificação do recorrente para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, como é de inteira J U S T I Ç A!.
O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência (fls.89 a 96).
Remetidos os autos ao tribunal da relação e aberta vista para efeitos do art.416.º, n.º1, do C.P. Penal, o Sr. Procurador-geral apôs visto.
Colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos a conferência.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Decisão recorrida
O despacho recorrido tem o seguinte teor:
«Nos presentes autos de RCO, aberta a audiência de discussão e julgamento, verificou-se que o Recorrente não havia junto o comprovativo da autoliquidação da taxa de justiça devida (a qual deveria ter sido paga nos 10 dias posteriores à notificação do despacho de fls. 34/35, estando o PR datado 14/07/2017, cf. fls.37).
Confrontado com o facto, o I. Mandatário do Recorrente alegou que havia emitido um DUC, em tempo, o qual se encontra liquidado, mas que, por lapso foi junto a um outro processo.
Nessa sequência, interrompeu-se a audiência, permitindo-se ao I. Mandatário que se deslocasse ao escritório a fim de encontrar o necessário comprovativo.
Retomada a diligência, pelo Recorrente foi junto novo DUC, cujo montante foi liquidado no dia 18 de Setembro de 2017 – data da diligência – conforme fls. 69.
Em face disto, o Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser julgado deserto o recurso, por falta de pagamento tempestivo da taxa de justiça, uma vez que o prazo de pagamento precludiu a 5 de Setembro de 2017, como melhor se alcança do teor da acta de fls. 60.
Nessa sequência, o Recorrente veio, então, dizer que, por manifesto lapso, procedeu à junção do DUC e respectivo comprovativo a um outro processo de contra-ordenação, requerendo prazo para juntar a estes autos o comprovativo do alegado. Mais invoca, sem prescindir, que tendo havido uma alteração de data, deve considerar-se como data a partir da qual deva proceder-se à autoliquidação da taxa de justiça a da notificação do correspondente despacho.
Por se vislumbrar a possibilidade do lapso invocado se consubstanciar num justo impedimento, o Tribunal concedeu ao Recorrente a possibilidade de juntar o documento a que aludiu.
Assim, em 19/09/2017, o recorrente procedeu à junção “do DUC comprovativo da autoliquidação da taxa de justiça que por lapso se juntou ao processo contraordenação n.º 3-148-2017 – em que é recorrida C. M. B…” (cf. fls. 64 e ss.).
Levadas a cabo as competentes pesquisas, verificou-se que o DUC ora junto foi liquidado, precisamente, no dia 19-09-2017, ou seja, no próprio dia em que foi junto a estes autos e não, ao contrário do que queria fazer crer o Recorrente, nos 10 dias após a notificação do despacho de fls. 34/5 (cf. fls. 70).
Vejamos, então.
Dispõe o art.º 8.º, n.º 7, do RCP que “É devida taxa de justiça pela impugnação das decisões de autoridades administrativas, no âmbito de processos contra-ordenacionais, quando a coima não tenha sido previamente liquidada, no montante de 1 UC, podendo ser corrigida, a final, pelo juiz, nos termos da tabela iii, que faz parte integrante do presente Regulamento, tendo em consideração a gravidade do ilícito”.
Prossegue o n.º 8 estatuindo que “A taxa de justiça referida no número anterior é autoliquidada nos 10 dias subsequentes à notificação ao arguido da data de marcação da audiência de julgamento ou do despacho que a considere desnecessária, devendo ser expressamente indicado ao arguido o prazo e os modos de pagamento da mesma”.
Temos assim que o citado artigo 8.º, n.º 7 estabelece para o processo contraordenacional um único pagamento da taxa de justiça, diferenciando-se o momento de pagamento em função do facto de ter ou não havido lugar ao pagamento prévio da coima.
In casu, não houve pagamento da coima, o recorrente foi notificado para autoliquidar a taxa de justiça no prazo legal e não o fez.
Alegado o justo impedimento, comprovou-se que o DUC ora junto não foi autoliquidado no prazo devido.
Acresce que, não temos dúvidas, o despacho a que se refere é o art.º 8.º, n.º 8 é um único – é aquele que poderemos apelidar de “despacho de recebimento”, onde o juiz designa data para a audiência ou notifica as partes para dizerem se se opõem à prolação da decisão por mero despacho (art.º 64.º e 65.º, do RGCOC).
Assim sendo, não pode o tribunal aderir à tese do recorrente de que, a cada alteração de data, ou demais vicissitudes que motivem um adiamento, renasce um novo prazo de 10 dias para que a taxa de justiça seja autoliquidada pois que tal contenderia com a segurança jurídica e, a final, com o próprio princípio da igualdade pois que se estaria a dar um benefício injustificado apenas pelo simples facto de ter ocorrido uma alteração na data primeiramente designada.
Face ao exposto, não estando o recorrente isento do pagamento de taxa de justiça, não tendo requerido Apoio Judiciário e não tendo procedido ao pagamento da taxa de justiça devida em tempo, julga-se deserto o recurso e declaro extinta a instância, nos termos do art.º 63.º, n.º 1, do RGCOC.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
Mts, ds.»
Apreciação
O âmbito do recurso é delimitado pelo teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação, apresentada, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso.
No caso presente, atentas as conclusões apresentadas, as questões trazidas à apreciação deste tribunal são as seguintes:
- se a taxa de justiça devida nos termos do art.8.º, n.ºs 7 e 8 RCP tem de ser paga no prazo de 10 dias após o despacho que designa dia para julgamento ou após a fixação definitiva da data para realização da audiência de julgamento;
- se a falta de pagamento da taxa de justiça pelo recorrente, implica que o tribunal o notifique para o efeito, com o acréscimo de multa de igual montante.

1ªquestão: sustenta o recorrente que o pagamento da taxa de justiça nos termos do art.8.º n.ºs 7 e 8 do RCP tem lugar no prazo de 10 dias após a fixação definitiva da data designada para a audiência de julgamento e não da data designada inicialmente e que não obteve a concordância do mandatário.
Entendemos não assistir razão ao recorrente.
Estabelece o art.8. do Regulamento das Custas Processuais (RCP), sob a epígrafe Taxa de justiça em processo penal e contraordenacional:
«1 - A taxa de justiça devida pela constituição como assistente é autoliquidada no montante de 1 UC, podendo ser corrigida, a final, pelo juiz, para um valor entre 1 UC e 10 UC, tendo em consideração o desfecho do processo e a concreta actividade processual do assistente.
2 - A taxa de justiça devida pela abertura de instrução requerida pelo assistente é autoliquidada no montante de 1 UC, podendo ser corrigida, a final, pelo juiz para um valor entre 1 UC e 10 UC, tendo em consideração a utilidade prática da instrução na tramitação global do processo.
3 - O documento comprovativo do pagamento referido nos números anteriores deve ser junto ao processo com a apresentação do requerimento na secretaria ou no prazo de 10 dias a contar da sua formulação no processo, devendo o interessado ser notificado no acto para o efeito.
4 - Na falta de apresentação do documento comprovativo nos termos do número anterior, a secretaria notifica o interessado para proceder à sua apresentação no prazo de 10 dias, com acréscimo de taxa de justiça de igual montante.
5 - O não pagamento das quantias referidas no número anterior determina que o requerimento para constituição de assistente ou abertura de instrução seja considerado sem efeito.
6 - Para o denunciante que deva pagar custas, nos termos do disposto no artigo 520.º do Código de Processo Penal, é fixado pelo juiz um valor entre 1 UC e 5 UC.
7 - É devida taxa de justiça pela impugnação das decisões de autoridades administrativas, no âmbito de processos contra-ordenacionais, quando a coima não tenha sido previamente liquidada, no montante de 1 UC, podendo ser corrigida, a final, pelo juiz, nos termos da tabela III, que faz parte integrante do presente Regulamento, tendo em consideração a gravidade do ilícito.
8 - A taxa de justiça referida no número anterior é autoliquidada nos 10 dias subsequentes à notificação ao arguido da data de marcação da audiência de julgamento ou do despacho que a considere desnecessária, devendo ser expressamente indicado ao arguido o prazo e os modos de pagamento da mesma.
9 - Nos restantes casos a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela III.
10 - Se o juiz não fixar a taxa de justiça nos termos do número anterior, considera-se a mesma fixada no dobro do seu limite mínimo.»
Em nossa opinião, o n.º8 deste dispositivo legal deve ser entendido no sentido de que o prazo de 10 dias para pagamento da taxa de justiça conta-se a partir da notificação do despacho que recebe a impugnação judicial e na sua sequência designa dia para julgamento ou determina que a decisão será proferida por despacho nos termos do art.64.º, n.º2, do RGCOC, pois com o despacho de recebimento da impugnação judicial, a que está associada a designação de dia para julgamento, inicia-se uma nova fase processual que dá lugar a tributação. Não teria sentido que enquanto não houvesse concordância do defensor quanto à data para julgamento, o impugnante não estivesse obrigado a liquidar a taxa de justiça, quando é certo que já se iniciara uma nova fase processual.
Improcede, assim, este fundamento do recurso.
2ªquestão: Sustenta o recorrente que, face ao não pagamento atempado da taxa de justiça, a secretaria deveria notificá-lo para liquidar a taxa de justiça acrescida de multa nos termos do art.642.º do C.P.Civil e art.4.º do C.P.Penal.
Compulsados os autos, resulta que o arguido foi notificado da data designada para julgamento e, igualmente, nos termos dos arts. 8.º, n.º4 RCP para, em 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça.
Esgotado tal prazo, não se mostrou comprovado o pagamento, vindo o arguido invocar que juntou o DUC respetivo a um outro processo de contraordenação, pelo que lhe foi concedido prazo para juntar tal comprovativo. O arguido juntou um DUC referente a outro processo e pago apenas em 19/9/2017, ou seja, no dia seguinte à data designada para a realização da audiência de julgamento e na qual invocou já ter procedido ao pagamento atempado da taxa de justiça, mas que juntou indevidamente a outro processo.
Conclui-se, assim, que não foi feito o pagamento tempestivo da taxa de justiça. No entanto, o tribunal recorrido não andou bem ao julgar deserto o recurso. Vejamos.
O recorrente defende que o tribunal recorrido devia ter aplicado o disposto no art.642.º do C.P.Civil ex vi art.4.º do C.P.Penal.
Nos termos do art.41.º do RGCOC, em matéria processual, são aplicáveis subsidiariamente ao processo contraordenacional os normativos do processo criminal.
Como o C.P.Penal não contém qualquer norma que regule a situação, forçoso será concluir pela existência de omissão, que deve ser integrada, por força do art.4.º do C.P.Penal, com recurso ao disposto no processo civil, concretamente ao art.642.º do C.P.Civil.
Dispõe o art.642.º, sob a epígrafe Omissão do pagamento das taxas de justiça:
«1 - Quando o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício do apoio judiciário não tiver sido junto ao processo no momento definido para esse efeito, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.
2 - Quando, no termo do prazo de 10 dias referido no número anterior, não tiver sido junto ao processo o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e da multa ou da concessão do benefício do apoio judiciário, o tribunal determina o desentranhamento da alegação, do requerimento ou da resposta apresentado pela parte em falta.
3 - A parte que aguarde decisão sobre a concessão do apoio judiciário deve, em alternativa, comprovar a apresentação do respetivo requerimento».
Não estabelecendo o art.8.º do RCP a consequência jurídica da omissão pelo impugnante do pagamento da taxa de justiça no prazo a que este normativo se reporta, entendemos ser aplicável o disposto o art.642.º do C.P.Civil, ex vi art.4.º do C.P.Penal e art.41.º do RGCOC (neste sentido, v. Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 3ª. ed., 2011, notas ao art. 8º. RCP, págs. 231 a 232 e, na jurisprudência, Ac.R.Évora de 4/4/2013, relatado pelo Desembargador Martinho Cardoso).
Posto isto, a impugnação judicial não devia ter sido jugada deserta sem que a secção de processos notificasse o impugnante a fim de, em dez dias, proceder ao pagamento omitido acrescido de multa de igual montante. Merece, assim, nesta parte provimento o recurso interposto.
III - Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes na 1ªseção criminal do Tribunal da Relação do Porto em julgar o recurso parcialmente procedente e em consequência revogar a decisão recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que determine a notificação do recorrente para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante.
Sem custas
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(texto elaborado pela relatora e revisto por ambos os signatários)
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Porto, 14/12/2017
Maria Luísa Arantes
Luís Coimbra