INSOLVÊNCIA
OPOSIÇÃO
INTERRUPÇÃO DO PRAZO
Sumário

1. Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se coma junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.”
2. Para aferir da tempestividade do pedido de suspensão do prazo de dedução de oposição à insolvência há-de ter-se em conta que o prazo é de dez dias e, é contínuo, e, se terminar em dia em que o tribunal está encerrado, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte - art. 30º,n.º1, e 9º, do CIRE e 144º,n.º2, do CPC.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
I.A.Relatório
O apelante, na qualidade de accionista e administrador da insolvente  deduziu embargos à insolvência da sociedade “ O.W. ,S.A.”, pedindo a revogação da respectiva sentença.
Alegou, em síntese, que o tribunal declarou a insolvência quando a ainda estava a correr o prazo de oposição à mesma e que, no decurso daquele prazo, pagou à requerente a dívida que tinha para com a mesma, o que constitui indicador da sua solvabilidade.
Não foi deduzida qualquer contestação aos embargos.
Foi proferida sentença a julgar improcedentes os embargos.   
I.B.-Síntese conclusiva

1. A decisão que decretou a insolvência da O.W.  parte de uma errada contagem do prazo para a Oposição.
2. O Tribunal “a quo” obnubilou os 5 dias de dilação – que expressamente refere na citação para a insolvência de dia 11 de maio – que o prazo de 10 incluía (a insolvente tem sede em C… e o Tribunal “a quo” é de Lisboa);
3. Lavrando neste lapso colocou o terminus do prazo no dia 23 de Maio (também aqui em erro);
4. Em 30 de Maio a insolvente deu entrada de requerimento nos autos a solicitar a suspensão dos autos (e a interrupção do prazo de Oposição) em virtude de solicitar à SSP nomeação de patrono.
5. E fê-lo porque, na sua convicção, ao prazo de 10 dias acrescido de 5 dias de dilação haveria ainda que aplicar o nº 5 do artº 145º do CPC.
6. Que prolongaria, com multa, o fim do prazo em causa precisamente até 30 de Maio.
7. Quando, em 3 de Julho, a Sentença é notificada à insolvente é também confrontada com o despacho a antecedê-la onde esta questão vem decidida.
8. Mas decidida contra a Lei primeiro porque não conta o prazo de dilação, depois porque não aplica o artº 145º CPC e por último porque coloca o requerimento da insolvente de 30 de Maio (doc.1) no dia 31 de Maio.
9. Com tal lapso de contagem de prazo vem a ser proferida Sentença que se baseia em dados apócrifos e isto porque:
10. Em 22 de Junho a insolvente é notificada pela SSP do deferimento do seu pedido de apoio judiciário.
11. Tal faria recomeçar a contagem de novo prazo para a Oposição que, devidamente contado, correria até ao dia 9 de Julho (ou 12 aplicando-se o artº 145º CPC);
12. A insolvente chegou a ter reunião marcada com o patrono nomeado no dia 26 de Junho (doc. 2).
13. Foi com indizível surpresa que foi notificado da Sentença em 3 de Julho.
14. Em 5 de Julho o requerente da insolvência foi pago.
15. Facto que iria ser levado ao conhecimento do Tribunal “a quo” ao abrigo do artº 21º CIRE mas que, pela situação criada, ficou inviabilizado.
16. Mas o circunstancialismo formal revelado bem como o facto do requerente da insolvência ter o seu crédito pago – e dentro do prazo certo para Oposição – são de molde a tornar insubsistente a sua consideração de insolvente.
17. Que, a ver pelo teor da Sentença ad Insolvência, se baseou precisamente no seu silêncio (agora explicado) e no incumprimento junto da requerente da insolvência que fariam presumir a incapacidade para cumprir obrigações.
18. Circunstâncias que, em rigor, não se verificaram pois o “silêncio” é apenas fruto de uma errada contagem de prazos pelo Tribunal “a quo” e o pagamento está feito (e foi feito no decurso do prazo que se julgou em curso para oposição).
19. Este circunstancialismo foi alegado “ex nuovo” em sede de embargos preenchendo notoriamente a condição de procedibilidade dos embargos que é a “novidade” da matéria susceptível de ser levada a embargos, também ai errando o Tribunal “a quo” ao pretender que tal matéria agora contraditória, já teria sido resolvida antes de questionada...
20. Devendo assim, a douta Sentença recorrida ser revogada por, para além do erro formal relativo aos prazos tem também errado enquadramento legal em sede de pressupostos e condicionamentos na sua decretação.

I.C.- Questões a merecerem apreciação
I.C.a- Tempestividade do pedido de suspensão do prazo de dedução de oposição à insolvência;
I.C.b-  Relevância do pagamento efectuado à requerente da insolvência.

II.Fundamentação
II.A- De facto
A primeira instância considerou provado o seguinte :
1 – Por sentença proferida em 11.06.2012 foi declarada a insolvência da “O.W. , SA”, pessoa colectiva nº …, com sede na E…, nº., A…, . C…, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de C… – Cfr. fls. 28 a 35 do processo principal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
2 – Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do relatório elaborado pela Sra. Administradora da Insolvência nos termos do art. 155 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, junto a fls. 112 a 193 do processo principal;
3 - Em 5 de Julho de 2012 a “O.W. , SA” liquidou a dívida que tinha para com a Requerente da insolvência (pontos 4 a 7 da matéria de facto constante da sentença de insolvência).

Dos autos resulta ainda o seguinte :
i) A insolvente, com sede em C…, foi citada para deduzir oposição à insolvência em 11/05/2012.-fl73
ii) No dia 30/05/2012,às 16h e 20 minutos, a insolvente comunica ao tribunal o pedido de protecção jurídica, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo,nomeação e pagamento de patrono, juntando cópia do requerimento efectuado perante o ISS (Instituto da Segurança Social);-fl.10 e 75 e 76;
iii) E requer a suspensão do prazo para deduzir oposição ao pedido de insolvência.- fl.10
iv) Em carta datada de 18/06/2012,a patrona nomeada agenda uma reunião com a insolvente.- fl.11
v) O ISS informa a insolvente do deferimento do pedido de protecção jurídica em 22/06/2012.- fl.12
vi) Por despacho de 11/06/2012 , o pedido de suspensão em iii) é indeferido, com fundamento na sua extemporaneidade.-fl.77;
vii) Por sentença datada de 11/06/2012, é decretada a insolvência da requerente, com fundamento na falta de pagamento de uma dívida à requerente, na existência de “outras obrigações vencidas” e na inexistência de “dinheiro ou crédito para pagar a quem deve”.-fl.77 a 84.
viii)  Em 05/07/2012 a insolvente pagou, à requerente da insolvência, a quantia que lhe devia( €1.519,20) e motivou o pedido de insolvência.- fl.13.
ix) O mandatário da requerente da insolvência, na comunicação que envia ao mandatário do apelante, dispensa-o da confidencialidade daquele expediente e  informa que não apresenta requerimento de desistência do pedido de insolvência atenta a prolação da sentença.-fl. 13.
x) Na sentença declaratória de insolvência deu-se como provado ,para além da dívida à requerente , que a insolvente :
a) Tem outras obrigações pecuniárias vencidas (n.º8).
b) Não dispõe de dinheiro ou crédito para pagar a quem deve (n.º9).




II.B.-De direito

II.B.a-Tempestividade do pedido de suspensão do prazo de dedução de oposição à insolvência;

Na sentença impugnada entendeu-se que o pagamento efectuado à requerente da insolvência não relevava, porquanto a declaração de insolvência datava de 11/06/2012 e o pagamento havia sido efectuado em 05/07/2012.
A insolvente foi citada para deduzir oposição à insolvência em 11/05/2012.
O prazo é de dez dias e, é contínuo, e, se terminar m dia em que o tribunal está encerrado, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte .- art. 30º,n.º1, e 9º, do CIRE e 144º,n.º2, do CPC.
A insolvente está sediada em C… pelo que beneficiava de uma dilação de 5 dias.- art.252º-A, n.º1, al.ªb), do CPC e 17º do CIRE.
O prazo para a insolvente deduzir oposição terminava pois a 26/05/2012 (Sábado) , logo a 28/05/2012.-art.144º,n.º2,do CPC.
E podia praticar o acto nos três dias úteis seguintes, ou seja até 31/05/2012.
O pedido de suspensão (não é suspensão mas sim interrupção, sendo diferentes os  regimes  jurídicos) de prazo foi requerido por telecópia enviada às 16h20m do dia 30/05/2012, pelo que se considera efectuado a 30/05/2012  e ,consequentemente, tempestivo.- art.143º,n.º4 e 150ºn,º2, al.ªc) do CPC, art.122º ,n.º1, da Lei n.º3/99 de 13 de Janeiro(LOFTJ)
É indiferente a falta de pagamento da multa a que se reporta o art.145º,n.º5,do CPC, atento o disposto no n.º6 do mesmo preceito (notificação pela secretaria para pagar a multa em falta acrescida de penalização).
II.B.b- Relevância do pagamento efectuado à requerente da insolvência.
Na sentença impugnada entendeu-se que:” In casu, no que respeita ao pagamento efectuado à Requerente da insolvência, não foi de facto tido em conta, nem podia tê-lo sido porque não havia ainda sido efectuado: a sentença foi proferida em 11 de Junho e o pagamento da dívida à Requerente foi feito em 5 de Julho.”

Ora, como se disse supra, o pedido de protecção jurídica foi tempestivamente apresentado.

Nos termos do art.24º,n.º4, da Lei n.º34/2004, de 29 de Julho,” Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se coma junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.”
Assim, em 30/05/2012 o prazo para deduzir oposição interrompeu-se e, quando a sentença de insolvência foi proferida, o prazo para deduzir oposição encontrava-se interrompido, pelo que aquela não devia ter sido proferida.
Aquele prazo de oposição reiniciou-se a partir da notificação, ao patrono nomeado, da sua designação.- art.34º,n.º5, al.a), da cit Lei n.º34/2004.
A patrona nomeada enviou à insolvente uma carta, datada de 18/06/2012,agendadeo uma reunião.
Assim a única data de referência para efeitos de contagem do reinício do prazo é de 18/06/2012.
E seguindo o raciocínio supra exposto, o prazo para deduzir oposição terminava a 06/07/2012 : - 10 dias+5 dias de dilação+3 dias do art.145º do CPC.
O pagamento efectuado pela insolvente, ocorreu pois durante o prazo para deduzir oposição e releva para efeitos de embargos à sentença de declaração de insolvência.
Efectivamente, os embargos à sentença declaratória de insolvência “…são admissíveis desde que o embargante alegue factos ou requeira meios de prova que não tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência. “-art.40º,n.º2, do CIRE.
Ora o pagamento efectuado ao credor requerente da insolvência é demonstrativo de alguma capacidade financeira da insolvente sendo irrelevantes os pontos n.º 8 e 9 da sentença declaratória da insolvência (referidos supra ) na medida em que não constituem factos mas conclusões.
Na sentença impugnada refere-se ainda que “…não deve ainda assim deixar de se considerar que a sentença (declaratória de falência) se fundou no facto de a Requerida ter uma dívida não paga à Requerente (que por diversas vezes solicitou o seu pagamento) desde Agosto de 2009, no valor de €1.519,20, e ainda na existência de outras obrigações pecuniárias vencidas e no facto de a Requerida não dispor de dinheiro ou crédito para proceder ao seu pagamento. Fundamentos estes que a Requerida não impugnou.”

Ora ,como se disse supra ,a sentença foi proferida sem que estivesse decorrido o prazo para oposição.

E não é relevante a existência de outras obrigações vencidas  no valor de € 812.916,08 a que se alude na sentença de embargos porque na sentença declaratória de falência não é mencionado qualquer valor  e ainda, porque  é a própria requerente da insolvência que declara não apresentar requerimento de desistência, ao abrigo do art. 21º do CIRE, por ter sido proferida a sentença ...



As conclusões do apelante procedem pois na totalidade.



III. Decisão

Considerando o que se acaba de expor, julgam-se procedentes os embargos e revoga-se a sentença declaratória de insolvência de  “ O.W. ,S.A.




Lisboa, 12 de Março de 2013

Teresa Jesus Ribeiro de Sousa Henriques

Isabel Maria Brás da Fonseca

Eurico José Marques dos Reis