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MEIOS DE PROVA
TEMPESTIVIDADE
IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO
PRAZO
Sumário
I – Não tendo a parte apresentado rol de testemunhas no seu primeiro articulado – única oportunidade processual que é certa para o efeito – não o pode fazer nos casos (futuros e incertos) de vir a poder apresentar resposta à matéria de excepção ou reconvenção em causa de valor superior à alçada do tribunal, nos termos do art. 60.º, n.º 1, ou de vir a ser realizada audiência preliminar nos termos do art. 62.º, em atenção aos princípios do dispositivo, da preclusão, da igualdade entre as partes e da responsabilidade das partes, ínsitos no art. 63.º, todos do Código de Processo do Trabalho, excepto quanto ao autor e exclusivamente para prova do alegado em resposta à matéria de excepção ou reconvenção, assim como também não pode a omissão ser suprida pelo juiz, dada a natureza complementar e instrumental dos seus poderes oficiosos. II – A acção declarativa com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, regulada nos arts. 98.º-B a 98.º-P do Código de Processo do Trabalho, tem por fim a impugnação de despedimento individual que seja comunicado por escrito ao trabalhador, seja por facto imputável ao mesmo, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação, e está sujeita ao prazo de caducidade de 60 dias previsto no n.º 2 do artigo 387.º do Código do Trabalho. III – Os demais casos de despedimento individual, v.g. os comunicados verbalmente, para cuja impugnação o trabalhador deve recorrer à acção declarativa com processo comum, estão abrangidos pelo regime de prescrição estabelecido pelo n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho. (Elaborado pela Relatora)
Texto Parcial
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
1. Relatório
1.1. AA, solteiro, NIF (…), residente na R. (…), n.º 7, 2.º D, 0000-000 ..., veio intentar acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB - Cabeleireiros, S.A., com sede em Centro Comercial (…), loja (…), ..., 0000-000 ..., requerendo a citação prévia da R. com vista à interrupção da prescrição dos créditos laborais reclamados e pedindo: que seja declarada a existência dum contrato de trabalho entre as partes, remontando a Março de 2008; que seja declarada a ilicitude do despedimento do A.; e que seja a R. condenada a pagar-lhe todas as retribuições vencidas e vincendas, uma indemnização pelo despedimento ilícito no montante mínimo de € 4.050,00, uma outra, a título de danos patrimoniais, no valor de € 4.050,00, e ainda uma outra referente a danos não patrimoniais, no valor de € 2.500,00, bem como na quantia de € 12.150,00 relativa a compensação pelo não gozo de férias, no montante de € 2.250,00 respeitante a férias e respectivo subsídio do ano de 2010 e na importância de € 3.600,00 a título de subsídio de Natal dos anos de 2008, 2009 e 2010.
Para tanto alega, em síntese, que:
(…)
Foi realizada audiência de partes, na qual não se logrou obter a conciliação das mesmas (fls. 52/53).
A R. deduziu contestação, alegando, em síntese (fls. 60 e ss.):
(…)
Termina, pedindo a absolvição da R. do pedido.
O A. apresentou resposta, pugnando pela improcedência da excepção de prescrição e mantendo a sua versão dos factos (fls. 75 e ss.).
1.2. Proferido despacho saneador (fls. 119/120), procedeu-se a julgamento, no início do qual o Mmo. Juiz proferiu o seguinte despacho (fls. 149/150):
“Por lapso, não foi proferido despacho relativo ao rol de testemunhas apresentado pelo autor na sua resposta à contestação de fls. 74. Nos termos do disposto do artº. 63º, nº. 1 do Código de Processo do Trabalho, com os articulados, devem as partes juntar os documentos, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas. No caso vertente, o Autor não arrolou qualquer prova testemunhal com a sua Petição Inicial. Por outro lado, o seu segundo articulado estava limitado à matéria de defesa por excepção, concretamente a invocada prescrição do seu direito, como resulta do disposto no artº. 60º, nº. 1 do Código de Processo do Trabalho. Do exposto se conclui que o rol de testemunhas do Autor e o seu aditamento serão de admitir, mas apenas para prova dos factos alegados em resposta à excepção invocada, cujo ónus da prova pertence à Ré (artº. 342º do Código Civil). Concluindo, e com a referida limitação, admitimos o rol de testemunhas de fls. 79. Considerando que o Autor apenas tem prova testemunhal em relação à matéria de excepção, ao abrigo do disposto no artº. 634º, nº. 1 do Código de Processo Civil, determinamos que sejam primeiro ouvidas as testemunhas da Ré. Notifique.”
O A., inconformado, interpôs recurso deste despacho, formulando as seguintes conclusões (fls. 155 e ss.):
(…)
A R. não apresentou resposta a este recurso.
1.3. Findo o julgamento, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo (fls. 224 e ss.): “Face ao exposto, julgamos a presente acção improcedente, por não provada, absolvendo a R. de tudo o peticionado. Custas pelo A., sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia – artigo 446.º do Código de Processo Civil.”
O A., inconformado, interpôs recurso da sentença, arguindo em separado a nulidade da mesma nos termos do art. 668.º, n.º 1, als. c) e d) do CPC e apresentando alegações e conclusões, dizendo nestas (fls. 237 e ss.):
(…)
A R. apresentou resposta ao recurso da sentença interposto pelo A., pugnando pela improcedência da nulidade da sentença e da apelação (fls. 269 e ss.).
1.4. Os recursos foram admitidos por despachos de fls. 280 (o segundo) e 286 (o primeiro).
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação (fls. 293), a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, em parecer, no sentido de não ser concedido provimento aos recursos (fls. 294).
Colhidos os vistos (fls. 298 e 299), cumpre decidir.
2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – arts. 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi art. 87.º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho –, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são:
- se o A. podia na resposta à contestação e no aditamento arrolar testemunhas para serem inquiridas também à matéria de facto articulada na petição inicial, uma vez que nesta não apresentou rol de testemunhas;
- se ocorre a nulidade da sentença nos termos do art. 668.º, n.º 1, als. c) e d) do Código de Processo Civil;
- se, ao contrário do decidido na sentença, improcede a excepção de prescrição das indemnizações e outras compensações decorrentes do alegado despedimento ilícito.
3. Fundamentação de facto
Os factos que se consideram como provados, a ter em conta na decisão dos dois recursos, são os que emergem do Relatório supra e ainda os seguintes:
1. O A exerceu a sua actividade de cabeleireiro no estabelecimento comercial da R. denominado «CC – Salão de Cabeleireiros», sito no Centro Comercial (…), Loja (…), Av. (…), em ... – ....
2. Estabelecimento comercial explorado pela R. e sua sede social.
3. Por aquela sua actividade, o A. auferia da R. uma contrapartida monetária, através de transferência bancária, habitualmente duas vezes em cada mês.
4. Uma primeira entre o dia 20 e o dia 26 e uma segunda entre o dia 6 e o dia 10 do mês seguinte àquele a que respeitava.
5. Não auferindo o A. qualquer outra remuneração, quer da R., quer de terceiros.
6. A. e R. apuseram as respectivas assinaturas no documento escrito junto a fls. 29, intitulado «Contrato de Prestação de Serviços», dando-se aqui por integralmente reproduzido o respectivo conteúdo.
7. Na actividade que exercia no estabelecimento da R., o A utilizava alguns objectos/utensílios seus, como por exemplo tesouras, pentes e navalhas.
8. As lâminas, toalhas, golas de pescoço descartáveis, shampoos e outros produtos para o cabelo eram fornecidos pela R..
9. O A. era obrigado a usar farda, composta por uma camisa tipo «t-shirt», com a sigla/logótipo «CC» nas costas, e um crachá/placa identificadora com o seu nome e a marca «CC» no peito.
10. O A. estava obrigado a entregar à R. os denominados recibos verdes em troca dos valores líquidos que aquela lhe entregava.
11. Recaindo sobre o A. o ónus de pagar as respectivas contribuições para a Segurança Social.
12. O A. exerceu a actividade referida em 1. entre Março de 2008 e data não concretamente apurada mas situada antes de 25 de Outubro de 2010.
13. O A. apresentou na Direcção-Geral dos Impostos documento de declaração de início de actividade, enquanto sujeito passivo categoria B.
14. Mantendo esta actividade aberta entre 07/04/2008 e 01/06/2011.
15. Também os custos com o fornecimento da água, energia eléctrica e telefone efectuados pelo A. no estabelecimento comercial da R. eram por esta suportados.
16. A contrapartida pela actividade de cabeleireiro prestada pelo A. e paga pela R. variava em função da qualidade e quantidade dos serviços efectuados aos clientes da R..
17. O A. mostrou descontentamento junto da R. por esta lhe descontar nas quantias a que tinha direito pela actividade prestada montantes impostos por decisões judiciais no âmbito de processos de execução.
4. Fundamentação de direito
4.1. A primeira questão a decidir, conforme acima se enunciou, é se o A. podia na resposta à contestação e no aditamento arrolar testemunhas para serem inquiridas também à matéria de facto articulada na petição inicial, uma vez que nesta não apresentou rol de testemunhas.
Entendeu o Mmo. Juiz a quo que não, a partir da interpretação conjugada do disposto nos arts. 60.º, n.º 1 e 63.º do Código de Processo do Trabalho.
Com efeito, estabelece o n.º 1 do art. 63.º que, com os articulados, devem as partes juntar os documentos, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas; acrescenta o n.º 2 que o rol de testemunhas pode ser alterado ou aditado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade no prazo de 5 dias.
Por seu turno, o art. 60.º, n.º 1 dispõe que, se o valor da causa exceder a alçada do tribunal e o réu se tiver defendido por excepção, pode o autor responder à respectiva matéria no prazo de 10 dias; havendo reconvenção, o prazo para a resposta é alargado para 15 dias.
A propósito do preceito legal que, no Código de Processo Civil, corresponde ao citado n.º 2 do art. 63.º, diz-se no sumário do Acórdão da Relação de Coimbra de 14 de Julho de 2010 (in www.dgsi.pt) que “[n]ão é possível oferecer prova testemunhal, nos termos do art.º 512º-A, n.º 1, do CPC, quando nenhuma testemunha haja sido indicada anteriormente para prova dos fundamentos da acção” e que “[e]ntendimento contrário equivaleria, afinal, a estabelecer como prazo normal para a indicação de testemunhas o do referido normativo, situação legitimamente não pretendida pelo legislador.”
Em conformidade, decidiu-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 519/2000, de 29 de Novembro de 2000 (in www.dgsi.pt), “não julgar inconstitucional, face ao disposto no n.º 1 do artigo 13º da Constituição, a norma constante do artigo 512º-A, do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual não é possível apresentar novas testemunhas na data aí prevista, quando não exista qualquer rol prévio.”
Já visando em concreto o art. 63.º do Código de Processo do Trabalho, diz-se no Acórdão da Relação do Porto de 2 de Outubro de 2006 (in www.dgsi.pt) que, se o autor “não apresentou qualquer testemunha também não há rol para alterar” e, relativamente à invocação da aplicação do disposto nos arts. 265.º, n.º 3 e 645.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, por força do art. 1.º, n.º 2, al. a), daquele primeiro diploma, que “a inquirição de testemunhas por iniciativa do tribunal não se destina a suprir os erros, os lapsos e as deficiências das partes.” Aí se cita também pertinentemente Lopes do Rego (Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2004, Almedina, pp. 533-534), de acordo com o qual “[o] exercício dos poderes de investigação oficiosa do tribunal pressupõe que as partes cumpriram minimamente o ónus que sobre elas prioritariamente recai de indicarem tempestivamente as provas de que pretendem socorrer-se para demonstrarem os factos cujo ónus probatório lhes assiste - não podendo naturalmente configurar-se como uma forma de suprimento oficioso de comportamentos grosseira ou indesculpavelmente negligentes das partes.”
O que se deixa dito para o oferecimento de testemunhas no cotejo entre os articulados e o requerimento de aditamento ou alteração vale, mutatis mutandis, para o que se deve considerar como admissível nos casos (futuros e incertos) de vir a ser apresentada defesa por excepção ou deduzida reconvenção em causa de valor superior à alçada do tribunal, nos termos do art. 60.º, n.º 1, ou de vir a ser realizada audiência preliminar nos termos do art. 62.º, ambos do Código de Processo do Trabalho: não é suposto, em atenção aos princípios do dispositivo, da preclusão, da igualdade entre as partes e da responsabilidade das partes, que «se deixe entrar pela janela o que não pode entrar pela porta», pelo que, não tendo a parte apresentado rol de testemunhas no seu primeiro articulado – única oportunidade processual que é certa para o efeito – não o pode fazer posteriormente, excepto quanto ao autor exclusivamente para prova do alegado em resposta à matéria da excepção ou da reconvenção, assim como também não pode a omissão ser suprida pelo juiz, dada a natureza complementar e instrumental dos seus poderes oficiosos.
Só esta interpretação das disposições legais em apreço garante a coerência do quadro normativo relativo ao oferecimento de testemunhas estabelecido pelo legislador no âmbito do processo laboral, em atenção a princípios igualmente relevantes, como sejam o da celeridade, da colaboração e da boa fé.
Em face do exposto, improcede o primeiro recurso interposto pelo A..
4.2. Já no âmbito do seu segundo recurso, começa o A. por arguir a nulidade da sentença, nos termos do art. 668.º, n.º 1, als. c) e d) do Código de Processo Civil, na medida em que aquela se não pronunciou sobre a natureza do contrato celebrado entre as partes, a ilicitude do despedimento e as consequências daí decorrentes, bem como contém contradição entre os fundamentos e a decisão ao julgar procedente a excepção de prescrição sem primeiramente verificar se estava em causa um contrato de trabalho.
Estabelece o citado art. 668.º, n.º 1:
1- É nula a sentença quando:
a) não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido;
f) Seja omissa no que respeita à fixação da responsabilidade por custas, nos termos do n.º 4 do artigo 659.º.
Em rigor, os casos das alíneas b) a f) constituem situações de anulabilidade da sentença e não de verdadeira nulidade, respeitando à sua estrutura (falta de fundamentação e oposição entre os fundamentos e a decisão) ou aos seus limites (omissão ou excesso de pronúncia e pronuncia ultra petitum) – cfr. José Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, pág. 703.
Em primeiro lugar, a invocada nulidade / anulabilidade da sentença consistente na omissão de pronúncia sobre questões de que devia tomar conhecimento, é a consequência lógica do estatuído no art. 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, nos termos do qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Ora, tendo o Mmo. Juiz a quo entendido julgar procedente a excepção peremptória de prescrição de todos os direitos invocados pelo A., a qual, servindo de causa extintiva dos mesmos, é determinante da improcedência total do pedido, nos termos do art. 487.º, n.º 2 do mesmo diploma, não necessitava de apreciar as demais questões suscitadas nos autos, mormente as acima enunciadas, por terem ficado prejudicadas pela solução dada àquela.
Por outro lado, o mencionado art. 660.º, no seu n.º 1, apenas estabelece a prioridade de resolução das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, podendo as demais ser resolvidas de modo indiferenciado, desde que não exista uma precedência lógica que imponha uma ordem em concreto.
Ora, traduzindo-se a defesa por excepção peremptória na alegação de factos que servem de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor, determinando a improcedência total ou parcial do pedido (cfr. o citado art. 487.º, n.º 2), é, em regra, susceptível de ser decidida em face da mera configuração dada pelo autor ao seu direito, sem necessidade da sua efectiva demonstração.
No caso em apreço, por exemplo, o Mmo Juiz recorrido considerou demonstrados todos os elementos indispensáveis para se concluir pela verificação da prescrição dos direitos invocados pelo Apelante, o que tornava inútil a apreciação da efectiva existência destes, uma vez que tal apreciação nunca seria susceptível de alterar a solução daquela outra questão.
Não se vislumbra, assim, qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão da sentença, na medida em que, tendo o tribunal recorrido analisado e valorado os factos provados no sentido de que os mesmos integravam a verificação da excepção peremptória de prescrição, concluiu de forma lógica no sentido da absolvição da R. do pedido, em conformidade com o já citado art. 487.º, n.º 2.
Pelo exposto, improcede a nulidade da sentença arguida pelo Recorrente.
4.3. Finalmente, importa julgar se, ao contrário do decidido na sentença, improcede a excepção de prescrição das indemnizações e outras compensações decorrentes do alegado despedimento ilícito.
O Mmo. Juiz recorrido apreciou a questão nos seguintes termos: “A prescrição configura uma excepção peremptória, em regra de conhecimento dependente de arguição pelo interessado, que, em caso de procedência, determina a absolvição da R do pedido – artigos 493.º, n.º 3, 496.º, este do Código de Processo Civil, e 303.º do Código Civil. O prazo de prescrição a ter em conta nestes autos é de um ano a contar da data em que o contrato de trabalho cessou – artigo 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho. Assentou-se que o A exerceu a sua actividade como cabeleireiro para a R entre Março de 2008 e data não concretamente apurada mas localizada antes de 25 de Outubro de 2010 (cfr. facto 12.). Assim, considerando que a eventual relação laboral que serve de suporte a tudo o aqui peticionado contra a R cessou o mais tardar em 24 de Outubro de 2010 e que a A intentou esta demanda em 24 de Outubro de 2011 (cfr. assinatura electrónica de fls. 36), e que só em 31 de Outubro de 2011 foi a R citada (cfr. fls. 42), é mister considerar estar prescrito o direito de que o A se arroga titular perante a R, prescrição esta ocorrida às 24 horas do dia 24 de Outubro de 2011 sem que estivesse verificada a ocorrência de qualquer circunstância interruptiva da prescrição, maxime a citação. Assim sendo, e sem necessidade de tecer ulteriores considerandos, deve proceder a invocada excepção de prescrição e ser a R absolvida de tudo o peticionado, visto a prescrição decretada tornar inútil a apreciação dos diversos pedidos.”
Ora, concorda-se inteiramente com o decidido, sem prejuízo de o art. 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho estabelecer mais precisamente que o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho e, assim, se dever entender, em face da factualidade provada, que a prescrição dos direitos do A. se completou às 24 horas do dia 25 de Outubro de 2011 sem que estivesse verificada a ocorrência de qualquer circunstância interruptiva da mesma, maxime a citação.
Com efeito, e desde logo, nem sequer se provaram quaisquer factos de onde se possa concluir pela cessação do alegado contrato de trabalho por despedimento promovido verbalmente ou tacitamente pela R., uma vez que apenas ficou assente que o A. exerceu a sua actividade profissional em benefício daquela entre Março de 2008 e data não concretamente apurada mas situada antes de 25 de Outubro de 2010, desconhecendo-se a causa do terminus.
Por outro lado, o próprio A. sempre admitiu que os seus créditos sobre a R. estivessem sujeitos ao prazo de prescrição a que alude o art. 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho, conforme se alcança da petição inicial e da resposta à contestação, limitando-se a sustentar que o mesmo se completava em data posterior à que ficou provada e a pretender a respectiva interrupção através de citação prévia da R. que a lograsse preceder.
Sendo certo, finalmente, que se deve entender que, no âmbito do Código do Trabalho de 2009, aquele prazo de prescrição abrange os direitos e créditos inerentes à impugnação judicial de despedimento individual que não seja comunicado através de decisão escrita invocando facto imputável ao trabalhador, extinção do posto de trabalho ou inadaptação.
Na verdade, o recurso à analogia decorre da existência duma lacuna da lei, que tem sido definida como a omissão de determinada situação juridicamente relevante na letra ou no espírito da lei, o que pressupõe que se esgotou todo o processo interpretativo dos textos sem se ter encontrado nenhum que contemplasse o caso cuja regulamentação se pretende (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, 1987, p. 60).
Ora, aquele art. 337.º, n.º 1 reproduz na essência o estabelecido no art. 38.º, n.º 1 da Lei do Contrato de Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969, no âmbito de cuja vigência inexistia qualquer prazo de caducidade para o exercício dos direitos do trabalhador ou do empregador emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, salvo casos muito pontuais, como por exemplo o da acção de impugnação de despedimento colectivo (art. 25.º, n.º 2 da Lei da Cessação do Contrato de Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro), pelo que se entendia maioritariamente que todos os demais, incluindo os emergentes da ilicitude do despedimento individual promovido pelo empregador ou da ilicitude da resolução do contrato de trabalho operada pelo trabalhador caíam no âmbito de previsão daquela norma.
Mantendo-se tal norma no citado art. 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009, cujo art. 387.º, conjugado com os arts. 98.º-B a 98.º-P do Código de Processo do Trabalho, determinam que apenas se manteve o prazo de caducidade para a impugnação do despedimento individual introduzido pelo art. 435.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2003 para os casos em que o mesmo seja comunicado através de decisão escrita invocando facto imputável ao trabalhador, extinção do posto de trabalho ou inadaptação, e reduzido de um ano para 60 dias, não se vislumbra porque haveria de se concluir pela existência duma omissão legal que, no âmbito da Lei do Contrato de Trabalho, dominantemente não foi entendida como tal, no que toca ao exercício doutros direitos dos sujeitos da relação jurídica laboral emergentes da cessação do contrato de trabalho, como sejam os da situação em apreço e os decorrentes da resolução com justa causa, caducidade, revogação e denúncia.
Preceitua, aliás, o art. 298.º, n.º 2, do Código Civil, que quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras de caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição, sendo isso que sucede precisamente no citado art. 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2009.
Neste sentido, e analisando o problema em termos exaustivos, de que reproduzimos apenas o essencial, veja-se Pedro Furtado Martins (Cessação do Contrato de Trabalho, Princípia, Cascais, 2012, pp. 397-413), segundo o qual aquele diploma contém “…um regime algo complexo, em que passaram a existir três modalidades de impugnação judicial do despedimento: - A ação com processo especial privativa do despedimento coletivo (artigos 156.º a 161.º do CPT); - A ação com processo especial de impugnação do despedimento por facto imputável ao trabalhador, do despedimento por extinção do posto de trabalho e do despedimento por inadaptação, quando estes tenham sido comunicados por escrito ao trabalhador (artigos 98.º-B a 98.º-P do CPT); - E a ação de impugnação com processo comum, aplicável a todos os despedimentos não formalizados por escrito. (…) Sucede que para estas situações o atual Código do Trabalho não prevê o prazo em que a ação de impugnação tem de ser proposta. Por isso volta a colocar-se um problema que se suscitava no domínio da LCT, cabendo determinar se se deve considerar que a invalidade é arguível a todo o tempo, sem dependência de prazo, ou se será de aplicar o prazo de um ano. Nesta última solução, questiona-se ainda se esse é o prazo geral de caducidade que o artigo 287.º do Código Civil prevê para a arguição da invalidade dos atos anuláveis, ou o prazo de prescrição dos créditos laborais (artigo 337.º, 1). (…) No domínio da LCT não havia disposição legal a consagrar prazo para impugnar judicialmente o despedimento, sustentando-se que o prazo de prescrição dos créditos laborais fixado no artigo 38.º, 1 da LCT era aplicável aos efeitos decorrentes da ilicitude do despedimento. Daí resultava, ainda que indiretamente, um limite temporal para o exercício da ação de impugnação do despedimento. Não sendo a única solução proposta, esta foi a que obteve a adesão largamente predominante da jurisprudência que, para tanto, considerou que o prazo de prescrição abrangia também os direitos emergentes da realização dum despedimento ilícito, encarados como «direitos de crédito» numa aceção específica que se entendia consagrada no art. 38.º da LCT. (…) Como dissemos, a ponderação das consequências da solução faz-nos propender para uma interpretação diferente que assegure uma articulação mais harmoniosa das consequências da aplicação do prazo de interposição da ação de impugnação do despedimento com processo comum e do prazo de prescrição dos créditos laborais, aí incluindo os emergentes da cessação do contrato. Tal solução passa por considerar, contrariamente ao que nós próprios sustentávamos anteriormente e aderindo à tese que era dominante na legislação anterior ao CT/2003, que o prazo de prescrição do art. 337.º, 1 abrange também os créditos emergentes da realização de um despedimento ilícito e, nessa medida, funciona como um prazo que condiciona a interposição da ação de impugnação sempre que esta revista a forma de processo comum.”
De resto, como salienta a R. nas suas alegações, o preâmbulo do DL n.º 295/2009, de 13/10, que veio alterar o Código de Processo do Trabalho a partir de 1 de Janeiro de 2010, acolhe expressamente tal solução, ao referir: “Para tornar exequíveis as modificações introduzidas nas relações laborais com o regime substantivo introduzido pelo CT, prosseguindo a reforma do direito laboral substantivo, no seguimento do proposto pelo Livro Branco sobre as Relações Laborais e consubstanciado no acordo de concertação social entre o Governo e os parceiros sociais para a reforma das relações laborais, de 25 de Junho de 2008, cria-se agora no direito adjectivo uma acção declarativa de condenação com processo especial, de natureza urgente, que admite sempre recurso para a Relação, para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, sempre que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual. Nestes casos, a acção inicia-se mediante a apresentação pelo trabalhador de requerimento em formulário próprio, junto da secretaria do tribunal competente, no prazo de 60 dias previsto no n.º 2 do artigo 387 do CT. (…) Todas as demais situações continuam a seguir a forma de processo comum e ficam abrangidas pelo regime de prescrição previsto no n.º 1 do artigo 337.º do CT.”
Finalmente, diga-se que, tendo em conta as razões expostas, mantém validade a doutrina do Tribunal Constitucional (cfr. o Acórdão n.º 148/87, de 6/05/1987, in BMJ, 367.º-203, e o Acórdão n.º 140/94, de 26/01/1994, in BMJ, 433.º-168) que não julgou inconstitucional a norma constante do n.º 1 do art. 38.º da Lei do Contrato de Trabalho, designadamente na interpretação de que o mesmo abrangia o direito de impugnar o despedimento ilícito.
Conclui-se, pois, em síntese, que, ponderando na interpretação das normas jurídicas em cotejo os respectivos elementos literais, históricos, racionais e sistemáticos, é de entender que o prazo de prescrição a que alude o art. 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 abrange os direitos e créditos inerentes à impugnação judicial de despedimento individual que não seja comunicado através de decisão escrita invocando facto imputável ao trabalhador, extinção do posto de trabalho ou inadaptação.
Impõe-se, assim, em conformidade, a manutenção da decisão recorrida e a improcedência da apelação.
5. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar ambos os recursos improcedentes e, em consequência, confirmam-se integralmente o despacho e a sentença recorridos.
Custas pelo Apelante.