PROPRIEDADE INDUSTRIAL
REGISTO DE MARCA
MARCAS
IMITAÇÃO
Sumário

I – Em matéria de imitação/reprodução de marcas, a comparação que define a semelhança verifica-se entre um sinal e a memória que se possa ter do outro. II – Nessa linha, a imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem as marcas em cotejo, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados e separadamente.
III - Os elementos fonéticos são mais idóneos para perdurar na memória do público do que os elementos gráficos ou figurativos.
IV - Daí que, quanto às marcas nominativas, o aspecto a considerar em primeiro lugar seja o da semelhança fonética.
V - No caso das marcas fortes, só uma diferença tipo poderá afastar o juízo de imitação.
VI – Já no caso das marcas débeis uma pequena variação poderá ser suficiente para que o juízo de confusão seja afastado.
VII - Ocorre semelhança fonética, e mesmo gráfica, entre o logótipo e os sinais – marca e logótipo – “PORTUGÁLIA”.
(Sumário do Relator)

Texto Parcial

Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação

I – Portugália Mediação de Seguros, Lda, requereu, no INPI, a concessão de registo de logótipo n.º 23750, o que mereceu oposição por parte de Portugália – Administração de Patrimónios, S.A., na qualidade de titular de vários direitos prioritários.
 Vindo tal registo a ser indeferido, por despacho do Diretor de Marcas e Patentes, de 2012-02-06, considerando, designadamente, “uma forte semelhança gráfica e fonética”, entre “o sinal requerido e a marca prioritariamente registada “Portugália” e a insígnia, “Grupo Portugália””.

Inconformada, interpôs aquela Requerente recurso judicial, alegando, em suma, não haver identidade entre os serviços prestados pela requerente e pela requerida, para além de não existir qualquer semelhança gráfica ou figurativa entre “ambas as marcas em confronto”, também não sendo configurável situação de concorrência desleal objectiva.

Cumprido o disposto no art.º 43º do Código da Propriedade Industrial, foi remetido pelo I.N.P.I. o processo administrativo respectivo.
E citada a Portugália – Administração de Patrimónios, S.A., em cumprimento do art.º 44º do mesmo Código, nada alegou aquela.

Sendo proferida sentença que concedeu provimento ao recurso, revogando “o despacho proferido em 06 de Fevereiro de 2012, (d)o Ex.mo Director do Departamento de Marcas e Modelos do lNPI, que indeferiu o pedido de registo do logótipo n.º 23570 “Portugália Seguros” concedendo-se assim protecção ao referido logótipo com a seguinte representação
”.

Desta feita inconformada a Portugália – Administração de Patrimónios, S.A., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões:
(…)
 
Contra-alegou a Recorrida, pugnando pela manutenção do julgado.

II- Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objeto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 685º-A, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil “cessante”, que sempre cobrará aplicação relativamente aos efeitos produzidos pelos actos praticados no âmbito da sua vigência, e, assim, no tocante às condições de admissibilidade do recurso interposto nesse quadro legal, e balizamento do seu objecto – são questões propostas à resolução deste Tribunal:
- se a sentença recorrida enferma da nulidade que lhe é assacada;
- se é de recusar o registo de logótipo requerido pela Recorrida.
*
Considerou-se assente, na 1ª instância, sem impugnação a propósito, a matéria de facto seguinte:
“1. Por despacho de 06 de Fevereiro de 2012, o Ex.mo Senhor Director do Departamento de Marcas e Desenhos ou Modelos do INPI, por subdelegação de competências do Conselho Directivo, publicado no Boletim da Propriedade Industrial a 13 de Fevereiro de 2012, recusou o registo de logótipo n.º 23570   , pedido em 21 de Fevereiro de 2011
2. O referido logótipo foi recusado para assinalar os seguintes serviços: «Seguros Vida e não Vida, actividades auxiliares de seguros e fundões de pensões e gestão de fundos».
3. O logótipo é composto pelos vocábulos “Portugália” e “seguros” e um símbolo que usa as cores “Pantone 282C Solid Coatedpantone 285C solid coatedpantone 137C solid coated”, com a seguinte representação .
4. Em data anterior à do pedido de registo do logótipo, encontrava-se já registada, por despacho de 20 de Fevereiro de 1997, a marca nacional n.º 252028 “PORTUGÁLIA”, composta por este vocábulo em letras maiúsculas, sem qualquer cor associada.
5. Trata-se de marca relativa à classe 36ª da classificação internacional de Nice «administração de bens imobiliários, negócios, negócios financeiros, agências imobiliárias e investimentos de capitais», pertencente à sociedade Portugália-Administração de Patrimónios, S.A..
6. Esta sociedade é ainda titular:
a) da insígnia de estabelecimento n.º 10586, composta pela expressão em letras maiúsculas “GRUPO PORTUGÁLIA”, registada por despacho de 10 de Outubro de 1994;
b) do logótipo n.º 18537, consistente no vocábulo em letras maiúsculas “PORTUGÁLIA”, registado por despacho de 10 de Outubro de 1987;
c) da marca comunitária n.º 867457 “PORTUGÁLIA”, composta por este vocábulo em letras maiúsculas, sem qualquer cor associada, destinada a assinalar, os serviços a que se alude em 5), bem como “cervejas, águas minerais e gasosas, limonadas, xaropes e bebidas refrigerantes” (produtos da classe 32ª da classificação internacional de Nice) e “restaurantes, hotelaria, snack-bares e cervejarias (serviços da classe 42ª da referida classificação), registada a 07 de Janeiro de 2011;
d) da marca nacional n.º 250201 “PORTUGÁLIA”, composta por este vocábulo em letras maiúsculas, sem qualquer cor associada, destinada a assinalar “restaurantes, hotelaria, snack-bares e cervejarias (serviços da classe 42ª da referida classificação), registada por despacho de 29 de Maio de 1992;
e) da marca nacional n.º 339479, mista, “DESDE 1925 PORTVGÁLIA”, destinada a assinalar “restaurantes, hotelaria, snack-bares e cervejarias (serviços da classe 42ª da referida classificação), registada por despacho de 23 de Março de 2001.
7. A recusa fundamentou-se em haver afinidade entre a actividade exercida pela entidade que se pretende referenciar através do logótipo e os serviços associados à marca registada “Portugália”, havendo perigo de gerar confusão do consumidor em geral, dada a forte semelhança gráfica e fonética existente entre o sinal requerido e a referida marca, e de, inclusive, a recorrente realizar concorrência desleal em relação à sociedade Portugália-Administração de Patrimónios, S.A. nos termos do disposto no artigo 304.º-I, n.º 1, alíneas b) e e), do Código da Propriedade Industrial.”.
*
Vejamos:

II – 1 – Da arguida nulidade de sentença.
1. Considera a Recorrente, nos n.ºs 21 e 22 do corpo das suas alegações, que “Em reforço da fundamentação expendida pelo Mmo. Juiz a quo para justificação do seu entendimento de que o logótipo impugnado por PORTUGÁLIA (SEGUROS) não é semelhante nos termos relevantes para a lei, e consequentemente não é confundível com os sinais distintivos registados pela ora. Apelante, progride então o Mmo. Juiz a quo por uma avaliação sobre a valia distintiva destes sinais registados.
Com efeito, para além de uma tal análise configurar um manifesto excesso de (errada) pronúncia (uma vez que tais sinais não se caracterizam por outros elementos para além da expressão PORTUGÁLIA, estando os respectivos direitos de exclusivo consolidados na ordem jurídica, e tendo sido já reconhecido judicialmente o respectivo prestígio quanto aos serviços de restauração que há muito distingue e referencia, aos quais respeitam igualmente os registos respectivos supra enunciados), o Mmo. Juiz a quo partindo de uma análise sobre uma marca totalmente diversa (leia-se LUSITÂNIA) (?!!), deixa então expresso que "a marca e insígnia que motivou a recusa do registo do logótipo (impugnado) são sinais fracos, a primeira é uma marca débil, bastando a junção a esta última do vocábulo seguros e de um grafismo a duas cores para que se possa afirmar, (...), que o juízo de confusão se encontra afastado.".
Consignado, na conclusão M), resultar claro “Do trajecto ou percurso decisório (…) que toda a análise e subsunção jurídica é deficiente porquanto
(…)
o Mm. juiz a quo para sustentação da sua tese, em manifesto excesso de pronúncia procedeu uma indevida avaliação do valor distintivo das marcas e demais sinais distintivos PORTUGÁLIA, da Apelante, os quais são sinais notórios no mercado, e gozam de reconhecido prestígio e reputação, concluindo que ainda assim, o logótipo impugnado com os mesmos não é confundível ou associável apesar de tais valores acrescidos de referencia e distinção;”.

2. Como é sabido, a nulidade por excesso de pronúncia – cominada no art.º 668º, n.º 1, alínea d), 2ª parte, do Código de Processo Civil cessante (e no art.º 615º, n.º 1, alínea d), 2ª parte, do novo Código de Processo Civil) que, sem embargo do princípio da aplicação imediata da nova lei de processo, sempre se entenderia cobrar aqui aplicação, por se deverem ressalvar todos os efeitos produzidos no âmbito de vigência da lei antiga – verifica-se quando o juiz conhecer de questões de que não podia tomar conhecimento, e, assim, “sempre que o tribunal utiliza, como fundamento da decisão, matéria não alegada (…) bem como quando conhece de matéria alegada (…) em condições em que está impedido de o fazer.”.[1]

Ora, deveras – e adaptando o instituto à peculiar idiossincrasia do processo de recurso de decisão do INPI – não se vislumbra na fundamentação da sentença recorrida, qualquer laivo de incursão em matéria que se não contivesse já nos autos.
Nem a Recorrente, rigorosamente, substancia tal nulidade, apenas se detendo, como resulta dos transcritos excertos das suas alegações, no esforço de demonstração do erro de julgamento da sentença recorrida.
E se porventura pretendeu integrar tal excesso de pronúncia com a circunstância de o “Mmo. Juiz a quo” partir “de uma análise sobre uma marca totalmente diversa (leia-se LUSITÂNIA) (?!!),”, então sempre se diria ser manifesta a inconsequência de uma tal arguição.
Pois como logo se intui, trata-se aí de consideração relativa a situação que se considerou análoga, para efeitos de caracterização do grafismo “Portugália” como “sinal distintivo fraco”, embora omitindo a fonte doutrinária/jurisprudencial, porventura visada.
Com o que se queda a sentença, e nessa parte, no domínio do enquadramento jurídico, sem extravasar das questões colocadas à sua apreciação.

Também se não lobrigando como tal “plano de fundamentação” – e ainda que envolvendo a “transcrição de excertos de doutrina e jurisprudência que nada têm de relevante para o caso concreto dos autos, pois não está aqui em causa uma marca, uma insígnia ou um logótipo, caracterizados por um vocábulo vulgar e da linguagem comum, uma forma geométrica pura, ou cores isoladamente consideradas, sinais simples, ou fenómenos jurídicos como o secondary meaning…”, possa representar “um total desvio da matéria a decidir.”.

Improcedendo, sem necessidade de maiores considerações, o nesta parte concluído pela Recorrente.

II – 2 – Do registo de logótipo.
1. Como dá nota Luís M. Couto Gonçalves,[2] “O logótipo, que foi introduzido na nossa ordem jurídica pelo CPI de 1995, readquiriu uma importância muito maior, após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 143/2008 de 25 de Julho, tendo, agora, um regime jurídico mais vasto, decalcado, em grande medida, do da marca (artigos 304.º-A a 304.º-S), a que correspondeu a supressão de dois sinais distintivos, com tradição na nossa ordem jurídica: o nome e a insígnia.”.
O que aliás é assinalado no preâmbulo do sobredito Decreto-Lei, onde ler-se pode: “Deve ainda referir-se a fusão de três modalidades de direitos da propriedade industrial (nomes, insígnias de estabelecimento e logótipos) numa só (logótipos).
 Esta agregação permite distinguir com mais clareza as diversas modalidades de protecção da propriedade industrial, evitando o recurso a diversos registos e a diversos pagamentos para um mesmo fim.”.
Tratando-se de um sinal distintivo de uma entidade individual ou colectiva, de carácter público ou privado, que nele tenha interesse legítimo, podendo ser constituído por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente por elementos nominativos, figurativos, ou por uma combinação de ambos, desde que sejam adequados a distinguir uma entidade que preste serviços ou comercialize produtos, cfr. art.ºs 304º-B e 304º-A, n.ºs 1 e 2, do Código da Propriedade Industrial.
Considerando-se o logótipo em sentido estrito, que distingue a entidade, directa e unitariamente, através de um único sinal, e o logótipo em sentido amplo, que o faz indirectamente, através da ligação aos estabelecimentos nos quais essa entidade presta actividade económica, aproximando-se, nesta hipótese, da função do nome ou insígnia suprimidos, vd. art.ºs 304º-C, n.º 2, 304º-P, n.º 2 e 304º-S, alínea a), 1ª parte.
Não podendo o logótipo, como a marca, ser constituído por um sinal genérico, descritivo, usual e fraco, salvo se tiver adquirido secondary meaning
…Ou seja, se tiver ocorrido um fenómeno de conversão de um sinal originariamente privado de capacidade distintiva, por descritivo ou usual – vd. art.º 188º, n.º 3, do Código da Propriedade Industrial – num sinal distintivo de produtos ou serviços, reconhecido como tal, no tráfico económico, através do seu significado secundário, em consequência do uso e de mutações semânticas ou simbólicas, [3] como aflora no art.º 223º, n.º 1, alíneas a), c) e d), ex vi do art.º 304º-H, n.º 2, e art.º 304º-Q, n.º 2, todos do Código da Propriedade Industrial.  

O logótipo, nas palavras do mesmo Luís M. Couto Gonçalves,[4] “adquire-se pelo registo.”, o qual, para a doutrina dominante, e em vista do disposto no art.º 304º-N.º, do Código da Propriedade Industrial, tem assim eficácia constitutiva do direito privativo ao exclusivo do logótipo…
…Como a tem relativamente à propriedade e ao exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina, vd. art.º 224º, n.º 1, do mesmo Código.

E os fundamentos de recusa desse registo, no que ao logótipo respeita, mostram-se elencados, de forma taxativa, quanto aos absolutos, no art.º 304º-H, e, por remissão deste, no art.º 24, e, quanto aos relativos, no art.º 304º-I, e, por remissão deste, nos art.ºs 240º, 241º a 242º, todos do Código da Propriedade Industrial.
Na remissão para aqueles dois últimos normativos contemplando-se a protecção dos chamados logótipos notórios, e de prestígio, respectivamente.
Os primeiros, permitindo a protecção com isenção do “princípio da territorialidade”, os segundos, podendo garantir a isenção do “princípio da especialidade”, ou seja contemplando uma protecção alargada do direito privativo a actividades económicas distintas.

Feito este primeiro viaticum

2. Considerou-se na decisão do Exm.º Director de Marcas e Patentes do I.N.P.I., com referência à “alínea b) do n.º 1 do artigo 304º-I do Código da Propriedade Industrial”:
“No caso em análise, depois de apreciados os argumentos apresentados pelas partes, verifica-se que:
- Os direitos da reclamante, gozam de prioridade relativamente ao presente pedido de registo;
- entre a atividade exercida pela entidade que se pretende referenciar através do sinal em estudo "Seguros vida e não vida, atividades de seguros e fundos de pensões e gestão de fundos" – e os serviços relativamente aos quais a marca prioritária se encontra registada para a classe 36.ª  "administração de bens imobiliários, negócios, negócios financeiros agências imobiliários e investimentos de capitais" há identidade/afinidade; Têm um carácter concorrente e complementar, e podem partilhar os mesmos canais de mercado e podem ainda ser oferecidos ao público consumidor em concorrência direta.

do confronto entre o sinal requerido,  e a marca prioritariamente registada "PORTUGALIA" e a insígnia, "GRUPO PORTUGÁLIA", ressalta uma forte semelhança gráfica e fonética.
Assim, sendo será de concluir que os sinais em apreço evidenciam um elevadíssimo grau de semelhança gráfica no que concerne "PORTUGALIA", porque o elemento "SEGUROS" do logótipo da reclamante, mais não é que descritivo dos serviços que pretende referenciar.
Coexistindo todos no mercado, facilmente ocorrerão no espírito do consumidor situações de associação.
Acresce que, a requerente, independentemente da sua intenção, poderia mover à reclamante concorrência desleal pelo que seria possível a ocorrência de prejuízos e inconvenientes de toda a ordem - alínea e) do n.º 1 do art.° 304.°I do C.P.I.”.

Havendo-se expendido, na sentença recorrida:

“Cotejando os serviços assinalados pela marca “Portugália” com aqueles que se pretende sejam associados ao logótipo cujo registo se peticiona no presente recurso, conclui-se que existe afinidade/identidade.
(…)
No que concerne à semelhança entre marcas (…) o vocábulo “Portugália”, na perspectiva do consumidor comum, encontra-se em Portugal associado a dois grandes sectores — viação e restauração.
Assim, a palavra seguros associada ao grafismo colorido conferem ao conjunto capacidade distintiva aos olhos do consumidor comum, afastando qualquer semelhança não permitida pela lei.
Por outras palavras, não existe um risco legalmente inadmissível de associação, não se tendo provado que a actividade de negócios financeiros da sociedade Portugália-Administração de Patrimónios, S.A. goze de consabida notoriedade na sociedade portuguesa, de tal modo que aumentasse o perigo do consumidor comum, quando confrontado com o logótipo em causa, maxime com o vocábulo seguros, associá-lo (de imediato) com o objecto social dessa sociedade. (…)
A marca e insígnia que motivou a recusa do registo do logótipo são sinais fracos, a primeira é uma marca débil, bastando a junção a esta última do vocábulo seguros e de um grafismo a duas cores para que se possa afirmar, na senda do citado aresto, que o juízo de confusão se encontra afastado.
(…)
Por fim (…) não deve, de todo o modo, confundir-se a marca notória (…) com a marca célebre ou de grande prestígio, figura inovadoramente introduzida no nosso direito interno pelo Código da Propriedade Industrial de 1995, actualmente prevista no artigo 242.º do Código da Propriedade Industrial de 2003.
O regime de protecção da “marca notória” circunscreve-se a produtos ou serviços idênticos ou afins. Uma vez que a notoriedade da marca “Portugália” encontra-se na área da restauração, aquele não tem aplicação in casu.
A protecção das “marcas célebres ou de grande prestígio” «em Portugal ou na comunidade e sempre que o uso da marca posterior procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los» não só é independente do seu registo em Portugal, como ultrapassa já, sem dúvida, o princípio da especialidade (…)
Contudo, não se provaram quaisquer factos demonstrativos de que a recorrente pretende, com o uso do logótipo n.º 23570, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca "Portugália” (…)
Por fim, é de sublinhar que tanto para se poder falar em concorrência desleal como em protecção de marca de prestígio, o logótipo que a recorrente pretende registar teria de gozar de identidade ou semelhança gráfica ou fonética com a marca de grande prestígio.
Ora, concluiu-se supra que tal identidade não existe, que o logótipo, no seu conjunto, composto por dois vocábulos e grafismo, não comporta, no seu conjunto, semelhança gráfica e fonética susceptível de induzir em erro o consumidor, mesmo o mais distraído, nem se provou qualquer susceptibilidade de a recorrente praticar actos de concorrência desleal.
Não se verifica, pois, in casu, qualquer situação prevista legalmente para recusar o registo da marca.”.

Sustentando a Recorrente, ex adverso, e como visto, que:
O logótipo impugnado PORTUGÁLIA (SEGUROS) é semelhante na respectiva caracterização às marcas, à insígnia e logótipo, nominativos, PORTUGÁLIA, anteriormente registados pela Apelante;
Essa semelhança é susceptível de induzir os consumidores a confundir ou associar os sinais atribuindo ao logótipo impugnado a mesma origem empresarial dos sinais da Apelante;
Atenta a notoriedade e a reputação de que goza a marca PORTUGÁLIA na esfera jurídica da Apelante é inevitável que sendo a mesma titular de uma marca registada destinada à oferta de serviços idênticos ou afins da actividade comercial a que é destinado o logótipo impugnado PORTUGÁLIA (SEGUROS), exista o risco de uma tal referência ser reconduzida à empresa da Apelante.

3. Nos termos do citado art.º 304º-I, e pelo que agora aqui pode interessar:
“ 1 - “Constitui ainda fundamento de recusa do registo:
a) (…)
b) A reprodução ou imitação, no todo ou em parte de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços afins aos abrangidos no âmbito da actividade exercida pela entidade que se pretende distinguir, se for susceptível de Induzir o consumidor em erro ou confusão ou se criar o risco de associação com a marca registada;
c) (…)
d (…)
e) O reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal ou de que esta é possível independentemente da sua intenção;
f) (…).”
2 (…)
3 (…).”.

E, de acordo com o art.º 245º:
“1 - A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2 – Para os efeitos da alínea b) do n.º 1:
a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins;
b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins
3 – Considera-se imitação ou usurpação parcial de marca o uso de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada.” (o realce a negrito é nosso).

Certo que “Os motivos de recusa aplicáveis ao registo de logótipos correspondem, mutatis mutandis, aos previstos relativamente às marcas”,[5] valerão aqui as considerações doutrinárias e jurisprudenciais produzidas em sede de recusa de registo de marca.

4. Pois bem:
No que concerne à prioridade de registo não se suscitam quaisquer dúvidas quanto a dela beneficiarem a marca “PORTUGÁLIA”, n.º 252028, e o logótipo “PORTUGÁLIA”, n.º 18537, uma e outro da Recorrente.

Também não sofrendo crise a afinidade da actividade da entidade que se pretende referenciar através do logótipo – seguros vida e não vida, actividades auxiliares de seguros e fundos de pensões e gestão de fundos – e os serviços associados àquela marca, a saber, administração de bens imobiliários, negócios, negócios financeiros, agências imobiliárias e investimentos de capitais.
Jogando pois, nesta vertente o já aludido princípio da especialidade da marca, a que Ferrer Correia[6] se referia também como princípio da novidade, assinalando que “a lei formula para as marcas o mesmo princípio do exclusivismo que formulou para a firma e o nome ou insígnia de estabelecimento”, restringindo-o embora “aos produtos da mesma espécie ou afins.”.

Essa “afinidade/identidade” tendo sido equacionada, como visto, e bem, na sentença recorrida, que, quanto a esse ponto não mereceu impugnação de banda da Recorrente.
E, assim, considerando, designadamente, que “A identidade quer entre os sinais, quer entre os produtos ou serviços, é aferida, na perspectiva do consumidor médio, relativamente aos produtos ou serviços para protecção dos quais o registo é pedido”, e que “Na verdade, um dos serviços que se pretende que o logótipo assinale é justamente a “gestão de fundos”. Ora, a marca “Portugália” reporta-se a “negócios financeiros e investimentos de capitais”, ou seja, na perspectiva do homem comum, a serviços com natureza ou características próximas e finalidades idênticas ou similares à dos serviços que se pretende sejam associados ao logótipo.”.

Chegando-se pois a tal conclusão, partindo-se do ponto de vista dessa figura abstracta do “consumidor” – “o consumidor médio do produto ou produtos em questão”, nas palavras de Ferrer Correia[7] – e utilizando não só o critério da finalidade e utilidade dos produtos e serviços, como também esse outro, igualmente referido pela doutrina – mas a encarar com prudência, quando tomado isoladamente – da natureza dos produtos e serviços.
Sendo impressivo, a propósito, que, como assinala Luís M. Couto Gonçalves,[8] “o risco de afinidade aumenta”, nos “casos em que possa mediar uma relação de substituição, complementaridade, acessoriedade ou derivação, entre os produtos ou serviços ou, mesmo entre produtos e serviços.” (sublinhado e negrito, nossos).
Para além de que “Afinidade não significa confundibilidade. Produtos não confundíveis (exterior ou estruturalmente considerados) podem ser produtos afins.”.

5. Da semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra, do logótipo posterior com a marca e logótipo anteriormente registados, que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distinguir aquele de cada um destes senão depois de exame atento ou confronto, ou que crie um risco de associação.

Trata-se, a marca registada da Recorrente, n.º 252028, de uma marca nominativa.
Sendo, de qualquer modo, que quanto aos diversos tipos de marcas há um conjunto de critérios de apreciação comuns, da dita “semelhança”.
Tendo sempre em atenção, porém, que como adverte Ferrer Correia,[9] “o consumidor (…) não tem à vista (em regra) as duas marcas para fazer delas um exame comparativo.”.
Por isso existindo “a imitação de uma marca por outra (…) quando, postas em confronto, elas se confundam (…) existirá ainda, convém sublinhá-lo, quando, tendo-se à vista apenas a marca a constituir, se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra de que se tenha conhecimento. Este processo de aferição da novidade é o que melhor tutela o interesse que a lei visa proteger – o interesse em que se não confundam, através da marca, mercadorias idênticas ou afins pertencentes a empresários diversos”.
Na expressão de Carlos Olavo,[10] “a comparação que define a semelhança verifica-se entre um sinal e a memória que se possa ter do outro.”.

O que nos conduz ao primeiro dos aludidos critérios de apreciação comuns, qual seja o de que “A imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem as marcas em cotejo, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados e separadamente”.[11]
 “Por isso, é por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas”[12]…salvo caso de “justificada necessidade”.[13]

Veja-se, na jurisprudência, e neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-03-1999,[14] em cujo sumário ler-se pode: “I - É ao aspecto geral das marcas que se deve atender para se aferir do carácter distintivo ou de semelhança entre elas; ou seja, é o conjunto da "imagem" que nos há-de transmitir a impressão de semelhança ou diferença entre as marcas em comparação. II - Há que ter em conta o consumidor médio dos produtos em causa, distraído mas interessado nesses produtos.” (o sublinhado é nosso).

Por outro lado, deverão irrelevar, no conjunto da apreciação das marcas, as suas componentes genérica ou descritiva.
Critério este que se prende com a problemática da menor protecção às marcas débeis, em sede de imitação, e ressalvada a hipótese de secondary meaning, prevista no art.º 223º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial.
Desde já se ressalvando, no entanto, que está em causa, quando se fala de componente genérica ou descritiva, a utilização de um sinal ou indicação, que, em princípio, se referem à espécie ou características, de um produto ou serviço, ou “que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio” – cfr. alíneas a), c) e d) do n.º 2 do mesmo art.º 223º.[15]
Devendo pois, nas marcas complexas – constituídas por mais de um elemento nominativo, privilegiar-se, sempre que possível, o elemento dominante.

Assim se tendo julgado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-05-2013,[16] que “1. Embora integrem uma marca registada, os termos de uso corrente, sem efectivo valor distintivo, não podem ser objecto de apropriação exclusiva, sendo autorizada a sua utilização na composição de outras marcas, ainda que para designação de produtos similares. 2. O facto de se encontrar registada a marca “intel inside” não impede que seja registada a marca “ecoinside”, considerando que apenas a marca “intel” é dotada de notoriedade e que o termo “inside” é de uso corrente da língua inglesa.”.

Um último critério, que, como dá nota Luís Couto Gonçalves,[17] vem sendo sufragado pelo TJCE, é o de que quanto maior for a notoriedade da marca anterior maior é o risco de confusão com uma marca posterior.
Referindo Carlos Olavo,[18] que “Outro dos factores a ponderar na apreciação da susceptibilidade de confusão de um sinal relativamente a outro é o da notoriedade do sinal imitado.”.

6. Revertendo à marca registada da Recorrente, temos que se trata, no tocante à sua constituição, e como visto, de marca nominativa, simples, composta pelo vocábulo “PORTUGÁLIA”, em letras maiúsculas, sem qualquer cor associada.
Nela havendo assim a considerar, para efeitos comparativos, os planos visual, fonético e ideográfico.
Sendo certo que, como refere Carlos Olavo,[19] “Os elementos fonéticos são mais idóneos para perdurar na memória do público do que os elementos gráficos ou figurativos”.
“Daí que, quanto às marcas nominativas, o aspecto a considerar em primeiro lugar seja o da semelhança fonética.”.
E “De facto, os elementos nominativos são retidos na memória sobretudo pelos fonemas que os compõem, em detrimento da respectiva grafia.”.
Mas, diga-se, também no que respeita às marcas mistas, isto é, compostas simultaneamente por elementos gráficos/figurativos e nominativos, se julgou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-05-2003,[20] que “a experiência demonstra que o elemento nominativo é, em regra, o mais importante para a apreciação do risco de confusão.”.
No que aliás converge com a posição da generalidade da jurisprudência e doutrina europeias, relativamente aos sinais complexos, sintetizadas por Eugen Ulmer.[21]
Ora é incontornável que no logótipo em causa, , do tipo misto – cfr. art.º 304º-A, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial –  e para lá da utilização das cores amarela e azul, emparelhadas, em cada um dos três elementos do conjunto gráfico à direita – o elemento forte, é o vocábulo Portugália…
Bastando ter presente que o vocábulo “seguros” – aliás em plano inferior, letra de diminuta dimensão relativa e impressão pouco marcada – é tipicamente um componente descritivo, indicativo da espécie de serviço prestado pela entidade a distinguir, e usual na língua portuguesa.
Não podendo o logótipo, tal como a marca, e por remissão do art.º 304º-H, n.º 1, alíneas b) e c), ser constituído, em princípio, apenas por tal sorte de elemento, salvo se tivesse adquirido secondary meaning, o que não é o caso.
Por igual carecendo o referido conjunto gráfico à direita, de sobrelevância distintiva a se, sendo certo, a propósito que, como por argumento a contrario se extrai do disposto nos art.ºs 304º-D, n.º 1, alínea c) e 304º-E, n.º 2, do mesmo Código, o logótipo, pode ser colorido, mas a cor ou combinação de cores não pode constituir um logótipo…

Tendo-se deste modo que o elemento assim prevalecente no logótipo cujo registo foi requerido pela ora Recorrida – o nominativo Portugália – corresponde, no plano fonético e ortográfico, à integralidade da marca nacional n.º 252028 “PORTUGÁLIA”, da Recorrente – e à do logótipo n.º 18537, consistente no vocábulo em letras maiúsculas “PORTUGÁLIA”, também daquela.
Apenas nesse outro plano do grafismo, e assim em processo analítico, se podendo descortinar uma minudente diversidade, qual seja a de nos sinais da Recorrente o vocábulo se mostrar redigido integralmente em letras maiúsculas.
O que, de resto, é como que “compensado” pela circunstância de no rejeitado logótipo o mesmo vocábulo ser redigido em bold.

E, como já assinalava Justino Cruz,[22] em anotação ao art.º 94º do Código da Propriedade Industrial de 1940, “Pode haver apenas um elemento comum entre as duas marcas – mas ser de tal forma predominante que dê lugar à confusão.”.

Também, e desde logo, como refere Luís Couto Gonçalves,[23] “No caso das marcas fortes – assim designadas porque não apresentam referência conceitual ao produto ou ao serviço que distinguem ou não fazem parte do património semântico comum (marcas arbitrárias e de fantasia, respectivamente)” – como assim é caso da marca registada e do logótipo da Recorrente – “só uma diferença tipo poderá afastar o juízo de imitação.”
Diversamente, portanto, “das marcas débeis – compostas por meras alterações morfológicas do nome do produto ou serviço (marcas expressivas), ou, ainda, por expressões ou figuras integrantes da linguagem ou património comuns”, em que “uma pequena variação poderá ser suficiente para que o juízo de confusão seja afastado.”.

Sem que, e salvo o devido respeito, colha a observação, produzida na sentença recorrida, de se encontrar “o vocábulo “Portugália”, na perspectiva do consumidor comum (…) em Portugal associado a dois grandes sectores — viação e restauração.”
Para além da já assinalada secundaridade e fraqueza do vocábulo seguros no conjunto do logótipo da Recorrida, ponto é que a marca registada da A., considerada na decisão do INPI, e como igualmente já assinalado, contempla serviços afins dos visados pelo logótipo da Recorrida.
Que nada têm que ver com “viação e restauração”, sendo o consumidor médio desses produtos e serviços afins que é tido em consideração para efeitos de equacionamento do erro ou confusão.

Sendo de assinalar, conquanto assim apenas marginalmente, que aquela “associação”, não sendo referida como facto notório, também não foi levada ao elenco dos factos assentes…

Concluindo-se pois que, diversamente do entendido na sentença recorrida, ocorre semelhança fonética, e mesmo gráfica, entre o logótipo em questão e os sinais da Recorrente, facilmente indutora do consumidor em erro, confundindo a memória que tenha da marca e, ou, logótipo da Recorrente com o logótipo cujo registo foi requerido pela Recorrida.

E, quando assim não fosse, como efectivamente é, sempre a semelhança referenciada compreenderia um manifesto risco de associação do logótipo da Recorrida com a marca da Recorrente.
Risco esse – que passou a fazer parte do conceito de imitação sob o impulso da Primeira Directiva do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988 (89/104/CEE), que harmoniza as legislações dos Estados-membros em matéria de marcas, vd. art.º 4º, alínea b), daquela – que, por contraponto ao conceito de confusão em sentido estrito, “para as situações-típicas em que haja o risco do público-consumidor confundir a origem dos produtos ou serviços.”, vem sendo ligado pela doutrina ao conceito de confusão em sentido amplo, compreendendo “as situações atípicas em que o público consumidor, reconhecendo a diferente origem dos produtos ou serviços, incorra no risco de pensar existir uma qualquer relação de tipo jurídico, económico ou comercial entre as diferentes origens”.[24]
E que, do mesmo modo que o risco de confusão em sentido estrito, “implica necessariamente”, como refere Américo da Silva Carvalho,[25]  “um juízo de valor por parte do julgador: colocando-se na posição de consumidor (…)”, sendo por isso matéria de direito.

7. E pelo que respeita ao fundamento de recusa de registo de logótipo, previsto no art.º 304º-I, n.º 1, alínea e)…
Abrange-se, naquele preceito, a contrariedade objectiva intencional e a contrariedade objectiva não intencional às normas da concorrência desleal.
Surgindo a concorrência desleal aqui como uma situação de “desconformidade objectiva”, numa perspectiva “preventiva”.[26]
Nas palavras de Luís Couto Gonçalves, “Procura-se prevenir a atribuição de um direito privativo a um concorrente que, de modo intencional ou não, desencadeia ou pode desencadear com o seu pedido uma situação objectivamente desleal (um acto contrário às normas e usos honestos de qualquer actividade económica). Normalmente, tratar-se-á de uma situação potencial de concorrência desleal por confusão com os produtos ou serviços de outro concorrente embora seja possível conjecturar outro tipo de situações.”.
Mas, prossegue aquele Autor, “não nos iludamos: mesmo naquela hipótese a questão nada tem a ver com a confusão entre marcas. Para haver confusão, entre marcas seria necessário que a marca do eventual concorrente lesado se encontrasse validamente registada e protegida no quadro do direito de marcas e que se verificassem os requisitos, e só esses, previstos no art. 245.º n.º 1. Nada mais. Seria uma situação que dispensaria a verificação de outros requisitos, nomeadamente os respeitantes à contrariedade de normas e usos honestos, a prova da relação de concorrência e a prova da confusão objectiva (e não a simples identidade ou afinidade) entre os produtos ou serviços propriamente ditos.
Ora não é isso que acontece no âmbito deste fundamento de recusa. O concorrente queixoso não pode invocar qualquer direito privativo de marca e, portanto, recorrer aos critérios previstos no art. 245.°.
Na previsão da norma têm de caber outras situações como por exemplo:
O pedido de registo de uma marca de facto usada há mais de seis meses por um outro concorrente;
O pedido de registo de uma marca cujo registo haja já sido pedido num dos países da CUP ou OME por um outro concorrente que não tenha cumprido o prazo de prioridade de seis meses para o pedido do registo em Portugal previsto no art. 4.° C-1 da CUP.”.

Não sendo pois essa a situação dos autos, também ponto é que sempre estariam verificados os fundamentos de recusa do registo do logótipo da Recorrida, anteriormente analisados, com referência ao art.º 304º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código da Propriedade Industrial.

8. Por fim, e conquanto assim apenas marginalmente, mais se assinalará no que se refere à matéria das marcas notórias e marcas de prestígio, abordada na sentença recorrida.
Que quando fosse de conceder a notoriedade da marca “PORTUGÁLIA”, na área da restauração, em Portugal – como se entendeu na sentença recorrida – não seria, ainda assim, de concitar a protecção conferida no art.º 241º, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial, por isso que “Ao contrário da protecção conferida às marcas de prestígio (definida no artigo 242.°), a das marcas notórias é limitada pelo princípio da especialidade, pelo que só impede o registo de marcas iguais ou semelhantes que se destinem a identificar produtos idênticos ou afins.”.
Sendo também que a notoriedade da marca – efectivamente invocada, tal como o prestígio da mesma, pela ora Recorrente, na reclamação apresentada no INPI, como se constata no teor dos art.ºs 38º a 43º daquela peça – tem, em regra, “que ser demonstrada por quem a invoque, podendo, nomeadamente, para este efeito ser apresentadas imagens, estudos de mercado, evidências do volume de vendas, da posição alcançada no mercado, da publicidade de que o sinal tenha sido objecto e decisões judiciais em que ao mesmo já tenha sido reconhecida notoriedade.”…[27]

Quanto à marca de prestígio, a lei, verificados certos requisitos, possibilita a sua não sujeição ao princípio da especialidade.
Porém, entre tais requisitos figura o de “que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los.”.
Tendo o TJCE julgado, em Acórdão de 14 de Setembro de 1999,[28] as autoridades competentes devem, na ponderação do reconhecimento do estatuto de marcas de prestígio, "tomar em consideração todos os elementos pertinentes do processo, a saber, designadamente, a parte de mercado detida pela marca, a intensidade, o alcance geográfico e a duração da sua utilização, bem como a importância dos investimentos efectuados pela empresa para a promover".
E, em Acórdão de 27 de Novembro de 2008,[29] que “a prova de que o uso da marca posterior causa ou é susceptível de causar prejuízo ao carácter distintivo da marca anterior pressupõe que sejam demonstrados ma alteração do comportamento económico do consumidor médio dos produtos ou serviços para os quais a marca anterior está registada consecutiva ao uso da marca posterior ou um risco sério de que essa alteração venha a concretizar-se no futuro".

Não estando assentes uma tal intenção ou perigo de prejuízo.

Posto o que, e nessa parte, se revela correcto o enquadramento efectuado na 1ª instância.
*
Procedem assim, nesta conformidade, as conclusões da Recorrente.

Impondo-se, revogada a sentença recorrida, a repristinação do despacho do Exm.º Senhor Director do Departamento de Marcas e Desenhos ou Modelos do INPI, que indeferiu o pedido de registo do logótipo n.º 23570 "Portugália seguros".
*

III – Nestes termos, acordam em julgar a apelação procedente e revogam a sentença recorrida, confirmando a decisão  do Exm.º Senhor Director do Departamento de Marcas e Desenhos ou Modelos do INPI, que indeferiu o pedido de registo do logótipo n.º 23570 "Portugália seguros".

Custas pela Recorrida, que, contra-alegando, decaiu.
*
Em observância do disposto no n.º 7 do art.º 713º, do Código de Processo Civil, passa a elaborar-se sumário, da responsabilidade do relator, como segue:
(…)
*
Lisboa, 2013-11-14

Ezagüy Martins
Maria José Mouro
Maria Teresa Albuquerque
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[1] Assim, Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo processo civil”, LEX, 1997, pág. 222. Vd. também José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado, Rui Pinto, in “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 670.

[2] In “Manual de Direito Industrial”, 2ª Ed., Almedina, 2008, pág. 289.
[3] Assim, Luís M. Couto Gonçalves, in op. cit., pág. 250.
[4] In op. cit., pág. 290.
[5] In “Código da Propriedade Industrial, Anotado”, Coordenação Geral de António Campinos, Coordenação Científica de Luís Couto Gonçalves, co-autores André Robalo, Carla Albuquerque, Inês Vieira Lopes, João Marcelino, Maria João ramos, Miguel Gusmão, Telmo Vilela, Almedina, 2010, pág. 528, Anotação II.
[6] In “Lições de Direito Comercial”, Vol. I, Universidade de Coimbra, 1973, págs. 328, 329.
[7] In op. cit., pág. 330.

[8] In op. cit, págs. 276, 277.
[9] Idem, págs. 329-330.
[10] In “Propriedade Industrial”, Vol. I, 2ª Ed., Almedina, 2005, pág. 101.
[11] Carlos Olavo, in op. cit., pág. 102.
[12] Ibidem. No mesmo sentido, vd. J. G. Pinto Coelho, in RLJ, Ano 93º, pág. 71.
[13] Vd. Luís Couto Gonçalves, in op. cit., pág. 278.
[14] Proc. 99B152 , Relator: NASCIMENTO COSTA, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[15] Vd. ainda mesmo autor e obra, pág. 399.
[16] Proc. 844/10.5TYVNG.P1.S1, Relator: ABRANTES GERALDES, no mesmo sítio da Internet.
[17] In op. cit., pág. 279, com citação dos casos Sabel (Acórdão. 11/11/1997) Canon (Acórdão de 29/9/1998), Lloyd (Acórdão de 22/6/1999), adidas (Acórdão de 22/6/2000), todos in http://europa.eu.int/jurisp/cgi-bin/!ettext.pl? lang=pt.
[18] In op. cit., pág. 107.
[19] In op. cit., pág. 102.
[20] Proc. 02B3968, Relator: FERREIRA DE SOUSA, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[21] In “La Repression de la Concurrence Déloyale”, pág. 95, aliá citado por Carlos Olavo, in op. cit., pág. 110.
[22] In “Código da Propriedade Industrial”, com a colaboração de Jorge Cruz, 2ª ed., 1985, pág. 220.
[23] In op. cit., pág.235, nota 459.
[24] Apud, Luís M. Couto Gonçalves, in op. cit., pág. 280.
[25] In “Direito de Marcas”, Coimbra Editora, 2004, pág. 622.
[26] Assim, com referência ao art.º 25º, n.º 1, alínea d), do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro, Oliveira Ascensão, in “Concorrência Desleal”, Almedina, 2002, págs. 191, 192, e 243-245.
[27] In “Código da Propriedade Industrial, Anotado”, Coordenação Geral de António Campinos, Coordenação Científica de Luís Couto Gonçalves, co-autores André Robalo, Carla Albuquerque, Inês Vieira Lopes, João Marcelino, Maria João ramos, Miguel Gusmão, Telmo Vilela, Almedina, 2010, pág. 471, anotações III e IV.
[28] No processo C-375/97 (General Motors Corporation vs. Yplon S.A., em litígio envolvendo a marca “Chevy”)
[29] No processo -252/2007 (Intel Corporation lnc. vs. CPM United Kingdom Ltd).