CUSTAS DE PARTE
MINISTÉRIO PÚBLICO
LEGITIMIDADE
Sumário

Nos termos do Regulamento das Custas Processuais, o Ministério Público não tem legitimidade para promover a execução da cobrança de custas de parte.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa


1. RN intentou a presente execução visando o pagamento coercivo de «custas de parte» que o executado, LR foi, por sentença, condenado a pagar.

2. Foi proferido despacho que indeferiu liminarmente o requerimento executivo, com fundamento em ilegitimidade do exequente e falta de título.

3. Inconformado, apela o exequente e, em conclusão, diz:

a) O Ministério Público, face ao Regulamento das Custas Processuais, em vigor, não tem legitimidade para promover a execução da cobrança de custas de parte (art. 27/3 do Dec. Lei 34/2008; art. 36/3, 26/2, RCP; art. 30 da Portaria 419-A/2009);

b) O credor de custas de parte tem legitimidade para intentar execução com vista à sua cobrança (art. 26/2, 3612, RCP);

c) O título executivo para cobrança das custas de parte é a sentença que condenou o devedor de custas no cumprimento dessa obrigação, acompanhada da nota discriminativa (art. 25 e 26 RCP e 53 do CPC);

d) Correndo a execução sob a forma sumária e não tendo o Agente de Execução suscitado a intervenção do juíz, nos termos do art. 855º, do CPC, não pode ser indeferida liminarmente a execução, por se tratar de um acto que a lei não permite (855/1 CPC), com a consequente nulidade (art. 195 CPC).

4. Cumpre apreciar e decidir se a decisão recorrida enferma de nulidade, bem como se o exequente detém legitimidade para instaurar execução visando o pagamento de «custas de parte».

5. Fundamentação de Direito

5.1. Da nulidade

Alega o recorrente que, correndo a execução sob a forma sumária e não tendo o agente de execução suscitado a intervenção do Juíz, não pode – sob pena de nulidade – ser indeferido liminarmente o requerimento executivo.

Não é, contudo, assim.

Na verdade, o Juíz, ao abrigo do poder-dever de gestão processual plasmado nos arts. 6º e 590º, do CPC, não só pode, como deve, providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias, bem como, sendo caso disso, indeferir a petição.

Aliás, no processo de execução – como expressamente se prevê no art. 734º, nº1, do CPC – o Juíz pode conhecer oficiosamente até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do art. 726º, o indeferimento liminar.

É, assim, manifesto não ter sido cometida qualquer nulidade.

5.2. Da legitimidade do exequente

Na acção instaurada por LR contra RN, foi proferida sentença, já transitada em julgado, que julgou a acção totalmente improcedente e, pelo decaimento, condenou o autor nas respectivas custas.

Oportunamente, e nos termos previstos no art. 25º, do Regulamento das Custas Processuais, o réu juntou aos autos a respectiva nota discriminativa e justificativa, relativa a custas de parte.

Como se sabe, as custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas e são pagas directamente pela parte vencida à parte que delas seja credora – art. 26º, nºs 1 e 2, do RCJ.

Por sua vez, no art. 35º, do RCJ, sob a epígrafe “execução” estabelece-se que “não tendo sido possível obter-se o pagamento das custas (…) é entregue certidão da liquidação da conta de custas ao Ministério Público, para efeitos executivos (…)”.

Não obstante, e ao contrário do que poderia decorrer de uma leitura apressada daquela norma, tudo indica que o legislador não quis atribuir legitimidade ao Ministério Público para instaurar acção executiva para cobrança de direito de crédito de que seja titular a parte vencedora.

Com efeito:

O revogado Código das Custas Judiciais no seu art. 116º, nº3 estabelecia que, verificado determinado circunstancialismo, o interessado podia requerer ao Ministério Público que instaurasse execução para cobrança da dívida de custas de parte.

Dali resultava que a atribuição de legitimidade ao Ministério Público para instaurar acção com vista à cobrança coerciva das quantias devidas a título de custas de parte não era automática.

Ora, o actual Regulamento nem sequer contém preceito semelhante.

Afigura-se-nos, portanto, que a legitimidade para instaurar a execução por dívida de custas de parte pertence ao respectivo credor.

Tal entendimento sai ainda reforçado se tivermos presente que:

No art. 36º, nº3, do actual Regulamento das Custas Judiciais sob a epígrafe “cumulação de execuções” prevê-se expressamente a existência de duas execuções, uma instaurada pela parte vencedora contra o responsável pelas custas de parte e, outra, instaurada pelo Ministério Público por dívida de custas.

Por tudo o exposto, é de concluir que “não incumbe ao Ministério Público a instauração da acção executiva com vista à realização do pagamento de custas de parte (…)”.[1]

7. Nestes termos, acorda-se em revogar a decisão recorrida, que será substituída por outra que ordene o prosseguimento da execução.

Custas a cargo da parte que as suportar a final.
Lisboa, 11.02.2014
Maria do Rosário Morgado
Rosa Ribeiro Coelho
Amélia Ribeiro Coelho

[1] Salvador da Costa, Regulamento das Custas Judiciais, anotação ao art. 35º.