I - Tratando-se de imóveis destinados a longa duração, o prazo de denúncia dos defeitos é de um ano a contar do conhecimento dos mesmos (cfr. os arts.916º, nºs 2 e 3, e 1225º, nºs 2 e 4).
II - Quanto ao prazo de exercício do direito de eliminação dos defeitos, o mesmo é de 6 meses a contar da denúncia atempada dos defeitos, nos termos do art.917º, ou de 1 ano, no caso de serem aplicáveis os nºs 2 e 3, do art.1225, ex vi do nº4, do mesmo artigo.
III – Nos termos deste último artigo, o vendedor com intervenção directa na construção, modificação ou reparação do imóvel destinado a longa duração e que executou tais obras, tendo em vista a comercialização desse imóvel, deve estar sujeito às regras da responsabilidade civil do empreiteiro por defeitos da obra.
IV – Se o dono da obra contratar a construção de um imóvel com um empreiteiro e posteriormente o comercializar, não deve ser considerado um construtor/vendedor, para os efeitos do disposto no art.1225º, nº4, devendo antes responder nos termos previstos para a venda de coisa defeituosa (arts.913º e segs.).
V - O que justifica a aplicação do regime do contrato de empreitada à responsabilização pelos defeitos da construção é o facto do vendedor ser também o seu construtor, o que lhe dá um conhecimento privilegiado das características da obra por si realizada, independentemente das finalidades que presidiram à edificação.
VI - O STJ tem entendido, em geral, que, para os efeitos do nº4, do art.1225º, se considera construtor o vendedor do imóvel que, no âmbito da sua profissão, teve o domínio da respectiva construção
VII - Uma coisa é a denúncia ter de indicar os defeitos concretos de que a obra padece, e outra ter o denunciante de conhecer e de precisar qual a sua causa, não sendo exigível este conhecimento e esta precisão.
(Sumário do Relator)
1 – Relatório.
No … Juízo Cível de Lisboa, MV intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum sumário, contra PH, MV, C –CJ –.ª, e FB, alegando que é proprietária de um apartamento em …, que identifica, por o ter adquirido aos réus P e M, por escritura de 4/1/10, tendo aquele, que é arquitecto, assegurado à autora que o mesmo se encontra em excelentes condições de habitabilidade, já que tinha sido objecto de reabilitação e de remodelação.
Mais alega que, segundo informações prestadas pelo referido réu, tais obras haviam sido executadas pela ré C, Ld.ª, a qual, no entanto declinou essa responsabilidade, dizendo que foi a ré CJ quem executou essas obras, sendo que o réu FB é sócio gerente de ambas aquelas empresas.
Alega, também, que poucas semanas depois de se ter mudado para o apartamento, a autora verificou a existência de manchas escuras nas paredes do seu quarto e de manchas acinzentadas no respectivo soalho, tendo a situação piorado rapidamente, já que, em pouco tempo, a parede tinha água a escorrer até ao chão e o soalho ficou completamente escuro, denotando sinais evidentes de humidade e infiltrações. Que, em 6/8/10, o quarto já estava inabitável, com extensos danos nos estuques, pinturas, rodapés e soalhos.
Alega, ainda, que contactou com o réu P e com a ré CJ, Ld.ª, para tentar resolver o problema, tendo esta referido que os trabalhos tinham sido realizados pela ré CJ.
Alega, por último, que, uma vez que nenhum dos réus tomou a iniciativa de solucionar os defeitos verificados, a autora não teve outra alternativa senão mandar reparar esses defeitos, a expensas suas, tendo despendido o total de € 16.007,39. Que a cama da autora ficou totalmente destruída pela humidade e pelo bolor, tendo a mesma o valor de € 1.100,00. Que por causa dos aludidos defeitos esteve impossibilitada do uso de parte substancial do apartamento durante 6 meses. Que em virtude de tais defeitos, passou por dificuldades e teve preocupações, tendo sofrido desgaste físico e psíquico.
Conclui, assim, que devem os réus ser condenados, solidariamente, a pagar à autora:
a) A quantia de € 16.007,30, a título de compensação pelas quantias despendidas pela autora com as obras de reparação dos defeitos do apartamento;
b) A quantia de € 1.100,00, como compensação pelos danos irreparáveis causados na cama da autora, como consequência directa dos defeitos do apartamento;
c) A quantia de € 2.400,00, a título de indemnização pela impossibilidade de uso de parte substancial do apartamento, para o fim a que se destina, durante 6 meses, por causa dos defeitos do apartamento;
d) A quantia de € 500,00, como compensação pelas dificuldades, tempo despendido, preocupação e desgaste físico e psíquico causados pelos defeitos do apartamento.
Os réus C, Ld.ª, CJ, Ld.ª e FB, contestaram, alegando a ilegitimidade dos réus C e FB.
Mais alegam que foi o réu P que contratou com a ré CJ a remodelação do seu apartamento, tendo este entregue a obra em Janeiro de 2007, a qual foi aceite por aquele sem reservas.
Alegam, ainda, que, posteriormente, o edifício veio a ser sujeito a obras de recuperação no âmbito do RECRIPH.
Concluem, assim, que não existe relação de causalidade adequada entre a prestação do empreiteiro e os danos alegados, pelo que devem ser absolvidos do pedido.
Os réus P e M contestaram, alegando que o direito que a autora se arroga se encontra extinto por caducidade.
Concluem, deste modo, pela sua absolvição do pedido.
A autora respondeu às excepções, concluindo como na petição inicial.
Seguidamente, foi proferido despacho saneador, onde se julgaram partes legítimas os réus C, Ld.ª, CJ, Ld.ª e FB, tendo-se selecionado a matéria de facto relevante considerada assente e a que passou a constituir a base instrutória da causa.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, após decisão da matéria de facto, proferida sentença, nos seguintes termos:
«a) julgo improcedente, por não provada, a acção contra a R. C, e o R. Fernando, os quais absolvo do pedido;
b) julgo parcialmente procedente a acção e condeno os R. P e M, no pagamento à A. da importância de € 16.507,39, acrescida de juros moratórios que se venceram desde 13.04.2011, e os vincendos a esta data, à taxa supletiva de juros civis, e absolvo-os do demais pedido;
c) julgo parcialmente procedente a acção e condeno a R. CJ no pagamento à A. da importância de € 16.507,39 (de forma solidária relativamente ao pedido em que vão condenados os R. P e M como se decide em alínea b) supra), acrescida dos juros moratórios que se vencerem desde 13.04.2011, e os vincendos a esta data, à taxa supletiva de juros civis, e absolvo-a do demais pedido».
Inconformados, interpuseram recurso daquela sentença os réus P e M, por um lado, e a autora, por outro.
Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Fundamentos.
2.1. Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:
(…)
Factos não provados, por não ter sido junto o documento respectivo :
(…).
2.2. RECURSO DA AUTORA
2.2.1. A recorrente remata as suas alegações com as seguintes conclusões:
I.
(…)
2.2.2. São as seguintes as questões que importa apreciar no presente recurso:
1ª – saber se a Relação deve alterar a decisão proferida sobre os pontos 6º, 66º e 67º, da base instrutória, no sentido pretendido pela recorrente;
2ª – saber se a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia, nos termos da 1ª parte, da al.d), do nº1, do art.615º, do C.P.C.;
3ª – saber se os réus devem ser condenados, solidariamente, a pagar à autora a quantia de € 1.100,00, pelos danos causados na cama, e a quantia de € 2.400,00, pela impossibilidade de uso de parte substancial do apartamento.
2.2.2.1. Perguntava-se no ponto 6º da b.i.:
«Tais obras foram totalmente da responsabilidade do empreiteiro R. CJ, que a executou e nomeou os responsáveis pela sua execução e fiacalização?».
Resposta:
«Provado»
Despacho de fundamentação:
« - Artigo 6. – Cfr depoimento de TB, no quadro da fundamentação da resposta ao artigo 3.»
« - Artigo 3. – Cfr teor do documento respectivo, não impugnado, e assinado por CJ, Ld.ª, e depoimento de TB, que viu aquele e disse ter sido o que conheceu na relação do R. FB com os RR. P e M para a realização da obra em 2006/2007 no apartamento daqueles, bem como que o trabalho de encarregado da mesma que assumiu foi para a CJ, Ld.ª – sociedade de que o dito FB era então (e continua a ser) sócio maioritário e gerente – aquela que foi quem lhe pagou. Explicou que o seu pai é sócio gerente seja da C, Ld.ª como da CJ, Ld.ª, que as mesmas têm objecto diferente, a primeira presta serviços de projectos para obras de construção civil, enquanto a segunda é construtora, empreiteira, sendo certo que as mesmas trabalhavam em harmonia, uma planeava, a outra executava, sob a gestão do FB, este não actuando em nome individual.
Este testemunho é contrariado pelo R. P no depoimento de parte ao artigo39. onde diz que em 2009 comunicou à A. que tinha contratado a supracitada obra com C, Ld.ª, mas não vemos suporte documental para tal, sendo que o facto de C, Ld.ª ser o destinatário da comunicação de 20.10.06 de CML doc.8 pi, fls.43, já visto pelo descrido que pode ter intervindo no projecto da obra, e presumindo qual haja sido o requerimento a que se responde (? com o teor da «Memória Descritiva e Justificativa», de 25.09.06, documentos 3 e 4 juntos à contestação dos RR. Sociedades e F, fls.185/188?) não implica que o requerente de pedido de informação prévia seja o futuro empreiteiro, nesta condição, porventura um prestador do dono da obra ou de quem para este trabalhe».
Segundo a recorrente, resulta do depoimento da testemunha TB, bem como do depoimento de parte do réu P, e, ainda, dos documentos nºs 7 e 8, juntos com a p.i., que a C foi, pelo menos, responsável pela planificação da obra.
Vejamos.
Quanto ao depoimento de parte daquele réu, o mesmo foi reduzido a escrito, no que se entendeu por confessório, nos seguintes termos, na parte que ora interessa (cfr. fls.441 a 443):
«ao art.39. disse: sim, foi perguntado pela Autora quem tinha sido o empreiteiro das obras de 2006/2007 e respondi que foi a C, Ld.ª.
Sabia que a C, Ld.ª já tinha um projecto de remodelação da fracção, que serviu de princípio de conversa com a mesma. Soube da existência de uma empresa ligada às mesmas pessoas da C, Ld.ª, chamada CJ, Ld.ª, mas a minha convicção é que a empreitada foi contratada exclusivamente com C, Ld.ª e foi isso que transmiti à Autora».
Todavia, está demonstrado nos autos que «Em 04 de Julho de 2006, a R. CJ apresentou ao R. P (…), fls.170/184, proposta de trabalhos a realizar na Sobreloja do prédio sito na Rua …, em Lisboa, pelo preço total de € 36.980,00, mais I.V.A., que o R. P aceitou em 05.07.2006 apondo a sua assinatura» (cfr. a resposta ao ponto 3. da b.i.).
E, ainda, que:
«No 2º semestre de 2006 e até Janeiro de 2007 foram realizadas obras de reabilitação e remodelação na fracção «B» pela R. CJ, Ld.ª, a qual o dono da obra, o R. P, aceitou sem reservas» (cfr. a al.D dos factos assentes, conjugada com a resposta ao ponto 3. da b.i.).
Por conseguinte, estamos perante um documento assinado pelo réu P, onde este declara concordar com a proposta apresentada pela ré CJ, Ld.ª, cujo representante legal igualmente assina tal documento (cfr. fls.171).
Acresce que o réu P não é peremptório quando alude à C, Ld.ª, limitando-se a referir ser sua convicção que a empreitada foi contratada com aquela empresa.
Quanto ao depoimento da testemunha TB, o que resulta do mesmo é que tal testemunha foi o encarregado da obra em questão, trabalhando por conta da CJ, Ld.ª, que foi quem executou a obra.
Esclareceu, ainda, esta testemunha que a C, Ld.ª fazia os projectos e a CJ, Ld.ª executava, sendo esta, pois, a responsável pela execução.
Deste modo, tal depoimento não põe em causa a resposta dada ao ponto 6., antes pelo contrário, confirma o aí exarado.
Sendo que, na hipótese de ter sido a C a planear os trabalhos em questão, não se apurou ou alegou, sequer, qualquer deficiência nesse planeamento.
No que respeita ao documento nº7, junto com a p.i. (cfr. fls.41 e 42), trata-se de um mail, datado de 15/10/10, enviado pelo réu P para PS, onde aquele refere expressamente:
«A empresa que realizou chama-se C, Ld.ª mas sei que na altura da obra o proprietário da empresa, Sr. FB, estava a tratar da abertura de outra empresa CJ, Ld.ª por pretender incorporar também os filhos como sócios da empresa».
Mais uma vez, o réu P alude às duas empresas, não afirmando, sem margem para dúvidas, ter sido a C, Ld.ª, efectivamente, a executar as obras.
Quanto ao documento nº8, junto com a p.i. (cfr. fls.43), trata-se de uma notificação feita pela Câmara Municipal de … à C, Ld.ª, datada de 20/10/06, onde se refere que a obra a realizar não está dispensada de licenciamento.
Aliás, esse facto consta da al.E dos factos assentes. Porém, do mesmo não resulta que as obras efectivamente efectuadas não tenham sido, totalmente, da responsabilidade da ré CJ, Ld.ª.
Concorda-se, deste modo, com o teor do despacho de fundamentação, que justifica suficientemente a resposta dada ao ponto 6. da b.i..
Não há, pois, que alterar tal resposta.
Perguntava-se no ponto 66º:
«O quarto da fracção B estava mobilado com cama que a A. adquirira em Abril de 2007 pelo preço de € 1.995,00 e cujo valor em 2010 era de € 1.100,00?».
E no ponto 67º perguntava-se:
«E em consequência das deficiências nas paredes, rodapés e soalho da fracção B, a cama que ali existia ficou totalmente destruída pela humidade e pelo bolor, como se vê na fotografia doc. 14 p.i. (fls.65)?».
Resposta a ambos os pontos:
«Não provado».
Despacho de fundamentação:
«Artigos 66 e 67 – Nos seus depoimentos, os meios de prova produzidos sobre mobiliário no quarto, JS e FF, disseram não o terem visto, referindo o primeiro que quando esteve ali em Março-Abril 2010, a A. lhe terá transmitido que aguardava a recepção de mobília que viria de Itália. O documento 6 junto pela A. na sessão de julgamento de 06.07.13, fls.437/438, documenta a aquisição de mobiliário, não a sua instalação e utilização no apartamento».
Segundo a recorrente, deveriam ser dados como provados os referidos pontos, não só à luz dos documentos juntos, como à luz da experiência comum.
Os documentos seriam a fotografia de fls.65 e a factura de fls. 437.
No entanto, daqueles documentos, só por si, não resulta que o quarto da fracção estivesse mobilado com a cama adquirida pela autora pelo preço de € 1.995,00 e que a mesma tenha ficado totalmente destruída pela humidade e pelo bolor.
Sendo que, não consta que outra prova tenha sido produzida sobre essa matéria.
Por outro lado, não se vê que a experiência comum permita concluir, como pretende a recorrente, que esta não compraria uma cama daquele valor para não a instalar na sua residência em Portugal. Ou que os problemas de infiltrações, causados pelas deficiências do apartamento, seriam adequadas a destruir completamente qualquer mobiliário que estivesse instalado no quarto. Ou, ainda, que o valor de € 1.100,00 é um valor adequado para compensar a destruição do mobiliário de um quarto.
Não há, deste modo, que alterar a resposta dada aos pontos 66 e 67 da b.i..
Verifica-se, pois, que os concretos meios probatórios constantes do processo e da gravação nele realizada, não impõem decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Haverá, assim, que concluir que não deve a Relação alterar a decisão proferida sobre os pontos 6º, 66º e 67º, da b.i., no sentido pretendido pela recorrente (cfr. os arts.640º e 662º, do C.P.C.).
2.2.2.2. Entende a recorrente que a sentença recorrida se devia ter pronunciado e aplicado a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, pelo que, não se tendo pronunciado sobre tal questão, incorreu no vício de nulidade, nos termos dos arts.615º, nº1, al.d) e 608º, nº2, do C.P.C..
Mais alega que não foi possível identificar quem é que, concretamente, executou as obras, por culpa dos réus C, CJ e F.
Alega, também, que os réus C e F imputam responsabilidade à ré CJ por esta não exercer, no momento, qualquer actividade, nem ter património que possa ser executado.
Alega, ainda, que quando a personalidade colectiva é usada de modo ilícito e abusivo, para prejudicar terceiros, é possível proceder ao levantamento da personalidade colectiva, também designado por desconsideração da personalidade jurídica das sociedades comerciais, nos termos do art.334º, do C.Civil.
Para, depois, concluir que deviam os réus C, CJ e FB ter sido considerados, solidariamente, responsáveis pela reparação dos danos sofridos pela autora.
É certo que, na p.i., a autora invocou a referida teoria, por não lhe ser possível, nem exigível, identificar quem é que, concretamente, executou as obras, por culpa dos réus.
No entanto, como se refere na sentença recorrida, a matéria provada não demonstra a intervenção, a qualquer título, dos réus C, Ld.ª e FB na obra realizada no apartamento em 2006/2007, em que a autora fundamentou a sua demanda contra aqueles, pelo que a acção improcede quanto aos pedidos formulados contra aqueles dois réus.
Por conseguinte, a sentença recorrida resolveu a questão de saber quem executou as obras – a ré CJ, Ld.ª –, condenando-a, solidariamente, juntamente com os réus P e M, e absolvendo os réus C, Ld.ª e FB dos pedidos contra eles formulados.
O que vale por dizer que o tribunal não deixou de conhecer de questão de que devia conhecer, sendo que não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que as partes se apoiam para sustentar a sua pretensão.
E sempre se dirá que a questão suscitada não tem nada a ver com a chamada teoria da desconsideração da personalidade jurídica, antes se tratando de um caso de dúvida sobre o sujeito da relação controvertida (cfr. o art.39º, do C.P.C.).
Na verdade, aquela teoria foi criada por certa doutrina a partir de precedentes jurisprudenciais dos EUA, da Inglaterra e da Alemanha, tendo em vista autorizar o tribunal a ignorar a autonomia patrimonial de pessoa jurídica, sempre que ela tiver sido utilizada como expediente para a realização de fraude, tornando, assim, possível a responsabilização directa e ilimitada do sócio, por obrigação que, originariamente, cabia à sociedade.
Haverá, assim, que concluir que a sentença recorrida não é nula, nos termos da 1ª parte, da al.d), do nº1, do art.615º, do C.P.C..
2.2.2.3. Quanto à questão de saber se os réus devem ser condenados, solidariamente, a pagar à autora a quantia de € 1.100,00, a título de indemnização pela destruição da cama da autora, tal pedido pressupunha que se dessem como provados os pontos 66º e 67º da b.i..
Porém, uma vez que já se concluiu que não deve ser alterada a resposta a esses pontos, que, por isso, se mantêm como não provados, não podiam os réus deixar de ser, como foram, absolvidos desse pedido.
No que respeita à questão de saber se os réus devem ser condenados, solidariamente, a pagar à autora a quantia de € 2.400,00, pela impossibilidade de uso de parte substancial do apartamento, considerou-se na sentença recorrida que, das respostas aos pontos 69º e 70º, não resulta que a autora não haja ajustado a utilização das outras divisões da casa de modo a suprir a inutilização do quarto de dormir, não realizando despesas para tanto, sem embargo dos incómodos que a situação lhe haja provocado, já ao nível da indemnização por danos morais.
Mais se considerou, naquela sentença, quanto a danos morais, que:
«(…) respigamos com interesse o que se prova nas alíneas V1), P2), Q2) e V2, a saber a inutilização de uma divisão da casa da A., o quarto de dormir, e a atitude deliberadamente omissiva dos vendedores em promoverem a reparação, fazendo recair sobre aquela os incómodos da privação do quarto, e também do sossego, enquanto se viu confrontada em ser ela a ter que resolver questão que em primeira linha incumbia aos vendedores, situação que se arrastou por vários meses, e que entendemos ultrapassar em muito, aquilo que um contraente cumpridor deve suportar da actuação do incumpridor, ou seja os mesmos são danos morais graves para efeitos da sua indemnização. E prosseguindo em sede de fixação daqueles, atentos os critérios previstos no artigo 494º do C.Civil, e face a uma presumida situação económica semelhante dos envolvidos, temos que o valor quase simbólico reclamado pela A., de € 500,00 (…) não é seguramente desajustado por excesso, pelo contrário, fixando-se assim a indemnização no valor de capital de € 16.507,39, da A. relativamente aos RR. P e M».
Segundo a recorrente, houve um mal entendido quanto ao teor do seu pedido, porquanto, aquilo que a sentença recorrida considerou danos morais, dividiu-os a autora em dois pedidos:
- 1º: de indemnização que avaliou em € 2.400,00 e que dizia respeito à impossibilidade de uso de uma divisão da casa durante 6 meses;
- 2º: de indemnização que computou em € 500,00 e que dizia respeito aos danos causados pelas dificuldades, tempo despendido, preocupação e desgaste físico e psíquico causados pelos defeitos do apartamento.
Mais alega que, assim, a sentença recorrida deveria ter condenado os réus, solidariamente, no pagamento de uma compensação à autora no valor de € 2.400,00, a par da indemnização pelos «outros» danos morais de € 500,00.
Verifica-se, pois, que a autora também considera danos morais os compreendidos no 1º pedido atrás referido.
Só que, a forma como os avaliou não tem a ver com aquele tipo de danos, já que, para obter o referido valor de € 2.400,00, partiu do valor locativo da casa, alegadamente de € 800,00 por mês, e da constatação de que, durante 6 meses, só pôde usar 50% da casa.
Por isso que concluiu dever ser indemnizada por 50% do valor locativo do imóvel (50% x € 800,00 x 6), ou seja, € 2.400,00.
Note-se que apenas se provou que o referido valor locativo era de cerca de € 400,00 por mês (cfr. a resposta ao ponto 70º da b.i.), pelo que, utilizando aquele critério, o valor da indemnização não ultrapassaria os € 1.200,00 (50% x € 400,00 x 6).
De todo o modo, também consideramos, como na sentença recorrida, que os factos constantes da al.J dos factos assentes e das respostas aos pontos 63º, 68º e 69º da b.i., atrás transcritos, traduzem, tal como os constantes da resposta ao ponto 71º, danos não patrimoniais com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito (cfr. o art.496º, nº1, do C.Civil).
Nada impedindo que o respectivo valor acresça aos pedidos € 500,00, porquanto, tem sido orientação pacífica dos tribunais que os limites da condenação estabelecidos no art.609º, nº1, do C.P.C., se entendem referidos ao pedido global e não às parcelas em que se desdobra o cálculo do prejuízo.
Deste modo, em juízo de equidade, tendo em conta as regras de boa prudência, de bom senso prático e de justa medida das coisas, considera-se adequada a fixação, a título de danos não patrimoniais sofridos pela autora, no que respeita à factualidade constante da al.J dos factos assentes e das respostas aos pontos 63º, 68º e 69º da b.i., do montante indemnizatório de € 1.000,00.
Este montante acresce, pois, aos já fixados na sentença recorrida a esse título (€ 500,00). O que significa que a condenação, a título de danos não patrimoniais, deverá atingir o total de € 1.500,00.
Haverá, assim, que alterar, nesta parte, a sentença recorrida, atenta a parcial procedência do recurso.
2.3. RECURSO DOS RÉUS P E M
2.3.1. Os recorrentes rematam as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…)
2.3.2. A recorrida contra-alegou, concluindo nos seguintes termos:
(…)
2.3.3. A questão fulcral que importa apreciar consiste em saber se a presente acção caducou.
A este propósito, na sentença recorrida, teceram-se as seguintes considerações:
«Anote-se para efeitos de interpretação do artigo 1225º, 4 C.Civil, o cerne da divergência nesta parte, que ainda que a norma esteja inserida sistematicamente no «Contrato de empreitada», o legislador não estabelece na sua previsão que se trate apenas de obra feita no âmbito de um contrato de empreitada, tão só que tenha sido o vendedor quem fez a obra. Quer dizer que, desde logo pela presunção de que o intérprete não deve distinguir onde o legislador não o fez, e sobretudo pelo elemento teleológico com evidência visando o reforço da garantia da qualidade do bem em venda (do que se trata), o sentido técnico-jurídico de quem fez a obra, não é outro que reportar-se a quem definiu e pagou o preço da mesma, o vendedor, haja sido ele a realizá-la materialmente (quando é construtor civil) ou por empreitada a outrem.
Neste entendimento, não se questionando que até ao final de 2010, ainda não tinha decorrido cinco anos sobre a realização da obra de recuperação do imóvel em 2007 (alíneas M e R), que a venda é de Janeiro de 2010 (alínea F1), que as deficiências são comunicadas aos Réus P e M (quem deduziu a caducidade) pelo menos até 19.08.10 (alíneas X1 e Z1) e que esta acção (visando a indemnização) foi proposta em 13.04.11 (alínea X2), então, sem mais considerações, haverá que julgar improcedente a supracitada caducidade».
Segundo os recorrentes, construtor nos termos e para os efeitos do disposto no nº4, do art.1225º, do C.Civil (serão deste Código as demais disposições citadas sem menção de origem), será apenas quem construiu por meio de gestão directa, sem a intermediação de um empreiteiro, sendo que o mero dono da obra não profissional não preenche o conceito do citado artigo.
Mais alegam que, tendo aplicação ao caso o disposto nos arts.916º e 917º, a autora tinha 30 dias para denunciar os defeitos, após o conhecimento destes (art.916º, nº2), e 6 meses para propor a presente acção (art.917º).
Alegam, ainda, que, tendo a autora detectado os defeitos em Março/Abril de 2010, os mesmos só foram denunciados aos recorrentes em Agosto de 2010, isto é, decorridos mais de 3 meses.
E, por outro lado, que, tendo a acção dado entrada em 18/4/11, a mesma foi proposta mais de 6 meses após a denúncia.
Para, depois, concluírem pela caducidade da referida acção, nos termos do disposto no art.917º.
Vejamos.
Como é sabido, o DL nº267/94, de 25/10, além de prever a expressa responsabilização do empreiteiro perante o terceiro adquirente do imóvel, dando nova redacção ao nº1, in fine, do art.1225º, veio aplicar o regime estatuído pelo art.1225º ao «vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado», aditando-lhe o novo nº4.
Assim, como refere Calvão da Silva, in Compra e Venda de Coisas Defeituosas, 5ª ed., pág.107, «quando, na compra e venda, o alienante tenha sido também o construtor do imóvel (vendedor e construtor), mas inexista e apesar de inexistir empreitada entre ele e o comprador, aos defeitos da coisa transmitida deve aplicar-se o regime do art.1225º e não o dos arts.916º e 917º - tenha-se presente, contudo, que o mesmo Decreto-Lei introduziu o novo nº3 do art.916º, o qual em grande parte harmoniza com a empreitada os prazos no caso de a coisa vendida (por alienante não construtor) ser um imóvel: a denúncia será feita até um ano depois de conhecido o defeito e dentro de cinco anos após a entrega do imóvel. Com a diferença de a acção dever ser proposta: dentro dos seis meses subsequentes à denúncia, no art.917º; dentro do ano subsequente à denúncia, no art.1225º, nº2, e no art.1224º, nº2 – vejam-se o acórdão do STJ, de 8/11/2007 (Proc. nº07B2976), o acórdão do STJ, de 15/2/05 (Proc. nº04A4577); o acórdão da Relação de Coimbra, de 14/11/2006 (Proc. nº477/05.8TBILV.C1)».
Por conseguinte, tratando-se de imóveis destinados a longa duração, como acontece no caso dos autos, o prazo de denúncia dos defeitos é de um ano a contar do conhecimento dos mesmos (cfr. os arts.916º, nºs 2 e 3, e 1225º, nºs 2 e 4).
Quanto ao prazo de exercício dos direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato, indemnização, o mesmo é de 6 meses a contar da denúncia atempada dos defeitos, nos termos do art.917º, ou de 1 ano, no caso de serem aplicáveis os nºs 2 e 3, do art.1225, ex vi do nº4, do mesmo artigo.
No entanto, se é certo que o vendedor com intervenção directa na construção, modificação ou reparação do imóvel destinado a longa duração e que executou tais obras, tendo em vista a comercialização desse imóvel, deve estar sujeito às regras da responsabilidade civil do empreiteiro por defeitos da obra, já o caso de o dono da obra contratar a construção de um imóvel com um empreiteiro e posteriormente o comercializar, tem vindo a suscitar opiniões divergentes na nossa jurisprudência, como refere João Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 5ª ed., pág.180.
Acrescenta este autor (ob. e loc. cits.): «Quando Vaz Serra incluiu no seu projecto que o vendedor de imóvel ficava sujeito à mesma responsabilidade que o empreiteiro, quando tivesse sido ele a construí-lo, modificá-lo ou repará-lo (art.25º, nº4), apenas recortou no seu horizonte as situações de intervenção directa na actividade construtora do vendedor, dado que eram apenas esses os casos relativamente aos quais a doutrina e jurisprudência italiana, na altura, discutiam a extensão do regime da empreitada. Apesar desta proposta não ter sido acolhida inicialmente pela redacção inicial do art.1225º, do C.C., algumas decisões judiciais vieram a retomá-la nos seus precisos termos, numa interpretação criativa deste preceito legal. Quer estas decisões, quer as vozes de apoio que se ouviram na doutrina e que reclamaram uma alteração legislativa nesse sentido, limitaram sempre a aplicação do regime previsto no art.1225º, do C.C., aos casos em que o vendedor era o construtor directo do imóvel, tendo o DL nº267/94 satisfeito essa reivindicação».
Concorda-se, ainda, com o defendido pelo mesmo autor, ob. cit., págs.181 a 183, quando refere:
«Na verdade, não se justifica que quem contrate com um empreiteiro a construção de um imóvel, vendendo-o posteriormente a terceiros, seja considerado um construtor/vendedor, para os efeitos do disposto no art.1225º, nº4, do C.C., devendo antes responder, nos termos previstos para a venda de coisa defeituosa (art.913º e segs., do C.C.), pelos defeitos existentes no imóvel, uma vez que o adquirente pode responsabilizar o empreiteiro contratado pelo vendedor, nos termos admitidos no art.1225º, nº1, in fine, do C.C., e regulados nos diversos números do citado artigo».
É que, nestes casos, o vendedor não é o autor da obra, pelo que não se encontra numa posição similar à do empreiteiro, relativamente ao conhecimento que tem da obra, para poder responder segundo o regime da empreitada.
Por isso que parece ser indiferente que o vendedor seja ou não um profissional da actividade de comercialização de imóveis, apenas relevando essa qualidade para efeitos de determinar se o regime aplicável é o regime geral previsto no Código Civil ou o regime especial de venda de bens de consumo constante do DL nº67/2003.
Assim, o que justifica a aplicação do regime do contrato de empreitada à responsabilização pelos defeitos da construção é o facto do vendedor ser também o seu construtor, o que lhe dá um conhecimento privilegiado das características da obra por si realizada, independentemente das finalidades que presidiram à edificação.
Deste modo, o vendedor que incumbiu terceiro da realização da obra responde perante o adquirente por defeitos desta, segundo o regime da compra e venda de coisas defeituosas (art.913º), enquanto o empreiteiro responde perante o comprador segundo o regime do contrato de empreitada (art.1225º, nº1). Parecendo nada impedir que ambos possam ser demandados, em simultâneo, pelo adquirente para satisfazerem os seus direitos (situação de litisconsórcio voluntário).
Note-se que em Itália, apesar de não existir um preceito com o conteúdo do nº4, do art.1225º, a doutrina e a jurisprudência dominantes defendem que a aplicação do regime da responsabilização do empreiteiro pelos defeitos em imóveis de longa duração ao construtor-vendedor apenas abrange os casos em que o vendedor é um profissional e foi o construtor directo da obra (cfr. os autores citados por João Cura Mariano, ob.cit., pág.182, nota 494).
Segundo este autor, ob.cit., pág.181, nota 493, que temos seguido muito de perto, pode ver-se, no sentido por si defendido, Pedro Romano Martinez, in Direito das Obrigações, pág.134, José Manuel Vilalonga, in Compra e venda e empreitada: contributo para a distinção entre os dois contratos, ROA, Ano 57, I, págs.219-223, e Pedro de Albuquerque/Miguel Assis Raimundo, in Contrato de Empreitada, págs.451-453.
E na jurisprudência, podem ver-se os Acórdãos do STJ, de 22/6/05, e da Relação do Porto, de 11/12/07 e de 3/3/09, disponíveis in www.dgsi.pt.
O STJ, no entanto, tem entendido, em geral, que, para os efeitos do nº4, do art.1225º, se considera construtor o vendedor do imóvel que, no âmbito da sua profissão, teve o domínio da respectiva construção (cfr., entre outros, os Acórdãos de 19/4/12, 5/3/13 e 13/5/14, todos igualmente disponíveis in www.dgsi.pt).
Seja como for, entendemos que o caso dos autos não se integra numa situação desse tipo.
Na verdade, apurou-se que o réu P, em 2006, era estudante de arquitectura, e que, no seu relacionamento com a CJ, afirmava conhecimentos em matéria de construção e de edifícios, suficientes para se permitir discutir as soluções a realizar na obra, cuja execução acompanhou como dono da obra (respostas aos pontos 4º e 5º da b.i.).
Mais se apurou que, no 2º semestre de 2006 e até Janeiro de 2007, foram realizadas obras de reabilitação e remodelação da fracção pela CJ, que o dono da obra, o réu P, aceitou sem reservas, tendo tais obras sido totalmente da responsabilidade da empreiteira CJ, que as executou e nomeou os responsáveis pela sua execução e fiscalização (cfr. a al.D dos factos assentes e a resposta ao ponto 6º da b.i.).
Apurou-se, ainda, que a aquisição por compra da fracção por parte dos réus P e M, foi registralmente inscrita a seu favor, a título provisório por natureza, em 6/9/06, mas que, em data até 21/2/07, foi aquela inscrição convertida em definitiva (cfr. as als.A e G dos factos assentes).
Apurou-se, também, que desde 2007 até Dezembro de 2009, o réu P residiu na fracção, e que, em 4/1/10, a mesma foi vendida pelos réus P e M à autora, que aí passou a residir (cfr. a al.H dos factos assentes e as respostas aos pontos 16º e 24º da b.i.).
Não se pode, pois, dizer que os réus P e M tiveram o domínio da construção, antes tendo contratado para o efeito a empreiteira CJ, que executou a obra e nomeou os responsáveis pela sua execução e fiscalização.
Por conseguinte, não têm que ser considerados vendedores-construtores, mesmo tendo em conta o critério mais amplo atrás referido.
O que significa que, devendo ser tratados como meros vendedores, se aplica ao caso o disposto nos arts.916º e 917º, e não o disposto no art.1225º, nº4.
Logo, a acção destinada a exercer e fazer valer qualquer dos direitos contratuais do comprador, caduca decorridos 6 meses sobre a data da denúncia tempestiva, nos termos do art.917º.
Na verdade, tem-se entendido pacificamente que se justifica a extensão do art.917º, que refere apenas a acção de anulação, às acções dos demais direitos, designadamente, de reparação ou substituição da coisa, de resolução e de indemnização (cfr., entre outros acórdãos, o Acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ, de 4/12/96).
Ora, resultando da prova produzida que, como se diz na sentença recorrida, a venda é de Janeiro de 2010, que as deficiências foram comunicadas aos réus P e M pelo menos até 19/8/10 e que a presente acção foi proposta em 13/4/11, constata-se que a denúncia dos defeitos foi feita dentro do prazo de 1 ano previsto no art.916º, nº3, mas que a acção de indemnização foi instaurada depois de ter decorrido o prazo de 6 meses previsto no art.917º.
Haverá, assim, que concluir que a presente acção caducou.
Entende a autora, aqui recorrida, que a acção foi interposta dentro dos 6 meses seguintes à denúncia, porquanto só fez uma verdadeira denúncia dos defeitos na sua comunicação escrita enviada, através de carta registada, dirigida aos réus P e M, datada de 5/11/10.
Mais alega que tal denúncia tem de ser feita de forma concreta e minuciosa, sendo necessário que os defeitos sejam indicados de forma precisa, para que ao empreiteiro seja dada a possibilidade de analisar a sua natureza e relevância, citando, para o efeito, Romano Martinez e, ainda, o Acórdão da Relação de Lisboa, de 9/2/10.
É certo que está provado que, por carta de 5/11/10, com o teor de fls.97/101, por correio registado c/AR, remetida aos réus P e M, a autora descreveu-lhes os defeitos verificados no apartamento, carta que foi devolvida por os declaratários não a terem levantado (cfr. as respostas aos pontos 49º e 50º da b.i.).
No entanto, é igualmente certo que também se provou que, em Março/Abril de 2010, começaram a aparecer os problemas das infiltrações (cfr. as respostas aos pontos 27º e 28º da b.i.), os quais, em 6/8/2010, se terão agravado (cfr. as respostas aos pontos 32º e 34º da b.i.), sendo que, até 19/8/2010, a autora contactou o réu P, remetendo-lhe cópia da parte de um relatório de inspecção ao imóvel e solicitando-lhe ajuda para a resolução do problema, mas não tendo este mostrado querer assumir qualquer responsabilidade pelos defeitos verificados, conforme mail de 19/8/2010 (cfr. as respostas aos pontos 35º e 36º da b.i.).
Por isso que se considerou atrás, tal como, aliás, na sentença recorrida, que as deficiências foram comunicadas aos réus P e M, pelo menos, até 19/8/2010.
Alega, ainda, a recorrida que contratou uma empresa, em finais de Outubro de 2010, para descobrir a razão das infiltrações, designadamente através do levantamento do soalho (cfr. a resposta ao ponto 43º da b.i.), tendo enviado cópia do respectivo relatório na tal carta remetida em 5/11/2010, onde se descrevem as causas das infiltrações verificadas, pelo que a denúncia foi feita em Novembro de 2010.
Porém, uma coisa é a denúncia ter de indicar os defeitos concretos de que a obra padece (cfr., neste sentido, Romano Martinez, in Direito das Obrigações, 2ª ed., pág.481 e João Cura Mariano, ob.cit., pág.98), e outra ter o denunciante de conhecer e de precisar qual a sua causa, não sendo exigível este conhecimento e esta precisão (cfr. último autor citado, págs.98 e 99).
No mesmo sentido, o Acórdão do STJ, de 5/7/12, disponível in www.dgsi.pt, em cujo sumário se pode ler:
«I – Ao comprador cabe o ónus da prova dos defeitos de imóvel que foi vendido pelo empreiteiro (arts.342º e 1225º do CC).
II – Já não cabe todavia ao comprador o ónus de provar as causas dos defeitos – o vício do solo ou da construção, modificação ou reparação ou os erros de execução que estiveram na origem dos defeitos da obra ou da sua ruina total ou parcial – muito menos ainda as concretas falhas técnicas de execução que originaram esses defeitos».
Aliás, no Acórdão da Relação de Lisboa, de 9/2/10, igualmente disponível in www.dgsi.pt, citado pela recorrida, não se defende coisa diferente, referindo-se aí que « (…) muito embora o acto de denúncia deva indicar inequivocamente, com o grau de precisão possível os defeitos detectados na obra (…), não é exigível ao dono da obra que precise a sua causa.
Por conseguinte, a autora não estava obrigada, nem a identificar as causas dos defeitos detectados, nem a denunciá-los com o rigor técnico com que foram mencionados na carta de 5/11/2010, onde, no essencial, se confirma, embora mais detalhadamente, a existência das anomalias já antes denunciadas aos réus P e M até 19/8/2010.
Procede, pois, o recurso, havendo que revogar, em conformidade, a sentença recorrida, na parte em que julgou improcedente a caducidade invocada pelos recorrentes.
Deste modo, não há que conhecer das demais questões suscitadas pelos recorrentes, cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada à questão da caducidade (art.608º, nº2, 1ª parte, do C.P.C.).
3 – Decisão.
Pelo exposto:
1 – Concede-se provimento ao recurso interposto pelos réus P e M e revoga-se a sentença apelada, na parte em que os condenou, julgando-se a respectiva acção totalmente improcedente e absolvendo-se os mesmos do pedido;
2 – Concede-se parcial provimento ao recurso interposto pela autora e altera-se a sentença apelada, na parte em que condenou a ré CJ, que vai agora condenada no pagamento à autora da importância de € 17.507,39, acrescida dos juros moratórios referidos naquela sentença;
3 – Custas pela autora e pela ré CJ, na proporção de, respectivamente, um terço e dois terços, em ambas as instâncias.
Lisboa, 16 de Setembro de 2014
Roque Nogueira
Pimentel Marcos
Tomé Gomes