CONDUÇÃO SEM CARTA
EMBRIAGUEZ
PENA ACESSÓRIA
PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULO MOTORIZADO
Sumário

Ao condutor não legalmente habilitado a conduzir veículos com motor, se condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, deve ser-lhe também aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69º, nº 1, alínea a), do mesmo Código.

Texto Parcial

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa

I - RELATÓRIO

1. Nos presentes autos com o NUIPC ..., do 2º Juízo - 3ª Secção, do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, em Processo Especial Sumário, foi o arguido A condenado, por sentença de 31/03/20.., pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de 8 meses de prisão e pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 2/98, de 03/01, na pena de 12 meses de prisão.

Após cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 20 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

 2. O Ministério Público não se conformou com o teor da decisão e dela interpôs recurso.

2.1 Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição):

1 - Por sentença proferida nos presentes autos, procedeu o Tribunal a quo, à condenação do arguido A pela prática, em autoria material e em concurso real de um crime de condução de veículo sem habilitação legal e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez na pena única de 20 meses de prisão suspensa por igual período (sendo as parcelares respectivamente de 8 meses de prisão e de 12 meses de prisão). Nenhuma pena acessória lhe foi aplicada.

2 - Limitando-se o recurso ora em causa à questão de saber se se aplica ou não pena acessória de inibição de condução, quando o arguido tenha cometido simultaneamente o crime de condução de veículo em estado de embriaguez e condução sem habilitação legal, entendemos que a não aplicação de tal pena acessória implica a violação do disposto nos artigos 40°, 69° n° 1 alínea a), 70° e 71° n.° 1 e n° 2, todos do Código Penal.

3 - Em abono do presente recurso, começaremos por dizer que o art. 69°, n.° 1, alínea a) do Código Penal, determina que é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos, quem for punido por crime previsto nos arts. 291° ou 292°, não ressalvando de todo em todo se o condenado é ou não titular de carta de condução.

4 - Ao contrário do argumento utilizado pela Mma Juiz a quo para justificar a não aplicação de tal pena acessória - porque o objectivo do art. 69° é a obtenção pelo arguido de carta de condução, facto a que tal pena vem obviar - esta proibição de conduzir tem não só um efeito de prevenção geral de intimidação, como um efeito de prevenção especial, devendo contribuir, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano (cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Edição Aequitas - Editorial Notícias -1993, Pág. 165).

5 - Porquê aquele prisma de o condenado a esta pena não obter como pretendido a carta de condução, ao invés de se sentir estimulado a obtê-la precisamente para evitar nova condenação, pelo menos no que tange ao crime de condução sem habilitação legal? Somos de opinião que isto é em rigor um estímulo - e a realidade isso tem comprovado - e não um óbice ou um obstáculo. Isto sim, é a verdadeira ressocialização do agente pretendida pela lei.

6 - E na verdade, tal raciocínio é uma falácia, se atentarmos desde logo no modo de cumprimento desta pena, nestes casos concretos em que há condenação pelo crime de condução de veículo sem habilitação legal e em estado de embriaguez. É que efectivamente, o que vem sendo determinado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, é que o cumprimento de tal pena acessória se inicie com o trânsito em julgado da sentença/acórdão condenatório.

7 - A não aplicação desta pena acessória a quem, cumulativamente cometa os crimes previstos nos arts. 292° do CPenal e 3° do DL 2/98 de 3 de Janeiro, face aqueles outros que "apenas" cometeram o crime do art. 292° do C.Penal, mas que têm carta de condução e a quem, consequentemente será aplicada tal pena acessória, levaria a um tratamento desigual que a lei não pretende. Neste caso, o "maior infractor" sairia, injustificadamente, beneficiado.

8 - Sendo que, como refere a senhora Juiz, nem se pode dizer que tal pena acessória seja inútil (expressão nossa), uma vez que ficará a constar do CRC do condenado.

9 - Por outro lado, tal pena acessória não se limita meramente aos veículos automóveis ligeiros, mas sim a todos os veículos com motor e cuja condução exija tal licença (cfr. arts. 121° a 125° do C. da Estrada), como os motociclos ou ciclomotores.

10 - Nesta conformidade, atendendo à TAS revelada pelo arguido 1,31 g/1 (após dedução do EMA) e aos antecedentes criminais do arguido (já condenado anteriormente em Junho de 2011 pela prática, além do mais, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez na pena acessória de 4 meses de inibição de condução de veículos motorizados na via pública), por outro, considerando que são ténues as exigências de prevenção especial no caso concreto, entendemos que a pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados que deve ser aplicada não deverá ir além do limite mínimo legal, i.e., em 5 meses, porquanto consideramos que a mesma é justa, adequada e proporcional aos aludidos fins.

Assim, julgando totalmente procedente o recurso interposto e decidindo conforme o ora pugnado (face ao disposto nos art. 426°, n° 1 do Código de Processo Penal), proferindo-se acórdão que substitua a sentença proferida nos autos, V. Ex.as farão a costumada e habitual Justiça.

3. O arguido não respondeu à motivação de recurso.

4. Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, incorrendo em lapso por atender a que o recurso tinha sido interposto pelo arguido, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

5. Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do CPP, tendo sido apresentada resposta pelo arguido, em que pugna pela não aplicação da pena acessória de proibição de conduzir.

            6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

           Cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1.   Âmbito do Recurso

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.

No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, a questão que se suscita é a da aplicação ou não da pena acessória de proibição de conduzir no caso em apreço.

2.   A Decisão Recorrida

Ouvida a gravação da audiência, onde consta a sentença oralmente proferida (artigo 389º-A, do CPP), constata-se que o tribunal a quo considerou como provados os seguintes factos:

No dia 11 de Março de 2014, cerca das 18:05 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..., na freguesia de Santa Maria dos Olivais, em Lisboa, neste circunstancialismo foi abordado pela PSP numa acção de fiscalização, que solicitou a sua carta de condução, tendo o arguido declarado não ser titular de carta de condução ou de outro documento válido para a condução do veículo na via pública o que efectivamente ocorria.

 Ao actuar da forma descrita fê-lo voluntária, livre e conscientemente, sabendo que a condução nestas circunstâncias é crime.

Entretanto foi submetido ao teste de pesquisa de álcool no sangue, através do aparelho “Drager Alcotest 7110 MKIIIP”, tendo resultado apurada a taxa de álcool no sangue de 1,42 g/l, sendo que depois da dedução da taxa máxima de erro admissível a taxa de álcool no sangue resulta ser 1,31g/l.

Tendo sido notificado para realização da contraprova, prescindiu do exercício de tal direito.

Fê-lo de forma voluntária, livre e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

O arguido confessou de forma integral e sem reservas os factos.

Tem antecedentes criminais conforme resulta do ser CRC de fls. 6 a 28 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido. Foi julgado e condenado por prática de crime de roubo em pena de prisão suspensa, já declarada extinta. E foi julgado e condenado por três vezes por prática de um crime de condução de veículo sem legal habilitação. A primeira por factos e sentença de Maio de 2007 foi condenado numa multa de setenta dias cumprida. A segunda por factos de 2008 e sentença de 2008, foi condenado igualmente em pena de multa, 150 dias de multa, substituída por trabalho, igualmente cumprida. E finalmente por factos e sentença de Maio de 2010 foi condenado em pena de prisão substituída por multa igualmente cumprida. Foi, por outro lado, igualmente condenado uma vez por prática de crime de condução de veículo em estado de embriaguez por factos e sentença de Junho de 2011, foi aplicada uma pena de seis meses de prisão substituída por multa, que entretanto foi substituída por trabalho a favor da comunidade e em quatro meses de pena acessória, penas declaradas extintas pelo seu cumprimento.

O tribunal dá ainda como provada a situação pessoal do arguido, ou seja, solteiro, reside com a sua mãe que trabalha, tem um filho que se encontra entregue à respectiva mãe, a quem presta a pensão de alimentos na quantia mensal de setenta e cinco euros. Encontra-se desempregado desde Agosto de 2013, fazendo alguns biscates e sendo ajudado financeiramente pela sua mãe e tem como habilitações literárias o 7º ano.

Quanto aos factos nãos provados, inexistem.

Fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):

Para dar como provados todos estes factos o tribunal teve em atenção as declarações prestadas pelo arguido que os confessou de forma integral e sem reservas, apenas alegando a necessidade de conduzir porque a sua namorada ia apara Inglaterra e tinha de a levar ao aeroporto e não tinha dinheiro para ir de táxi ou de qualquer outra forma, acabando por confirmar que sabia bem que este facto que alega em nada afastava a responsabilidade pela prática dos dois crimes e podia resolver o problema de outra forma sem praticar crimes.

Foram finalmente tidos em atenção os documentos habituais, a saber, são o teste de fls. 10, a notificação de contraprova de fls. 11 e o CRC cujo número de folhas foi já referido.

Apreciemos.

O recurso versa sobre matéria de direito, não tendo sido impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto e, uma vez que se não vislumbra qualquer dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP, nem nulidade alguma de conhecimento oficioso, cumpre considerar, como se considera, definitivamente fixada a matéria de facto constante da sentença sob recurso.

O tribunal a quo fundamentou a decisão de não aplicar ao arguido a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor (não obstante na sentença se afirmar “apesar da jurisprudência fixada pelo Tribunal da Relação de Lisboa ser unânime relativamente à aplicação da pena acessória neste tipo de situações”) com a seguinte argumentação:

Uma vez que não é ele titular de carta de condução, a pena acessória “não tem qualquer sentido”, pois está proibido, por natureza, de conduzir veículos na via pública. Está proibido enquanto não for titular de carta de condução.

Não existe qualquer objectivo de prevenção especial, pois se não tem carta de condução, está proibido por lei de conduzir.

Não existe qualquer objectivo de prevenção geral, pois o que o tribunal pretende é que o arguido não pratique crimes da mesma natureza até que seja titular de carta de condução. A aplicação da pena acessória não é qualquer tipo de incentivo para que ele tire a carta de condução”.

Vejamos então.

Não é pacífica a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores a propósito da problemática da aplicação da pena acessória de proibição de conduzir quando é cometido crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, do Código Penal, por agente que se não encontra habilitado legalmente para o exercício da condução, embora corrente fortemente maioritária se oriente em sentido afirmativo.

No Acórdão da Relação do Porto de 14/04/20.., Proc. nº …, relatado pelo aqui juiz-adjunto, consultável em www.dgsi.pt, elucidam-se os argumentos a favor e contra a aplicação da pena acessória e dá-se conhecimento de jurisprudência e doutrina em conformidade.

Aí se pode ler:

Os argumentos aduzidos no sentido da condenação do infractor não habilitado que pratique crime de condução de veículo em estado de embriaguez são, no essencial, os seguintes:

- Seria “um contra-senso que o condutor não habilitado legalmente a conduzir, podendo vir a obter licença ou carta de condução logo pouco depois da sentença condenatória, não se visse inibido de conduzir, quando o já habilitado fica sujeito a tal sanção” - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19/09/95, CJ Ano XX, 1995, Tomo IV, pág. 147.

- Após a publicação da Lei n.º 77/2001, o Código da Estrada foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 265-A/2001, de 28-09, tendo este diploma mantido como um dos requisitos para a obtenção do título de condução a circunstância de o requerente não se encontrar a cumprir decisão que tenha imposto a proibição de conduzir [cf. art. 126.º n.º1, alínea d) do C.E.]. A manutenção deste requisito para a obtenção da carta de condução pressupõe que a proibição de conduzir possa [deva] ser aplicada a quem não for dela titular.

- No mesmo sentido aponta o facto de o conteúdo material da sanção em causa ser o da imposição de uma proibição de conduzir e não o da previsão de uma suspensão dos direitos conferidos pela titularidade da carta de condução.

- A aplicação da proibição de conduzir visa não só assegurar de uma forma reforçada a tutela dos bens jurídicos como também evitar que o agente de tal crime volte a praticar factos semelhantes.

- Acresce, ainda, o facto de o art.º 353.º do Código Penal criminalizar a violação de proibições impostas por sentença criminal a título de pena acessória ou de medida de segurança não privativa da liberdade.

Da violação dessa proibição pode resultar para o agente, ainda que não seja titular de carta de condução, a responsabilização pela prática, em concurso efectivo, de um crime do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03-01, e de um crime do referido art. 353.º, pois que este tipo legal visa tutelar a autoridade pública e não a segurança das comunicações.

- A não aplicação da pena acessória num caso como este traduzir-se-ia num privilégio injustificado para quem teve um comportamento globalmente mais grave do que a [simples] condução em estado de embriaguez (cf., entre outros, o acórdão da Relação de Lisboa de 12-09-2007, acima mencionado).

Na doutrina, Germano Marques da Silva (in Crimes Rodoviários, Pena Acessória e Medidas de Segurança, pág. 32 e nota 54) também entende que “a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pode ser aplicada a agente que não seja titular de licença para o exercício legal da condução; o condenado fica então proibido de conduzir veículo motorizado, ainda que entretanto obtenha licença” e acrescenta ainda que “diferentemente quando for aplicada a medida de segurança de cassação e o agente não seja titular de licença, caso em que ao agente não pode ser concedida licença durante o período de interdição”, dado que “a proibição de conduzir veículo motorizado não pressupõe habilitação legal”.

O art. 10.º do DL n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro, que veio alterar o Código da Estrada, prevê no seu art. 10.º que a Direcção-Geral de Viação deve assegurar a existência de registos nacionais de condutores, de infractores e de matrículas, organizados em sistema informático, nos termos fixados em diploma próprio, com o conteúdo previsto nos art. 144.º e 149.º do Código da Estrada no que se refere ao registo dos condutores.

Para dar cumprimento ao referido normativo foi publicado e já está em vigor o DL n.º 98/2006, de 6 de Junho, que regula o registo de infracções de não condutores (infractores não habilitados). Neste diploma, o legislador, no art. 4.º, enumera vários elementos que deverão constar no registo de infracções do não condutor (RIO) e um dos elementos é a pena acessória aplicada pelo tribunal relativa a crimes praticados no exercício da condução.

Também nos Acórdãos desta Relação de Lisboa de 12/05/2010, Proc. nº 138/10.6SFLSB.L1-3 e 13/09/2011, Proc. nº 204/10.8GATVD.L1-5, no referenciado sítio disponíveis, se acolhe este entendimento.

Ora, a referida argumentação expendida, que se mostra lógica, racional e solidamente estruturada, conduz-nos à conclusão de que tal solução é efectivamente a que se mostra mais concordante com as disposições legais aplicáveis e a vontade do legislador, sendo certo até que o requisito para a obtenção do título de condução de que o requerente “não esteja a cumprir proibição ou inibição de conduzir” enunciado no artigo 126,º nº 1, alínea d), do Código da Estrada, também na redacção do Decreto-Lei nº 265-A/2001, de 28/09, continuou com acolhimento na versão introduzida pela Lei nº 44/2005, de 23/02 e no artigo 18º, nº 1, alínea e), do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir (RHLC), aprovado pelo Decreto-Lei nº 138/2012, de 05/07 (“não se encontrar a cumprir sanção de proibição ou de inibição de conduzir ou medida de segurança de interdição de concessão de carta de condução”), mesmo na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 37/2014, de 14/03 (“não se encontrar a cumprir sanção acessória de proibição ou de inibição de conduzir ou medida de segurança de interdição de concessão de carta de condução determinada por autoridade judicial ou administrativa portuguesa”), aplicável por força do artigo 126º, do Código da Estrada.

Assim, acomodamo-nos também nesta orientação, pelo que é de aplicar no caso sub judice a pena acessória de proibição de conduzir, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, apesar de o arguido não ser titular de carta de condução.

Cumpre então determinar qual a medida concreta da pena acessória que se mostra adequada no caso em apreço, considerando o limite mínimo de três meses e o máximo de três anos.

Seguindo a lição de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências jurídicas do Crime, Aequitas, 1993, pág. 90, as penas acessórias desempenham uma função preventiva adjuvante da pena principal, com sentido e conteúdo não apenas de intimidação da generalidade, mas também de defesa contra a perigosidade individual.

Porque se trata de uma pena, ainda que acessória, deve o julgador, na sua graduação atender, também, ao estabelecido no artigo 71º, do Código Penal, tendo presente que a sua finalidade (ao contrário da pena principal que visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente) assenta na censura da perigosidade.

Há que considerar, pois, a culpa do agente (que estabelece o limite máximo inultrapassável de pena concreta que é possível aplicar) e as exigências de prevenção nos termos referidos.

Cumpre ainda atender a todas as circunstâncias que depõem a favor ou contra o agente.

Ora, provado ficou que o arguido conduzia na via pública, pelas 18:05 horas, um veículo automóvel ligeiro de passageiros, com uma taxa de alcoolemia de 1,31 g/l, ou seja, com uma taxa não muito acima do valor que confere significado criminal à conduta – 1,2 g/l - o que é relevante para a apreciação do grau de ilicitude desta, nos termos supra já referidos.

Ficou provado também que a sua actuação foi dolosa e não meramente negligente.

O perigo inerente à conduta do recorrente não ultrapassou o abstracto, já valorado no tipo legal.

Sofreu já condenações criminais, sendo uma pela prática de crime de roubo, três por crime de condução de veículo sem habilitação legal e ainda uma outra – em Junho de 2011 - por crime de condução de veículo em estado de embriaguez, o que milita em seu desfavor.

Tem situação familiar estável e encontra-se desempregado, realizando alguns trabalhos esporádicos.

Assumiu a prática dos factos imputados, confessando-os integralmente e sem reservas.

Mas, no que tange à assunção dos factos, assume esta escassa relevância, considerando a evidência das provas contra o recorrente, mormente que foi interceptado pela autoridade policial no exercício da condução e o teste realizado não deixa dúvidas quanto à ingestão de bebidas alcoólicas.

As exigências de prevenção da perigosidade individual que se colocam no caso situam-se em nível elevado, considerando, conjugadamente, o grau de alcoolemia de que era portador e os seus antecedentes criminais significativos, concretamente no que concerne aos relativos a circulação rodoviária, sendo que foi até já condenado em pena acessória de proibição de conduzir por quatro meses, que não surtiu efeito algum, como é patente.

No que concerne às de intimidação geral, são elevadas, ponderando o elevado índice de acidentes de viação em que são intervenientes condutores influenciados pelo álcool.

Assim, considerando a moldura aplicável de 3 meses a 3 anos, a graduação da pena acessória em cinco meses, como pretende o recorrente (perto do limite mínimo) mostra-se adequada e proporcional.

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 2/2013 (in DR, Série I, de 08/01/2013), fixou jurisprudência no sentido de que “em caso de condenação, pelo crime de condução em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, do art. 292.º do CP, e aplicação da sanção acessória de proibição de conduzir prevista no art. 69.º, n.º 1, al. a), do CP, a obrigação de entrega do título de condução derivada na lei (art. 69.º, n.º 3, do CP, e art. 500.º, n.º 2, do CPP), deverá ser reforçada, na sentença, com a ordem do juiz para entrega do título, no prazo previsto, sob a cominação de, não o fazendo, o condenado cometer o crime de desobediência do art. 348.º, n.º 1, al. b), do CP.”

Visto que a pena acessória é aplicada por este Tribunal da Relação, importa determinar também aqui a cominação prescrita.

Cumpre, assim, julgar o recurso procedente.

III - DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam os Juízes … desta Relação em julgar procedente o recurso interposto pelo Ministério Público e, consequentemente, condenar o arguido A, pela prática do crime de condução em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292º, nº 1, e 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer tipo, que se gradua em 5 (cinco) meses, devendo o mesmo entregar o título de condução de veículos com motor de que eventualmente seja titular, no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado deste acórdão, sob a cominação de, não o fazendo, cometer o crime de desobediência previsto no artigo 348º, nº 1, alínea b), do Código Penal, mantendo-se em tudo o mais a sentença recorrida.

            Sem tributação.

            O arguido/condenado será notificado pessoalmente do teor deste acórdão.

Na 1ª instância se fará, oportunamente, a comunicação mencionada no artigo 69º, nº 4, do Código Penal.

            Lisboa, 14 de Outubro de 2014.

(Consigna-se que o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94º, nº 2, do CPP)

(Artur Vargues)

(Jorge Gonçalves)