ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA EXCLUSIVA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
MONTANTE DA INDEMNIZAÇÃO
CRITERIOS
Sumário

1. Da factualidade apurada extrai-se que o condutor do veículo CR, depois de ter parado no Stop, verificando que nenhum veículo se aproximava, empreendeu a travessia do cruzamento, quando foi inopinadamente embatido pelo veículo XL e que tal se deveu ao facto de o condutor do veículo XL circular a uma velocidade superior a 90 Km/hora, quando o limite ali era de 30 km/hora, em condições de visibilidade que impunha as maiores cautelas.
2. Em tais circunstâncias, não era exigível que o condutor do veículo CR ficasse indefinidamente parado no Stop para a eventualidade de surgir algum veículo na via que pretendia atravessar, muito menos que devesse contar com o aparecimento de veículos a velocidade muito superior à estabelecido para o local.
3. No domínio dos danos não patrimoniais, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemniza­ção não pode ter por escopo a sua reparação eco­nómica, mas sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; por outro lado, punir a conduta do agente.
4. Nessa perspectiva, tal indemnização não deverá confinar-se a uma dimensão puramente simbólica, mas assumir uma expressão significativa com relevo no quadro de vida do lesado e com re­percussão sancionatória para o lesante, importando ainda considerar o alargamento dos limites de cobertura do seguro obrigatório a que se tem assistido.
5. Todavia, no critério a adoptar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o nº 3 do artigo 8º do CC, por forma a evitar exacerbações subjectivas.
6. No caso vertente, o tipo de lesões sofridas e os múltiplos tratamentos a que o lesado foi sujeito, a penosidade suportada, durante 3 anos, sem que pudesse perspectivar uma recuperação física e anímica condigna, com a idade de 25 anos, vendo gorados todos os seus projectos de vida pessoal e profissional, constituem, à luz das regras da experiência comum, um quadro indiciário de um intenso sofrimento físico e moral, não se divisando que a sua morte prematura possam relevar como atenuante de um tal sofrimento.
7. Embora se possa equacionar que, se o lesado tivesse sobrevivido mais alguns anos, tal sofrimento se prolongaria no tempo, o certo é que a maior intensidade desse sofrimento verifica-se particularmente nos primeiros anos em que o lesado tinha bem vivas as memórias do tempo em que gozava de uma vida sadia e acalentava os seus projectos de vida na pujança da idade.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I – Relatório
1. RC (A.), solteiro, representado pelo seu curador provisório, JC, veio intentar acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, em 15/10/ 2010, junto do Tribunal Judicial de ..., contra as Companhias de Seguro AP, S.A. (1.ª R.), e CST, S.A. (2.ª R.), alegando, em resumo, que: 
. No dia 24/10/2007, pelas 21h45, ocorreu um acidente de viação, no cruzamento formado pela intersecção entre a Rua … e a Av. Eng. …, em …, O…, no qual intervieram os veículos ligeiros de marca Audi, com a matrícula …, pertencente a FS, conduzido por HM, e o de marca Opel Corsa, com a matrícula …, pertencente a MC, conduzido por AC, em que o A. seguia como passageiro, cuja responsabilidade civil de circulação perante terceiros se encontrava transferida, respectivamente, para 1.ª R. e a 2.ª R.;  
. O acidente ocorreu quando o veículo CR, provindo da Rua …, depois de parar num sinal STOP ali existente, avançou para o ponto onde tinha visibilidade, tendo então sido embatido, na sua lateral esquerda, pelo veículo XL, que circulava no sentido descendente da Avenida … no sentido do …;
. No momento do embate, a visibilidade de quem circulava na Rua … para atravessar a Avenida Eng. … estava condicionada pela existência de veículos estacionados de ambos os lados da Avenida, antes do referido cruzamento;
. A colisão deveu-se a culpa exclusiva do condutor do veículo XL, que circulava então a uma velocidade triplamente superior à permitida para o local (30 km/hora); 
. Em consequência desse embate o A. ficou encarcerado dentro do veículo CR, inconsciente e a sangrar da cabeça, tendo sido transportado para o Hospital S…, onde recebeu os primeiros socorros, sendo, sucessivamente, transferido para outras unidades hospitalares onde foi submetido a diversas intervenções cirúrgicas e tratamentos;
. Trinta e seis meses depois, com decorrência das lesões sofridas, o A. apresentava deficits graves, tais como: tetraparésia espástica, deficit de articulação, discurso por vezes hipofónico, ocasionalmente ininteligível, alterações de controlo postural nomeadamente do tronco e da cabeça, oftalmoplegia com diminuição acentuada da visão do olho esquerdo, dependência total para todas as actividades quotidianas, fadiga mental indutora de defeitos de atenção, diminuição da capacidade de iniciativa e incapacidade absoluta para o trabalho, tendo necessidade de cuidados médicos e paramédicos, de apoios técnicos específicos e de acompanhamento em terapia da fala e terapia ocupacional.
. O A. suportou a quantia de € 4.678,86, com os custos do seu internamento no LN e a quantia de € 13,20 paga no Centro de Saúde de O…, relativa à consulta mensal para efeitos de baixa médica;
. Suportou também a quantia de € 84.29 paga ao Hospital M relativa aos serviços de lavandaria, no período em que aí esteve internado, entre 1 e 18 de Fevereiro de 2010, e a quantia de € 76,00 relativa ao transporte de ambulância entre o Hospital M e o LN;
. Findo o internamento de seis meses no Hospital M, o A. teria de ser integrado numa unidade de saúde onde lhe fossem prestados os cuidados de que necessita, nomeadamente de acompanhamento diário das suas actividades básicas, fisioterapêuticas e cuidados médicos;
. A situação clínica do A. implica o uso de fraldas para o resto da vida, uma vez que não controla esfíncteres, prevendo para tanto o custo global até ao 75 anos, de € 24.482,64;
. O A. sofre ainda de epilepsia, o que impõe que lhe sejam ministrados medicamentos diariamente, cujo custo mensal ascende aos € 100,00 por mês, e necessita de "ajustes periódicos da dosagem do baclofen", com custos mensais ainda não determináveis;
. Segundo recomendações médicas, o A. terá de passar alguns períodos de tempo em casa, nomeadamente, aos fins-de-semana e épocas festivas, sendo que a casa dos pais não dispõe das condições para o efeito, necessitando de obras e adaptações, as quais terão um custo de € 13.235,00+IVA;
. Nas suas estadias em casa, necessita de equipamento que satisfaça o nível das suas necessidades humanas básicas com segurança, eficácia e conforto, de custo ainda desconhecido, sendo também fundamental a aquisição de uma cadeira de rodas que se ajuste às suas necessidades, a qual importará em € 8.264,40;
. O A., nascido em 01/06/1982, à data do acidente, exercia funções no agrupamento de Escolas PA …, Escola Básica Integrada …, auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 650,00, acrescido de um subsídio de refeição diária de € 4,03, e ainda prestava funções, em regime de prestação de serviço, na ISDL, Ld.ª, mediante a quantia mensal de € 250,00;
. Porém, em consequências das lesões sofridas em virtude do acidente, ficou totalmente incapacitado para o trabalho, devendo ser indemnizado pela perda de ganho, em quantia não inferior a € 330.400,66;
. Até à data do acidente, o A., então com 25 anos de idade, era uma pessoa saudável, robusta, nunca tendo tido problemas de saúde, fazendo a sua vida diária sem qualquer problema e praticando regulamente desporto; tinha espírito de iniciativa, era extrovertido, alegre e dinâmico, prevendo-se para ele um futuro promissor, quer a nível pessoal quer profissional; tinha namorada e perspectivava casar e ter filhos.
. Com o acidente, o A. foi submetido a múltiplos tratamentos, passando nos últimos 36 meses por um processo de reabilitação muito doloroso e prolongado, com toda a incomodidade que resulta do facto de estar imobilizado, bem como do facto de estar fortemente limitado na capacidade de comunicar a terceiros o que sente, devendo ser compensado por isso em valor não inferior a € 35.000,00;
. Embora a responsabilidade civil pelo acidente seja imputável exclusivamente a culpa do condutor do veículo XL, caso não seja demonstrada tal responsabilidade, devem ser solidariamente responsabilizadas ambas as Seguradoras demandadas, seja a título de repartição de culpas, seja de repartição do risco.
Concluiu o A. pedindo:
A - Em primeira linha, a condenação da 1.ª R., Companhia AP a pagar-lhe os seguintes montantes, acrescidos dos respectivos juros legais a contar da data da citação:
a) – Uma quantia não inferior a € 330.400,66, a título de indemnização por danos futuros;
b) - A quantia de € 4.678,86, pelos custos do internamento já despendidos desde a data do acidente até à presente data;
c) - A quantia de € 13.20, paga ao Centro de Saúde de O… relativa à consulta mensal para manutenção de baixa médica;
d) - A quantia de € 84.29, paga ao Hospital M relativa aos serviços de lavandaria no período em que o A. esteve internado, entre 1 e 18 de Fevereiro de 2010;
e) - A quantia de € 76,00, relativa ao transporte de ambulância entre o Hospital M e a Instituição de Cuidados Continuados L N;
f) - A quantia de € 24.482,64 correspondente ao gasto previsível com fraldas desde a data de propositura da acção até aos 75 anos de idade;
g) - A quantia de € 8.264,40 para pagamento da cadeira de rodas, orçamentada neste;
h) – Uma quantia não inferior € 350.000,00, a título de danos não patrimoniais;
i) – O que vier a liquidar-se para efeitos de execução de sentença para as seguintes despesas futuras do A. com:
- internamento numa instituição que lhe preste a assistência necessária à sua vivência em condições mínimas de dignidade, incluindo terapia da fala, fisioterapia e terapia ocupacional, a determinar após relatórios médicos subsequentes ao seu internamento no Hospital M, internamento que se prevê até aos 75 anos de idade de acordo com actual esperança média de vida para os homens;
- medicamentos para a epilepsia que se prevê até aos 75 anos de idade de acordo com actual esperança média de vida para os homens;
- a realização de obras em casa dos pais do A. e que, à data, foi estimada em € 13.235,00+IVA;
- o equipamento técnico necessário para receber o A. em casa, elencado no doc. 82;
   B – Subsidiariamente, a condenação solidária de ambas as R.R. Seguradoras nas indemnizações indicadas.
2. A 1.ª R. apresentou contestação, impugnou os factos atinentes à dinâmica do acidente e aos danos, alegando, em resumo, que:
. O cruzamento tem pouca visibilidade, atento o facto de se situar entre muros, sendo precedido de rectas para ambos os lados;
. No momento do acidente, o veículo XL circulava com as luzes do respectivo veículo acesas;
. O condutor do veículo CR surgiu inesperadamente no cruzamento, no momento em que o condutor do veículo XL se propunha a transpor o referido cruzamento, precedendo da Av. ...;
. O condutor do veículo CR não parou no sinal de Stop que se encontrava na referida via por onde o mesmo circulava, invadindo deste modo a faixa de rodagem onde circulava o veículo seguro, cortando a linha de marcha ao condutor do veículo seguro;
. Atenta a conduta inesperada do condutor do veículo CR, bem como á curta distância que mediava os dois veículos, não foi possível ao condutor do veículo XL evitar o embate frontal da sua viatura em pleno cruzamento;
. O embate dos veículos ocorreu com a parte frontal do veículo XL e a parte lateral esquerda do veículo CR;
. O A. circulava sem cinto de segurança, sendo este facto decisivo para o agravamento das lesões que teve. A;
. A conduta do condutor do veículo CR foi a causa exclusiva do acidente, o que faz ceder qualquer presunção legal de culpa;  
. O valor da indemnização terá de ser reduzida em função da proporção da responsabilidade do agravamento das lesões, sendo que o montante peticionado a título de danos não patrimoniais se mostra exagerado, tendo em atenção a jurisprudência dos Tribunais superiores, bem como os parâmetros estabelecidos na portaria 291/2007;
. No que respeita aos danos patrimoniais futuros, os mesmos também não tem suporte documental, que consubstanciem o montante peticionado.
. Para efeitos de indemnização por perda de ganho, apenas são considerados os rendimentos líquidos, bem como fiscalmente comprovados, de acordo com a Portaria 377/2008 de 26 de Maio e o Dec.-Lei 153/2008, de 06-08.
Conclui pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
3. A 2.ª R. também contestou, alegando, em síntese, que:
. A existência de veículos estacionados na Avenida … impedia ou dificultava a visibilidade dos veículos que circulassem quer na citada Avenida, como era o caso do XL, quer em relação a cada uma das vias que entroncava com aquela artéria, entre as quais a Rua …, em que circulava o veículo CR;
. O veículo CR procedia da Rua ... para seguir em frente, após o cruzamento com a Avenida … e, quando já se encontrava a meio do cruzamento, e sem nada que o fizesse prever, surgiu o veículo XL a circular a uma velocidade muito superior a 90 km/hora;
. O condutor do veículo XL vinha completamente distraído, pelo que não se apercebeu da manobra realizada pelo veículo CR, enquanto o condutor deste não podia prever o surgimento súbito daquele, não tendo tido qualquer hipótese de evitar o embate;
. Caso o veículo XL circulasse dentro dos limites de velocidade permitidos no local (30 km/hora), o veículo CR teria tempo de completar a manobra de atravessamento do cruzamento já iniciada, em condições de segurança;
. A velocidade manifestamente excessiva do veículo XL e a condução temerária e distraída do seu condutor foram as causas determinantes para a ocorrência do acidente;
. Caso se conclua ter existido responsabilidade do condutor do veículo CR a provar-se a não colocação do cinto de segurança por parte do A., tal facto agravou de forma considerável os danos invocados na petição inicial;
. Quanto à perda da capacidade de ganho os valores apresentados pelo A. são manifestamente exagerados, devendo os respectivos cálculos reportar-se à idade de 65 anos;
. A provar-se a incapacidade permanente reclamada pelo A., o mesmo terá direito ao subsídio por elevada incapacidade, a ser pago pela Segurança Social, bem como a outras prestações sociais legalmente previstas;
. Não são cumuláveis na esfera patrimonial do lesado a indemnização por perda de capacidade de ganho e o recebimento da pensão de invalidez que lhe foi atribuída pela segurança social com base no mesmo facto determinante da incapacidade;
. As verbas reclamadas pelo A. a título de danos não patrimoniais são manifestamente exageradas;
. À indemnização a calcular a final devem ainda ser abatidos os valores pagos pela aqui R. no âmbito do acordo alcançado em sede de providência cautelar.
Conclui pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
4. O Instituto de Segurança Social I.P. deduziu pedido de reembolso das prestações pagas a RC, contra Companhia de Seguros AP, S.A e CST, S.A., alegando, em síntese, que:
. No que respeita às circunstâncias em que ocorreu o acidente em causa, dá como reproduzidos todos os factos alegados pelo A.;  
. Em consequência do mesmo pagou ao seu beneficiário, no período de compreendido de 25/10/2007 a 11/11/2010 o montante de € 16.438,99, referente a subsídio por doença e prestações compensatórias de subsídio de Natal e Férias, referentes ao ano de 2009, no valor de € 780,08;
Concluiu pedindo a condenação de qualquer das R.R. ou solidariamente de ambas, consoante a repartição de culpas ou de risco que se apure, a pagar-lhe a quantia de € 17.219,07, acrescida de juros de mora legais, contados desde a notificação até integral pagamento.
5. A R. CST contestou o pedido deduzido pelo I.S.S., remetendo, quanto à dinâmica do acidente, para a contestação apresentada ao pedido do A.
Conclui pela sua absolvição do pedido reembolso.
6. A R. AP também contestou o pedido de reembolso do ISS, alegando que desconhece os valores liquidados e se estes resultam do acidente dos autos, pelo que os impugna, concluindo pela improcedência desse pedido.
7. Foi determinada a apensação a estes autos do processo, sob a forma ordinária, n° … do 5° Juízo Cível, em que o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE, demandou as ora R.R., ale-gando, em síntese, que:
. Em virtude do acidente aqui em causa foram assistidos nos serviços do ali demandante o lesado RC, que recebeu tratamentos até ao dia 02/06/2009, no valor global de € 110. 082,51, bem como e MG e AC, no valor de € 143,50, cada um.
. As R.R. são responsáveis pelo pagamento dessas quantias, nos termos do disposto no DL n.º 218/99, de 15/06, no tocante a RC e AC;
. Porém, sendo a lesada MG, passageira transportada no CR, face ao valor em causa, a R. CST é inteiramente responsável pelo custo do seu tratamento, nos termos do art.° 9.° do citado diploma legal.
Conclui pedindo:
- a condenação da R. CST no pagamento da quantia de € 167,20, a título de despesa de tratamento e juros de mora vencidos, bem como os vincendos, à taxa legal até efectivo pagamento, relativa à assistência prestada a MG;
- a condenação de ambas as R.R. no pagamento da quantia de € 114.635,05, a título de despesas e juros vencidos, bem como os vincendos à taxa legal até.efectivo pagamento, relativo à assistência prestada a RC e AC.
8. A R. AP contestou o pedido deduzido pelo Centro Hospitalar Lisboa Ocidental EPE de forma idêntica à contestação deduzida nos presentes autos, impugnando a matéria da assistência prestada pelo aqui A., concluindo pela improcedência desse pedido.
9. Também a R. CST contestou o pedido formulado pelo Centro Hospitalar Lisboa Ocidental EPE de forma idêntica à contestação deduzida nos presentes autos, impugnando a matéria da assistência prestada pelo aqui A. e concluindo pela improcedência desse pedido.
10. Entretanto, face ao óbito do A., ocorrido em 16/05/2012, foi deduzido incidente de habilitação de herdeiros, tendo a final sido julgados habilitados MC e JC para na qualidade de sucessores do A. RC, com eles prosseguirem os ulteriores termos da causa.
11. Findo os articulados, foi dispensada a audiência preliminar e proferido despacho saneador tabelar, seguindo-se a selecção da matéria de facto tida por relevante, com organização da base instrutória, conforme fls. 334 a 345 do Vol. 2.º).
12. Procedeu-se à realização da audiência final, no decurso da qual os habilitados A.A. desistiram de parte dos pedidos e procederam à redução do pedido a título de danos futuros, concluindo pela condenação das R.R. a pagar a quantia que viesse a resultar da dedução ao montante de € 59.859,00 das quantias pagas pelo Instituto de Segurança Social, a título de subsídio de doença, requerendo ainda a ampliação do pedido, no tocante à verba de € 12.787,30 relativa a despesas com internamento no Hospital M.
Nessas circunstâncias, foi homologada a desistência dos pedidos das seguintes quantias: € 24.482,64 (relativa a fraldas); € 8.264,40 (cadeira de rodas), internamento numa instituição; medicamentos para epilepsia; obras a realizar em casa dos pais e aquisição de equipamento técnico. E foi, ainda, admitida a redução do pedido nos termos requeridos, bem como a ampliação do pedido, restrita à verba de € 12.787,30 relativa ao internamento no Hospital M. Em resultado da desistência dos pedidos foi determinada a eliminação dos quesitos 43 a 46, 48 a 52.
13. Por fim foi proferida a sentença de fls., datada de 25/03/2014, na qual foi integrada a decisão de facto com a respectiva motivação, a julgar a acção parcialmente procedente, decidindo-se, por consequência:
A – Condenar a R. AP a pagar:
a) - Aos sucessores habilitados do primitivo A., a quantia global de € 353.885,58, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, a partir da citação sobre a quantia de € 41.098,28, a partir da notificação da ampliação do pedido relativamente à verba de € 12.787,30 e a partir da presente decisão relativamente à quantia de € 300.000,00 esta última devida a título de danos não patrimoniais;
b) – ao Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental EPE a quantia global de € 110.226,01, a título de despesas decorrentes de cuidados de saúde prestados a AC e RC; acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4% desde a data de vencimento de cada uma das facturas de fls. 14, 16 a 23 do processo apenso e sobre o respectivo montante;
c) - ao Instituto de Segurança Social, IP a quantia global de € 17.219,07, a título de reembolso das prestações efectuadas a RC (subsídio de doença e compensação de subsidio de férias e de Natal), acrescida de juros à taxa anual de 4% desde a notificação para contestar;
B – Absolver a R. CST de todos os pedidos.
Ficou também consignado que, uma vez que o primitivo A. RC não formulou pedido na acção principal que abrangesse o objecto da transacção efectuada no âmbito do procedimento cautelar, as verbas pagas pelas R.R. em cumprimento da decisão proferida no apenso não seria considerada, no sentido do abatimento ou compensação.
14. Inconformada com tal decisão, a R. AP apelou dela, formulando as seguintes conclusões:
   1.ª - A sentença de recorrida não teve em conta, na fixação do nexo de causalidade adequado, a conduta do condutor da viatura CR;
   2.ª - O condutor da viatura CR desrespeitou o sinal de STOP existente na via em que circulava;
   3.ª - Embora tivesse parado, conforme resulta da matéria de facto, "reiniciou a sua marcha e quando já se encontrava sensivelmente a meio do cruzamento deu-se o embate”, embate na lateral esquerda do veículo CR, que vinha do STOP, e frente do veículo XL que circulava na via prioritária, principal;
   4.ª – Não houve qualquer rasto de travagem, sendo que a via principal tinha visibilidade no sentido ascendente de, pelo menos, 40 metros, ambos os veículos circulavam com as luzes acesas e o condutor do veículo CR não tinha visibilidade suficiente do trânsito que circulava na Av. …, condicionada pela existência de veículos estacionados de ambos os lados da Avenida, antes do cruzamento; 
   5.ª - A sentença não aplicou correctamente, os pressupostos da responsabilidade civil, não aplicando correctamente o disposto nos artigos 24.º, n.º 1, 35.º, n.º 1, al a) e f), e 28.º, n.° 1, al b), do CE, violando ainda o disposto nos artigos 496.º, 562.º, 563.º e 566.º do CC;
   6.ª - A sentença fundamentou de forma errada a decisão, ao fazer apelo as normas constantes do artigo 483.º e seguintes do CC, mas não atender, devidamente, às causas do acidente – desrespeito pelo sinal STOP e velocidade excessiva;
   7.ª - Existe manifesta contradição entre a matéria assente e a decisão proferida, pelo que a mesma, deve ter como consequência, o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), e n.° 4, do CPC
   8.ª - Tendo em conta a matéria de facto     dada como provada, na decisão deveriam:
   - Ser ambas as R.R. condenadas no pagamento do valor da condenação, numa percentagem, equivalente a 50% desse valor;
   - O valor da condenação ser inferior, por serem manifestamente exageradas as verbas fixadas de € 300.000,00 pelos danos não patrimoniais;
9.ª - Face aos factos provados, contribuiu, para o nexo de causalidade adequada na ocorrência do acidente, as seguintes condutas: do condutor da viatura segura na ora Apelante - excesso de velocidade; do condutor da viatura segura na Demandada - desrespeito adequado da sinalização de STOP;
10.ª - A sinalização de STOP é imperativa e, a sua eficácia não está só no facto de "parar", vai muito além desse comportamento: o STOP exige, paragem e todo o tipo de comportamento necessário, para que o atravessamento da via se consiga sem qualquer perigo para o próprio e para com quem pretende cruzar.
11.ª - O condutor que circule da via do STOP perde toda a prioridade;
12.ª - A sua conduta deve pautar-se por reduzir a velocidade, parar, verificar prudentemente se a sua movimentação não se arrisca a colisões e pare isso tem de atender a todos os sinais dos veículos que provenham da via prioritária, ainda que conduzam o veículo com excesso de velocidade ou em contravenção com qualquer regra estradal.
   13.ª - Se existem condicionantes que limitem a conduta do automobilista que provém de uma via com STOP, mas exigível será o seu comportamento, mais cuidado deverá ter, porque, a zona de influência do SINAL DE STOP ainda não foi ultrapassada.
   14.ª - Não houve qualquer rasto de travagem, sendo que a via principal tinha visibilidade no sentido ascendente, de pelo menos 40 metros, ambos os veículos circulavam com as luzes acesas e o condutor do veículo CR não tinha visibilidade suficiente do trânsito que circulava na Av. …, condicionada pela existência de veículos estacionados de ambos os lados da Avenida, antes do cruzamento.
   15.ª - Esta zona de influência preventiva, inicia-se antes do STOP e continua para além dele, até o momento em que, o veículo não prioritário transpõe o cruzamento de vias em segurança para si e para os outros automobilistas.
   16.ª - O embate dos veículos ocorreu entre a parte frontal do veículo XL (seguro na ora Apelante) e a lateral esquerda do CR (seguro na 2.ª R.), ou seja, o embate no veículo CR deu-se na sua lateral esquerda;
   17.ª - O embate ocorre, em pleno cruzamento de vias, como refere a sentença: "no meio do cruzamento deu-se o embate”;
   18.ª – O embate terá sido imprevisível, repentino, inopinado e momentâneo.
   19.ª - O condutor do veículo que desrespeitou a sinalização STOP terá invadido a faixa de rodagem da Av. Eng.° …, no exacto momento em que aquele veículo aí circulava, uma vez que, nem rasto de travagem existiu;
20.ª - O sinal de STOP indica não só que c condutor é obrigado a parar antes de entrar no cruzamento, junto do qual está colocado, mas também o dever de dar passagem aos veículos que transitam na via em que vai entrar, independentemente da existência ou não de condicionantes que dificultem a sua tarefa.
   21.ª - Tendo o condutor da viatura CR avançado para além do STOP, teve uma conduta gravemente perigosa com desrespeito do sinal de STOP e, em conformidade, procedeu descuidadamente e com negligência,
22.ª - Naquele local e aquela hora, havendo veículos estacionados que dificultavam a visibilidade o condutor da viatura CR agiu com culpa por inobservância da sinalização de STOP
   23.ª - Em virtude do sinal de STOP, cumpriria ao condutor do veículo CR parar, como aguardar que o veiculo XL prosseguisse a sua marcha, ainda que com uma velocidade desadequada para o local.
   24.ª - Era de noite, o local apresentava alguma visibilidade, haviam carros estacionados, por isso, aguardar o momento certo para cruzar a via, era a conduta exigível.
   25.ª - Se o veículo XL circulava na via principal com uma amplitude visual de 40 metros, facilmente seria apreensível, até pelas luzes acesas que naquele momento circulariam veículos na Avenida prioritária.
26.ª - O sinal STOP, sendo de prescrição absoluta e de proibição, impõe a obrigação de interromper a marcha e retomá-la em segurança.
27.ª - O tempo de paragem é indiferente por si só, pode ser maior ou menor, pode ser um pouco a frente ou um pouco atrás, uma certeza contudo é possível, haver embate se o momento de retomar a marcha for inadequado.
28.ª - Se o cruzamento tinha visibilidade reduzida para o condutor do veículo CR e se existia um sinal de STOP na sua via, exigir-se-ia da parte do seu condutor, maior atenção, maior prudência, porque o perigo seria iminente.
29.ª - A cautela seria reforçada, não só para o tráfego que, violando ou não regras estradais, circulava na Avenida principal, como para o próprio condutor e ocupantes da sua viatura.
30.ª - Parou, apenas significa que esse condutor terá visto e apreendido, em parte, o que significa o sinal de STOP, sendo certo que tal paragem é irrelevante visto que o sinal de STOP obrigaria, também, a ceder a passagem ao condutor do veiculo seguro na ora Apelante, veiculo esse que, embora em excesso de velocidade, tinham, absoluta prioridade de passagem.
31.ª - A sinalização especial de STOP faz pressupor, inequivocamente, a necessidade um comportamento complexo de quem está obrigado a parar e a retomar a sua marcha.
32.ª - Esse comportamento, justifica-se, em face de todas as circunstâncias e, por mais cuidado que se tenha, se o embate é em pleno cruzamento, na via de trânsito por onde circula o veículo que detém a prioridade e o embate se dá entre a frente deste veiculo e a lateral esquerda daquele, não restam dúvidas que, no mínimo, o condutor que circula da via com STOP terá de ter culpa na produção do acidente.
33.ª - A sentença recorrida teve, a este respeito, uma visão meramente circunstancial do contexto das dores e sofrimentos da vítima, sem fundamentar a sua conclusão, pelo valor em causa.
34.ª - No mínimo exigir-se-ia uma fundamentação de direito e incidisse a decisão no âmbito da aplicação do princípio da equidade, isto é, ponderasse devidamente o caso concreto. Torna-se necessário retirar do contexto da sentença, os alicerces que justifiquem, o valor atribuído a título de dano não patrimonial.
35.ª - As dores e o sofrimento do lesado, entretanto falecido, foram, na verdade graves. Mas, infelizmente ele não sofreu durante uma vida longa: esta verdade (a morte prematura) conduz-nos friamente a ter como referencia "o tempo de sofrimento".
36.ª - No plano meramente quantitativo, é diferente fixar "danos não patrimoniais" a alguém que sofreu e continuará a sofrer, um conjunto de dores, angustias e limitações durante uma vida (a sua vida), do que alguém que, falecendo prematuramente, deixou de sofrer.
37.ª - O valor do dano não patrimonial deve ter em conta o tempo de vida entre o acidente e a morte prematura do infeliz jovem e este acontecimento, tem de ser tido em conta na fixação de um valor justo, em atenção ao juízo de equidade.
38.ª - É justo o valor de € 150.000.00, a título de danos não patrimoniais, repartido por ambas as demandadas em conformidade com a divisão de responsabilidade já referida.
39.ª - Deste modo, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que tenha em conta o exposto.
17. A O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, IP, apresentou contra-alegações a pugnar pela confirmação do julgado, rematando com o seguinte quadro conclusivo:
1.ª - No que ao ora recorrido diz respeito, para efeitos do presente recurso, apenas lhe cabe contraditar a pretendida divisão igualitária de responsabilidade pelo surgimento do sinistro automóvel em apreço e suas consequências.
2.ª - Pois, a apelante, para além de não ter posto em causa a decisão em apreço relativamente aos danos patrimoniais, limita-se a afrontar a parte da decisão que se refere aos danos não patrimoniais, sendo este pressuposto totalmente estranho ao ora recorrido.
3.ª - Por mera cautela de patrocínio e em abono da verdade e da justiça, o recorrido defende que a decisão objecto do presente recurso não merece ser revogada, uma vez que, em face da matéria assente, revela-se, à luz da lei, totalmente acertada.
4.ª - O Tribunal recorrido andou bem ao decidir-se pela responsabilidade exclusiva do condutor do XL na produção do acidente de viação em apreço e suas consequências.
5.ª - Dado que a matéria factual constante nos artigos 5° a 10°, 15°, 16°, 18°, 19°, 27° e 79° da fundamentação de facto, demonstra inequivocamente que o condutor do CR respeitou integralmente a mais elementar legislação rodoviária, inclusivamente o determinado pelo sinal de STOP aqui em apreço.
6.ª - Ficando, igualmente, demonstrado que teve uma actuação estradai verdadeiramente diligente e acertada, designadamente, em face das circunstâncias que caracterizavam o local do acidente.
7.ª - Não se podendo, por isso, dizer, em bom rigor, que o seu comportamento contribuiu de algum modo para a produção do sinistro e suas consequências.
8.ª - Todavia, o mesmo já não se poderá dizer a respeito do condutor do XL, isto é, do condutor do veículo segurado na recorrente.
9.ª - Dado que a matéria assente dos artigos 20°, 23° a 26°, 28° a 32°, 77° 78° e 80° da fundamentação de facto, revelam que foi exclusivamente responsável pelo mesmo.
10.ª - Correspondendo, por isso, a sua actuação estradai a uma notória violação do disposto artigos 24° n° 1, 25° n° 1 alíneas a) e f), e 28° n° 1 alínea b) e n° 2 do Código da Estrada.
11.ª - Nesta conformidade, defende-se que os requisitos da responsabilidade civil se encontram total e exclusivamente preenchidos em desfavor da ora apelante.
12.ª - Deste modo, se pugna pela manutenção integral da decisão aqui em apreço, sendo certo que, se por ventura, o entendimento da recorrente for acolhido, parcial ou totalmente, o pagamento integral do crédito do recorrido e demais acréscimos não está em perigo, visto que, a final, corresponderá tão-somente a uma modificação ao nível do seu concreto devedor, devendo, por isso e se for caso disso, as RR. serem condenadas na medida da responsabilidade dos seus segurados pelo sucedido.
18. A R. CST, S.A., apresentou contra-alegações, em que conclui nos seguintes moldes:
1.ª - Nas suas alegações, a Recorrente AP, não concordando com a douta decisão recorrida e com os seus fundamentos, entende que 1) tendo em conta a matéria de facto provada, devem ser ambas as Rés condenadas no pagamento do valor de condenação, na proporção de 50% para cada uma das Rés, por entender existir responsabilidade de ambos os condutores dos veículos intervenientes para a ocorrência do acidente; e que II) O valor de condenação a título de danos não patrimoniais, de 300.000 Euros, é manifestamente exagerado.
2.ª - Entende a Recorrida CST, S.A., quanto ao ponto 1) supra, não assistir qualquer razão à Recorrente, devendo confirmar-se a sentença recorrida, quer quanto aos seus fundamentos, quer quanto à sua decisão material.
3.ª - A sentença proferida apresenta-se acertada, não merecendo qualquer reparo, no que respeita à definição da responsabilidade no acidente, considerando que foi em exclusivo a manobra incauta do condutor do veículo seguro na Ré AP que provocou o acidente .
4.ª - Nos termos do disposto no art.° 684.° n.° 3 e 690.° n.° 1 e 3 do CPC, o objecto do recurso interposto pela parte é delimitado pelas suas alegações, não sendo ao Tribunal de recurso permitido o conhecimento de outras matérias a não se que a tal imponha a regra do conhecimento oficioso.
5.ª - No caso dos autos, a Recorrente AP não impugnou, nem de alguma forma pôs em causa, nas suas alegações, a decisão da Mma. Juiz "a quo" acerca das matéria de facto provada e não provada.
6.ª - Isto é, a Recorrente AP aceitou como boa a decisão do Tribunal "a quo" acerca da matéria de facto, não a impugnando.
7.ª - Não estamos, assim, portanto, no campo da análise sobre a decisão que o Tribunal fez acerca da matéria de facto considerada e não provada, mas sobretudo na ponderação que a Mma. Juiz "a quo" fez dessa matéria.
8.ª - Perante a factualidade considerada provada e não provada pelo Tribunal, alcançam-se sempre, duas conclusões: a) a de que o condutor do Opel Corsa "CR" cumpriu, na íntegra, todos os deveres e regras sobre segurança na condução estradai, não podendo agir de outro modo; e b) a de que, por outro lado, a conduta do condutor do veículo Audi XL" foi temerária, desantenta e incauta, sendo a única que contribuiu para a ocorrência do acidente.
9.ª - O condutor do veículo "CR" não teve qualquer responsabilidade no acidente; cumpriu com todas as regras de segurança e condução estradai; e não podia, por qualquer outro modo, evitar o acidente, ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrente.
10.ª - Da análise da matéria de facto provada (pontos 7 a 9, 27, 31, 78, mas sobretudo os pontos 5 e 79) que o condutor do veículo CR observou todas as regras estradais, não apenas relativamente a sinalização do STOP, mas ainda atinentes à circulação em cruzamentos e bem assim as regras gerais sobre segurança rodoviária.
11.ª - Como refere a sentença recorrida, "A condução do CR em nada contribuiu para a produção do acidente, uma vez que cumpriu as regras estradais, mormente a que lhe era imposta pela existência do sinal de stop. Na verdade, pese embora este sinal, que se lhe apresentava, impor a cedência de passagem ao trânsito que circule na via prioritária (in casu a Av. Eng. ...) não lhe era exigível que quedasse imobilizado eternamente. Uma vez que usou de todas as cautelas que se lhe impunham e que só arrancou depois de se ter assegurado que não circulava qualquer veículo naquela via, tendo o embate ocorrido quando havia percorrido cerca de dois metros. De acordo com o croquis de fls. 77, a largura da faixa de rodagem da Avenida é de 7 metros, o condutor do CR imobilizou-se num segundo momento, de molde a verificar se podia avançar, tendo ficado com parte do seu veículo em cima da passadeira de peões, com a parte da frente do CR na faixa de rodagem citada, de modo a ter visibilidade para além dos veículos estacionados naquela via, do seu lado esquerdo."
12.ª - Por outro lado, como salientou a sentença recorrida, a recorrente "AXA" não logrou provar, em primeiro lugar, a factualidade respeitante ao desrespeito do sinal de STOP na vertente de não imobilização do veículo perante a sinalização existente. – cfr alíneas e) e f) da matéria de facto não provada.
13.ª - O veículo "CR" observou assim todos os cuidados que se impõem a quem circule numa estrada com as condições que se lhe eram apresentadas.
14.ª - O CR parou num primeiro momento, junto do STOP; avançou um pouco mais, até ao início do cruzamento, onde voltou a parar; Verificou não existir circulação no cruzamento e avançou.
15.ª - O que, salvo o devido respeito, não se pode exigir ao condutor do veículo "CR" é que adivinhe que na Avenida ... circulava um veículo a uma velocidade superior a 90 km/hora (três vezes superior ao limite imposto pela sinalização), e que tenha de ceder a passagem a esse veículo, ou a outro, não se sabe como nem quando.
16.ª - No momento em que o "CR" reinicia a marcha, junto ao cruzamento da Rua ... com a Av ..., o "XL" ainda não se encontrava no cruzamento, nem sequer perto dele.
17.ª - O veículo "XL" circulava, a uma velocidade de pelo menos 90 km /hora, duas vezes superior à permitia no local (30 km/hora), o que dá uma velocidade de deslocação de 2 a 3 segundo para percorrer 80 metros.
18.ª - A circulação veículo XL a velocidade superior a 90 Km/h, em manifesta violação dos art°s. 24°, n° 1, 25°, n° 1, aI. a) e f) e do limite imposto no art° 28°, n° 1, al. b), todos do C.E.), no momento em que o CR iniciou a travessia da Av. ..., fez com que o XL não fosse visível, do local onde o condutor do CR se encontrava (depois de este ter avançado para além do sinal de stop).
19.ª - Como refere a douta decisão recorrida, "O embate só veio a verificar-se porque o XL circulava a velocidade que não lhe permitiu atentar na travessia do CR, que já a havia iniciado, o que lhe era possível, sendo que a velocidade que imprimia ao veículo não lhe permitiu sequer travar ou desviar-se do CR. Caso respeitasse o limite de velocidade de 30 km/h, ou não o excedesse de forma tão flagrante ter-lhe-ia sido possível evitar o embate. Assim, o tempo que demorou a percorrer cerca de 60 a 80 metros absorveu o tempo de reacção (cerca de 2 segundos) e daí, certamente, não existirem rastos de travagem.
20.ª - Na verdade, tendo em conta as regras da física e os elementos disponíveis, demorando o XL, a velocidade superior a 90 km/h, cerca de 2 a 3 segundos a percorrer os 80 metros que antecedem o cruzamento e tendo o CR acabado de arrancar, demoraria cerca de 2 segundos (a uma velocidade de 5 a 10 km/h) a percorrer a distância até ao local onde se deu o embate. Importa, ainda, realçar que a visibilidade do condutor do CR, para o seu lado esquerdo era inferior, cerca de 40 a 50 metros, por se tratar de plano ascendente, do que a visibilidade do condutor do XL que circulava em sentido descendente. Por outro lado, as zonas embatidas dos veículos (o que é perceptível das fotografias juntas aos autos), assim como o local onde se deu o embate (sensivelmente a meio do cruzamento) também apontam para o facto de o CR já ter percorrido alguma distância quando se deu a colisão. Isto é, o CR não foi colhido logo no início da travessia do cruzamento, na sua zona lateral da parte da frente – o que poderia sugerir que tivesse surgido repentinamente e em inobservância da paragem imposta pelo sinal de stop a que devia obediência. Com o seu comportamento o condutor do XL violou os art°s 24°, n° 1, 25°, n° 1, al. a) e f) e 28°, n° 1, al. b) e n° 2 do CE, impendendo sobre ele uma presunção juris tantum de negligência, que a ré AP não afastou."
21.ª - Foi a velocidade excessiva do Audi "XL" que impediu o "CR" de o avistar; que impossibilitou o "CR" de não iniciar a marcha; que impossibilitou o seu condutor de reduzir a velocidade e se necessário parar para permitir a conclusão da manobra do "CR" que já se encontrava no cruzamento; que impossibilitou o seu condutor de reduzir a velocidade e se necessário parar para evitar a ocorrência do embate; que provocou a violência do embate, de acordo com as fotografias constantes no processo, e a trajectória e projecções dos veículos, descritas nos pontos 22 a 26 da matéria de facto (deslocação de veículo a mais de 20 metros, com queda de poste, arrastamento de dois carro)
22.ª - Foi a velocidade excessiva do Audi "XL" que provocou os danos corporais no malogrado RC, com a extensão descrita nos autos.
23.ª - Foram a velocidade excessiva do Audi "XL" e a desatenção do seu condutor que fizeram com que não houvesse qualquer rasto de travagem no local.
24.ª - Foram a velocidade excessiva do Audi "XL" e a desatenção do seu condutor que estiveram na base da ocorrência do acidente (caso o Audi circulasse a uma velocidade de 30 km/hora, o acidente nunca teria acontecido, pois o seu condutor teria tempo para evitar o acidente).
25.ª - Foram a velocidade excessiva do Audi "XL" e a desatenção do seu condutor os factores que levaram à ocorrência do acidente.
26.ª - O condutor do veículo "XL" desrespeitou as mais elementares regras estradais, nomeadamente os artigos 24.°, n.° 1, 25.°, n.° 1, al. a) e f), 28.°, n.° 1, al. b), do Código da Estrada.
27.ª - É sobre ele que recai a presunção juris tantum de negligência;
28.ª - Assim sendo, deve ser inteiramente confirmada a decisão da primeira instância, no que à responsabilidade exclusiva do condutor do "XL" diz respeito, com as devidas consequências legais.
29.ª - No que respeita à quantificação dos danos não patrimoniais (ponto 2 das alegações da Recorrente), a Recorrida, em face da imputação exclusiva da responsabilidade do condutor do "XL", que defende nas presentes alegações, não tomará, por ora, posição quanto à mesma, por entender que o juízo que se faça acerca da responsabilidade exclusiva do condutor do "XL" implicará a absolvição da Recorrida quanto ao pedido de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do acidente.
19. O A. apresentou contra-alegações, em que concluem da seguinte forma:
1.ª - Recorrente interpôs recurso da sentença do tribunal a quo que julgou a presente acção parcialmente procedente por, em síntese, entender que aquela decisão deveria condenar ambas as demandadas, as companhias de seguros RR., a AP e a CST, no pagamento do valor da condenação na proporção de 50% para cada, e por entender que o valor de € 300.000,00 pelos danos não patrimoniais é excessivo, devendo ser reduzido para € 150.000,00
2.ª - Para o efeito, a Recorrente não impugnou a matéria de facto determinada pelo Tribunal a quo, nem requereu a este Tribunal a sua modificação ou ampliação, mas sugere diferente solução jurídica para a resolução do caso sub judicio, aduzindo factos que não estão provados e fazendo letra morta dos que estão, pelo que, a sua pretensão não pode proceder.
3.ª - A recorrente defende que a conduta do condutor da viatura CR foi, também causal do acidente", por este ter alegadamente desrespeitado a sinalização STOP e ter invadido a faixa onde o veiculo XL circulava, "no exato momento em que aquele veículo aí circulava, uma vez que, nem rasto de travagem existiu".
4.ª - Isto ao arrepio de tudo o que vem provado nos autos, sustentado, entre outros pela testemunha IP, Engenheira Física, licenciada pelo IST de Lisboa que, com recurso às leis da Física Clássica ainda em vigor, levou a cabo demonstrações exaustivas, calculando "as velocidades, a partir do arrastamento dos veículos estacionados, provocado pelo Audi. Todos os cálculos que fez partiram da velocidade a que o Audi circulava quando embateu nos veículos estacionados, depois de ter embatido no Corsa, independentemente do tempo de reacção (o que foi calculado numa fase posterior).
5.ª - Que a culpa do acidente foi exclusiva do veículo XL, decorre também do depoimento da testemunha RP, "pendura" do veículo XL, cfr. infra transcrito, que refere o excesso de velocidade do XL e a desatenção do seu condutor, que nem teve tempo de reacção para travar;
6.ª - Os fundamentos da recorrente até podiam ter algum sentido, caso não tivessem ficado provados os factos 5, 6, 7,8,9,10,16, 29 e 79 e ainda o facto 15, 18 e 19 infra: 15. No cruzamento da ... com a Av. ..., o condutor do CR imobilizou-o em virtude do sinal de Stop.
7.ª - Aí imobilizado, certificou-se que não circulavam quaisquer veículos na Av. Enc. ..., nem em sentido ascendente, nem no sentido descendente. Nem  avistou quaisquer veículos e reiniciou a marcha.
8.ª - Por outro lado, "Não se provaram os seguintes factos: f) O condutor do CR não parou no sinal Stop;
9.ª - Porém, a recorrente invoca de forma inusitada, diga-se, "as leis da física", alegando que se o condutor do veículo XL sofreu um embate frontal foi porque à sua frente encontrou um obstáculo, e que "esse obstáculo era exactamente o veiculo CR, que circulava da via com STOP". E mais: " se o embate se deu na sua lateral esquerda," do veículo CR, "mandam as leis da física concluir também que, esse veículo estaria na via de circulação do veículo XL, a via prioritária".
10.ª - Fica apenas por saber quais terão sido as leis da Física que contrariam as evidências da Física clássica e de que a recorrente alegadamente se socorreu, uma vez que não as indicou.
11.ª – Assim, atendendo a que:
- da matéria de facto provada pelo Tribunal a quo, que a Recorrente não pretende ver alterada ou ampliada, não há um único facto que permita afirmar que o sinal STOP não foi respeitado pelo condutor do CR;
- da matéria de facto provada consta que o veículo XL circulava a uma velocidade superior a 90Km/h; num local onde existia um limite de 30km/h;
- não deixando rastos de travagem; (cfr. Ponto 77, 21, 25 e 29);
- encontra-se provado que: "No cruzamento da ... com a Av. ..., o condutor do CR imobilizou-o em virtude do sinal de Stop."(cfr. Ponto 15)
- a recorrente não logrou fazer prova de que o condutor do CR não parou no sinal STOP (vide alínea f) dos factos não provados, fls. ... da douta sentença);
- a pretensão de ver condenada a Recorrida Ré CST, SA, em 50% do valor da indemnização é manifestamente infundada e improcedente, devendo ser mantida a decisão tomada pelo douto tribunal de primeira instância porque consentânea com a factualidade assente.
12.ª - O A. peticionou € 350.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais e para tanto aduziu factos inequivocamente reveladores da dor física e moral por si sofrida, em consequência das lesões e dos respectivos tratamentos, com todo o desespero e angústia que pode sentir-se em virtude desse estado de aprisionamento no próprio corpo.
13.ª - E, produzida a prova, o tribunal a quo considerou como provados os factos das al. a) a i) da sentença, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, e ainda que:
- até à data do acidente, o A. era uma pessoa saudável, robusta e não tinha problemas de saúde; fazia a sua vida diária sem qualquer problema e praticava regularmente desporto; tinha espírito de iniciativa, era extrovertido, alegre e dinâmico; tinha namorada e perspectivava casar e ter filhos.
- com o acidente, o ora A. sofreu dores intensas.
- passou nos 36 meses subsequentes ao acidente (data da instauração da petição inicia!) e posteriormente, até ao seu decesso, por um processo de reabilitação muito doloroso e prolongado.
- com toda a incomodidade que resulta do facto de estar imobilizado, bem como do facto de estar fortemente limitado na capacidade de comunicar a terceiros o que sente.
- durante seis meses, o A. foi submetido a tratamentos intensivos de fisioterapia no Centro de Alcoitão, que lhe causaram, e causam, dores físicas e psíquicas.
- Nos seis meses subsequentes à instauração da acção foi submetido novamente a uma intensiva ronda de tratamentos de reabilitação no Hospital M tais dores físicas e psíquicas são agravadas pelo facto de ter consciência de ter ficado permanentemente incapacitado, nomeadamente não podendo andar;
- o A. ficou fisicamente deformado e faz movimentos involuntários, dos quais resultam auto-mutilações e dores fortes.
- o A. sente desgosto, dor permanente e mau estar, facto que exterioriza, através do olhar e de alguns sons e vocábulos que vai emitindo.
- o A. pensa e sente, tem dor, alegrias e tristezas, desespera e se angustia e sente a dor profunda."
14.ª - Ora, foi com base nestes factos, em critérios jurisprudências e também nos critérios que infra se citam que o tribunal a quo fundamentou a sua decisão, a saber:
"o dano corporal em sentido restrito, caracterizado como o prejuízo de natureza não patrimonial que recai na esfera do próprio corpo, dano à integridade física e psíquica.
"valorar a dor física e dor moral, ou psíquica sofrida pelo lesado, por saber-se diminuído fisicamente. "
" a dor física está relacionada com diversos factores, nomeadamente a idade da vítima, factores psicossociais e tipo de personalidade e pelo tipo de lesão e tratamento que haja sido aplicado.
15.ª - Distingue-se, pois, do dano não patrimonial, que corresponde à afectação da integridade anatómica, fisiológica ou estética.
16.ª - É também merecedor de tutela o prejuízo de afirmação pessoal, valorando-se a diminuição ou anulação da capacidade do indivíduo para obter ou desfrutar os prazeres ou satisfações da vida como consequência directa do dano."
17.ª - Porém, a Recorrente apelou também desta decisão sustentando, em síntese, o seguinte: os acórdãos citados pelo Tribunal a quo não podem servir de ponto de referência à aludida decisão, porque "o que vemos neles é a determinação de valores por danos não patrimoniais em casos completamente distintos do presente. "
18.ª A sentença "teve uma visão meramente circunstancial do contexto das dores e sofrimentos da vítima, sem fundamentar a sua conclusão, pelo valor em causa;" sem indicar "os alicerces que justifiquem o valor da causa"; o valor arbitrado é excessivo, sendo que se aponta como justa a quantia de € 150.000,00, imputada em partes iguais a ambas as Rés, no âmbito da pretensa divisão de responsabilidade analisada no ponto A) anterior.
19.ª - Começa desde já por dizer-se o alegado nos pontos i) e ii) supra, não procede, em primeiro lugar, por terem sido devidamente explicitados os critérios que subjazem à fixação da indemnização, conforme supra citado, e depois porque ambos os médicos que testemunharam em juízo, enquadraram a situação do Autor nas piores em que se pode encontrar alguém, vejamos:
CA, médico cirurgião, refere: "... é doloroso, a sensibilidade está perfeitamente activa o doente é que não consegue se manifestar" (...) se estás a tentar fazer uma força que não consegues, isso dói, o musculo rijo em si também dói (...) tudo isso é centralmente transmitido ao doente refere dor, como o doente já era um estado critico, como lhe disse no principio, ele não consegue exacerbar dor(...) ele jamais vai abrir a boca e dizer dói …" em outros países da Europa ou o caso do Estados Unidos, por exemplo, uma situação como essa é uma daquelas situações em que é perfeitamente pertinente, por exemplo, a eutanásia ou quando por exemplo o doente desses entra na porta do serviço de urgências com uma lesão desse nível, a família então conversar connosco e diz não, não queremos que faca mais nada, se é para ficar assim...é melhor acabar com tudo."
- A testemunha HP, cirurgião ortopédico, que consultou o Autor em Alcoitão, No LN e também no Hospital M, refere: "... são estados de grande angústia, eu por outras razões, por exemplo em doentes que são submetidos a certo tipo de anestesia e analgesia, quando estão no pós-operatório pode se encontrar-se uma situação em que podem estar numa situação de consciência mas não se consegue nem falar nem mover-se e estão conscientes... os anestesistas falam disso (...) os doentes depois contam exactamente isso que é uma situação de grande ansiedade, de pânico mesmo, não é, como se estivessem incapacitados de poder comunicar e ao mesmo estão conscientes. (....) pelos sinais exteriores que ele apresentava eu acredito que sim, que seria uma situação que ele poderia ter, que ele teria com certeza..."
19.ª - Ou seja, do ponto de vista clínico e humano este é considerado pelos clínicos como um caso singular, efectivamente sem igual e sem correspondência na jurisprudência.
20.ª - Quanto ao ponto iii) e à pretensa redução do montante pecuniário arbitrado, de € 300.000,00 para € 150.000,00, a Recorrente alega que as "As dores e o sofrimento do lesado, entretanto falecido, foram, na verdade graves. Mas, infelizmente ele não sofreu durante uma vida longa: esta verdade (a morte prematura) conduz-nos friamente a ter como referencia "o tempo de sofrimento".
21.ª - Permita-se-nos a correcção: as lesões não foram apenas graves, foram, em termos de danos morais, as mais graves que ambos os clínicos referiram;
22.ª - Não estamos apenas perante "uma questão de quanto tempo de sofrimento", mas sim do tipo de sofrimento em causa, duma claustrofobia existencial difícil de conceber, acrescida de dores físicas e da dramática circunstância de o A. ter consciência do seu estado, mas não a capacidade de comunicar com o exterior.
23.ª - Por serem de extrema gravidade, considerando a culpa da R. Recorrente e as circunstâncias do caso concreto, afigura-se justa a compensação pelos danos morais, arbitrada pelo tribunal a quo de € 300.000,00, razão pela qual deverá ser mantida.
24.ª - Ainda assim e, apenas por esmerada cautela de patrocínio, mutatis mutandis para o caso em apreço, atente-se nas seguintes decisões de Tribunais Superiores: In Ac do STJ de 28-02-2013, que aqui se dá por integralmente reproduzido, em que o STJ arbitrou a quantia de 125.000,00€ de compensação por danos morais pelas lesões objectivas sofridas por um indivíduo 21 anos mais velho do que o A. e que, ao contrário deste, não tinha plena consciência do seu estado e podia queixar-se das dores físicas e as piores dores morais de que algum ser humano pode padecer;
25.ª - Um outro caso, em que nem existia este desesperante encarceramento existencial como o do A., foram já os tribunais mais longe, mesmo não podendo o tribunal antever quanto tempo poderia ser o dito "período do sofrimento", pois não estava demonstrado, nem pode estar, se um doente com estas patologias pode ter uma longa vida. Isto apesar da experiência comum dizer que não: tais doentes são vítimas mortais precoces das infecções geradas por este tipo de condição física e pela permanência constante em centros hospitalares: Ac. de 2.3.2011, processo n.21639/03.8TBBNV.L1: "€ 400.000 – lesada de 19 anos de idade, com tetraplegia, diminuição acentuada da função respiratória, incapacidade total para o trabalho, perda de sensibilidade do pescoço para baixo, com exceção dos ombros, necessidade de assistência permanente de outras pessoas";
26.ª - Dúvidas não restam que, nas circunstâncias concretas, entre os € 125.000 tidos como bons no caso de pessoa com 51 anos, que permaneceu em estado de coma durante 6 anos, mas sem sofrimento, nem consciência do estado em que se encontrava e os € 400.000,00, da jovem de 19 anos, que apesar da tetraplegia não perdeu a faculdade de comunicação com o exterior, o valor de € 300.000,00 judicialmente arbitrado se enquadra absolutamente dentro dos valores aceites pelo STJ. Deste modo, o montante arbitrado em Primeira Instância a título de danos não patrimoniais é de manter.
Por tudo quanto acima se diz, as alegações da Recorrente devem improceder na íntegra.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Delimitação do objecto do recurso
Como é sabido, no que aqui releva, o objecto do recurso é definido em função das conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4, 639.º, n.º 1 e 2, e 640.º, n.º 1 e 2, do CPC.
Dentro desses parâmetros, o objecto dos presentes recursos incide sobre as seguintes questões:
A – A invocada nulidade da sentença com fundamento em contradição entre a fundamentação e a decisão;
B – No plano do mérito,  
a) – a questão da repartição de culpas entre os condutores dos veículos XL e CR;
b) - a questão do alegado excesso do montante indemnizatório a título de danos não patrimoniais.
III – Fundamentação   
1. Factualidade dada como provada pela na 1.ª Instância
Vem dada como provada pela 1.ª Instância a seguinte factualidade, que aqui importa reordenar para uma melhor compreensão de todo o universo fáctico relevante[1]:  
1.1. Em 24-10-2007, entre as 21h45 e as 22h10, ocorreu um acidente de viação no cruzamento entre a Rua ... e a Av. Eng. ..., P…, O… – Alínea B) dos Factos Assentes.
1.2. No acidente foram intervenientes:
- o veículo ligeiro de passageiros, de marca Opel Corsa, matrícula …, conduzido por AC, propriedade de MC;
- o veículo ligeiro de passageiros de marca Audi, modelo A3, matrícula …, conduzido por HM, propriedade de FS - Alínea C) dos Factos Assentes.
1.3. A Av. Engenheiro ...é uma via de dois sentidos, enquanto a Rua ... é uma via de sentido único que desemboca num cruzamento com a Av. Engenheiro ... – Alínea G) dos Factos Assentes.
1.4. Existe um sinal de Stop para quem circula na Rua ..., o qual é precedido de uma passadeira para peões – Alínea H) dos Factos Assentes.
1.5. Na Avenida ..., atento o sentido de marcha do veículo XL, existe a seguinte sinalização vertical: “Zona de Acidentes - Modere a velocidade a 30” – resposta ao art.º 19.º da base instrutória.
1.6. Na Av. Engenheiro ..., imediatamente antes do cruzamento desta via com a Rua ..., existe uma passadeira para peões – resposta ao art.º 1.º da base instrutória.
1.7. O cruzamento é precedido de rectas para ambos os lados, sendo no sentido ascendente numa extensão de cerca de 70-80 metros, zona onde apresenta a curvatura referida em 1.9 c) – resposta ao art.º 22.º da base instrutória.
1.8. O acidente dos autos ocorreu no cruzamento entre a Rua ... e a Av. Eng. ...– Alínea E) dos Factos Assentes.
1.9. Atendendo ao sentido de marcha do veículo XL:
a) - A Av. Engenheiro ... é, até ao cruzamento com a Rua ..., sucessivamente entrecortada por três entroncamentos e dois cruzamentos.
b) - Tem uma trajectória com diversas curvas e contracurvas, em declive e pelo menos seis passadeiras.
c) - No quarteirão imediatamente anterior ao cruzamento com a Rua ..., e no seu início apresenta uma curvatura para a direita, e um declive, o que resulta numa visibilidade média no sentido ascendente de 40 a 50 metros
resposta ao art.º 20.º da base instrutória.
1.10. O cruzamento tem pouca visibilidade – Alínea F) dos Factos Assentes.
1.11. O CR circulava na ... – Alínea I) dos Factos Assentes.
1.12. O condutor do veículo Opel Corsa, CR, pretendia seguir em direcção à Rua … – facto alegado no art.º 24.º  da p.i. e no art.º 9.º da contestação da R. AP;
1.13. No cruzamento da ... com a Av. ..., o condutor do CR imobilizou-o em virtude do sinal de Stop – resposta ao art.º 1.º da base instrutória.
1.14. Nesse ponto, o condutor do CR não tinha visibilidade suficiente do trânsito que circulava na Av. ... – resposta ao art.º 2.º da base instrutória.
1.15. Avançou para diante do sinal de Stop e imobilizou-se no início do cruzamento, tendo parte do CR ficado em cima da passadeira existente na Rua ... – resposta ao art.º 3.º da base instrutória.
1.16. Aí imobilizado, certificou-se que não circulavam quaisquer veículos na Av. Eng. ..., nem em sentido ascendente, nem no sentido descendente – resposta ao art.º 4.º da base instrutória.
1.17. Não avistou quaisquer veículos e reiniciou a marcha – resposta ao art.º 5.º da base instrutória.
1.18. O XL circulava no sentido descendente da Av. Eng. ..., em direcção ao Casal da Choca – resposta ao art.º 6.º da base instrutória.
1.19. Na Av. ..., antes do embate, o XL circulava a velocidade superior a 90 Km/h – facto (velocidade) alegado no art.º 18.º da contestação da R. CST, no art.º 138-A  da  p.i.,  no art.º 29.º da p.i. do centro Hospitalar;
1.20. A distância de visibilidade, no sentido de marcha do XL, até ao cruzamento da Av. Eng. ... com a Rua ..., era de cerca de 60 a 80 metros – facto alegado no art.º 138.º-A da p.i..
1.21. A Av. ...tem limite de velocidade de 30 km/h – resposta ao art.º 7.º da base instrutória.
1.22. O embate dos veículos ocorreu entre a parte frontal do XL e a lateral esquerda do CR – Alínea J) dos Factos Assentes.
1.23. O embate deu-se sensivelmente a meio do cruzamento – facto alegado no art.º 29.º da p.i. de RC, no art.º 23.º da p.i. do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, EPE e art.º 21.º da contestação da R. AP;
1.24. Na sequência do embate, o veículo CR foi projectado contra um muro de uma casa e um poste de sinalização rodoviária que se encontrava no passeio do lado esquerdo da Av. Eng. ..., a alguns metros do cruzamento, no sentido descendente e arrancou o poste do chão – resposta ao art.º 8.º da base instrutória.
1.25. Após o embate contra o poste de sinalização, embateu num veículo estacionado do lado direito de quem desce a Av. ... e imobilizou-se no meio da via Av. Eng. ... a alguns metros do local onde ocorreu o embate – resposta ao art.º 9.º da base instrutória.
1.26. O XL, após ter embatido contra o CR, foi embater no veículo de marca Peugeot, modelo ..., de matrícula …, que se encontrava estacionado do lado direito da Av. Eng. ..., engrenado em marcha atrás, tendo-o arrastado para a frente cerca de três metros – resposta ao art.º 10.º da base instrutória.
1.27. Na faixa de rodagem não existem quaisquer sinais de travagem do veículo XL – resposta ao art.º 11.º da base instrutória.
1.28. O VF, por sua vez, embateu no veículo de marca Renault, modelo Espace, de matrícula …, que se encontrava estacionado à sua frente, veículo este que foi também arrastado cerca de três metros para a frente – resposta ao art.º 12.º da base instrutória.
1.29. À data do acidente, a visibilidade de quem se encontrava a circular na Rua ... e pretendia atravessar a Av. Engenheiro ... era condicionada pela existência de veículos estacionados de ambos os lados da Avenida, antes do cruzamento supra referido – resposta ao art.º 13º da base instrutória.
1.30. À data do acidente, o piso das estradas da Rua ... e Av. Eng. ... estava seco e encontrava-se em bom estado de conservação – resposta ao art.º 14.º da base instrutória.
1.31. Ambos os veículos circulavam com as luzes acesas – resposta ao art.º 23.º da base instrutória.
1.32. O A. seguia no CR, no banco de trás – Alínea D) dos Factos Assentes.
1.33. Na sequência do embate do XL no CR, o ora A. ficou inconsciente e encarcerado no interior do veículo – resposta ao art.º 24.º da base instrutória.
1.34. No dia 27/10/2007, foi transferido para o Hospital EG, onde foi internado nos serviços Neurocirurgia – resposta ao art.º 25.º da base instrutória.
1.35. Em 18/01/2008, foi emitido pelo médico responsável pelos Serviços de Neurocirurgia do Hospital EG, o Sr. Dr. CS, o relatório clínico de internamento do ora A. de fls. 94, o qual constitui o documento n.º 18 junto com a p.i. – resposta ao art.º 26.º da base instrutória.
1.36. No dia 5 de Agosto de 2008, teve alta hospitalar neurocirúrgica do Hospital EG e foi transferido para internamento em Fisiatria no CMR de A…, onde recebeu assistência até ao dia 14.02.2009 – resposta ao art.º 27.º da base instrutória.
1.37. No dia 20 de Dezembro de 2008, pelo CMR de A…, foi emitida a seguinte informação clínica que constitui o documento n.º 17, a fls. 93 – resposta ao art.º 28.º da base instrutória.
1.38. No dia 14 de Fevereiro de 2009, foi novamente transferido para o serviço de Neurocirurgia do Hospital EG, onde recebeu apoio da Medicina Física e de Reabilitação – resposta ao art.º 29.º da base instrutória.
1.39. No decorrer desse internamento, no dia 12 de Março de 2009, foi emitido, pela médica Fisiatra, o seguinte relatório que constitui o documento n.º 19 da p.i a fls. 95 – resposta ao art.º 30.º da base instrutória.
1.40. Também o Serviço de Neurologia, em 11-03-2009, emitiu o relatório médico que constitui o documento n.º 20 junto com a p.i, a fls. 96 – resposta ao art.º 31.º da base instrutória.
1.41. Em 02-06-2009, tendo recebido alta de neurologia, o A. foi transferido para a Unidade de Cuidados Médios "LN — Unidade de Autonomia e Bem Estar da Encarnação", em M…, onde recebe cuidados continuados paliativos, no seguimento do que foi emitido, em 10 de Julho de 2009 o relatório que constituem os documentos n.º 21 e 22 – resposta ao art.º 32.º da base instrutória.
1.42. Findo o primeiro internamento no Hospital M, em Fevereiro de 2010, foram emitidos os relatórios médicos, que constituem os documentos n° 23, 23A, 23B, 23C e 23D juntos a fls. 98 a 109 – resposta ao art.º 33.º da base instrutória.
1.43. Findo tal período de internamento, no dia 18 de Fevereiro de 2010, o A. regressou ao LN, na modalidade de internamento de longa duração, onde permaneceu até ao passado dia 21-09-2010 – resposta ao art.º 34.º da base instrutória.
1.44. Em 21-09-2010 o A. foi internado no Hospital M, no âmbito do acordo referido em 1.80 (alínea M) – resposta ao art.º 35.º da base instrutória.
1.45. Desde a data do acidente o A. apresentou:
a) - Tetraparésia espástica.
b) - Deficit de articulação.
c) Discurso por vezes hipofónico e ocasionalmente ininteligível.
d) - Alterações de controlo postural nomeadamente do tronco e da cabeça;
e) - Oftalmoplegia com diminuição acentuada da visão do olho esquerdo;
f) - Dependência total para todas as Actividades de Vida Diária (alimentar-se, higiene, vestuário, mobilização, evacuação e micção).
g) - Fadiga mental que induz defeito de atenção.
h) - Diminuição da capacidade de iniciativa.
i) - Incapacidade absoluta para o trabalho
resposta ao art.º 36.º da base instrutória.
1.46. Os factos descritos em 1.45 a) a i), conforme resposta ao art. 36, devem-se às lesões encefálicas e lesão do nervo óptico e ao facto de não se mostrar realizada intervenção para exploração do seu potencial de reabilitação – resposta ao art.º 37.º da base instrutória.
1.47. Em consequência, até ao seu óbito, o A. teve necessidade de:
a) - Cuidados médicos e paramédicos.
b) - Apoios técnicos específicos.
c) - Acompanhamento em terapia da fala e terapia ocupacional
resposta ao art.º 38.º da base instrutória.
1.48. Durante o seu internamento no LN o A. suportou a quantia infra, relativa aos custos do seu internamento:
a) - No dia 23.07.2009, a quantia de € 222,43;
b) - No dia 09.09.2009, a quantia de € 237,77;
c) - No dia 28.09.2009, a quantia de € 237,77;
d) - No dia 20.10.2009, a quantia de € 230,10;
e) - No dia 20.11.2009, a quantia de € 237,77;
f) - No dia 21.12.2009, a quantia de € 230,10;
g) - No dia 27.01.2010, a quantia de € 237.77;
h) - No dia 13.02.2010, a quantia de € 92.04;
i) - No dia 24.02.2010, a quantia de € 247.76;
j) - No dia 24.03.2010, a quantia de € 169.52;
k) - No dia 28.04.2010, a quantia de € 404.24;
l) - No dia 30.05.2010, a quantia de € 391.20;
m) - No dia 23.06.2010, a quantia de € 369.83;
n) - No dia 28.07.2010, a quantia de € 357.90;
o) - No dia 12.09.2010 a quantia de € 369.83;
p) - No dia 21.09.2010, a quantia de € 369.83;
q) - Em Outubro de 2010, a quantia de € 238.00
resposta ao art.º 39.º da base instrutória.
1.49. O A. despendeu € 13.20 pagas no Centro de Saúde de Oeiras, relativa à consulta mensal do A. para efeitos de baixa médica, nos seguintes termos:
a) - 29.06.2009 - € 2.20;
b) - 27.07.2009 - € 2.20;
c) - 26.08.2009 - € 2.20;
d) - 22.09.2009 - € 2.20;
e) - 27.10.2009 - € 2.20;
f) - 25.11.2009 - € 2.20
resposta ao art.º 40.º da base instrutória.
1.50. Gastou a quantia de € 84.29, paga ao Hospital M relativa aos serviços de lavandaria no período em que o A. aí esteve internado, entre 01 e 18 de Fevereiro de 2010 – resposta ao art.º 41.º da base instrutória.
1.51. E ainda a quantia de € 76,00 relativa ao transporte de ambulância entre o Hospital M e o LN – resposta ao art.º 42.º da base instrutória.
1.52. Necessitou de "ajustes periódicos da dosagem do baclofen" – resposta ao art.º 47.º da base instrutória.
1.53. À data do acidente, o ora A. exercia funções no agrupamento de Escolas de PA - 171827, Escola Básica Integrada Dr. JB, auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 650,00 e um subsídio de refeição diária de € 4,03 – resposta ao art.º 53.º da base instrutória.
1.54. Na ISDL, Ld.ª, onde à data do acidente prestava funções em regime de contrato de prestação de serviços, auferia a quantia mensal de € 250,00 – resposta ao art.º 54.º da base instrutória.
1.55. O A. não poderá mais retomar a actividade profissional que exercia à data do acidente, ou qualquer outra – resposta ao art.º 55.º da base instrutória.
1.56. Até à data do acidente, o A. era uma pessoa saudável, robusta e não tinha problemas de saúde – resposta ao art.º 56.º da base instrutória.
1.57. Fazia a sua vida diária sem qualquer problema e praticava regularmente desporto – resposta ao art.º 57.º da base instrutória.
1.58. Tinha espírito de iniciativa, era extrovertido, alegre e dinâmico – resposta ao art.º 58.º da base instrutória.
1.59. Tinha namorada e perspectivava casar e ter filhos – resposta ao art.º 59.º da base instrutória.
1.60. Com o acidente, o ora A. sofreu dores intensas – resposta ao art.º 60.º da base instrutória.
1.61. Passou nos 36 meses subsequentes ao acidente (data da instauração da petição inicial) e posteriormente até ao seu decesso, por um processo de reabilitação muito doloroso e prolongado – resposta ao art.º 61.º da base instrutória.
1.62. Com toda a incomodidade que resulta do facto de estar imobilizado, bem como do facto de estar fortemente limitado na capacidade de comunicar a terceiros o que sentia – resposta ao art.º 62.º da base instrutória.
1.63. Durante seis meses, o A. foi submetido a tratamentos intensivos de fisioterapia no Centro de Alcoitão, que lhe causaram, dores fisicas e psíquicas – resposta ao art.º 63.º da base instrutória.
1.64. Nos seis meses subsequentes à instauração da acção foi submetido novamente a uma intensiva ronda de tratamentos de reabilitação no Hospital M – resposta ao art.º 64.º da base instrutória.
1.65. Tais dores físicas e psíquicas são agravadas pelo facto de ter consciência de ter ficado permanentemente incapacitado, nomeadamente não podendo andar – resposta ao art.º 65.º da base instrutória.
1.66. O A. ficou fisicamente deformado e fazia movimentos involuntários, dos quais resultaram automutilações e dores fortes – resposta ao art.º 66.º da base instrutória.
1.67. O A. sentia desgosto, dor permanente e mau estar, facto que exteriorizava, através do olhar e de alguns sons e vocábulos que ia emitindo – resposta ao art.º 67.º da base instrutória.
1.68. O A. pensava e sentia, tinha dor, alegrias e tristezas, desesperava e se angustiava e sentia a dor profunda – resposta ao art.º 68.º da base instrutória.
1.69. A Segurança Social pagou ao A. a quantia de € 16.438,99 referentes a prestações pecuniárias pagas a título de subsídio por doença, bem como prestações referentes ao ano de 2009 no valor de € 780,08 – resposta ao art.º 69.º da base instrutória.
1.70. No dia 24-10-2007, pela 22h59m e 23h33m, respectivamente, MG e AC deram entrada nos Serviços de urgência do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, por necessitarem de tratamentos médico-hospitalar – resposta ao art.º 70.º da base instrutória.
1.71. Pelas 00h03 do dia 25-10-2007, o A. deu entrada nos serviços de urgência do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, por necessitar de tratamento médico-hospitalar – resposta ao art.º 71.º da base instrutória.
1.72. MG circulava no CR como passageira – resposta ao art.º 72.º da base instrutória.
1.73. O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental prestou serviços de assistência médico hospitalar a AC no valor de € 143,50 – resposta ao art.º 73.º da base instrutória.
1.74. O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, prestou tratamentos médicos a FG no valor de € 143,450 – resposta ao art.º 74.º da base instrutória.
1.75. O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, prestou tratamentos médicos ao A. no valor de € 110.082,51 – resposta ao art.º 75.º da base instrutória.
1.76. RC nasceu em … de Junho de 1982 e faleceu em 16 de Maio de 2012 - facto alegado no art.º 88.º da p.i. e considerado provado na decisão do incidente de habilitação de herdeiros de fls. 618, e ainda conforme documentos de fls. 95 e fls. 607;
1.77. O internamento de RC no Hospital M, no período posterior aos seis meses que foi objecto do acordo referido em 1.13, importou, na percentagem de 50%, em € 12,787,30, valor que a R. AP recusou pagar, sendo que a R. CST suportou igual importância – facto resultante da ampliação do pedido formulado a fls. 931, e da resposta das R.R. de fls. 967 e ss. e 973 e ss., bem como dos documentos de fls. 951 a 964.
1.78. Por decisão proferida nos autos de acção especial de interdição por anomalia psíquica com o n.° … deste Juízo foi decretada a interdição provisória do A., fixado o início da incapacidade em 24-10-2007 (data do acidente) e nomeado curador provisório o seu pai JC para a prática dos seguintes actos, entre outros: c) formalização do seu pedido de reforma por invalidez total d) defesa judicial dos seus interesses junto das seguradoras dos veículos envolvidos no acidente – Alínea A) dos Factos Assentes.
1.79. O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, emitiu as seguintes facturas nos seguintes termos:
- Com a identificação de AC, a factura n.° …, de 18-12-2007 e com vencimento em 02-01-2008.
- Com a identificação de MG, a factura n° …, de 18-12-2007 e com vencimento em 02-01-2008.
- Com a identificação de RC, as facturas n° …, datadas de 19/12/ 2007, 05/09/2007, 26/11/2008, 27/01/2009, 18/02/2009, 09/03/ 2009, 27/04/2009 e 04/03/2010, e com vencimento em 03/01/2008, 19/09/2007, 12/12/2008, 10/02/2009, 05/03/2009, 23/03/2009, 12/ 05/2009, e 18/03/2010 respectivamente
Alínea N) dos Factos Assentes.
1.80. No âmbito do procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória apenso, as partes celebraram transacção, homologada por sentença nos seguintes termos:
"1- As Requeridas obrigam-se ao pagamento ao Requerido, na proporção de 50 % para cada, de uma reparação provisória, a qual será determinada nos termos que se seguem:
2- O Requerido estará hospitalizado no Hospital Residencial M por um período de seis meses.
3- As Requeridas suportarão todos os custos com o internamento referido no ponto anterior, na proporção referida em 1), e durante o prazo referido em 2), mediante contra-apresentação das respectivas facturas"
Alínea M) dos Factos Assentes.
1.81. A responsabilidade civil pela circulação do ... encontrava-se contratualmente transferida para a Requerida CST, S.A.", através da Apólice com o n.° … – Alínea K) dos Factos Assentes.
1.82. A responsabilidade civil pela circulação do ... encontrava-se contratualmente transferida para a R. "AP – Companhia de Seguros, S.A.", através da Apólice como n.° …. – Alínea L) dos Factos Assentes.
2. Factualidade não provada
Foram dados como não provados os seguintes factos:
2.1. O CR imobilizou-se imediatamente antes do cruzamento em cima da passadeira, provando-se, outrossim, o que consta do item 17 supra;
2.2. O veículo VF foi arrastado quatro metros, provando-se, outrossim, o que consta do item 24 supra;
2.3. O veículo SU encontrava-se travado e engrenado em marcha atrás e foi arrastado quatro metros, provando-se, outrossim, o que consta do item 26;
2.4. O A. ia sentado atrás do condutor;
2.5. O condutor do CR surgiu inesperadamente no cruzamento quando, nesse momento, o XL se propunha transpor o referido cruzamento, precedendo da Av. ...;
2.6. O condutor do CR não parou no sinal Stop;
2.7. O A. circulava sem cinto de segurança e no lado direito do banco traseiro;
2.8. A Av. Eng. ... tem três cruzamentos até à Rua ..., lombas e oito passadeiras, provando-se o que consta do item 30;
2.9. Em Outubro de 2010, o A. suportou, pelo seu internamento no LN, a quantia de € 273,00, provando-se outrossim o que consta do item 49, al. q).
3. Do mérito do recurso
3.1. Quanto à invocada nulidade da sentença
A Apelante começa por arguir a nulidade da sentença recorrida com fundamento em manifesta contradição entre a matéria assente e a decisão proferida, ao abrigo do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), e n.° 4 , do CPC.
Ora, segundo o artigo 607.º, n.º 3, parte final, do CPC, o juiz na sentença deverá concluir pela decisão final, o que se reconduz, analiticamente, ao estabelecimento de uma equação discursiva entre: (i) - a base da facti species, simples ou complexa, plasmada no quadro normativo aplicá-vel - a dita premissa maior; (ii) - a factualidade dada como provada – a dita premissa menor; (iii) uma conclusão sustentada na estatuição legal correspondente ao referido quadro normativo.
Entre tais premissas e conclusão deve existir portanto um nexo lógico que permita, no limite, a formulação de um juízo de conformidade ou de desconformidade, o que não se verifica quando as premissas e a conclusão se mostrem formalmente incompatíveis, numa relação de recíproca exclusão lógica. Na verdade, sobre dois termos excludentes nem tão pouco é viável formular um juízo de mérito ou de demérito; já não assim quando se trate de uma relação de mera inconcludência, sobre a qual é possível formular um juízo de demérito. 
Ora a oposição entre os fundamentos e a decisão da sentença só releva como vício formal, para os efeitos da nulidade cominada na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, quando se traduzir numa contradição nos seus próprios termos, num dizer e desdizer desprovido de qualquer nexo lógico positivo ou negativo, que não permita sequer ajuizar sobre o seu mérito. Se a relação entre a fundamentação e a decisão for apenas de mera inconcludência, estar-se-á já perante uma questão de mérito, reconduzida a erro de julgamento e, por isso, determinativa da improcedência da acção.
No caso vertente, o tribunal a quo, procedendo à análise da factualidade provada, dela concluiu que a ocorrência do acidente se deveu a culpa exclusiva do condutor do veículo XL, por circular com excesso de velocidade, apesar de beneficiar da prioridade de passagem, considerando também que não ocorria inobservância da sinalização do Stop por parte do condutor do veículo CR.
Poderá discordar-se desse entendimento, mas tal discordância inscreve-se já em sede de apreciação de mérito, no plano do enquadramento jurídico da factualidade provada, como tal susceptível de reapreciação por este tribunal de recurso, que nunca no âmbito do invocado vício formal de manifesta oposição entre a fundamentação e a decisão.
Termos em que improcede a arguição da apontada nulidade da sentença.  
3.2. Quanto às questões de fundo
3.2.1. Da questão de repartição de culpas
Neste capítulo, a Apelante considera que a ocorrência do acidente é imputável, em igual proporção, a ambos os condutores dos veículos intervenientes, sustentando se o condutor do veículo XL circulava com excesso de velocidade, também o condutor do veículo CR desrespeitara o sinal de Stop a que estava obrigado.
Todas as Recorridas, defendem tese contrária, pugnando pela confirmação do julgado.
Esta questão terá de ser apreciada com base na análise da factualidade dada como provada quanto à dinâmica do acidente e a todo o circunstancialismo envolvente, aqui não impugnado em sede de decisão de facto.
Assim, da factualidade provada colhe-se, no que aqui interessa, o seguinte quadro:
(i) - Em 24-10-2007, entre as 21h45 e as 22h10, ocorreu um acidente de viação no cruzamento entre a Rua ... e a Av. Eng. ..., Porto Salvo, Oeiras – Alínea B) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.1;
(ii) - No acidente foram intervenientes:
- o veículo ligeiro de passageiros, de marca Opel Corsa, matrícula …, conduzido por AC, propriedade de MC;
- o veículo ligeiro de passageiros de marca Audi, modelo A3, matrícula ..., conduzido por HM, propriedade de FS
Alínea C) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.2.
   (iii) - A Av. Engenheiro ...é uma via de dois sentidos, enquanto a Rua ... é uma via de sentido único que desemboca num cruzamento com a Av. Engenheiro ... – Alínea G) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.3.
   (iv) - Existe um sinal de Stop para quem circula na Rua ..., o qual é precedido de uma passadeira para peões – Alínea H) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.4.
   (v) - Na Avenida ..., atento o sentido de marcha do veículo XL, existe a seguinte sinalização vertical: “Zona de Acidentes - Modere a velocidade a 30” – resposta ao art.º 19.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.5;
   (vi) - Na Av. Engenheiro ..., imediatamente antes do cruzamento desta via com a Rua ..., existe uma passadeira para peões – resposta ao art.º 1.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.6.
   (vii) - O cruzamento é precedido de rectas para ambos os lados, sendo no sentido ascendente numa extensão de cerca de 70-80 metros, zona onde apresenta a curvatura referida em 1.9 c) – resposta ao art.º 22.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.7.
   (viii) - O acidente dos autos ocorreu no cruzamento entre a Rua ... e a Av. Eng. ...– Alínea E) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.8;
   (ix) - Atendendo ao sentido de marcha do veículo XL:
 a) - A Av. Engenheiro ... é, até ao cruzamento com a Rua ..., sucessivamente entrecortada por três entroncamentos e dois cruzamentos.
b) - Tem uma trajectória com diversas curvas e contracurvas, em declive e pelo menos seis passadeiras.
c) - No quarteirão imediatamente anterior ao cruzamento com a Rua ..., e no seu início apresenta uma curvatura para a direita, e um declive, o que resulta numa visibilidade média no sentido ascendente de 40 a 50 metros
resposta ao art.º 20.º da base instrutória.
(x) - O cruzamento tem pouca visibilidade – Alínea F) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.10.
(xi) - O CR circulava na ... – Alínea I) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.11.
(xii) - O condutor do veículo Opel Corsa, CR, pretendia seguir em direcção à Rua … – facto alegado no art.º 24.º  da p.i. e no art.º 9.º da contestação da R. AP correspondente ao ponto 1.12;
(xiii) - No cruzamento da ... com a Av. ..., o condutor do CR imobilizou-o em virtude do sinal de Stop – resposta ao art.º 1.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.13;
(xiv) Nesse ponto, o condutor do CR não tinha visibilidade suficiente do trânsito que circulava na Av. ... – resposta ao art.º 2.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.14.
(xv) - Avançou para diante do sinal de Stop e imobilizou-se no início do cruzamento, tendo parte do CR ficado em cima da passadeira existente na Rua ... – resposta ao art.º 3.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.15.
(xvi) - Aí imobilizado, certificou-se que não circulavam quaisquer veículos na Av. Eng. ..., nem em sentido ascendente, nem no sentido descendente – resposta ao art.º 4.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.16.
(xvii) - Não avistou quaisquer veículos e reiniciou a marcha – resposta ao art.º 5.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.17.
(xviii) - O XL circulava no sentido descendente da Av. Eng. ..., em direcção ao C… – resposta ao art.º 6.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.18.
(xix) - Na Av. ..., antes do embate, o XL circulava a velocidade superior a 90 Km/h – facto (velocidade) alegado no art.º 18.º da contestação da R. CST, no art.º 138-A  da  p.i.,  no art.º 29.º da p.i. do Centro Hospitalar correspondente ao ponto 1.19.
 (xx) - A distância de visibilidade, no sentido de marcha do XL, até ao cruzamento da Av. Eng. ... com a Rua ..., era de cerca de 60 a 80 metros – facto alegado no art.º 138.º-A da p.i. correspondente ao ponto 1.20.
(xxi) - A Av. ...tem limite de velocidade de 30 km/h – resposta ao art.º 7.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.21.
(xxii) - O embate dos veículos ocorreu entre a parte frontal do XL e a lateral esquerda do CR – Alínea J) dos Factos Assentes correspondente ao ponto 1.22.
(xxiii) - O embate deu-se sensivelmente a meio do cruzamento – facto alegado no art.º 29.º da p.i. do A., no art.º 23.º da p.i. do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, EPE e art.º 21.º da contestação da R. AP correspondente ao ponto 1.23;
(xxxi) - Ambos os veículos circulavam com as luzes acesas – resposta ao art.º 23.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.31.
Foi ainda dado como não provado que:
- O condutor do CR surgiu inesperadamente no cruzamento quando, nesse momento, o XL se propunha transpor o referido cruzamento, precedendo da Av. ...;
- O condutor do CR não parou no sinal Stop.
Nenhum ponto da matéria em foco vem impugnado no presente recurso, nem ocorre motivo para, oficiosamente, suscitar tal questão. O que a Apelante sustenta, ao fim e ao cabo, é apenas a interpretação dessa factualidade à luz dos normativos aplicáveis. 
Ora, da factualidade em presença decorre, com clareza a conclusão a que chegou o tribunal recorrido, porquanto se extrai que o condutor do veículo CR, depois de ter parado no Stop, verificando que nenhum veículo se aproximava, empreendeu a travessia do cruzamento, quando foi inopinadamente embatido pelo veículo XL. E todo o circunstancialismo acima retratado aponta no sentido de que tal se deveu pelo facto de o condutor do veículo XL circular a uma velocidade superior a 90 Km/hora, quando o limite ali era de 30 km/hora, sendo que as condições de visibilidade impunha uma tal cautela.
De facto, em tais circunstâncias, não era exigível que o condutor do veículo CR ficasse indefinidamente parado no Stop para a eventualidade de surgir algum veículo na via que pretendia atravessar, muito menos que devesse contar com o aparecimento de veículos a velocidade muito superior à estabelecido para o local.
Para além destas considerações, sufraga-se aqui inteiramente a análise fáctico-jurídica, desenvolvido sobre este ponto na sentença recorrida, não se nos afigurando, salvo o devido respeito, merecer qualquer reparo. 
Nestes termos, improcedem as razões do apelante neste particular. 
3.2.2. Do montante indemnizatório a título de danos não patrimoniais
No que respeita à indemnização a título de danos morais, o primitivo A. peticionou uma quantia não inferior a € 350.000,00.
Porém, o tribunal a quo fixou-a no valor de € 300.000,00, atentos os padrões de vida à data da prolação da sentença.
Por sua vez, a Apelante sustenta que só se mostra justo o valor de € 150.000,00, tendo em conta, nomeadamente, o prematura decesso do lesa-do.
Vejamos.
O artigo 496.º, n.º 1, do CC prescreve que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.”
E o n.° 3 do mesmo normativo determina que o montante de indemnização seja fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, nos termos estatuídos no art.º 494.° do referido Código. Como sabiamente ensina o Sr. Prof. Antunes Varela e como se reitera no Ac. do STJ, de 10/2/98, o juízo de equidade requer do julgador que tome "em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida", sem es­quecer que sobredita "indemnização" tem natureza mista, já que visa não só reparar, de algum modo, o dano, mas também reprovar a conduta lesiva[2].
Com efeito, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemniza­ção dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação eco­nómica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, punir a conduta do agente.
Nessa perspectiva, tal indemnização não deverá confinar-se a uma di­mensão puramente simbólica, mas assumir uma expressão significativa com relevo no quadro de vida do lesado e com re­percussão sancionatória para o lesante, importando ainda considerar o alargamento dos limites de cobertura do seguro obrigatório a que se tem assistido.
Todavia, no critério a adoptar, não se devem perder de vista os pa-drões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o nº 3 do artigo 8º do CC, por forma a evitar exacerbações subjectivas.
No caso vertente, no que aqui releva, apura-se que:
a) - Em consequência do acidente o primitivo A. teve de ser submetido a múltiplas intervenções cirúrgicas e tratamentos;
b) - Desde a data do acidente o A. apresentou: a) – tetraparésia espástica; b) - déficit de articulação; c) - discurso por vezes hipofónico e ocasionalmente ininteligível; d) - alterações de controlo postural nomeadamente do tronco e da cabeça; e) - oftalmoplegia com diminuição acentuada da visão do olho esquerdo; f) – dependência total para todas as Actividades de Vida Diária (alimentar-se, higiene, vestuário, mobilização, evacuação e micção); g) - fadiga mental que induz defeito de atenção; h) - diminuição da capacidade de iniciativa; incapacidade absoluta para o trabalho – resposta ao art.º 36.º da base instrutória.
c) – Tais sequelas devem-se às lesões encefálicas e lesão do nervo óptico e ao facto de não se mostrar realizada intervenção para exploração do seu potencial de reabilitação – resposta ao art.º 37.º da base instrutória;
d) - Em consequência, até ao seu óbito, o A. teve necessidade de: a) - cuidados médicos e paramédicos; b) - apoios técnicos específicos; c) - acompanhamento em terapia da fala e terapia ocupacional – resposta ao art.º 38.º da base instrutória.
e) – O A. nasceu em nasceu em … de Junho de 1982 e faleceu em 16 de Maio de 2012;
f) - Até à data do acidente, o A. era uma pessoa saudável, robusta e não tinha problemas de saúde – resposta ao art.º 56.º da base instrutória;
g) - Fazia a sua vida diária sem qualquer problema e praticava regularmente desporto – resposta ao art.º 57.º da base instrutória.
h) - Tinha espírito de iniciativa, era extrovertido, alegre e dinâmico – resposta ao art.º 58.º da base instrutória.
i) - Tinha namorada e perspectivava casar e ter filhos – resposta ao art.º 59.º da base instrutória.
j) - Com o acidente, o ora A. sofreu dores intensas – resposta ao art.º 60.º da base instrutória.
k) - Passou nos 36 meses subsequentes ao acidente e posteriormente até ao seu decesso, por um processo de reabilitação muito doloroso e prolongado – resposta ao art.º 61.º da base instrutória.
l) - Com toda a incomodidade que resulta do facto de estar imobilizado, bem como do facto de estar fortemente limitado na capacidade de comunicar a terceiros o que sentia – resposta ao art.º 62.º da base instrutória.
m) - Durante seis meses, o A. foi submetido a tratamentos intensivos de fisioterapia no Centro de Alcoitão, que lhe causaram, dores fisicas e psíquicas – resposta ao art.º 63.º da base instrutória.
n) - Nos seis meses subsequentes à instauração da acção foi submetido novamente a uma intensiva ronda de tratamentos de reabilitação no Hospital M – resposta ao art.º 64.º da base instrutória.
o) - Tais dores físicas e psíquicas são agravadas pelo facto de ter consciência de ter ficado permanentemente incapacitado, nomeadamente não podendo andar – resposta ao art.º 65.º da base instrutória.
p) - O A. ficou fisicamente deformado e fazia movimentos involuntários, dos quais resultaram automutilações e dores fortes – resposta ao art.º 66.º da base instrutória.
q) - O A. sentia desgosto, dor permanente e mau estar, facto que exteriorizava, através do olhar e de alguns sons e vocábulos que ia emitindo – resposta ao art.º 67.º da base instrutória.
r) - O A. pensava e sentia, tinha dor, alegrias e tristezas, desesperava e se angustiava e sentia a dor profunda – resposta ao art.º 68.º da base instrutória.
Trata-se de um quadro patológico bastante doloroso e deprimente, cuja intensidade não pode ser desvalorizada pelo facto de entretanto ter falecido.
Com efeito, o tipo de lesões sofridas e os múltiplos tratamentos a que o lesado foi sujeito, a penosidade suportada, durante 3 anos, sem que pudesse perspectivar uma recuperação física e anímica condigna, com a idade de 25 anos, vendo gorados todos os seus projectos de vida pessoal e profissional, constituem, à luz das regras da experiência comum, um quadro indiciário de um intenso sofrimento físico e moral. E, como foi referido, não vemos que o facto da sua morte prematura possam relevar como atenuante de um tal sofrimento. É certo que, se o lesado tivesse sobrevivido mais alguns anos, tal sofrimento se prolongaria no tempo, mas a sua maior intensidade verifica-se particularmente nos primeiros anos em que tinha bem vivas as memórias do tempo em que gozava de uma vida sadia e acalentava os seus projectos de vida na pujança da idade.      
Acresce que o acidente se deveu a culpa exclusiva do condutor do veículo XL, cuja responsabilidade civil se encontrava transferida para a 1.ª R.
Nesta base, tem-se por ajustada a indemnização arbitrada.
IV - Decisão
Por todo o exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar totalmente improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
As custas do recurso ficam a cargo da apelante.
Lisboa, 25 de Novembro de 2014
Manuel Tomé Soares Gomes
Maria do Rosário Oliveira Morgado   
Rosa Maria Ribeiro Coelho
[1] Perante a constatada enunciação dos factos provados pela 1.ª Instância, não se pode aqui deixar de criticar o método, aliás frequente, de sequenciar os mesmos, sem a mínima preocupação de os reordenar lógica e cronologicamente, na sentença, sabido como é que o seu parcelamento, em sede de base instrutória, por decorrência do ónus de impugnação, os desloca dos nichos contextuais em que foram alegados pelas partes e que, por isso, devem ser reconduzidos à sua ordenação primitiva, sob pena de prejudicar a sua coerência semântica, podendo mesmo conduzir a leituras erróneas e dificultando a própria reapreciação da matéria de facto pelo tribunal de recurso.     
[2] Vide Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1º, 10ª Edição, Almedina, pag. 605, nota 4.