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CONTRATO DE ARRENDAMENTO
FIANÇA
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
NULIDADE DO CONTRATO
ABUSO DE DIREITO
Sumário
SUMÁRIO:
I – Em contrato de arrendamento que, por força do art. 7º, nº 1 do RAU, introduzido pelo DL nº 321-B/90, de 15 de Outubro, deva ser reduzido a escrito, a vontade de prestar fiança, que garanta as obrigações da locatária desse contrato, tem de ser declarada expressamente e pela mesma forma, nos termos do art. 628º, nº 1 do CC; IIII – Exigindo-se que a declaração, para além de ser reduzida a escrito, seja expressa, sem possibilidade de aplicação no caso do nº 2 do art. 217º, a intervenção de quem assina documento onde se menciona a sua participação como fiadora no contrato que dele consta, não traduz uma declaração tácita de prestação de fiança que seja válida; melhor, embora possa traduzir uma declaração tácita de fiança, não pode ser aceite com essa eficácia por a lei exigir para tal uma declaração expressa. IV -E não é uma declaração escrita expressa porque do documento não constam palavras escritas imputadas à apelada que tenham o necessário e adequado significado de assunção, por ela, de uma obrigação nos termos descritos no citado nº 1 do art. 627º. V – Só residualmente a nulidade do contrato poderá ser desconsiderada por ser abusiva a sua invocação; terá de verificar-se uma situação de confiança que seja justificada e que tenha sido criada censuravelmente por quem invoca a nulidade e na qual o outro contraente tenha investido de forma sensível, sem que esse investimento de confiança tenha possibilidade de ser assegurado por outra via. VI - O abuso do direito consistirá na invocação de uma nulidade formal que antes se provocou ou para a qual se contribuiu de forma relevante e censurável, criando-se na outra parte a convicção de que se não invocaria mais tarde a invalidade do negócio.
(Sumário da relatora)
Texto Integral
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I – O A intentou contra a R requerimento de injunção onde, invocando ser a requerida fiadora num contrato de arrendamento celebrado entre o requerente, como locador, e S Lda como locatária, e ter o locado sido entregue ao senhorio com diversas rendas não pagas, exige à requerida o pagamento da quantia de € 13.199,12, relativa a rendas, acrescida de juros vencidos no valor de € 1.554,96.
A ré deduziu oposição, além do mais, invocando a nulidade da fiança, por no contrato, que se limitou a assinar, não ter assumido responsabilidade pelo pagamento das quantias devidas pela inquilina.
Após resposta do autor, realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida sentença onde se fixou a matéria de facto tida como provada e se absolveu a ré do pedido.
Apelou o autor, tendo apresentado alegações onde pede a revogação da sentença e a sua substituição por decisão que condene a ré no pedido, formulando para tanto as conclusões que passamos a transcrever:
a) Concluindo quando à impugnação do julgamento respeitante à matéria de facto:
1) Considerando os documentos juntos aos autos, nomeadamente as certidões da matrícula da sociedade S Lda e a certidão de nascimento de IA, o autor aqui recorrente requer que seja dado por provado:
A inquilina S Lda encontra-se desde 17 de Fevereiro de 2012 com a matrícula comercial cancelada, após ter sido declarada insolvente e ter sido dissolvida e liquidada.
A mesma sociedade teve unicamente como gerentes IA e TO, que também eram titulares da totalidade do capital social.
Foram estas duas pessoas que, pela referida sociedade, assinaram o contrato de arrendamento de fls. … .
A mencionada IA é filha da contestante R
A ré (..) assinou o contrato, em causa, na qualidade de fiadora, surgindo o seu nome, morada e outros meios de identificação no cabeçalho do contrato e a sua assinatura após a palavra “fiador” e às assinaturas das legais representantes da sociedade inquilina.
2) Considerando a globalidade dos curtos depoimentos prestados na audiência de discussão e julgamento, conforme a acta, realizada a 6 de Maio de 2014, nomeadamente do autor (..) e da testemunha por este arrolada MR, cujos depoimentos estão gravados, no competente sistema de gravação da audiência, respectivamente, no tempo “7 minutos e 21 minutos a 21 minutos e 06 segundos” e no tempo “22 minutos e 06 segundos a 35 minutos e 09 segundos”, e bem assim, a ausência de qualquer contra prova ou mesmo negação formal dos factos, o autor aqui recorrente requer que seja dado por provado:
Foi condição para a celebração do contrato de arrendamento em causa nos autos que a sociedade inquilina tivesse um fiador como garante das suas obrigações.
Na fase pré negocial a sócia gerente IA indicou que a sua mãe poderia ser fiadora, o que esta aceitou, dando os seus elementos de identificação e comparecendo à assinatura do contrato e assumindo o apoio à iniciativa comercial da sua filha e da sua sócia, esta última também pessoa do relacionamento pessoal da fiadora.
Factor relevante para a escolha do locado foi a proximidade deste para com a residência da fiadora, pouco mais de cem metros, de modo a existir um apoio mútuo entre as referidas mãe e filha.
b) Concluindo quando à aplicação do direitos aos factos
3) A ré (..) ao colocar a assinatura no contrato celebrado, na qualidade de fiadora, assumiu responder pelas obrigações da sociedade inquilina, tendo a obrigação o conteúdo que decorre da aplicação das normas legais, onde se inclui a obrigação de pagamento das rendas vencidas e não pagas e referidas na petição inicial e no ponto 4 dos factos provados na sentença em crise.
4) A defesa da ré (..) ao negar ser fiadora das obrigações de uma inquilina, quando figura no contrato de arrendamento e assinou nessa qualidade de fiador e considerando ainda os factos supra referidos e que se pretende ver aditados aos restantes quatro factos dados por provados na instância recorrida, viola de modo grave e intolerável a boa fé que se impõe a qualquer parte na formação, celebração e execução de um contrato, obrigando à intervenção da norma do artigo 334 do Código Civil, pois é manifesto que a defesa excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico que lhe permitida, sendo deste modo ilegítima.
5) A ré, agora recorrida, na formação, celebração e execução do contrato de arrendamento sempre manifestou a sua vontade e qualidade de fiadora, assinando o contrato nessa qualidade.
6) Abusando do direito, a ré deve ver afastada a possibilidade de ver declarada a existência de qualquer vício do contrato.
7) E, consequentemente, a ré deve ser condenada no pedido.
8) A julgar de outro modo, o Tribunal a quo fez um mau julgamento da matéria de facto e uma errada aplicação das normas de direito presentes nos artigos 1022, 1038, 634628, 217, 762 e 334 todos do Código Civil.
Em contra-alegações que apresentou, a ré sustenta a improcedência do recurso.
II – Vêm descritos como provados os seguintes factos:
1. A 27 de Junho de 2004, o Autor e SR, como senhorios, S. LDA como inquilina e a Ré (...), na qualidade de fiadora, subscreveram um documento intitulado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO COMERCIAL”, cujo teor se reproduziu.
2. A renda acordada foi de € 400,00 (quatrocentos Euros), sendo aumentada anualmente até € 478,80 (quatrocentos e setenta e oito Euros e oitenta cêntimos).
3. O imóvel locado veio a ser entregue ao senhorio em Julho de 2010.
4. A S. LDA não pagou, durante a vida do contrato, as seguintes rendas: 2 rendas no valor unitário de € 431,60 (quatrocentos e trinta e um Euros e sessenta cêntimos) em 2007; 8 rendas no valor unitário de € 442,39 (quatrocentos e quarenta e dois Euros e trinta e nove cêntimos) em 2008; 12 rendas no valor unitário de € 454,78 (quatrocentos e cinquenta e quatro Euros e setenta e oito cêntimos) em 2009 e 7 rendas no valor unitário de € 474,80 (quatrocentos e setenta e quatro Euros e oitenta cêntimos) em 2010.
Importa ainda considerar que no contrato referido em 1., antes do clausulado que nele se inscreveu, consta que o mesmo é celebrado entre:
- o autor e SR, como primeiros outorgantes e senhorios;
- S. LDA, como segunda outorgante e inquilina;
- e (...), na qualidade de fiador.
A esta identificação das partes segue-se:
- a cláusula 1ª, na qual os primeiros outorgantes se dizem proprietários da loja que é objeto do contrato – correspondente à fração B, com o nº 129-A, do prédio sito na Rua (...), inscrito na matriz sob o art. 1301º da freguesia de (...);
- a cláusula 2ª, onde é declarado que os primeiros outorgantes dão de arrendamento à segunda outorgante a mesma loja;
- a cláusula 3ª, onde se lê que “O arrendamento é feito nos termos e condições seguintes”, definidas nas nove alíneas subsequentes onde se estabelece que o prazo é o de cinco anos renovável, que o início da vigência é em 1 de Julho de 2004, que a renda é de € 400,00 com atualização ao abrigo das leis vigentes ou vindouras, qual o regime de obras a fazer pela inquilina, que esta fica proibida de sublocar ou transferir o arrendamento sem autorização escrita salvo o caso de trespasse, como pode a inquilina pôr fim ao arrendamento, que vigoram as demais condições impostas pelo Código Civil e pelo RAU, que a inquilina deverá entregar o locado em bom estado de conservação e que o foro de Lisboa é o territorialmente competente para todas as questões emergentes do contrato.
A este clausulado seguem-se duas assinaturas apostas depois dos dizeres “Os senhorios”, duas assinaturas depois de “A inquilina” e, por último, a assinatura da ré, depois dos dizeres “O fiador”.
III – Abordemos agora as questões suscitadas pelo apelante. Da alteração da decisão proferida sobre os factos:
Com invocação do teor das certidões de matrícula da sociedade inquilina - fls. 60-61 – e de nascimento da sócia gerente IA – fls. 78-79 – e, bem assim, do documento que corporiza o contrato de arrendamento – fls. 10-12 –, o apelante sustenta que se deve julgar como provado que:
a) a sociedade inquilina tem desde 17/2/2012 a matrícula comercial cancelada, após ter sido declarada insolvente e ter sido dissolvida e liquidada;
b) a mesma sociedade teve unicamente como gerentes IA e TO, titulares da totalidade do capital social;
c) ambas as sócias gerentes intervieram no arrendamento, assinando-o, pela mesma sociedade;
d) a referida IA é filha da ré;
e) a ré assinou o contrato na qualidade de fiadora, estando o seu nome, morada e outros elementos de identificação no cabeçalho do contrato e a sua assinatura após a palavra “fiador” e as assinaturas dos legais representantes da sociedade inquilina.
Em face do conteúdo da dita certidão extraída do registo comercial e relativa à sociedade inquilina, julga-se como provada a seguinte matéria, oportunamente alegada pelo ora apelante:
5. Em 20.10.2009 foi inscrito no registo comercial o trânsito em julgado da decisão que declarou a insolvência da sociedade inquilina;
6. Em 17.2.2012 foi inscrito no registo comercial o encerramento da liquidação da sociedade inquilina e o cancelamento da sua matrícula;
7. Esta sociedade, com o capital social de € 5.000,00, apenas teve como gerentes as sócias IA e TO, cada uma delas titular de uma quota no valor de € 2.500,00.
E por tal resultar da dita certidão de registo de nascimento, julga-se ainda como provado que:
8. IA é filha da ré.
Ainda, porque tal se extrai do documento que incorpora o contrato de arrendamento, julga-se como provado que:
9. No acordo referido em 1., pela sociedade inquilina figuram as assinaturas das ditas sócias e gerentes TO e IA.
10. No cabeçalho do mesmo acordo consta a intervenção da ré como fiadora, bem como, no final, a assinatura desta por baixo do dizer “O fiador”.
Pretende também o apelante, agora fundado nos depoimentos prestados em julgamento pelo autor e pela testemunha Maria de Fátima Ribeiro – em segmentos que identifica, por referência ao local da gravação onde se encontram - que se julgue como provada a matéria que indica na sua conclusão 2).
Ouvida a gravação dessas passagens, cujo conteúdo a apelada não discute e ao qual nenhum elemento probatório contrapõe, constata-se que as declarações prestadas são fundamento bastante para formar convicção suficientemente segura da verdade dos seguintes factos que se julgam como provados:
11. Foi condição para a celebração do contrato referido em 1. que a sociedade inquilina tivesse um fiador como garante das suas obrigações.
12. Na fase pré negocial a sócia gerente IA indicou que a sua mãe poderia ser fiadora, o que esta aceitou, dando os seus elementos de identificação, assinando o contrato com os demais intervenientes e assumindo o apoio à iniciativa comercial da sua filha e da sua sócia, esta última também pessoa do seu relacionamento pessoal.
13. Fator relevante para a escolha do locado foi a proximidade deste para com a residência da ré, pouco mais de cem metros, de modo a existir um apoio mútuo entre a mãe e a filha.
Sobre o mérito da decisão:
Na sentença recorrida absolveu-se a ré do pedido por se ter entendido, essencialmente, que, devendo a fiança resultar de contrato no qual seja prestada por escrito a declaração do fiador, a inexistência, no contrato, de uma declaração negocial da ré, nos termos da qual esta se constitua perante e para com os senhorios, fiadora das obrigações emergentes do contrato para a locatária, leva a concluir pela invalidade da fiança.
Adiante-se, desde já, que esta solução, pelas razões que passamos a expor, não merece censura.
A fiança - garantia pessoal pela qual o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor - deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal – arts. 627º, nº 1 e 628º, nº 1 do CC[1] (diploma a que respeitam as normas doravante referidas sem menção de diferente proveniência).
O contrato de arrendamento aqui discutido foi celebrado em 27.6.2004, estando em vigor o RAU, introduzido pelo DL nº 321-B/90, de 15 de Outubro, que exigia no art. 7º, nº 1, a sua celebração por escrito.
Daí que essa exigência de forma igualmente abrangesse, então, a válida constituição de fiança que garantisse as obrigações da locatária desse arrendamento.
Sendo assim, e embora o nº 1 do art. 217º do mesmo código admita que a declaração negocial expressa seja feita por palavras, por escrito ou por qualquer outro meio direto de manifestação da vontade, no caso só uma declaração por escrito poderá satisfazer a exigência legal para a constituição da fiança.
E não só a mera observância da forma escrita bastava, exigindo-se ainda que a declaração reduzida a escrito fosse expressa, portanto, sem possibilidade de aplicação, no caso, do nº 2 do citado art. 217º.[2]
Por isso, a simples intervenção da apelada assinando um documento onde se menciona a sua participação como fiadora no contrato que dele consta, não traduz uma declaração tácita de prestação de fiança que seja válida; melhor, embora possa traduzir uma declaração tácita de fiança, não pode ser aceite com essa eficácia por a lei exigir para tal uma declaração expressa.
E não é uma declaração escrita expressa porque do documento não constam palavras escritas imputadas à apelada que tenham o necessário e adequado significado de assunção, por ela, de uma obrigação nos termos descritos no citado nº 1 do art. 627º.
Impõe-se ainda salientar que a cláusula 3ª, ao referir que vigorarão todas as demais condições impostas pelo CC e pelo RAU, não é sustentáculo idóneo para se ter como prestada pela apelada uma declaração de fiança; essa estipulação contratual insere-se em contexto onde apenas se versam direitos e obrigações do locador e do locatário que tenham a cobertura imperativa desses diplomas legais, o que não abrange a fiança.
Daí que a fiança seja nula por inobservância da forma legalmente prescrita, por força do art. 220º.
Nas conclusões 4ª e 5ª o apelante defende que, ao invocar um vício formal do contrato, a apelada incorre em abuso do direito, pelo que se não pode aceitar a tentativa de se eximir às obrigações que dele resultam para si.
Sendo a fiança nula por falta de forma, esta tese do apelante remete-nos para a questão da relevância das chamadas “inalegabilidades formais”, entendidas, nas palavras de Menezes Cordeiro[3] como situações em que a invocação da nulidade do negócio jurídico, por falta de forma, não deve ser admitida por envolver um abuso do direito contrário ao princípio da boa fé.
Sobre o problema salienta este Autor a dificuldade de aderir sem reservas a um entendimento que reconheça ampla relevância a estas inalegabilidades, por razões que passam, nomeadamente, pela sua difícil conciliação com o conhecimento oficioso da nulidade pelo juiz e por ser inadmissível a redução teleológica[4] quanto a normas formais[5].
Acabando por aceitar a inalegabilidade formal, Menezes Cordeiro entende, porém, que a mesma, para além dos requisitos que são próprios do “venire”[6], requer ainda a verificação de outros, a saber:
- serem apenas dos intervenientes no negócio os interesses em discussão;
- a situação de confiança ser censuravelmente imputável à pessoa a responsabilizar;
- o investimento de confiança ser sensível e dificilmente assegurado por outra via.[7]
É de dizer, pois, que só residualmente a nulidade do contrato poderá ser desconsiderada por ser abusiva a sua invocação; será necessário verificar-se uma situação de confiança que seja justificada, criada censuravelmente por quem invoca a nulidade e na qual o outro contraente tenha investido de forma sensível, sem que esse investimento de confiança tenha possibilidade de ser assegurado por outra via.
Este condicionalismo aproxima-se das situações em que o abuso do direito releva por integrar um “venire contra factum proprium”, sendo o factum proprium o comportamento daquele que concorreu censuravelmente para a celebração de contrato nulo e criou na outra parte, pelas circunstâncias concretas, a convicção que não invocaria mais tarde a nulidade.
O abuso do direito consistirá, pois, na invocação de uma nulidade formal que antes se provocou ou para a qual se contribuiu de forma relevante e censurável.
Entendemos, porém, que no caso concreto se não verifica um circunstancialismo que possa ser subsumido às noções teóricas supra resenhadas.
Cabia ao apelante o ónus de provar as circunstâncias capazes de impedir uma eficaz invocação da nulidade pela pessoa que interveio no contrato na veste de fiadora – cfr. art. 342º, nº 2 do CC.
Mas não se provou que a apelada haja contribuído censuravelmente para a situação de confiança em que o apelante investiu – investimento este que se manifestou ao contratar, o que não teria feito se não houvesse um fiador.
Aceitou, é certo, figurar no contrato naquela veste, dando os seus elementos de identificação e assinando o contrato com os demais intervenientes; mas nada revela que tenha sido da sua autoria a redação dada ao contrato – ou que de algum modo tenha contribuído para ela -, redação que, como se viu, está viciada em termos geradores de nulidade por razões formais.
Nada mostra que tenha contribuído, e muito menos culposamente, para a inobservância da forma legalmente prescrita para a assunção da obrigação de fiança no contrato em causa, nem que haja concorrido para a formação de qualquer razoável convicção no sentido de que a nulidade da fiança jamais seria por si invocada.
E, sem isso, não pode dizer-se que o exercício do direito que lhe assiste de invocar a correspondente nulidade seja ilegítimo por exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé – art. 334º do C. Civil.
Diga-se, finalmente, que o apoio que deu à iniciativa comercial da sua filha e da sócia desta – facto nº 12 - é explicado pelos laços familiares que a ligam àquela, sem qualquer reflexo causal na celebração do contrato.
Assim, não são de acolher as razões invocadas contra o mérito da decisão impugnada.
IV – Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente, mantendo-se a sentença impugnada.
Custas a cargo do apelante.
Lx. 10.02.2015
(Rosa Maria M. C. Ribeiro Coelho)
(Maria Amélia Ribeiro)
(Graça Amaral)
[1] Segundo o nº 1 do art. 628º “A vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.” [2] Sendo o qual “O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.” [3] Em “Tratado de Direito Civil”, vol. V, 2011, págs. 299 e segs.. [4] Entendida como “a operação interpretativa que permite restringir o alcance de uma norma quando se verifique que o escopo por ela visado já foi alcançado” – Ibidem, pág. 308 [5] Nas palavras do mesmo Autor, “As normas relativas à forma não têm fins claros. Elas valem por si e pela segurança que assumem emprestar aos negócios envolvidos. Basta ver que negócios importantes são consensuais, enquanto outros, pouco significativos, se sujeitam à forma solene máxima. As normas formais serão, assim, normas plenas. Com uma consequência relevante: não admitem redução teleológica .” – ibidem, pág. 308 [6] “ a situação de confiança; a justificação para a confiança; o investimento de confiança e a imputação de confiança ao responsável que irá, depois, arcar com as consequências.” – ibidem, pág, 311. [7] Ibidem, pág. 311