DELIBERAÇÃO ASSOCIATIVA
DESTITUIÇÃO
DANOS
Sumário

I – Em situações como a dos autos, em que o processo deliberativo normal mente utilizado pela sociedade decorria da prévia tomada da decisão pelo accionista largamente maioritário (detentor de 99,98% do capital social), sendo, de seguida, elaborada pelo presidente da mesa da assembleia geral, uma acta, como se aquela decisão tivesse sido obtida numa assembleia geral, e vindo a correspondente lista de presenças a ser assinada subsequentemente, de forma individual e sucessiva, pelos restantes accionistas, não podem ter-se como inexistentes as deliberações constantes dessa acta.
II - A acta em causa constitui um acto adequado, na sua aparência material, a vincular a sociedade pelos efeitos jurídicos da deliberação nela constante, verificando-se o “corpus” do negócio jurídico correspondente a uma deliberação social. E, além dessa aparência, a verdade é que, cada um dos accionistas, assinando correspondentemente a lista de presenças, manifestou a aprovação dessa deliberação.
III- Esse processo constitutivo – desde que se verifica aprovação da decisão pela unanimidade- corresponde ao de uma deliberação unânime por escrito.
IV – Com efeito, as deliberações unânimes por escrito, a que se refere a 1ª parte do nº 1 do art 54º CSCom, podem ser formadas em assembleia universal espontânea, mas, as mais das vezes, são formadas sem reunião de assembleia.
V -E isto significa que, não obstante ser falsa a verificação de uma assembleia geral da R. no dia mencionado na acta – pois que, nesse dia e hora e local, os accionistas da R. não se reuniram para deliberarem como aí consta – nem por isso essa acta deixa de conter e documentar a deliberação da R. em apreço - a da recondução antecipada dos orgãos sociais da mesma para o mandato de 2013/2016 - constituindo essa deliberação uma deliberação unânime por escrito.
VI – De todo o modo, sempre se mostraria inadmissível que a R. se pretendesse prevalecer da inexistência e a nulidade dessa deliberação com fundamento na falsidade da acta e do respectivo modo de revelação, quando foi ela que, sem conhecimento do A., deu causa às irregularidades dessa forma – admitir esse procedimento implicaria abuso de direito na modalidade de inalegabilidade formal.
VII -Mas tambem na modalidade de “venire contra factum proprium”, pois que a R. aceita a existência e validade de deliberações anteriores tomadas nas mesmas condições do que a que está em causa nos autos, quando tal lhe é conveniente, e rejeita a existência e validade desta deliberação, por tal não lhe convir.
VIII - Por aplicação do disposto no art 272º e 275º/2, ex vi do disposto no art 278º, todos do CC, na pendência do prazo as partes estão obrigadas a proceder segundo a boa fé, de modo a não comprometerem a integridade do direito da outra, o que implica que não devam proceder à «sabotagem» do termo - se a verificação deste for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se o mesmo por verificado.
IX - O que significa que a R. não podia - sob pena de ilicitude – ter provocado a destituição do A., sem justa causa, antes do fim do mandato, porque desse modo impediu que este mantivesse a qualidade de administrador no momento da respectiva renovação. Só poderia destituir o A. antes do fim do mandato em curso se, para tanto, tivesse justa causa.
X –Quando a R. utiliza um acto lícito – a destituição do administrador sem justa causa antes do termo do respectivo mandato – para atingir um resultado contrário à boa fé – obstar a que aquele mantenha a qualidade de administrador no fim do mandato, de modo a que este possa ser renovado - está também a agir em abuso de direito.

Texto Integral

Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I - JL, em 28/2/2013, intentou  a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra CS Hotels, Golf & Resorts, S.A., pedindo que seja declarada a inexistência de justa causa da destituição de administrador a que a R. procedeu e, em consequência, seja a mesma condenada a pagar-lhe:

  - indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu em virtude dessa destituição, no montante global de 952.600,00 euros, correspondente ao valor da remuneração mensal fixa que  receberia até ao final de Dezembro de 2012 e ao valor da remuneração mensal fixa que receberia a partir daquela data até ao final do mandato (Dezembro de 2016), acrescida de juros à taxa legal, contados de 19/11/2012 até efectivo e integral pagamento;

  - indemnização pelos danos não patrimoniais que lhe causou em virtude do modo como decorreu esse processo de destituição, danos esses a fixar em montante não inferior a 50.000,00 €, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;

- as quantias devidas a titulo de despesas de representação incorridas ao serviço e por conta da R., no montante de 381,10 €, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, ter sido nomeado administrador da R. em 1/7/2011 para o mandato então em curso – quadriénio 2009/2012 - tendo-lhe sido atribuída, entre o mais, uma remuneração líquida mensal paga 14 meses por ano de € 10.000,00, sendo que na Assembleia Geral em que foi deliberada tal designação, foi deliberada a renúncia aos cargos de Presidente e Vogal do Conselho de Administração da R. de Carlos e Ana M, passando o Conselho de Administração da mesma a ser composto pelo A. e por Virgínia. O capital da R. é distribuído pelo referido Carlos, que detém 19.996 acções (99,98%), uma acção para a referida Virgínia, sua mulher, uma acção para Joana, filha do casal, uma acção para a referida Ana M uma acção para o marido desta, Dinis. Em virtude do bom desempenho do A. na administração e do facto do mesmo ter vindo a receber desde o início de 2012 diversos convites para sair do “Grupo CS”, Carlos, em Março de 2012, fez-lhe um convite para se manter no cargo de administrador para além de 2012, consequentemente no quadriénio de 2013/2016, convite que o mesmo aceitou. Por deliberação tomada em reunião da Assembleia Geral da R. de 2/5/2012 foi aprovada, por antecipação relativamente ao termo do mandato em curso, a recondução do A. como administrador para o quadriénio de 2013/2016, recondução que foi assumida pela R., interna, e também externamente, tendo a mesma logo diligenciado a inscrição no registo comercial da referida deliberação. Porém, em Agosto de 2012, Carlos informou o A., que a R. e várias sociedades do “Grupo CS” (que se encontravam em situação de iminente insolvência) seriam vendidas a um Fundo gerido pela “ECS Capital” e que tal Fundo tinha imposto como condição do negócio o afastamento dos administradores que à data exercessem os respectivos cargos na R. com mandato até final de 2016. Em face desta informação, o A. mostrou-se disponível para acertar a sua saída imediata da administração mas, em função de uma indemnização que deveria ter em conta as remunerações que auferiria até final do mandato – até 2016. Ora, Carlos, não apenas não fez evoluir tais negociações, como iniciou em 12/9/2012 um processo punitivo e persecutório ao A., com vista a que o mesmo procedesse à renúncia ao referido cargo. Assim, e entre o mais, em 12/9/2012 diligenciou que fosse requerida junto da CRCom o cancelamento da inscrição no registo da deliberação que reconduziu o A. como administrador para o quadriénio de 2013/2016; em 20/9/2012 a Assembleia Geral da R. nomeou Carlos como Presidente do Conselho de Administração da R até ao final do mandato em curso – 2012 - tendo alterado os estatutos da sociedade de modo a que ele pudesse sozinho vincula-la; em 28/10/20012, em reunião do Conselho de Adminstração avocou o referido Carlos para si todos os pelouros, incluindo o de representação, deixando sem nenhum  o A.; e em 5/11/2012 a R. procedeu à destituição do A. com alegada «justa causa objectiva». É neste contexto que o A. requer na presente acção a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, aqui atendendo ao modo como o próprio processo de destituição ocorreu.

A R. contestou, tendo alegado, em termos genéricos, que a deliberação que prorrogou o mandato do A. como administrador não existiu, porque a Assembleia Geral referida na acta não teve nunca lugar, tendo sucedido que os respectivos accionistas só mais tarde assinaram a lista de presenças, sendo que, quando o fizeram, nenhum tinha lido a acta. Concretamente, refere que a recondução a que o A. alude foi por ele sugerida e, sendo certo que o mesmo falou do “assunto” com Carlos, foi ele quem promoveu junto do Presidente da Mesa da Assembleia Geral, Vasco, a elaboração de uma acta da Assembleia Geral da sociedade que concretizasse aquele objectivo. Precisa que nenhum dos accionistas subscreveu ou assinou a acta referente a essa assembleia, e até finais de Julho/princípios de Agosto nenhum deles a tinha lido, sendo que, pelo menos, três deles, só tiveram conhecimento da mesma e do seu teor no dia 23/9/2012, aquando da Assembleia Geral universal da R. que revogou a aparente deliberação social em causa, e só em finais de Julho/princípios de Agosto, quando se procedeu à revisão e organização da documentação para efeito de auditoria jurídica é que o referido Vasco promoveu a assinatura, de forma individual e sucessiva, pelos accionistas, da correspondente lista de presenças, pelo que não se pode convolar aquela deliberação numa deliberação unânime por escrito. Sustenta após, que essa deliberação, a não se ter como inexistente, sempre será nula, invocando o disposto no art 56º/1 al a) e d) CSC, e referindo que o respectivo conteúdo derroga as disposições imperativas dos arts 391º/3 CSC e 403º/5 e, a assim não se entender, sempre será ineficaz, na medida em que a sua eficácia dependia de o A. se manter na cargo de administrador no final de 2012, e isso não sucedeu, porque foi destituído com justa causa antes dessa data. Justa causa que sempre existiria na medida em que o A. violou com dolo a obrigação de observar deveres de lealdade, visto que pretendeu obter uma vantagem patrimonial a que sabia não ter direito, pois que foi acompanhando as negociações com o Fundo sabendo da exigência do mesmo de que à data dos Acordos/Contratos a que se chegasse todos os membros dos corpos sociais de todas as sociedades do “Grupo CS” haveriam de ter cessado a sua ligação com as mesmas, alegando ainda que foi a pedido insistente do mesmo que Vasco promoveu o registo da deliberação em causa na CRCom. Por assim ser, entende que a R. nada devia ao A., mas, para evitar discussões desnecessárias, pagou-lhe as remunerações que lhe eram devidas se o mandato se tivesse concluído em 31/12/2012, tendo-lhe pago no dia 27/2/2013 a quantia de € 38.096,57, correspondente ao montante liquido relativo às remunerações dos meses do Novembro e Dezembro e aos subsídios de Férias e de Natal de 2012, apenas não lhe tendo pago as despesas no montante de € 381,00, que o mesmo também reclamava, por deficiência dos serviços.

 Replicando, o A. pugnou pelo afastamento da invocada inexistência e invalidade da deliberação,  pondo em relevo que da correspondência electrónica junta aos autos resulta que Carlos e Virgíniativeram conhecimento da acta da suposta Assembleia Geral da R. em Maio de 2012 e que foi publicitada no interior da R. a certidão comercial da mesma com o registo da recondução dos órgãos sociais, defendendo que, não tendo ele conhecimento da não realização da Assembleia Geral a que se refere a acta em referência, mesmo que ela não tenha tido lugar e a acta seja falsa, a respectiva deliberação deverá reconduzir-se a uma deliberação unânime por escrito. Relativamente ao valor que lhe foi pago, impugna os cálculos vertidos no doc nº 5 junto com a contestação, entendendo ter sido pago por defeito no que ao valor em causa respeita.

Proferido despacho saneador e seleccionada a matéria de facto, veio a ter lugar o julgamento, após o qual, produzidas que foram por ambas as partes alegações de direito, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a R. a pagar ao A. as quantias devidas a titulo de despesas de representação, no montante de 381,10 euros, acrescidas de juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento, no mais  absolvendo a R. do pedido, condenando ainda A. e R. nas custas, na proporção do decaimento.

O A. requereu a reforma da sentença quanto a custas, entendendo que, nos  termos e para os efeitos dos números 2 e 3 do artigo 356° do CPC, a responsabilidade  pelas referentes à quantia de E 61.771,67 deveria ter sido assacada à R., referindo que o pagamento que lhe foi feito referente às retribuições até ao final do mandato de 2012 -embora apenas no montante líquido de € 38.096,57, correspondente à quantia bruta de E 61.771,67 -  foi por ele recebido já na pendência da presente acção. Assim, no que respeita à referida parcela do pedido, o tribunal devia ter considerado que a R. deu causa a acção, pois se o pagamento tivesse sido efectuado atempadamente, a acção não teria, quanto àquela concreta parcela, sido intentada.

A R. respondeu - já nas alegações do presente recurso – opondo-se ao requerido, na reafirmação de que o pagamento ao A. não foi feito na pendência da acção.       

O tribunal de 1ª instância indeferiu a pretendida reforma, referindo que o pagamento da parcela em causa ocorreu antes da propositura da acção, mais precisamente no dia anterior, e que a circunstância de o A, provavelmente, só ter tido conhecimento desse pagamento já depois da propositura da acção, não releva em termos de considerar a inutilidade superveniente nos termos por ele propostos.

II – O A. apelou, tendo concluído as respectivas alegações nos seguintes termos:

A.Matéria de facto

Quesitos 2º a 4°e 6° da base instrutória

1-Os elementos probatórios contidos nos autos e a argumentação apresentada pelas Partes impunham que o Tribunal a quo tivesse formulado outras (e sobretudo outro tipo de) respostas aos quesitos em apreço, assentes num conjunto de premissas e conclusões sustentadas por documentos não impugnados e por depoimentos claros e prestados em sentido uniforme;

2-Em primeiro lugar, resultou demonstrado nos autos que o Senhor Carlos era o accionista maioritário da Recorrida (99,98% do capital social, sendo detentor de todas as acções menos 4) e era quem, na prática, decidia os destinos da sociedade, sendo certo que os restantes accionistas foram por ele escolhidos por serem pessoas da sua inteira confiança (mulher, filha e amigos íntimos), detendo participações sociais simbólicas e por conta dele, o "dono da empresa', apenas para garantir os formalismos legais associados à constituição e funcionamento de uma sociedade anónima (cfr. alínea F) da matéria de facto assente; declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 01h01 m50 a 01h07m30), VASOUES (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 2m30 a 4m00 1 12m20 a 25m30), Manuel (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 —14m30 a 15m35131m00 a 38m10), BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 13m00 a 13m35 1 31m30 a 32m30) e CARLOS FERRERA (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 3m45 a 4m20));

3-Em segundo lugar, e tal como confessado pela Recorrida no artigo 24.° da sua contestação, as decisões do Senhor Carlos eram, por via de regra, vertidas em actas de reuniões de assembleias gerais da Recorrida que não se realizavam, limitando-se os restantes accionistas a participar no processo de formalização das referidas decisões, nomeadamente assinando a posteriori as correspondentes listas de presenças ("papéis", nas elucidativas palavras da testemunha VASQUES), sendo essa a maneira de formalizar o que ele, o "dono da empresa", queria/determinava, pelo que nada houve de estranho no processo conducente à formalização da deliberação de reconduzir o Recorrente para o mandato 2013/2016, designadamente a elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia geral que não teve lugar e a assinatura sucessiva e individual da respectiva lista de presenças (cfr. artigo 24.° da contestação; declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 27m15 a 32m40 101h01m50 a 01h07m30 j 01h15m00 a 01h18m30), VASOUES (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 4m30 a 7m30 1 12m20 a 25m30) MARGARIDA (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 1h01m00 a 1h04m55 1 1 h22m00 a 1 h22m50) e PAULINO (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 50m00 a 55m35));

4-Em terceiro lugar, a decisão de reconduzir o Recorrente para o quadriénio 2013/2016, inclusivamente a elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia geral da Recorrida que o deliberasse formalmente e o subsequente registo da deliberação, era do conhecimento e foi autorizada pelo Senhor Carlos (cfr. alíneas M), N) e O) da matéria de facto assente, alínea Q) da matéria de facto assente e e-mail e carta para os quais a mesma remete, alínea T) da matéria de facto assente e e-mail e carta para os quais a mesma remete; Documento n.° 2 junto com a contestação e no Documento n.° 39 junto com a réplica; declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 11m30 a 13m00 1 16m00 a 18m00), MARGARIDA    (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 15m30 a 16m05));

5-A Senhora MARGARIDA confirmou que o tema da recondução do Recorrente para o quadriénio 2013/2016 havia sido discutido entre o Recorrente e o Senhor Carlos, tendo o mesmo dado instruções para "regularizar" a situação com o Senhor Dr. Vasco, advogado interno e Presidente da Mesa da Assembleia Geral, o que foi exactamente o que aconteceu, com o conhecimento, consentimento e autorização do "dono da empresa";

6 -A "regularização da situação com o Vasco" não poderia significar outra coisa que não a recondução do Recorrente para o quadriénio seguinte, na medida em o Senhor Carlos bem sabia que o mandato em curso terminava em 31 de Dezembro de 2012, porquanto ele próprio havia sido, no decurso do dito mandato, substituído pelo Recorrente naquele concreto cargo de administrador da Recorrida;

7-A tese avançada pela Recorrida (o Recorrente teria promovido a sua "auto-recondução", escondendo dos accionistas, desde logo do Senhor Carlos, as respectivas diligências adoptadas para o efeito) resulta completamente contrariada pela circunstância, devidamente demonstrada nos autos, de o Senhor Carlos ter (1) negociado a saída do Recorrente da empresa mediante o pagamento de uma indemnização que pressupunha o mandato de 2013/2016 (cfr. documento junto aos autos pela Recorrida em requerimento de 14 de Março de 2014 e completado pelo Documento junto pelo Recorrente na audiência de julgamento de 20 de Março de 2014; declarações prestadas por (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 1h07m00 a 1h23m30); (ii) diligenciado junto do fundo que iria adquirir a CS Hotels a manutenção do Recorrente na administração da empresa (declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 48m50 a 51m40 11h39m20 a 1h40m30) e MARGARIDA (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 38m00 a 41m45 1 1h26m00 a 1h30m15)); (iii) convidado o Recorrente para um cargo de gestão de um hotel na Madeira que continuaria no perímetro de activos dele, Carlos (declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 48m50 a 51m40 11 h39m20 a 1h40m30) e MARGARIDA (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 38m00 a 41m4511h26m00 a 1h30m15));

8-A referida tese é também desmontada pelo facto de o processo de recondução ter decorrido, no que respeita ao Recorrente, com total transparência e boa fé, tendo sido amplamente difundido quer fora, quer dentro da empresa Recorrida e recebido com naturalidade por todos quantos se relacionavam com o Recorrente e com a Recorrida (cfr. Documento n.° 39 junto com a réplica; alínea J) da matéria de facto assente, da qual resulta que o registo da deliberação de recondução foi promovido em Maio de 2012, alínea II) da matéria de facto assente e Documento n.° 40 junto com réplica, dos quais resulta que o Senhor Dr. Vasco remeteu uma mensagem de correio electrónico para todos os detentores de cargos relevantes na empresa, remetendo-lhes a certidão do registo comercial na qual se encontra vertida a recondução do Recorrente; declarações prestadas nos autos por CARLA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 4m40 a 11m20), MANUEL (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 8m00 a 15m35), BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.05.2014 — 15m30 a 24m45), J OLIVEIRA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 4m45 a 7m45), CARLOS (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 5m00 a 18m50) e PEDRO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 5m30 a 16m00));

9- De resto, várias testemunhas que exercem ou exerceram funções de relevo na Recorrida vieram aos autos afirmar que uma decisão deste género não poderia ter sido tomada sem o conhecimento e consentimento do Senhor Carlos (cfr., entre outras, declarações prestadas por BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 28m30 a 31m15) e CARLA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 17m20 a 19m00));

10-Em quarto lugar, resulta demonstrado nos autos que a acta da suposta reunião de 2 de Maio de 2012 foi elaborada pelo Senhor Dr. Vasco, após conversas manadas entre ele e o Recorrente, sendo que os concretos termos em que a mesma foi redigida foram criação exclusiva do referido Senhor Dr. Vasco (cfr. declarações presadas nos autos por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 8m20 a 9m00 ( 1h07m30 a OlhO9m00));

11-Em quinto lugar, e como já resultava do admitido no artigo 26.° da contestação, a prova produzidas veio confirmar que, ao assinarem a lista de presenças referente à (acta da) reunião da assembleia geral da Recorrida de 2 de Maio de 2012, os accionistas pretenderam formalizar o que aí houvesse sido (rectius, fosse dado por) decidido (cfr. artigo 26 da contestação e resposta dada ao quesito g.' da base instrutária; declarações prestadas nos por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 1h24m50 a 1h40m00) e VASQUES (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 12m20 a 25m30));

12-Em conclusão, a ponderação de todas estas premissas, conclusões e elementos probatórios obrigava o Tribunal a quo a responder nos seguintes termos: (1) quesito 2.° e  3° - «Provado que o Autor alertou o Senhor Carlos para o facto de o mandato estar quase a terminar, o qual deu instruções para o Autor falar com o Senhor Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, para regularizar a situação»; (ii) quesito 4.° - «Provado que, em momento anterior a Maio de 2012, o Senhor Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, foi incumbido de elaborar uma acta na qual se encontrasse vertida a decisão de reconduzir o Autor para o mandato de 2013/2016, o que fez, sendo que o conteúdo do referido documento foi inteira e exclusivamente da sua autoria»; (Ui) quesito 6.° - «Provado que o Senhor Carlos e a Senhora Virgínia tinham conhecimento da acta a que alude o quesito 1.0 e do registo da deliberação que nela constava pelo menos desde 24 de Maio de 2012 e que os restantes accionistas só tiveram conhecimento da existência da acta em causa (ainda que não do seu teor) em finais de Julho, princípios de Agosto, no momento em que assinaram a respectiva lista de presenças».

Quesito 11.° da base instrutória

13-A Recorrida não demonstrou, como lhe competia, a factualidade vertida no presente quesito, porquanto nenhum elemento probatório aponta nesse sentido (designadamente nada resultou nesse sentido das declarações prestadas por Vasco (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 36m00 a 38m30));

14- Pelo contrário, o quesito em causa resulta infirmado da análise do Documento n.° 2 junto com a contestação e do Documento n.° 39 junto com a réplica;

15- Assim sendo, os elementos probatórios não permitiam ao Tribunal a quo considerar demonstrado o quesito em causa, o qual deveria ter sido dado como não provado.

Quesito 16.° da base instrutória

  16 - O Recorrente peticionou a condenação da Recorrida no pagamento de uma indemnização, decorrente da destituição sem justa causa, no valor correspondente à: (i) remuneração mensal fixa que o Recorrente receberia até ao final de 2012, ou seja, € 63.440,00; e à (ii) remuneração mensal fixa que o Recorrente receberia a partir daquela data até ao final do mandato para o qual havia sido reconduzido (final de 2016), ou seja, € 888.160,00;

17 - Posteriormente à apresentação da petição inicial a juízo, a Recorrida pagou ao Recorrente a quantia líquida de € 38.751,70, supostamente correspondente ao montante bruto de € 61.771,67, alegadamente relativa às remunerações que este receberia até ao final de Dezembro de 2012;

18 - Para além de não resultar cabalmente esclarecido nos autos a que título foi efectuado aquele pagamento (cfr. Documento n.° 4 junto com a contestação, do qual resulta que os valores em causa terão sido pagos ao Recorrente a titulo de «Premio Ocasional»), a verdade é que o montante pago é inferior ao que seria devido até 31 de Dezembro de 2012;

19- Assim sendo, impunha-se uma outra resposta ao quesito 16.° da base instrutória, nomeadamente nos seguintes termos: «Provado que a demandada pagou ao demandante apenas a quantia líquida de € 38.751,70, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, a titulo das remunerações devidas até 31 de Dezembro de 2012, não tendo pago a quantia de 381,10 euros, referente ao reembolso das despesas de representação, e a quantia relativa às remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros).».

Quesito 17.° da base instrutória

20 –E entre a apresentação da petição inicial a juízo e a data da sentença mediaram quase dois anos, pelo que a resposta ao presente quesito obrigava a um esforço interpretativo, no sentido de tornar actual e útil o alegado pelo Recorrente;

21-.Por força das funções desempenhadas para a Recorrida, o Recorrente auferiu e auferiria a remuneração mensal fixa líquida, paga catorze meses por ano, de €10.000,00 (dez mil euros), sendo certo que para além do referido vencimento, o Recorrente tinha, ainda, direito a uso de viatura de função (BMW topo de gama) e seguro de saúde (cfr. alíneas H) e I) da matéria de facto assente e resposta ao quesito 15.° da base instrutória);

22-Resulta evidente dos elementos probatórios constantes dos autos que o impacto socioeconómico da destituição promovida sem justa causa pela Recorrida foi tremendo para o Recorrente;

23- O rendimento do Recorrente sofreu um decréscimo superior a 85%, e isto sem sequer tomar em consideração a perda do uso de telemóvel, viatura (inclusivamente para uso pessoal), combustível e de seguro de saúde, complementos que, naturalmente, possuem relevantissima expressão económica, encontrando-se a prestar serviços de consultoria por sua conta, o que não se assemelha, nem de perto nem de longe, ao estatuto socioprofissional que detinha no Banco Popular e, mais tarde, e para o que aqui releva, num grupo com projecção nacional e internacional como era o Grupo CS (cfr. declaração de rendimentos de 2013 entregue á Autoridade Tributária e Aduaneira junta aos autos na audiência de julgamento de 27 de Maio de 2014; declarações prestadas por CARLA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 40m00 a 43m50), BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 —35m45 a 37m05), JOSÉ EDUARDO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 2m30 a 11m00) e PEDRO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 21m00 a 25m50);

24- Em face de todos estes elementos, impunha-se uma outra resposta ao quesito 17.° da base instrutória, nomeadamente nos seguintes termos: «Provado que, a partir de Janeiro de 20Í3, o Autor passou a prestar, a título individual, serviços de consultoria e que, quando comparado com o rendimento fixo que auferia na Ré, o rendimento auferido pelo Autor após a sua destituição decresceu em mais de 85%.».

Alteração da Decisão Sobre a Matéria de Facto /Anulação da Sentença

25-A alteração às respostas dadas pelo Tribunal a quo não obrigavam o Digníssimo Tribunal a qualquer esforço processual acrescido, tratando-se, apenas, de, a partir do alegado pelas Partes e da prova produzida, retirar e conjugar ilações que permitissem concluir no sentido da alteração à decisão de facto nos termos peticionados;

26-Caso assim não se entenda, o Recorrente peticionará — peticiona - ao Digníssimo Tribunal a ampliação da matéria de facto, porquanto, ao não considerar e valorar um conjunto de factos relevantes para a boa decisão da causa, desde logo levando-os ao rol de factos considerados provados, o Tribunal a quo não deu cumprimento ao poder-dever vertido nas alíneas a) e b) do n.° 2 do artigo 5.° do Código do Processo Civil;

27- Os factos integrados na ampliação assumem, de forma evidente, a maior relevância para a boa decisão da causa, afigurando-se, instrumentais, concretizadores ou complementares de factos essenciais, os quais foram devidamente invocados pelo Recorrente e admitidos / confessados pela Recorrida (ou, pelo menos, sujeitos ao seu contraditório);

28- O n.° 1 do artigo 662.° do Código de Processo Civil atribui ao Tribunal da Relação o poder-dever de alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto num conjunto alargado de circunstâncias, entre elas, a omissão, pela primeira instância, de consideração e valoração de factos instrumentais, concretizadores ou complementares;

29- Nesses termos, o Tribunal da Relação encontra-se em condições de, sem necessidade de determinar a anulação da sentença recorrida, modificar a decisão de facto, considerando ainda assente a seguinte factualidade: (1) «A lista de presenças relativa à reunião da assembleia geral da Recorrida de 2 de Maio de 2012 foi assinada por todos os accionistas da Recorrida, nos termos do documento a fls. ... (cfr documento junto com o requerimento de 6 de Maio de 2014)»; (ii) «O procedimento habitual seguido no Grupo CS e na Recorrida passava pela elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente»; (iii) «A recondução do Recorrente no cargo de administrador da Recorrida para o quadriénio 2013/2016 foi efectivamente inscrita no registo comercial, nos termos da certidão permanente impressa em 29 de Agosto de 2012, Inscrição 7 -Ap. 59, de 25 de Maio de 2012, a fls.    (cfr. documento n.° 9 junto com a petição inicial)»;

30- Caso assim não se entenda, deverá o Digníssimo Tribunal considerar indispensável a ampliação da matéria de facto, passando a contemplar a factualidade acima descrita, e, nessa sequência, determinar a anulação da sentença recorrida, tudo nos termos e para os efeitos da alínea c) do 2 e alínea c) do n.° 3 do artigo 662.° do Código de Processo Civil.

B. MATÉRIA DE DIREITO

B.1.  Da Deliberação de Recondução do Recorrente para o Quadriénio 2013/2016

Da existência de, no mínimo, uma deliberação unânime por escrito:

31- Quer a acta de 2 de Maio de 2012, quer a respectiva lista de presenças encontram-se devidamente assinadas por todos aqueles que tinham que o fazer, tivesse a reunião tido lugar: a acta encontra-se assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral e por quem o teria secretariado, enquanto a lista de presenças - onde expressamente se diz que a mesma respeita a assembleia geral realizada em 2 de Maio de 2012 - se encontra assinada por todos e cada um dos accionistas;

32- Os accionistas sabiam o que assinavam: uma lista de presenças referente a uma suposta reunião da assembleia geral da Recorrida realizada em 2 de Maio de 2012;

33 - Da mesma forma que sabiam que tal assinatura tinha um efeito jurídico, de resto, por eles pretendido: a "regularização" formal das deliberações anteriormente tomadas, inclusivamente a(s) datada(s) de 2 de Maio de 2012;

34- Todos estavam conscientes que aquele acto (assinatura da lista de presenças) produziria efeitos (regularização formal de deliberações) e não só se conformaram com essa consequência directa e necessária, com a desejaram sem enganos;

35- A vontade dos sócios foi inequivocamente expressada através da assinatura da lista de presenças: a vinculação ao conteúdo da acta respectiva e ao sentido das decisões aí vertidas;

36 - As assinaturas apostas na lista de presença devem ser qualificadas como declarações de voto (que constituem uma modalidade de declarações negociais) — os accionistas minoritários aderiram, irrestrita e incondicionalmente, ao voto também ele já expressado pelo accionista maioritário;

37 - Assim sendo, a formalização destes documentos, nos termos acima expostos, sempre configuraria uma das formas de deliberação que (nos termos do disposto no artigo 54.°, n.° 1, 1.a parte, ex vi do artigo 373.°, ambos do CSC) a lei coloca à disposição dos accionistas das sociedades anónimas: a deliberação unânime por escrito;

38 - Assim sendo, deverá o Digníssimo Tribunal considerar ter sido validamente tomada a deliberação de recondução do Recorrente para o quadriénio 2013 / 2016, por ter assumido, no limite, a forma de deliberação unânime por escrito.

Dos vícios da deliberação de recondução) invocados pela Recorrida:

39 - Em primeiro lugar, não colhe a tese, expendida a dado passo pela Recorrida, de que a deliberação de recondução seria nula por violação da alínea a) do n.° 1 do artigo 56.° do CSC, uma vez que o facto de a assembleia geral não ter reunido no dia 2 de Maio de 2012 não exclui que se tenha tomado uma deliberação unânime por escrito (cfr. n.° 1 o artigo 54.° do CSC);

40 -  Em qualquer caso, sempre faltaria legitimidade (activa) à Recorrida para invocar o vício em causa (cfr. n.° 1 do artigo 60.° do CSC);

41 - Perante uma deliberação nula, apenas uma de duas soluções seria admissível: ou a respectiva renovação, sendo possível, ou a promoção da declaração judicial da respectiva nulidade, mediante a instauração da competente acção (cfr. n.° 1 do artigo 57.° do CSC). Mas já não a revogação da deliberação, acto que pressupõe um juízo de validade prévio;

42 - Mesmo que algum dos accionistas da Recorrida viesse a intentar tal acção — o que não aconteceu - sempre haveria que concluir pela impossibilidade dessa invocação em vista da assinatura por todos eles da lista de presenças (cfr. n.° 3 do artigo 56.° do CSC);

43 - Em segundo lugar, também não procede a tese da Recorrida de que a nulidade da deliberação decorreria também da violação do disposto nas alíneas c) e d) do artigo 56.° do CSC;

44 - A deliberação foi tomada praticamente no termo do mandato em curso, a apenas meio ano do inicio do mandato seguinte, com o intuito de a Recorrida garantir a permanência e continuidade do Recorrente no órgão de administração;

45 - O CSC não estabelece qual o momento em que os membros dos órgãos sociais devem ser designados, determinando, porém, que a duração dos mandatos não pode ser superior a quatro anos civis (sendo este também o prazo supletivo da lei na falta de indicação no contrato) e, igualmente importante, que as sociedades podem deliberar a reeleição dos membros em funções;

46 - A Recorrida pretendia - e assim o registou e publicitou interna e externamente - que o novo mandato se iniciasse em Janeiro de 2013 e, prevendo-se para tal mandato uma duração de quatro anos (até final de 2016), a deliberação antecipatória de recondução (reeleição) não viola o limite legal de quatro anos (cfr. n.° 3 do artigo 391.0 do CSC);

47 - Em qualquer caso, nunca poderiam os efeitos de uma eventual declaração de nulidade enfermar todo o negócio jurídico, toda a relação de administração que se iniciou no momento da aceitação da eleição;

48 - Sempre deveria o Digníssimo Tribunal considerar a vontade hipotética da Recorrida e concluir pela duração do mandato do Recorrente até 31 de Dezembro de 2015 (cfr. artigos 292.° e 293.° do Código Civil);

49 - Em terceiro lugar, também a tese da ineficácia invocada pela Recorrida deverá ser considerada improcedente, uma vez que a celebração do negócio jurídico em causa (designação para o cargo de administrador para o quadriénio 2013/2016) ocorreu no momento em que o Recorrente conheceu e aceitou a deliberação de recondução, ou seja, necessariamente pelo menos em Maio de 2012;

50 - Consequentemente, o início da relação de administração entre a Recorrida e o Recorrente relativa ao novo mandato deu-se no momento da aceitação pelo Recorrente, determinando, desde logo, a produção de efeitos jurídicos e, mais do que isso, expectativas e efectivos direitos na esfera jurídica das partes;

51 - Com (a única) excepção do efeito jurídico relativo à renovação do mandato, o inicio do exercício de funções, o qual, porque subordinado a um termo suspensivo, ocorreria, de forma automática, apenas no dia 1 de Janeiro de 2013. Ou seja, a produção da totalidade dos efeitos da relação de administração encontrava-se tão-somente dependente da verificação de uma circunstância totalmente alheia às partes: o decurso do tempo;

52 - A legítima deliberação antecipatória de (re)eleição do Recorrente foi revogada pela sociedade já no decurso da relação de administração, pelo que a sua destituição ocorreu quando já se havia iniciado a produção de efeitos jurídicos da referida deliberação.

B.2.     Do Abuso de Direito

53 - Aceitar as teses da inexistência da deliberação, da respectiva invalidade ou mesmo ineficácia seria admitir que a Recorrida se pudesse servir a seu "bel-prazer" da lei e da tutela pela mesma conferida, ora tomando como válido e eficaz um documento por si mesma produzido, quando tal se afigura conveniente, ora propugnando pela sua absoluta inexistência ou invalidade quando se lhe não apraz suportar as consequências jurídicas do mesmo decorrentes;

54 - Consubstanciaria um claro abuso de direito, na vertente venire contra facturn proprium, opor ao Recorrente a suposta inexistência ou invalidade de uma deliberação quando, para outros efeitos, designadamente para efeitos de uma auditoria interna (levada a cabo para promover a sua venda a um terceiro), a Recorrida levou a cabo todos os actos necessários (leia-se recolha das assinaturas de todos os accionistas) com vista a garantir a validade de tal acto;

55 - De igual modo, determinar a invalidade de uma deliberação porque os accionistas, negligente e displicentemente, "assinaram de cruz", sem cuidar de averiguar a que é que se reportava o documento que se encontrava a assinar, desprotegendo, em consequência, um terceiro de boa-fé afectado pela deliberação assim aprovada, consubstanciaria um ostensivo e censurável abuso de direito;

56- A invocação da inexistência ou invalidade decorrente da não realização da reunião de 2 de Maio de 2012 quando, simultaneamente, todas as deliberações anteriormente adoptadas pela Recorrida (e algumas posteriores) foram tomadas nesses mesmíssimos termos (isto é, sem ocorrência física da dita reunião e mediante posterior "formalização" com a subscrição da respectiva lista de presenças), não tendo a Recorrida posto em causa nenhuma das outras deliberações com base nessa circunstância, configuraria, de igual modo, um flagrante e inadmissível abuso de direito;

57 - A Recorrida não só criou no Recorrente a legítima convicção de que a deliberação da sua recondução existia e havia sido validamente tomada (através de actos de publicidade interna e externa), como também procedeu à sua revogação com base em supostos vícios, identificáveis em todas as demais deliberações adoptadas pelos accionistas, os quais, para essas outras deliberações, nunca foram invocados, designadamente promovendo a respectiva revogação ou anulação com base nessas irregularidades;

58 - A Recorrida demorou cerca de quatro meses a promover o cancelamento do registo da deliberação de recondução do Recorrente para o quadriénio 2013/2016 perante a Conservatória do Registo Comercial e cerca de seis meses a proceder à revogação da deliberação, sendo que, durante esse período, a recondução do Recorrente foi assumida, por todos, inclusivamente pela própria Recorrida, perante todos, dentro e fora da sociedade, circunstâncias objectivas que tornam ainda mais manifesto o abuso.

B.3.     Da Obrigação da Recorrida de Indemnizar o Recorrente pela Destituição sem Justa Causa

59 - Os fundamentos invocados pela Recorrida para sustentar a destituição do Recorrente não se reconduzem, quer do ponto de vista fáctico, quer do ponto de vista da qualificação jurídica, a uma justa causa de destituição (cfr. COUTINHO DE ABREU, «Destituição de Administradores de Sociedades», BFD 83 (2007), pág. 83 e 84; ANTONIO MENEZES CORDEIRO, «Código das Sociedades Comerciais Anotado», 2.' ed., 2011, Almedina, pág. 1071; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de Dezembro de 2005, disponível em CJ XXX (2005) 5, 116-121 (120111)); Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão proferido em 11 de Julho ddisponível em www.dgsi.pt);

60 - A destituição sem justa causa obriga a sociedade a indemnizar o administrador destituído «pelo modo estipulado no contrato com ele celebrado ou nos termos gerais de direito» (cfr. n.° 5 do artigo 403.° do CSC);

61 - Encontram-se verificados os pressupostos da obrigação da Recorrida indemnizar o Recorrente por destituição sem justa causa, a saber: (i) a qualidade de administrador, (ii) a existência de danos indemnizáveis e (iii) o nexo de causalidade entre facto e dano;

62 - No que concerne aos danos indemnizáveis, a cessação de funções de administrador com recurso a uma justa causa inexistente confere o direito a uma indemnização destinada a compensar a perda da expectativa de exercício do mandato até final, pelo que o Recorrente deverá ser ressarcido no montante global correspondente às remunerações vincendas até ao termo do mandato, isto é, até ao dia 31 de Dezembro de 2016 (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 30 de Novembro de 2010, disponível em www.dgsi.pt, e respectivas referências bibliográficas aí vertidas);

63 - Em qualquer caso, encontra-se devidamente demonstrado nos autos que, após cessar as funções que exercia na Recorrida, o Recorrente não teve oportunidade de exercer outra actividade de idêntico nível económico, social e profissional;

64 - O Recorrente presta, agora, de forma individual, serviços de consultoria, o que não se assemelha ao estatuto socioprofissional que detinha no Banco Popular e, mais tarde, e para o que aqui releva, num grupo com projecção nacional e internacional como era o Grupo CS. Encontra-se, igualmente, demonstrado que, quando comparado com o rendimento fixo que auferia na Recorrida, o rendimento auferido pelo Recorrente após a sua destituição decresceu em mais de 85% (e isto limitando a análise às remunerações, sem considerar o relevantíssimo valor económico de outras regalias asseguradas no exercício de funções na Recorrida como sejam telemóvel, viatura de serviço (para uso também pessoal), combustível e seguro de saúde);

65 - A esta conclusão não é alheio o facto de o país se encontrar a atravessar uma gravíssima e prolongada crise económico-financeira, com naturais e nefastos impactos na dinâmica do mercado de trabalho, tomando diminutas as já escassas probabilidade de alguém como o Recorrente - quase 46 anos de idade à data do seu afastamento do cargo de administrador da Recorrida - encontrar um emprego compatível com as suas habilitações e qualificações e muito menos com condições remuneratórias, profissionais e sociais sequer semelhantes às proporcionadas pela empresa Recorrida;

     66 -  No que respeita ao nexo de causalidade, os prejuízos sofridos pelo Recorrente onsubstanciados na perda da expectativa de exercício do mandato até final —resultaram, comprovadamente, da destituição operada, como se viu, sem justa causa, configurando tais danos a consequência normal, típica e provável dessa destituição.

B.4. Da Obrigação da Recorrida de Indemnizar o Recorrente por Danos Não Patrimoniais

67- A Recorrida, na pessoa do seu accionista controlador Carlos, deu início a um processo levianamente conduzido de hostilização sistemática do Recorrente, traduzido no rebaixamento e na completa depreciação da sua imagem profissional e reputação, o qual culminou com a sua destituição com alegada, mas inexistente, justa causa (cfr. alíneas L), R), V), X), AA), BB) e FF) da matéria de facto assente);

68- Tal actuação, por parte da Recorrida, configura, por si só, a prática de um facto ilícito que consubstancia fundamento autónomo de responsabilidade civil, nos termos do disposto no artigo 484.° do Código Civil (cfr. COUTINHO DE ABREU, «Destituição de Administradores de Sociedades», BFD 83 (2007), pág. 88.; Tribunal da Relação de Lisboa, em Acórdão de 26 de Fevereiro de 2009, disponível em www.dgsi.pt);

69- A conduta da Recorrida violou direitos de personalidade do Recorrente, nomeadamente o direito à honra e consideração e o direito à saúde física e mental, pelo que, em consequência, se deverá concluir pela natureza antijurídica desse comportamento, ou seja, pela sua ilicitude (cfr. resposta positiva dada ao quesito 18.° da base instrutória; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Fevereiro de 2005, disponível em www.dgsi.pt);

70- De resto, tal como alegado na petição inicial, os comportamentos acima assinalados -que individualmente considerados representam, efectivamente, o exercício de direitos societários - serviram um propósito único: humilhar o Recorrente, com comportamentos hostis, forçando-o a abandonar, "pelo seu pé", a sociedade Recorrida, após as conversações para esse efeito terem malogrado (cfr. CARLA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 26m00 a 43m00), MANUEL (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 1h05m00 a 1h07h00 1 1h23m30 a 1h25m00) e BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 45m00 a 54m50));

71 - Os ditos direitos societários foram exercidos pela Recorrida de forma contrária aos seus fins sociais e económicos e, por conseguinte, manifestamente abusiva (cfr. artigo 334.° do Código Civil), donde também por esta via se conclui que os ditos comportamentos se revelaram ilícitos;

72 - A forma como tal processo de destituição foi gerido e publicitado implicou não só um grande sofrimento, tristeza e revolta, que afectaram profundamente o Recorrente, fazendo-o sentir-se humilhado e vexado na sua dignidade pessoal e profissional, como também uma grave quebra de prestígio profissional e social, em necessário prejuízo da sua honra e reputação (cfr. declarações prestadas por EDUARDO (Audiência de Julgamento de 20.03,2014 — 2m30 a 11m00) PEDRO (Audiência de Julgamento de 20,03.2014 —21m00 a 25m50));

73 - E tudo isto quando o Recorrente se encontrava a desenvolver um excelente trabalho na Recorrida, fruto do seu empenho e de sacrifício pessoal (inclusivamente colocando a sua vida em risco), tudo em prol do sucesso e da continuação da empresa (cfr. Declarações prestadas por BRUNO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 4m30 a 15m00), CARLA (Audiência de Julgamento de 17.03.2014 — 13m00 a 17m00), MANUEL (Audiência deJulgamento de 17.03.2014 —18m00 a 23m30), PEDRO (Audiência de Julgamento de 20.03.2014 — 5m00 a 16m00) e CARLOS (Audiência de Julgamento de 27.05.2014 — 5m00 a 18m50));

74 - O comportamento da Recorrida foi ilícito, culposo e provocou, directa e necessariamente, graves danos não patrimoniais ao Recorrente, encontrando-se, assim, a Recorrida constituída na obrigação de indemnizar o Recorrente.

C.RESPONSABILIDADE POR CUSTAS

75 - No que concerne ao pagamento efectuado pela Recorrida do montante líquido de € 38.096,57, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, recebido pelo Recorrente já durante a pendência da presente acção, o Tribunal a quo deveria ter considerado, no quer respeita àquela concreta quantia, extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, a qual decorreu da satisfação voluntária, por parte da Recorrida, de parte da pretensão do Recorrente, determinando, dessa forma, nos termos dos números 2 e 3 do artigo 356.° do Código de Processo Civil, a responsabilidade da Recorrida pelas custas associadas;

76 - Caso o Tribunal a quo decida indeferir o pedido de reforma de sentença a propósito da responsabilidade pelas custas processuais, mantendo a decisão de custas inalterada, deverá o Digníssimo Tribunal da Relação reapreciar essa decisão, determinando, nos termos dos números 2 e 3 do artigo 356.° do Código de Processo Civil, a responsabilidade da Recorrente pelas custas relativas à quantia de E 61.771,67.

Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, deverá a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser:

A- Entende pois, que a sentença deve ser revogada no que concerne à resposta aos quesitos 2.°, 3.°, 4.°, 6.°, 11.°, 16.° e 17.° da base instrutória, substituindo-a por uma que considere:

a) Quanto aos quesitos 2.° e 3.° da base instrutória: «Provado que o Autor alertou o Senhor Carlos para o facto de o mandato estar quase a terminar, o qual deu instruções para o Autor falar com o Senhor Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, para regularizar a situação»;

b) Quanto ao quesito 4.° da base instrutória: «Provado que, em momento anterior a Maio de 2012, o Senhor Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, foi incumbido de elaborar uma acta na qual se encontrasse vertida a decisão de reconduzir o Autor para o mandato de 2013/2016, o que fez, sendo que o conteúdo do referido documento foi inteira e exclusivamente da sua autoria.»;

c) Quanto ao quesito 6.° da base instrutória: «Provado que o Senhor Carlos e a Senhora Virgínia Saraiva tinham conhecimento da acta a que alude o quesito 1.° e do registo da deliberação que nela constava pelo menos desde 24 de Maio de 2012 e que os restantes accionistas só tiveram conhecimento da existência da acta em causa (ainda que não do seu teor) em finais de Julho, princípios de Agosto, no momento em que assinaram a respectiva lista de presenças»;

d) Quanto ao quesito 11.° da base instrutória: «Não provado»;

e) Quanto ao quesito 16.° da base instrutória: «Provado que a demandada apenas pagou ao demandante a quantia líquida de € 38.751,70, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, a titulo das remunerações devidas até 31 de Dezembro de 2012, não tendo pago a quantia de 381,10 euros, referente ao reembolso das despesas de representação, e a quantia relativa às remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros)»;

f) Quanto ao quesito 17.° da base instrutória: «Provado que, a partir de Janeiro de 2013, o Autor passou aprestar, a título individual, serviços de consultoria e que, quando comparado com o rendimento fixo que auferia na Ré, o rendimento auferido pelo Autor após a sua destituição decresceu em mais de 85%».

Em qualquer caso,

Nos termos e para os efeitos do n.° 1 do artigo 662.° do Código de Processo Civil, deverá o Digníssimo Tribunal, modificar a decisão de facto, sem determinar a anulação da sentença recorrida, considerando assente a seguinte factualidade:

i - «A lista de presenças relativa à reunião da assembleia geral da Recorrida de 2 de Maio de 2012 foi assinada por todos os accionistas da Recorrida, nos termos do documento a fls. ... (cfr. documento junto com o requerimento de 6 de Maio de 2014)»;

ii - «O procedimento habitual seguido no Grupo CS e na Recorrida passava pela elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas,    dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente»;

iii - «A recondução do Recorrente no cargo de administrador da Recorrida para o quadriénio 2013/2016 foi efectivamente inscrita no registo comercial, nos termos da certidão permanente impressa em 29 de Agosto de 2012, Inscrição 7 — Ap. 59, de 25 de Maio de 2012, a fls. ... (cfr. documento n." 9 junto com a petição inicial)».

Caso assim não se entenda,

Deverá o Digníssimo Tribunal considerar indispensável a ampliação da matéria de facto, passando a contemplar a factualidade acima descrita, e, nessa sequência, determinar a anulação da sentença recorrida, tudo nos termos e para os efeitos da alínea c) do n.° 2 e alínea c) do n.° 3 do artigo 662.° do Código de Processo Civil.

B- Revogada na parte que julgou improcedente parte do pedido, considerando-o, pelo contrário, totalmente procedente e, em consequência, condenar a Recorrida:

a) No pagamento ao Recorrente de uma indemnização pelos danos patrimoniais por este sofridos em virtude da destituição, sem justa causa, nos seguintes termos:

b) A diferença entre o valor da remuneração mensal fixa que o Recorrente receberia até ao final de Dezembro de 2012 - € 63.440,00 (sessenta e três mil e quatrocentos e quarenta euros) - e a quantia entretanto paga pela Recorrida a esse titulo, no montante de € 61.771,67 (sessenta e um mil setecentos e setenta e um euros e sessenta e sete cêntimos), ou seja, € 1.628,33 (mil e seiscentos e vinte e oito euros e trinta e três cêntimos), a que acresce, nos termos do artigo 806.° do Código Civil, juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da constituição em mora (19.11.2012) até efectivo e integral pagamento;

c) O valor da remuneração mensal fixa que o Recorrente receberia a partir daquela data até ao final do mandato (Dezembro de 2016), ou seja, € 888.160,00 (oitocentos e oitenta e oito mil e cento e sessenta euros), a que acresce, nos termos do artigo 806.° do Código Civil, juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da constituição em mora (19.11.2012) até efectivo e integral pagamento.

d) No pagamento ao Recorrente de uma indemnização pelos danos não patrimoniais a este causados em virtude do modo como decorreu o processo de destituição, danos esse a fixar em montante nunca inferior a € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a que acrescerão os correspondentes juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da data da citação até efectivo e integral pagamento.

A R. apresentou contra-alegações nelas pugnando pela manutenção do decidido.

II – O tribunal da 1ª instância julgou provados os seguintes factos:

A) O demandante, JL, foi convidado por Carlos para integrar a equipa de gestão do «Grupo CS»

B) No dia 1 de Janeiro de 2011, o demandante celebrou um contrato de trabalho com a sociedade "HERSAL -Investimentos Turísticos, S.A.", integrada no «Grupo CS».

C) No âmbito do contrato referido na alínea antecedente, o demandante obrigava-se a prestar à demandada "a sua actividade profissional como licenciado em marketing" — cfr. documento de fls. 222 e 223.

D) O demandante exercia a sua actividade para a generalidade das empresas do denominado «Grupo CS», a partir da "HERSAL — Investimentos Turísticos, SA."

E) formação nas áreas turística, hoteleira e de restauração".

F) O capital social da sociedade referida na alínea antecedente é detido e distribuído, pela forma seguinte:

 19.996 acções (99,98%) - Carlos;

1 acção (0,005%) - Virgínia;

1 acção (0,005%) - Joana ;

1 acção (0,005%) - M Moreira ;

1 acção (0,005%) - Vasques.

G) Em 1 de Abril de 2011, a administração da demandada "CS — Hotels, Golf e Resorts, S.A.", conferiu poderes ao demandante para, em seu nome e representação, praticar os seguintes actos: "celebrar contratos de trabalho, de utilização de trabalho temporário e de estágio e dirigir as relações laborais sociedade exercer o poder disciplinar; celebrar contratos, protocolos e acordos de promoção comercial dos empreendimentos turísticos, equipamentos de animação e de estabelecimentos de restauração e bebidas, administrados ou explorados pela mandante, no âmbito do denominado «Meeting Industry».

H) No dia 1 de Julho de 2011, o Autor foi designado Administrador da CS HOTELS pela respectiva Assembleia-geral, com efeitos a partir daquela data e para o mandato então em curso, ou seja, para o quadriénio 2009/2012.

I) Naquela data, foi ainda deliberada a atribuição aos membros do Conselho de Administração de uma remuneração mensal líquida, paga catorze meses por ano, de E 10.000,00 (dez mil euros), montante esse que, dessa forma, o autor passou a auferir por força do exercício de funções na ré.

J) A deliberação a que se alude no quesito sob o n.° 1 foi apresentada para inscrição no dia 25 de Maio de 2012 — cfr. fls. 92.

L) Em Agosto de 2012, Carlos informou o demandante que existiam negociações, positivas, para o desbloqueamento de financiamento bancário e inversão de capital na sociedade ""CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", permitindo a revitalização das sociedades que se encontravam em situação de iminente insolvência, no âmbito dos processos especiais de revitalização, "PERs".

M) No âmbito do referido na alínea antecedente a sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", seria vendida a um fundo gerido pela "ECS Capital", que integraria todos os activos do "Grupo CS".

N) A "ECS Capital" impunha, no âmbito das negociações, a como condição para concretização do referido na alínea antecedente, o afastamento de todos os membros dos corpos sociais da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", com mandato até final de 2016.

O) Vasco, em representação da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", endereçou à Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o requerimento constante de fls. 119 e 120.

P) Em 20 de Setembro de 2012, o demandante endereçou a Carlos o email e a missiva constantes de fls. 121 e 122 e 123 e 124.

Q) Em reunião da assembleia-geral da "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", realizada em 20 de Setembro de 2012, os accionistas dispuseram-se a deliberar sobre: a alteração dos artigos 12.° e 16.° do contrato de sociedade; e "proceder à eleição do presidente do conselho de administração até ao final do mandato em curso (2009-2012)", tudo como melhor consta do documento junto a fls. 127 e 128, que aqui se dá por reproduzido constante de fls. 129.

R) Em 3 de Outubro de 2012, Carlos enviou ao demandante o email constante de fls. 134 e 135.

S) Em 9 de Outubro de 2012, o demandante enviou a Carlos o email constante de fls. 138 e 139.

T) O demandante enviou a Carlos os emails constantes de fls. 141 a 143; 145 a 148; 151 e 152; 153 e 154; 160 a 162; 163 e 164.

X) Em 9 de Outubro de 2012, o demandante enviou a Carlos, o email constante de fls. 167.

Z) Em 28 de Outubro de 2012, o demandante recebeu de Carlos, o email constante de fls. 169, no qual comunicava a realização de uma reunião do conselho de administração da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", para o dia 29 de Outubro de 2012, para as 11 horas.

AA) Em 29 de Outubro de 2012, realizou-se uma reunião do conselho de administração da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", em que foram debatidos os assuntos relatados na acta constante de fls. 172 e 173, tendo sido deliberado que: «por decisão do PCA o mesmo avoca a si na referida qualidade todos os pelouros inclusive o de representação. Fica assim sem nenhum pelouro distribuído o vogal da administração, Dr. João Diogo Leitão.».

BB) Em 29 de Outubro de 2012, foi divulgado pelos serviços da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", o email em que se informava que o demandante "não tem nenhum pelouro atribuído no conselho de administração, inclusive o de representação" — cfr. fls. 174.

CC) Em 1 de Novembro de 2012, o demandante enviou a Carlos, o email constante de fls. 175 e 176.

DD) Em 5 de Novembro de 2012, Carlos, enviou ao demandante o email em que lhe comunicava o conteúdo de uma deliberação tomada em reunião de accionistas da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", que havia sido realizada no mesmo dia e em que lhe comunicava a sua destituição do cargo de administrador, alegando "justa causa objectiva" — cfr. fls. 177 a 179.

EE) Em 19 de Novembro de 2012, o demandante enviou à sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", o email constante de fls. 180 e 181 e a carta constante de fls. 182 e 183, no qual reivindicava o pagamento da quantia de novecentos e cinquenta e um mil e seiscentos euros (€ 951.600,00), correspondente a remunerações que seriam devidas até 31 de Dezembro de 2012, no montante de sessenta e três mil quatrocentos e quarenta euros (€ 63.440.00); oitocentos e oitenta e oito mil e cento e sessenta euros (€ 888.160,00), referente a remunerações a receber até ao final do mandato, em 31 de Dezembro de 2016; e trezentos e oitenta e um euros e dez cêntimos (€ 381,10), a título de despesas de representação.

FF) Em 28 de Outubro de 2012, realizou-se uma assembleia de accionistas da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", em que foi tomada a deliberação constante da acta plasmada no documento de fls. 184 a 189.

GO) Em 5 de Novembro de 2012, realizou-se uma assembleia de accionistas da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", em que foi tomada a deliberação constante da acta plasmada no documento de fls. 190 a 194.

HH) No dia 24 de Maio de 2012, o Senhor Doutor Vasco remeteu o email a fls. (Documento n° 39) ao autor.

II) No dia 28 de Maio de 2012, o Senhor Doutor Vasco remeteu o email a fls. (Documento n° 40) para os seguintes destinatários: JL, Virgínia , Carla , Fernando , Manuel, Joana e Vasco .

JJ) O demandante promoveu junto do presidente da mesa da assembleia-geral da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A." a elaboração da acta da AG referida no quesito 1° (acta de fls.109 a 110 e 226 a 228).

LL) A acta a que alude o quesito 1.° foi elaborada, nos termos referidos no quesito antecedente, sem que tivesse sido tomada a deliberação correspondente em assembleia-geral realizada no dia que dela consta (2 de Maio de 2012).

MM) Os accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1.°, até finais de Julho, princípios de Agosto.

NN) Nenhum dos accionistas subscreveu a acta referida no quesito 1.°, até à data referida no quesito antecedente.

00) Dois dos accionistas tomaram conhecimento do teor da acta referida no quesito 1.°, no dia 28 de Outubro de 2012, aquando da realização da assembleia geral que revogou a deliberação de recondução do mandato dos corpos sociais que constava na acta referida no quesito 1°.

PP) Só em finais de Julho, princípios de Agosto, quando se procedeu à revisão e organização da documentação para efeitos da auditoria jurídica a efectuar pela Uria Menendez — Proença de Carvalho é que o Presidente da Mesa da Assembleia Geral promoveu a assinatura pelos accionistas, da Lista de Presenças correspondente à acta a que alude o quesito 1°.

QQ) Os accionistas assinaram a referida lista de presenças, individual e sucessivamente.pelo presidente da mesa da assembleia-geral por insistência do demandante.

SS) A deliberação foi apresentada para registo e lavrada por um ajudante da conservatória.

TT) O demandante não assistiu a qualquer reunião que teve por objecto as negociações tendentes à revitalização e venda da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", a que aludem as alíneas M) a O).

UU) Ao demandante não foram dados a conhecer os documentos em que estariam vertidos os termos das negociações referidas nas alíneas M) a O).

VV) Para além do vencimento referido em I), o demandante tinha direito a uso de viatura de função e seguro de saúde.

XX) A demandada não pagou ao demandante a quantia de 381,10 euros, referente ao reembolso das despesas de representação e a quantia relativa a remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros).

ZZ) O demandante sente tristeza e desgosto pela forma como foi dispensada a sua colaboração com a sociedade demandada.

IV – Decorrendo o objecto do recurso das conclusões das alegações, importa nele decidir as seguintes questões:

A)- Do ponto de vista da matéria de facto, e em função da respectiva precedência lógica:

a - se, nos termos e para os efeitos do art 662º/1 do CPC, o tribunal deverá modificar a decisão de facto, (sem determinar a anulação da sentença recorrida), considerando (também) assente determinada factualidade à qual o A/recorrente alude;

 b- assim não se entendendo, se o tribunal deve ter como indispensável a ampliação da matéria de facto de modo a passar a contemplar essa factualidade,  determinando, em consequência, a anulação da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos da art 662º/2 al c) e 3 al c) do CPC.

c- se a decisão da matéria de facto deve ser alterada no que respeita às respostas dadas aos arts 2º a 6º e 11º, 16º e 17º da base instrutória no sentido defendido pela A/recorrente.

B)-Do ponto de vista da decisão de direito (e na pressuposição da não anulação da sentença recorrida e da consideração da referida matéria de facto como aditada e alterada) se deverá julgar inteiramente procedente a acção - excepto no que respeita à  quantia entretanto paga pela R. no montante de € 61.771,67, relativamente à qual se deverá ter por extinta a instância por inutilidade superveniente da lide -  resultado que postula a resolução das seguintes questões:

a- se, se deverá considerar como existente a deliberação referente à recondução do A. no cargo de administrador para o quadriénio de 2013/2016, devendo ser tida como uma deliberação unânime por escrito;

b- se essa deliberação se mostra válida e eficaz;

c- se, porque a R. destituiu o A. sem justa causa, o deverá indemnizar nos termos peticionados, excepto no respeitante à aludida quantia que a R. já lhe pagou;

d- se, assim sendo, a R. deverá ser responsabilizada inteiramente pelas custas da acção, também no respeitante a essa quantia, porque foi paga no dia anterior ao da respectiva propositura.

A-a-A realização da audiência de julgamento nos presentes autos decorreu já na vigência do CPC/2013.

Consequentemente, e nos termos do art 5º/1 da L 41/2013 de 26/6, que aprovou esse mesmo Código, são-lhe  aplicáveis as respectivas normas, incluindo a do respectivo art 5º, que admite a consideração pelo tribunal, ainda que não concretamente alegados, dos factos instrumentais e dos concretizadores ou complementares dos essenciais que hajam sido alegados, desde que uns e outros resultem da instrução da causa e sobre estes últimos- os complementares e concretizadores - as partes tenham tido a possibilidade de sobre eles se pronunciar.

Os factos que o A./apelante pretende que – em qualquer caso - sejam tidos em consideração pelo tribunal, chegando a invocar para tal o disposto no art  662º/2 al c) e a consequente anulação da decisão proferida pela 1ª instância, são, concretamente, os seguintes:

- A lista de presenças relativa à reunião da assembleia geral da Recorrida de 2 de Maio de 2012 foi assinada por todos os accionistas da Recorrida, nos termos do documento a fls. ... ;

- O procedimento habitual seguido no Grupo CS e na Recorrida passava pela elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente;

-A recondução do Recorrente no cargo de administrador da Recorrida para o quadriénio 2013/2016 foi efectivamente inscrita no registo comercial, nos termos da certidão permanente impressa em 29 de Agosto de 2012, Inscrição 7 — Ap. 59, de 25 de Maio de 2012, a fls. ..;

Ora, todos estes factos foram alegados na acção, por uma, ou outra das partes – ao contrário do que o sustenta a R. nas suas contra–alegações relativamente ao segundo dos mesmos -  pelo que, à partida, não fará grande sentido chamar à colação o disposto no referido art 5º /2 als a) e b).

Mas vejamos no que refere a cada um deles.

O facto da a lista de presenças relativa à reunião da Assembleia Geral da R. de 2 de Maio de 2012 ter sido assinada por todos os seus accionistas foi alegado pela R. no art 26º/2ª parte da contestação, ao referir que,  «…   o Presidente da Mesa da Assembleia Geral promoveu a assinatura de forma individual e sucessiva, pelos accionistas, da correspondente Lista de Presenças», asserção em que o termo «correspondente» se refere à acta da (pretensa, suposta) Assembleia Geral da R. de 2/5/2012.

Essa matéria foi, aliás, inserida na base instrutória – respectivos arts 9º e 10º - e  foi tida como provada na 1ª instância, sem que o A., ora impugnante da matéria de facto, a tenha incluída nesta impugnação. 

O facto de ser procedimento habitual, seguido no “Grupo CS”, e na R.  de elaborar uma acta de uma reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada (e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente), é matéria alegada pela própria R. no art 24º da contestação, onde expressamente referiu esse procedimento como habitual, nos seguintes termos: «… actuando-se como habitualmente se actuava nas diversas sociedades do Grupo e na R., sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, elaborou-se uma acta tipo de uma assembleia universal de sociedade a deliberar o que se pretendia, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada».

Apesar de na 1ª instância não se ter feito constar este facto da selecção da matéria de facto, a verdade é que, a simples circunstância de a R. admitir a aludida  prática não pode deixar de ser tida em consideração pelo presente tribunal.

Quer dizer, sempre se poderia e deveria valorar autonomamente, em sede de decisão, a circunstância que a R. revela e de que procura tirar partido, de ser prática habitual nela – como no grupo empresarial em que se integra – a de se «fabricarem» actas de assembleias gerais que, como tal, nunca tiveram efectivo lugar, não obstante se fazer valer no seu dia-a-dia de deliberações sociais feitas constar nessas actas.

Sucede que o facto em referência – alegado, como se disse, pela R. – não obstante não constar da base instrutória – como deveria constar, atento o desconhecimento que o A. alega, na réplica, relativamente à prática em questão – foi amplamente provado na audiência de julgamento em função do depoimento que a própria R. entendeu como, perfeitamente esclarecedor e “muito corajoso” da testemunha Vasco, Presidente da Mesa da Assembleia Geral da R., como adiante melhor se verá.

Abolida como foi, com o novo CPC, a selecção da matéria de facto nos moldes em que a previa o anterior, tendo sido substituída pela indicação dos temas de prova, não pode, obviamente, dada a já referida aplicação imediata do NCPC aos presentes autos, ter-se a ausência desse facto na base instrutória como obstativo ao entendimento de que se mostra provado. Até, por um argumento de maioria de razão, extraído do próprio art 5º CPC, já atrás referido: se, hoje o juiz, se pode servir de factos complementares ou concretizadores dos essenciais alegados, pese embora a sua não alegação, muito mais poderá ter como adquirido para o processo, facto dessa natureza que tendo sido alegado não tenha sido feito constar da base instrutória, desde que, na sua convicção, tal facto resulte provado em função dos meios de prova produzidos. Podendo fazê-lo o juiz da 1ª instância, também o poderão os juízes da 2ª, quando chamados a pronunciar-se relativamente à alteração do facto essencial em relação ao qual aquele se mostra complementar ou concretizador.

Está, pois, fora de questão a anulação da decisão para ampliação da base instrutória no que respeita ao facto em causa que se deverá ter como provado, em função da prova que adiante melhor se referirá.

Relativamente ao facto da recondução do A. no cargo de administrador da R. para o quadriénio 2013/2016 (ter sido) inscrita no registo comercial, trata-se de facto que foi alegado por ambas partes, que está presente na matéria assente, como decorrre da respectiva al J) («A deliberação a que se alude no quesito sob o nº 1 foi apresentada para inscrição no dia 25/5/2012»), e está provado por documento autêntico (a respectiva certidão do registo comercial), nada obstando, pois, à sua consideração para efeitos de decisão.

b) Mais relevantemente, importa saber se a decisão da matéria de facto deve ser alterada no que respeita às respostas dadas aos arts 2º a 6º, 11º, 16º e 17º da base instrutória, tal como o defende o A..

Iniciando a apreciação da impugnação da matéria de facto pelas respostas referentes aos arts 2°, 3°, 4° e 6° da base instrutória, recorde-se, em primeiro lugar,  o que neles se pergunta:

2 -O demandante, durante os meses de Fevereiro/Março de 2012, sugeriu a Carlos, que deliberasse a recondução dos membros do Conselho de Administração da sociedade “CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.”, para o quadriénio que decorreria entre Janeiro 2013 e 31 de Dezembro de 2016?

3 -Para concretização do facto referido no quesito anterior, o demandante falou com o Carlos, tendo este aceite a sugestão?

4- O demandante promoveu junto do presidente da mesa da assembleia geral da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.' a elaboração de uma acta de assembleia geral para concretização do anunciado no quesito sob o n.° 2?

6. Os accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1.°, até finais de Julho, princípios de Agosto?

O tribunal a quo respondeu «não provado» aos arts 1º a 3º, «provado que o demandante promoveu junto do presidente da mesa da assembleia geral da sociedade "CS Hotels Golf & Resorts, S.A. a elaboração da acta da assembleia geral referida no quesito 1°», ao art 4º, e «provado» ao art 6º .

Pretende o apelante que este tribunal lhes responda do seguinte modo:

Aos arts 2º e 3º - «Provado que o Autor alertou o Senhor Carlos para o facto de o mandato estar quase a terminar, o qual deu instruções para o Autor falar com Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, para regularizar a situação»;

Ao art 4º- «Provado que, em momento anterior a Maio de 2012, o Senhor Vasco, presidente da mesa da assembleia geral da Ré, foi incumbido de elaborar uma acta na qual se encontrasse vertida a decisão de reconduzir o Autor para o mandato de 2013/2016, o que fez, sendo que o conteúdo do referido documento foi inteira e exclusivamente da sua autoria»;

Ao art 6° - «Provado que o Senhor Carlos e a Senhora Virgínia tinham conhecimento da acta a que alude o quesito 1.° e do registo da deliberação que nela constava pelo menos desde 24 de Maio de 2012 e que os restantes accionistas só tiveram conhecimento da existência da acta em causa (ainda que não do seu teor) em finais de Julho, princípios de Agosto, no, no momento em que assinaram a respectiva lista de presenças».

Antes de mais cumpre referir que, genericamente, não assiste razão à R./apelada quando nas contra-alegações sustenta a impossibilidade deste tribunal sancionar as respostas pretendidas pelo apelante aos pontos da matéria de facto em referência, por tais respostas integrarem factos daqueles não constantes.

 Como é sabido, desde há muito que se têm como inteiramente admitidas respostas aos “quesitos” com carácter esclarecedor que integrem, para esse esclarecimento, factos de carácter instrumental - havendo apenas que na fundamentação da decisão da matéria de facto explicar a sua presença nessas respostas – e hoje – em face do já referido art 5º CPC - ter-se-á igualmente como admitida a inserção nas mesmas de factos complementares ou concretizadores, desde que resultem da instrução da causa e sobre eles as partes tenham podido pronunciar-se, exigindo-se também e naturalmente, a  explicação da sua prova na referida fundamentação.

Por outro lado, e também ao contrário do que o sustenta a apelada nas contra-alegações, mostra-se  relevante para responder à matéria em apreço, ter em atenção, tal como o defende o apelante, a correlação de poderes no interior da sociedade R.

Neste aspecto, resulta da al F) da matéria de facto, logo fazendo antever aquela correlação que, «o capital social da sociedade referida na alínea antecedente é detido e distribuído, pela forma seguinte: a) 19.996 acções (99,98%) - Carlos; b) 1 acção (0,005%) - Virgínia; c) 1 acção (0,005%) - Joana ; d) 1 acção (0,005%) - Ana M; e) 1 acção (0,005%) - Vasques».

Foram várias as testemunhas que – espontaneamente - qualificaram Carlos como o «dono da empresa».

Assim, textualmente, Manuel Carvalho - «era o dono da empresa» - que depois explicitou a razão dessa observação: «Virgínia é mulher do Enq. Carlos; Joana é filha do Enq. Carlos»; Margarida «pessoa da confiança  do Eng. Carlos», e Vasques «marido da Dra. Margarida

Também Bruno referiu Carlos  «como o dono da empresa», e igualmente o fez Carla .

 Explicitou Dinis que «o Eng. Carlos quando fundava alguma nova empresa, que correspondia à sua área de negócio ou desenvolvimento dos negócios, como ele era o accionista único, deixemo-nos de subterfúgios, era o accionista único e como não podia constituir a sociedade sozinho» …«chamava familiares e  amigos próximos», que «não representavam nada a não ser serem accionistas formalmente».

E Vasco, chamado a tribunal, particularmente para explicar a existência da acta da Assembleia Geral de 2/5/2012 -  na sequência do documento por ele produzido junto com a contestação, cfr fls 224  - referiu em tribunal: «Por regra, se me pergunta se as reuniões existiam... por regra não existiam, isto é, havia a um pedido do Eng. Carlos , enquanto accionista da sociedade HERSAL, por sua vez de todas as outras, que pedia que fizesse a nomeação daquela pessoa, que se fizesse uma procuração a favor do Dr. X para fazer determinados actos, portanto, nesse sentido, sim». …«Foi exactamente, em nenhuma delas (actas)  foi realizada assembleia…da acta 1 à acta 8 não houve realização de reunião entre os accionistas». E à pergunta da Exma Juiza se «faziam o que o Eng. Carlos lhes dizia para fazer e depois formalizavam isso em acta»,  respondeu, «basicamente … sim, Sra. Dra.. estamos a falar de accionista único… de todas as sociedades».

Para além deste depoimento - com a importância que lhe atribuiu a própria R.- ser bastante para prova do facto acima referido – o de que, «o procedimento habitual seguido no Grupo CS e na Recorrida passava pela elaboração de uma acta de uma reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente»- dele, e dos demais acima mencionados, só pode resultar a constatação indiscutível de que Carlos - accionista largamente maioritário da R. - era quem decidia os destinos da mesma, destinando-se a existência dos demais - pelo carácter simbólico das respectivas participações e por serem pessoas próximas do mesmo, familiares ou amigos-  a cumprir a exigência da lei a esse respeito referente à constituição da sociedade anónima implicar um número de sócios não inferior a cinco – cfr art 273º/1 CSCom.

Podendo, pois, afirmar-se, como o faz o A/apelante, que os demais accionistas se limitavam a participar no processo de formalização das decisões tomadas pelo «dono da empresa», concluindo-se que as decisões de Carlos eram, «por via de regra, vertidas em actas de reuniões de assembleias gerais da Recorrida que não se realizavam, limitando-se os restantes accionistas a participar no processo de formalização das referidas decisões, nomeadamente assinando a posteriori as  correspondentes listas de presenças, sendo essa a maneira de formalizar o que o "dono  da empresa" queria/determinava».

Revertendo à concreta matéria perguntada nos arts 2º e 3º - se «o A, durante os meses de Fevereiro/Março de 2012, sugeriu a Carlos, que deliberasse a recondução dos membros do Conselho de Administração da sociedade “CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.”, para o quadriénio que decorreria entre Janeiro 2013 e 31 de Dezembro de 2016», e se, «para concretização do facto referido no quesito anterior,  falou com o Carlos, tendo este aceite a sugestão» – importa, ainda, e antes de mais, atentar no que a R. Admite, na contestação, ter ocorrido.

Assim é que refere no art 22º desse articulado que o A. «preocupado com o seu futuro lembrou-se de sugerir que a R deliberasse, desde logo, a recondução dos membros do Conselho de Administração da sociedade até 31/12/2016…», e no art 23º que, «tendo falado com o Eng Carlos (que não se terá oposto à sugestão) promoveu junto do Presidente da Mesa da Assembleia Geral da sociedade a elaboração de uma acta da assembleia geral da sociedade  que concretizasse o objectivo visado pela sugestão que apresentara», alegando ainda no subsequente art 24º que o A. procedeu assim «com o perfeito conhecimento» do já referido habitual procedimento da R relativamente à feitura de actas.

Não pode, pois, a R. vir escamotear o conhecimento e a concordância de Carlos relativamente à recondução dos membros do Conselho de Administração da sociedade para o novo quadriénio – que terá sido efectivamente sugerida pelo A. -  pois que,  admitidamente, «não se terá oposto à (tal) sugestão».

Acresce que a própria Ana M referiu no seu depoimento a existência desta conversa prévia do A. com Carlos, dizendo, concretamente que, quando se apercebeu – em fins de Julho /princípios de Agosto da acta em causa - «achei que aquilo não era sequer muito legal e falei com o Eng. Carlos e o Eng. Carlos também se mostrou surpreendido e o que ele me disse, na altura, foi que: " Eu, de facto, o Dr. João Leitão abordou-me no corredor e disse-me que tínhamos que resolver o problema porque o mandato estava quase a terminar." E que ele disse, como normalmente acontecia: "Então, se o mandato está a terminar, fala com o Vasco para, portanto, para … regularizar a situação»

Donde se deverá concluir que Carlos não apenas – placidamente - não se opôs à sugestão do A., como – intervenientemente - o autorizou a falar com o «Vasco» - Presidente da Mesa da Assembleia Geral da R - «para regularizar a situação».

Sucede ainda que a correspondência electrónica trocada entre Vasco e o A. resultante dos e-mails juntos aos autos – correspondência que a referida testemunha Vasco se limitou a confirmar em julgamento, nada tendo acrescentado, no aspecto em apreço, aos termos dela constantes – corrobora este entendimento.

Assim:

Mostra-se junto a fls 224, correspondendo ao doc nº 2 junto com a contestação,  um e-mail enviado em 15/5/2012, pelas 16,18 h, por Vasco ao A., dele constando como anexo «Acta AG recondução orgãos sociais docx» e com o seguinte conteúdo: «Caro João, junto para teu conhecimento minuta da acta a deliberar a nomeação dos órgãos sociais da CS Hotels para o quadriénio 2013/2016. Vou averiguar junto da Conservatória se, de facto, é possível fazer esse registo uma vez que o mandato em curso só termina no final deste ano».

 A fls 297, correspondendo ao doc nº 39 junto com a réplica, mostra-se junto email do A. a Vasco, datado de 15/5/2012, pelas 22,42 h, com o seguinte conteúdo: «Obrigado Vasco. Segundo o Lemos Damião sim. Sem isso não vale nada. Depois diz. Abraço».

A fls 225 consta um e-mail enviado em 24/5/2012, pelas 10,27 h, por Vasco ao A., com o seguinte conteúdo: «Na sequência da nossa conferência telefónica, solicito que me confirmes a autorização/concordância do Eng° CS quanto à realização do registo em causa e termos da acta anexa».

Igualmente a fls 225 dos autos consta a resposta do A. a esse e-maiI,  pelas 17,08 h, verificando-se que o mesmo foi enviado a Vasco, mas com conhecimento a Carlos e Virgínia Saraiva, contendo como anexo «Acta AG recondução orgãos sociais docx» e apresentando o seguinte  conteúdo: «Caro Vasco, este tema, renovação dos mandatos que se vencem no final deste ano, já tinha sido falado por mim ao Enq. CS (foi há cerca de 2 meses, altura que te pedi para avançar mas que pela falta de tempo / disponibilidade tua só agora foi possível), e por ele autorizado».

Destes e-mails, conjugados com o episódio relatado pela testemunha Margarida Magalhães no seu depoimento e, sem esquecer a posição da R. na contestação, decorre, com muita clareza, que o A. falara por volta de Março com Carlos sobre o assunto em causa – renovação dos mandatos que se vencem no final de 2012; que, logo nessa altura - por volta de Março – o A. falara com Vasco, para «avançar», porque Carlos lhe dissera para junto dele «regularizar a situação». E que, por isso, «a renovação dos mandatos que se vencem no final do ano» estava autorizada por Carlos, não tendo  o A. agido «nas costas» deste e menos ainda «às escondidas» do mesmo, até porque, mantendo em anexo «a Acta AG recondução orgãos sociais» que Vasco lhe enviara no seu mail de 15/5/2012, lhe respondeu, dando conhecimento dessa resposta – e daquela acta – a Carlos e aVirgínia .

Consequentemente, o A. não apenas agiu com a autorização prévia de Carlos, como este, e a accionista Virgínia, tiveram conhecimento da concreta acta de 2/5/2012, pelo menos, em 24/5/2012.

  Nem se diga, como o diz a R. nas contra alegações deste recurso, que cabia ao A. fazer prova de que Carlos e Virginia leram o email e atentaram na acta em causa, pois, como é evidente, se alguma prova a este nível mais se exigia, sempre seria da parte da R. que teria que provar que aqueles emails, por razões excepcionais que evidenciaria, não tinham chegado ao conhecimento daqueles accionistas.

De todo o modo e ainda, não pode esquecer-se, concorrendo indestrutivelmente para o conhecimento daquela acta e da deliberação dela constante, que a mesma chegou a estar registada na Conservatória do Registo Comercial durante cerca de  quatro meses – de 25/5/2012 a 12/9/2012, cfr fls 92.

Recorde-se ainda que de acordo com a al II) da matéria assente, no dia 28/5/ 2012, Vasco  remeteu o email que consta de fls 299 dos autos a todos os detentores de cargos relevantes na empresa, pesoas que, segundo a testemunha Carla , tinham interesse em saber «as alterações que eram levadas a registo, relativas às sociedades do grupo» - para além do A., naturalmente, e ela própria,  Virgínia, Fernando (Diretor Financeiro), Manuel (Director de Recursos Humanos), Bruno (Diretor Responsável da Área Financeira), Paulino (financeiro), Cristóvão (técnico de contas), Joana David (também  técnica de contas), Vasco (Diretor Geral das unidades hoteleiras), apresentando esse email o seguinte conteúdo: «Junto certidão actualizada da CS Hoteis, Golf & Resorts, S.A., com o registo de recondução dos Órgãos sociais. Os melhores cumprimentos». Conteúdo que não poderia passar despercebido a qualquer das pessoas a quem foi enviado.

È importante mencionar, a propósito do que se tem vindo a fazer referência,  que da prova produzida em julgamento, nada resultou de que se pudesse, sequer, suspeitar, que o A. tivesse tido conhecimento, antes da notificação da contestação produzida nestes autos, da prática habitual/padrão da  R. acima referida: a de elaborar actas de reunião da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à(s) deliberação(ões) uma fundamentação que parecesse adequada e fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente.

Nem o contrário resulta da missiva que o mesmo. endereçou a Carlos em 20/9/2012 – fls 121/124 – e menos ainda da que lhe enviou em 9/10/2012 – fls 138 - em resposta ao conhecimento que aquele lhe dera em 3/10/2012 da alteração dos estatutos da sociedade e de que fora eleito como Presidente do Conselho de Administração da mesma até ao final do mandato, onde se refere expressamente à «deliberação correspondente intocada», demonstrando não lhe passar pela cabeça poder ela sofrer do processo de constituição acima referido.

 Tão pouco resultou provado que o A. estivesse ao corrente da exigência do Fundo no sentido do acordo com o mesmo pressupor o afastamento de todos os membros do corpos sociais da A., até porque, apenas em Agosto, Carlos lhe deu a conhecer tal exigência, como resulta das alíneas L) M) e N) dos factos assentes.

Não pode, pois, a R. pretender que o A. agiu com má fé, constituindo seu propósito salvaguardar de antemão a sua posição para vir a poder extrair vantagem patrimonial a que sabia não ter direito.  

Neste contexto de prova mostra-se adequado e correcto responder aos arts 2º e 3º da base instrutória essencialmente nos termos em que o pretende o A., embora se entenda que a resposta em causa deverá ser mais explicativa, quer inserindo o momento temporal em que o A. interpelou Carlos, quer referindo claramente estar em causa a recondução dos membros do Conselho de Administração da sociedade para o quadriénio subsequente.

Assim, responde este tribunal aos arts 2º e 3º:

«Provado que o A., por volta de Março de 2012, sugeriu a Carlos a  recondução dos membros do Conselho de Administração para o subsequente quadriénio, e, em resposta, o mesmo deu-lhe instruções para falar com Vasco, Presidente da Mesa da Assembleia Geral, no sentido deste regularizar essa situação».

Na sequência desta resposta, e apesar da que o A/apelante  propugna para o art da base instrutória se afigurar, também ela, no essencial, correcta, entende-se preferível a seguinte:

«Nessa altura, e na sequência das instruções que lhe fornecera Carlos, o A. solicitou a Vasco que procedesse no sentido de resultar assegurada a recondução dos membros do Conselho de Administração da A. para o subsequente quadriénio».

Do que atrás se disse, logo resulta que a resposta de “Provado” ao art 6º da base instrutória - onde, lembre-se, se pergunta se «os  accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1° até finais de Julho/princípios de Agosto» – se mostra incorrecta.

Com efeito, quer Carlos, quer Virgínia, tiveram conhecimento da referida acta em função do referido e-mail do A. datado de 24/5/2012, em que o mesmo, embora dirigindo-se a Vasco, dava conhecimento dessa resposta àqueles accionistas e anexava o texto da acta em questão.

Entende-se, no entanto, não ser necessário responder ao art 6º do modo como o pretende o A., na medida em que, considerações há nessa resposta, que advêm com clareza das subsequentes aos arts 7º a 9º da base instrutória.

Com efeito, em função destas respostas resulta adquirido que nenhum dos accionistas subscreveu a acta em questão até finais de Julho/princípios de Agosto –  resposta ao art 7º; que só em finais de Julho/princípios de Agosto, quando se procedeu à revisão e organização da documentação para efeitos de auditoria jurídica a efectuar pela Uria Menendez- Proença de Carvalho, é que o Presidente da Mesa da Assembleia Geral promoveu a assinatura pelos accionistas da Lista de Presenças correspondente a tal acta – resposta aos arts 9º; o que os accionistas fizeram, individual e sucessivamente – resposta ao art 10º;  que  dois dos accionistas – que ouvida a prova se sabe serem Dinis e Joana -  tomaram conhecimento do teor dessa acta no dia 28/10/2012, aquando da realização da Assembleia Geral que revogou a deliberação de recondução do mandato dos corpos socais que constava da acta referida no quesito 1º-  resposta ao art 8º.

Vê-se, no entanto, conveniência, em responder ao referido art 6º explicando a  resposta negativa que ao mesmo se impõe, por isso fazendo sentido a 1ª parte da resposta defendida pelo A., embora se imponha para a mesma outra formulação.

Assim responde-se ao artigo em referência nestes termos:

 «Provado que apenas três dos  accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1° até finais de Julho/princípios de Agosto, pois que Carlos e Virgínia tiveram conhecimento dessa acta, pelo menos, desde 24 de Maio de 2012.»

Restando a accionista Ana M, deve referir-se ter resultado da prova - quer do respectivo depoimento, quer da mensagem de correio electrónico de fls. 544 - que tomou conhecimento da acta e da deliberação nela contida, pelo menos, na data dessa mensagem – 14/8/2012 –  mensagem que  enviou aos advogados da R., com cópia para Carlos, referindo-lhes,  «na sequência de conversa com o Eng° CS  já terá tido consigo, pedia-lhe o favor de analisar a legalidade da nomeação para o quadriénio 2013/2016 dos Administradores (...) à luz dos estatutos e do direito em geral».

 

No art 11º da base instrutória pergunta-se se «o registo da deliberação na conservatória do registo comercial foi efectuado pelo presidente da mesa da assembleia geral por insistência do demandante».

O tribunal da 1ª instância respondeu «provado» e o A/apelante pretende a alteração dessa resposta para «não provado».

Como a testemunha  Vasco a respeito dessa questão nada acrescentou  ao constante da correspondenia electrónica a que acima se fez referência – cfr fls 224 297 e 225 – e nenhuma outra prova foi feita no aspecto em apreciação, ter-se-á que responder ao ponto fáctico em apreço em função dessa correspondência.

E dela resulta que, anteriormente a 15/5/2012 já o A. falara com o Exmo Dr Damião – advogado da R.  – no sentido de saber se era possível e necessário o registo em causa. E resultará também – da expressão «de facto», utilizada nesse email («vou averiguar junto da Conservatória se, de facto, é possível fazer esse registo uma vez que o mandato em curso só termina no final deste ano»), que o A. já falara com Vasco no sentido de promover o registo em causa.

E é precisamente isso que se entende provado, respondendo-se, por isso ao art 11º do seguinte modo:

«O A. antes de 15/5/2012 solicitara a Vasco que promovesse o registo da deliberação na Conservatória do Registo Comercial».

 

No art 16º da base instrutória pergunta-se se «a demandada não ressarciu o demandante das quantias referidas em EE».

Constando dessa al EE) que «em 19 de Novembro de 2012, o demandante enviou à sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, S.A.", o email constante de fls. 180 e 181 e a carta constante de fls. 182 e 183, no qual reivindicava o pagamento da quantia de novecentos e cinquenta e um mil e seiscentos euros (€ 951.600,00), correspondente a remunerações que seriam devidas até 31 de Dezembro de 2012, no montante de sessenta e três mil quatrocentos e quarenta euros (E 63.440.00); oitocentos e oitenta e oito mil e cento e sessenta euros (€ 888.160,00), referente a remunerações a receber até ao final do mandato, em 31 de Dezembro de 2016; e trezentos e oitenta e um euros e dez cêntimos (€ 381,10), a título de despesas de representação», o tribunal da 1ª instância respondeu ao ponto da matéria de facto em questão do seguinte modo:

«Provado apenas que a demandada não pagou ao demandante a quantia de € 381,10 referente ao reembolso das despesas de representação e a quantia relativa às remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros)».

Pretende o A/apelante que este tribunal altere tal resposta dando-lhe o seguinte conteúdo:

 «Provado que a demandada apenas pagou ao demandante a quantia líquida de € 38.751,70, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, a título das remunerações devidas até 31 de Dezembro de 2012, não tendo pago a quantia de 381,10 euros, referente ao reembolso das despesas de representação, e a quantia relativa ás remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros)».

Não pode deixar de se dar razão ao mesmo, embora se imponha corrigir a quantia paga ao A. pela R. como melhor se verá.

È que, ao contrário do que o refere a R. nas contra-alegações, o A. na réplica insurgiu-se relativamente ao facto de as remunerações que lhe eram devidas  até 31/12/2012 perfazerem apenas o valor de 38.751,70, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, e não o valor liquido correspondente à quantia bruta de  € 3440,00, peticionada na acção e que reclamara da R. na carta de 19/11/2012 junta a fls 180/182. Com efeito, o A. no art 146º da réplica refere «impugnar os cálculos vertidos no doc nº 5 junto a contestação e, consequentemente, a qualificação dos valores que efectivamente lhe foram pagos, uam vez que, por defeito, os mesmos não correspondem à realidade», e no art 147º reitera que «no que respeita ao mandato que terminaria em 31/12/2012 tem direito a receber a quantia de € 63.440,00». 

Como resulta dos documentos juntos pela R. na contestação (fls 230 a 232), máxime de fls 232, a quantia que a mesma depositou em conta do A. no referente às remunerações que lhe eram devidas até 31/12/2012 não foi sequer a de € 38.751,70 constante da resposta ao artigo em referência, mas apenas a de € 38.096,57.

Logo, a resposta ao art 16º tem efectivamente que ser alterada, e também, como acima se salientou, referentemente ao valor efectivamente pago pela R..   

Assim responde-se ao art 16º da base isntrutoria nos seguintes termos:

«Provado que a R. pagou ao A. a quantia líquida de 38.096,57, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, a titulo das remunerações devidas até 31 de Dezembro de 2012, não tendo pago a quantia de 381,10 euros, referente ao reembolso das despesas de representação, e a quantia relativa às remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 euros)».

No art 17º pergunta-se se «o demandante não aufere qualquer provento desde 5/11/2012» e o tribunal de 1ª instância respondeu «Não provado».

Pretende o A/apelante que tal resposta seja alterada respondendo-se neste termos:  «Provado que, a partir de Janeiro de 2013, o Autor passou a prestar, a título individual, serviços de consultoria e que, quando comparado com o rendimento fixo que auferia na Ré, o rendimento auferido pelo Autor após a sua destituição decresceu em mais de 85%».

Ora o A. alegou, por referência ao momento em que interpôs a acção – Fevereiro de  2013 - que até então estava inactivo. Porém, na audiência de julgamento, que teve lugar já em Março de 2014, sobretudo em função do depoimento da testemunha Carla , passou a saber-se que, entretanto, e ainda em 2013, o A. passou a fazer trabalhos de consultoria pontuais. E embora resultasse muito claro dos vários depoimentos produzidos a respeito destes proventos, que, genericamente os rendimentos do A. neste tipo de actividade se situaram muito abaixo dos que lhe eram proporcionados pela R., não poderá deixar de ser da declaração de rendimentos relativa ao ano de 2013 junta a fls 638 a 641 que se haverá que responder ao ponto factico agora em apreciação.

Dela resulta que no ano de 2013 o A. auferiu um rendimento bruto de 39.543,27 ao qual devem ser deduzidos 9.885,82 € de retenções na fonte.

Em função desses elementos, responde-se ao art 17º da base instrutória, nos seguintes termos:

«Provado que, a partir de Janeiro de 2013, o A. passou a prestar, a título  individual, serviços de consultoria, e no ano em causa auferiu um rendimento bruto de 39.543,27, tendo efectuado 9.885,82 € de retenções na fonte».

B)- Alterada como foi a decisão de factos nos termos que antecedem,  importa agora apreciar as acima referidas questões em sede de aplicação do direito aos factos.

   a)E, antes de mais, cumpre saber se, ao contrário do que foi entendido na 1ª instância, a deliberação social cujos efeitos estão em causa nos autos se deverá ter como existente, e, não obstante a falsidade da acta em que se encontra vertida, valer como uma deliberação escrita unânime.

Ao nível em questão, há que partir do facto provado resultante da resposta ao art 1º da base instrutória, que o aqui apelante não colocou em causa: «A acta da reunião da assembleia geral da sociedade "CS Hotels, Golf & Resorts, A.", realizada no dia 2 de Maio de 2012 foi elaborada sem que tivesse sido tomada a deliberação correspondente em assembleia geral realizada no dia que dela consta».

O tribunal a quo entendeu que a indiscutível falsidade da acta em causa implicaria a inexistência da deliberação.

Citou, para assim concluir, e na sequência das citações da R. nas alegações de direito, Raúl Ventura [1], referindo: «A figura da "deliberação inexistente" - definida como sendo aquela que é simulada ou destituída de qualquer elemento essencial à sua existência - não está prevista na lei, de certo por não ser susceptível de produzir qualquer efeito, e tem sido considerada na doutrina como aquela em que "falte absolutamente" algum dos seus "elementos essenciais específicos"». E acrescentou: «Dir-se-á que não existe deliberação social quando um certo acto não seja adequado, nem sequer na sua aparência material, a vincular a sociedade pelos efeitos jurídicos por ele visados».  Cintando de seguida Manuel de Andrade [2], referiu ainda: «Dá-se a inexistência quando nem sequer aparentemente se verifica o corpus de certo negócio jurídico. Quando nem sequer na aparência existe uma qualquer materialidade que corresponda à própria noção de tal negócio. Temos ainda inexistência quando, embora exista essa aparência, a realidade não corresponde todavia àquele conceito»

Ora, na situação dos autos não se verifica a primeira das situações referidas a respeito da «inexistência» da deliberação: a acta em causa constitui um acto adequado,  na sua aparência material, a vincular a sociedade pelos efeitos jurídicos da deliberação nela constante. Em função dela verifica-se o “corpus” do negócio jurídico correspondente a uma deliberação social.

E, do nosso ponto de vista, não se verifica também a segunda, sobretudo depois que este tribunal procedeu à alteração da resposta ao art 6º, dando como provado que «apenas três dos accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1° até finais de Julho/princípios de Agosto, pois que Carlos e   Virgínia tiveram conhecimento dessa acta, pelo menos, desde 24/5/2012».

 Porém, mesmo ainda antes dessa alteração – e dando-se- erradamente, como já se viu, por adquirido, que a (totalidade dos) accionistas não tiveram conhecimento da acta a que alude o quesito 1°, até finais de Julho, princípios de Agosto - ainda assim, não poderia sustentar-se que o que verdadeiramente sucedeu não corresponda ao conceito de deliberação social. Com efeito, a realidade (do que passou) corresponde ainda ao conceito de deliberação social, como se tentará evidenciar com as considerações subsequentes.

Nos termos do artigo 54°/1 CSCom, «podem os sócios, em qualquer tipo de sociedade, tomar deliberações unânimes por escrito e, bem assim, reunir-se em assembleia-geral, sem observância de formalidades prévias, desde que todos estejam presentes e todos manifestem a vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado assunto». E no seu nº 2 refere-se: «Na hipótese prevista na parte final do número anterior, uma vez manifestada por todos os sócios a vontade de deliberar, aplicam-se todos os preceitos legais e contratuais relativos ao funcionamento da assembleia, a qual, porém, só pode deliberar sobre os assuntos consentidos por todos os sócios.»

Em comentário a esta norma escreve Pinto Furtado [3]: «O modo de revelação da deliberação dos sócios é geralmente um processo verbal desenvolvido em assembleia. A sua documentação em acta ou instrumento notarial (…) não constitui propriamente um meio de exteriorização, mas uma ulterior declaração testemunhal da sua estrutura e conteúdo, não podendo aqueles documentos ser tidos (…) como a forma da deliberação. Forma é a configuração que a deliberação recebe com a sua constituição – e só isso».

E para explicitar esta sua observação analisa o diposto no art 53º referindo entre o mais: «Na epígrafe do art 53º o Código não se refere à ideia global de forma das deliberações dos sócios mas, no plural, às formas de deliberação», reconduzindo-as a quatro: [4]«a) deliberações formadas em assembelia geral; deliberações de assembleia universal; c) deliberações unânimes por escrito; d) deliberações por voto escrito», configurando-as «como modelos específicos do conceito de deliberação padronizados ma lei pela sua frequência prática e o interesse social da sua tutela jurídica». Salientando que nas sociedade anónimas não têm lugar as deliberações por voto escrito – que só podem ser utilizadas pelas sociedades por quotas, cfr art 247º/1, e pelas sociedades em nome colectivo, cfr art 189º/1 - o autor em causa  procede a uma outra distinção nas deliberações – as com, e sem reuniãio da assembleia geral, distinção esta pressuposta pelo art 63º/4, incluindo nas primeiras, as deliberações formadas em asembleia geral e as formadas em assembleia universal, e na segunda, as deliberações por voto escrito, acrescentando [5]: «Já opomos a mais formal reserva a considerar as deliberações unânimes por escrito como formadas sempre em assembleia», pois que estas deliberações, a «par deste modo de formação em assembleia geral espontânea, poderão igualmente formar-se – e talvez mais frequentemente – sem reunião de assembleia», concluindo que «só as deliberações por voto escrito podem considerar-se como formadas sempre sem reunião da assembleia geral».

 E justifica [6] a aglutinação no referido art 54º/1 das deliberações unânimes por escrito às obtidas em assembleias universais, em função «do traço comum de as duas constituírem modos de substituição de uma assembleia geral em forma, através da intervenção da totalidade dos sócios», sendo que por assembleia universal se deverá entender «a assembleia geral não convocada, ou convocada irregularmente, a cuja reunião tenham comparecido todos os sócios e todos tenham então aprovado a sua constituição e a susceptibilidade de passarem a deliberar sobre um assunto determinado».

Assim, o nº 2 do referido art 54º, bem como as exigências da parte final do seu nº 1, ao contrário do que o parece ter entendido o Exmo Juiz a quo, reportam-se às assembleias universais, nada tendo a ver com o processo de formação das deliberações unânimes por escrito.

Aliás, o autor que se vem citando,  quanto a estas, põe em destaque [7] que «em parte alguma estabeleceu o Código o modo de formação de semelhante arquétipo deliberativo»; apenas exigiu «expressa e indubitavelmente, que tal deliberação seja aprovada por unanimidade», frisando que, «faltando esta, a deliberação não será nula, nos termos do art 56º/1 b) e 3, que se refere apenas a outra forma de deliberação, a por voto escrito (…), estaremos perante uma pseudo deliberação, ferida de inexistência».

Procede à distinção entre a deliberação por voto escrito e a deliberação unânime por escrito, referindo que, «ao contrário da por voto escrito ( …) em que de antemão, se não sabe qual será o resultado da votação, a unânime por escrito, na concepção do legislador, é antes, lembrando a nosso Lei Mental, como que uma deliberação mental – pois, no momento em que se decide iniciar a sua formação, já se sabe que ela corresponde ao voto unânime dos sócios».

E depois de claramente enunciar que «a deliberação unânime por escrito deverá pois, em princípio, constar de um documento avulso, que, de regra, será um escrito particular» [8],, acrescenta: «Em vez disso, porém, não vemos obstáculo sério a que o escrito seja constituído precisamente pelas páginas correspondentes do livro de actas, onde a deliberação se consignou e foi a assinar por todos os sócios, como deliberação unânime por escrito expressa em acta» ( «a prática da circulação da acta respectiva parece, aliás, ser frequente entre nós»).

Mas, Pinto Furtado, que se tem vindo a citar, na sua obra «Deliberações de Sociedades Comerciais»[9],  é mesmo absolutamente explícito a respeito de, em situação semelhante à ocorrida nos autos, não se dever ter a deliberação social como inexistente. Assim,  quando refere «a hipótese», «também por vezes tratada na doutrina italiana como de “não assembleia” (...) segundo a qual, a pedido dos sócios, os administradores  procederam muito à “vara larga” (alla buena) redigindo uma “acta” a conter a “deliberação” em que todos estão de acordo, registando-a como formada em “assembleia”, quando esta, afinal, não se realizou», e, criticando o Ac RP 20/171967 (Jur Rels, 13º-1209) que refere essa situação como uma hipótese de inexistêencia, em que «verdadeiros sócios fabricassem uma acta para fingirem terem tomado certa deliberação», pronuncia-se do seguinte modo: «A tal propósito, temos de dizer que parece hoje obviamente desacertado configurar a espécie como um caso de falta de correspondência com a “facti species” de deliberação, quando afinal ela descreve, com inteira e manifesta validade, nitidamente, a tipica forma de deliberação unânime por escrito (art 54º/1 CSC).

E atrás [10] já referira: «(...) ficando excluídos da ideia da inexistência (...) (a hipótese) «em que não tenha havido sequer reunião, por os sócios terem procedido muito sumariamente deixando que redijam os administradores uma acta duma assembleia inexistente por estarem de acordo com as deliberações que deveriam tomar (...)».

Acaba por restringir a ideia de inexistência juridica (da generalidade das  deliberações) às «hipóteses em que não subsista sequer uma declaração comum dos sócios que tenha recolhido a maioria dos votos (...), ou em que não haja ao menos uma aparência de deliberação», apenas exigindo para o arquétipo correspondente às deliberações unânimes escritas «que expressa e indubitavelmente, tal deliberação seja aprovada por unanimidade».  

Coutinho de Abreu[11], citado pelo A./apelante, em anotação ao aludido art 54° do CSCom, afirma: «Verificando-se urgência para a tomada de uma decisão (urgência não compatível com a convocação de assembleia), a impossibilidade ou inconveniência de assembleia (com ou sem convocação) ou outras circunstâncias, e verificando-se ainda a concordância de todos os sócios quanto a certa proposta,  basta que esta proposta (ou a decisão correspondente) e aquela concordância sejam inscritos em  documento(s).Normal e tradicionalmente, os documentos são em papel. Estes documentos escritos serão em geral particulares, incluindo livros de actas, mas não está excluída a possibilidade de documento autêntico. Pode uma deliberação constar de um só documento, assinado por todos os sócios (ou representantes); mas também pode constar de vários, cada um com idêntico texto deliberativo e parte das assinaturas exigidas. Assim, as assinaturas podem ser feitas no mesmo lugar e (quase mesmo) tempo, no mesmo lugar mas em tempos diferentes, ou em diferentes lugares e tempos.(...) Ocorrem com alguma frequência casos assim: em acta assinada por todos os sócios, diz-se que certas deliberações foram adoptadas em determinada assembleia geral; porém, nunca tal assembleia se realizou. As ditas deliberações são — enquanto (ou na forma de) deliberações de assembleia — inexistentes. Mas porque obtiveram o assentimento de todos os sócios (por via das assinaturas), elas são qualificáveis como deliberações unânimes por escrito.»

Na situação concreta dos autos, não pode deixar de se reconhcer que na aparência e na materialidade existe uma realidade que não pode deixar de corresponder à de uma deliberação social, ainda que unânime por escrito.

È que, quer a acta de 2 de Maio de 2012, quer a respectiva lista de presenças – que Vasco refere ter sido elaborada apenas em 24/5, cfr fls 224 - se encontram assinadas por todos aqueles que tinham de o fazer se a a reunião que nela se refere tivesse tido lugar -  a acta encontra-se assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral e por quem o teria secretariado, como o exige o disposto no art 388º/2 CSCom («As actas das reuniões da assembleia geral devem ser redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido como presidente e secretário»); a lista de presenças, encontra-se assinada por todos os accionistas, nos termos do art art 382°/3 («Os accionistas presentes e os representantes de accionistas devem rubricar a lista de presenças, no lugar respectivo»), como resulta das respostas aos arts 9º e 10º base instrutória.

            Nem se diga que, dois deles – Dinis e Joana – quando assinaram as respectivas presenças naquela lista não tinham conhecimento nem vontade de assentirem na deliberação em causa, e que apenas tomaram conhecimento do teor da acta a que se referia tal lista de presenças no dia 28/10/2012, aquando da realização da Assembleia Geral que revogou a deliberação de recondução do mandato dos corpos sociais.

     È que, tal falta de conhecimento e de vontade não pode ser oponível ao A., desde o momento em que o mesmo desconhecia a falsidade da acta em referência.

E de todo o modo, como é evidente, qualquer dos dois referidos accionistas poderia e deveria saber o que estava a assinar, tanto mais que a lista de presenças em referência – correspondendo, decerto, ao documento de fls 547 que a R. juntou em audiência -   assinalava nela própria ser referente à Assembleia- geral de 2/5/2012.  Afinal, a accionista Ana Margarida, teve o cuidado de se informar a respeito do conteúdo dessa acta, por isso tendo pedido esclarecimento ao advogado da R. por email de 14/8/2012, não obstante ter assinado a correspondente lista de presenças.

Por outro lado, e como o evidencia o apelante foi, ainda e efectivamente, no interesse da sociedade, que também aqueles dois accionistas assinaram, sem ler, a acta em causa, pois que, ao fazerem-no, e como resulta da al PP), pretendiam no interesse da mesma, organizarem a documentação para efeito da auditoria jurídica a efectuar pela Uria Menendez-Proença de Carvalho, tendo sido nessa emergência que o Presidente da Mesa da Assembleia Geral promoveu a assinatura pelos accionistas da lista de presenças correspondente à referida acta e de muitas outras, quer referentes à R., quer referentes a outras sociedades do Grupo (Vasco chegou a falar em cerca de 300…). Como o assinala o apelante, «tal assinatura tinha um efeito jurídico, de resto, por eles pretendido: a "regularização" formal das deliberações anteriormente tomadas. A de 2 de Maio de 2012 e todas as demais.»

Fazendo sentido perguntar como o faz o apelante : «Aliás, que outro sentido poderia ter a aposição da assinatura naquela lista de presenças que não a adesão unânime à decisão (também ela um voto) já expresso pelo accionista ultramaioritário, independentemente do seu sentido?!»

Por isso, só pode irrelevar o desconhecimento dos já acima referidos dois  accionistas relativamente ao teor da acta em referência – é que, não obstante esse desconhecimento – que eles poderiam e deveriam ter suprido no momento, informando-se – eles quiseram efectivamente vincular-se ao conteúdo dessa acta e ao sentido das decisões aí vertidas.

Diga-se, aliás, que esse desconhecimento apenas confirma o já referido modo de funcionamento decisório da R., pois que, tendo as assinaturas da lista de presenças sido feitas individual e sucessivamente  - al QQ) da matéria de facto – os accionistas Joana – como já se sabe, filha de Carlos e Virginia -  e Dinis – marido (ou companheiro) da  accionista Ana Margarida,  pessoa de confiança de Carlos – limitaram-se a assinar, porque tal lista já estava anteriormente assinada, e porque levantariam eles «complicações»?! Efectivamente, atenta a já referida prática padrão de actuação da R., as assinaturas eram apostas apenas para conferir uma aparência de regularidade formal às actas das assembleias gerais, uma vez que tudo era previamente decidido pelo accionista Carlos (detentor de 99,98% do capital social da R.)

E isto significa que não obstante ser falsa a verificação de uma assembleia geral da R. no dia 2/5/2012 – pois,que nesse dia e hora e local, os accionistas da R. não se reuniram  para deliberarem como aí consta – nem por isso essa acta deixa de conter e documentar a deliberação da R. em apreço - a da recondução antecipada dos orgãos  sociais da mesma para o mandato de 2013/2016 - constituindo essa deliberação uma deliberação unânime por escrito [12].

Sempre se dirá, no entanto que, se aquilo que já se viu constituir prática/padrão na sociedade R., e inclusivamente nas sociedades do grupo a que a mesma pertence - elaborar  actas de reuniã(ões) da assembleia a deliberar o que se pretendia, sem que tivesse havido qualquer reunião de accionistas, dando-se à deliberação uma fundamentação que parecesse adequada, fazendo-se assinar a correspondente lista de presenças por todos os accionistas subsequentemente (consequentemente, vista a análise precedente, dar a deliberações unânimes escritas a falsa aparência de deliberações formadas em assembelia geral), pudesse implicar,  na situação dos autos, a conclusão da inexistência da deliberação – e já se viu que não é o caso – então,  sempre se deveria obstar a esse resultado conclusivo através da operância do abuso de direito.

O apelante refere a este respeito a modalidade do abuso de direito que se usa referir como “venire contra factum proprium”, perspectivando-o em diferentes atitudes da R: por um lado, na circunstância desta opôr ao A. a suposta inexistência (ou invalidade) de uma deliberação quando, para outros efeitos, designadamente para os de uma auditoria interna, ter levado a cabo todos os actos necessários (recolha das assinaturas de todos os accionistas) com vista a garantir a validade de tal acto; por outro, na circunstância de, invocando embora a inexistência (ou invalidade) decorrente da não realização da reunião de 2/5/2012, não o fazer relativamente às deliberações anteriormente adoptadas nos «mesmíssimos termos», isto é, sem ocorrência física da dita reunião e mediante posterior "formalização" com a subscrição da respectiva lista de presenças.

De uma maneira ou de outra, a R. estaria a “contraditar-se”, negando, no seu interesse, comportamentos anteriores seus, não obstante a necessária confiança que aquela acta, de que o A. teve conhecimento em Maio de 2012 através do email que lhe enviou Vasco, Presidente da Mesa da Assembleia Geral, e que chegou a ser levada a registo comercial, para ele naturalmente implicou relativamente à sua recondução no cargo de administrador no subsequente mandato.

O «exercício de uma posição jurídica em contradição com uma conduta antes assumida ou proclamada pelo agente, sem que tal se justifique» [13], antes implicando uma mudança de atitude consoante as conveniências do mesmo, implica necessariamente abuso de direito - e, na verdade, a R. aceita a existência e validade de deliberações tomadas nas mesmas condições do que a que está em causa nos autos quando tal lhe é conveniente, e rejeita a existência (e validade) desta deliberação quando tal já lhe não convém.

A carga violadora da ética implicada no abuso de direito sentir-se-á, porventura, de modo mais sensivel nas atitudes da R., quando se faça apelo directo à modalidade do mesmo designada por inalegabilidade formal.

 Aqui,  dever-se-á ter como contrário à boa fé um “venire” negativo - «alguém prevalecer-se de nulidades quando, conhecendo-as, tivesse em momento prévio mostrado a intenção de agir em execução do negócio viciado», devendo ter-se em consideração que «a invocação de nulidades não esgota o universo dos “pretextos”; temos ainda a invocação da caducidade ou de outros factores impedientes, sempre em contradição» [14].

Nesta perspectiva, será inadmissível que a R. invoque a inexistência (e também a nulidade...) da deliberação em causa nos autos, com fundamento na falsidade de uma acta e do modo de revelação dessa deliberação [15], quando foi ela que, sem conhecimento do A., deu causa às irregularidades dessa forma, não podendo por isso admitir-se que a alegação dessas irregularidades surta o efeito de desvincula-la da materialidade subjacente.

 b) Mas, a R. – subsidiariamente para ao caso de se entender que a deliberação existe (e, note-se, que ela própria, ao pretender tê-la revogado na Assembleia Geral de 28/10/2012, acta nº 11, a fls 184, pressupôs a respectiva existência) - vem sustentar que a deliberação em apreço seria nula, nos termos das als a) e d) do art 56º CSCom, consequentemente, por um lado, porque teria sido tomada em assembleia geral não convocada, não tendo todos os sócios estado presentes ou representados, por outro, porque o conteúdo da mesma, directamente ou por actos de outros orgãos que determine ou permita, ofenderia preceitos legais que não podem ser derrogados, nem sequer por vontade unânime dos sócios, estando a reportar-se à norma do art 391º/3 do CSCom que estabelece que os administradores são designados por um período fixado no contrato de sociedade não excedente a quatro anos civis.

Ora, no tocante àquela invocada primeira causa de nulidade, já se viu como a mesma irreleva na situação dos autos, na medida em que já se concluiu que a deliberação em causa não foi tomada numa assembeia geral, sequer universal.

No tocante à segunda, basta ter em consideração a totalidade da referida norma do nº 3 do art 391º: «na falta de indicação do contrato, entende-se que a designação é feita por quatro anos civis, sendo pemitida a reeleição», para se entender não estar também em causa, ainda que indirectamente, tal causa de nulidade.

Na verdade, ao contrário do que a R. o dá a entender, não está em causa uma encoberta prorrogação do mandato para lá do limite temporal dos quatro anos, que permitisse a subsunção à invocada norma jurídica da al d) do art 56º; está em causa uma clara e assumida reeleição para um novo mandato, implicada na recondução antecipada dos corpos sociais para esse novo mandato. Assume-se claramente no teor da deliberação que «mesmo considerando que o mandato dos actuais órgãos sociais termina no final do corrente ano, entende-se que se deveria, desde já, reconduzir os actuais membros para o quadriénio 2013 /2016»,significando que se quis que no novo mandato, a ter inicio em 1 de Janeiro de 2013 e terminus a 31 de Dezembro de 2016, se mantivessem os actuais membros da administração, que, como tal, se tinham como reeleitos.

Por isso, nenhuma razão há para entender que esta deliberação antecipatória de recondução, traduzindo-se numa reeleição, viole o limite legal de quatro anos previsto no número 3 do artigo 391° do CSC.

Por último, importa avaliar a eficácia da deliberação em causa.

Pretende a R. de modo a impedir a produção dos efeitos da deliberação em apreciação, que tais efeitos não poderão ter-se como produzidos, na medida em que – e como é obvio – a «deliberação só podia produzir efeitos em relação a quem pertencesse aos corpos sociais da sociedade na data em que fora tomada  (2/5/2012) e que ainda a eles continuasse a pertencer em 31/12/2012, data do termo do mandato em curso» - art 29º da contestação -  referindo, e bem, que «a deliberação não podia produzir efeitos em relação a um qualquer membro dos Corpos Sociais que entretanto falecesse, ou tivesse ficado absoluta e definitivamente incapacitado para o exercicio do cargo ou que entretanto renunciasse ao cargo .... ou que entretanto tivesse sido destituído, com ou sem justa causa, pela sociedade – art 31º da contestação – tendo sido esse o caso do A. que foi destituido – com justa causa, alega - antes do fim do mandato em curso, frisando que a sociedade mantinha em relação a todos os membros dos corpos sociais que haviam sido eleitos para exercer funções até ao termo do mandato em curso, todos os seus poderes, incluindo os de os destituir.

À materia em causa respondeu o A. na réplica, contrapondo que a celebração do negócio jurídico em causa (designação para o cargo de administrador para o quadriénio 2013/2016) ocorreu no momento em que o A. conheceu e aceitou a deliberação de recondução, ou seja, necessariamente, pelo menos, em Maio de 2012, e nesse momento ter-se-á como iniciada a relação de administração entre a R. e o A. relativa ao novo mandato, com a respectiva produção de efeitos jurídicos, com excepção do efeito jurídico relativo à renovação deste - o inicio do exercício de funções - o qual, ficou subordinado a um termo suspensivo

Cumpre antes de mais sublinhar que, tendo sido decidido na 1ª instância que a destituição do A. ocorreu sem justa causa, a R., não tendo recorrido, conformou-se com esse segmento da decisão, pelo que é neste momento pacífico que a destituição do A., operada pela deliberação de 5/11/2012,  foi sem justa causa.

Aliás, nem outro podia ser o entendimento da R., na medida em que foi ela própria quem, procedendo ao pagamento da indemnização que entendeu devida ao A., aceitou nos autos a inexistência de justa causa para a respectiva destituição.

È controvertida na doutrina a natureza juridica da deliberação social, não faltando, porém, quem lhe atribua a natureza de negócio jurídico, como disso dá noticia Pinto Furtado[16]. Assim, Menezes Cordeiro, que as insere na categoria de «negócio jurídico plural» , Oliveira Ascenção, Lucas Coelho, Coutinho de Abreu,  Pedro Maia,  Brito Correia.          

A recondução antecipada do administrador para novo mandato nenhum interesse teria, para ele ou para a sociedade - e são facilmente perspectiváveis os intereses contrapostos de um e outra, aqui a satisfação pelo desempenho do administrador e o desejo da continuidade da administração na mesma linha que se pespectiva como proveitosa, ali a segurança inerente -  se uma e outra das partes não resultasse vinculada à inerente declaração de vontade.

Será, pois, razoável o entendimento do A. de que, desde a aceitação pelo mesmo dessa recondução imediata, que se dará com o  respectivo conhecimento, se produzem todos os efeitos da relação de administração, à excepção do respectivo início, de tal modo que se possa dizer que a produção da totalidade dos efeitos da relação de administração se encontra apenas dependente do decurso do tempo.

Porém, ainda que essa não seja a melhor maneira de perpectivar o nascimento dos efeitos da relação de administração, a verdade é que a noção de termo suspensivo tanto cobre o início dos efeitos do negócio, como apenas a respectiva exercibilidade.

Com efeito, diz Mota Pinto [17] a respeito do conceito de termo, que o mesmo se traduz na «cláusula acessória típica pela qual a existência ou a exercebilidade de um negócio são postos na dependência de um acontecimento futuro mas certo, de tal modo que os efeitos só começam ou se tornam exercitáveis a partir de um certo momento  (termo suspensivo ou inicial) ou começam desde logo, mas cessam a partir de certo momento (termo resolutivo ou final)». Assim se os efeitos do negócio só começam, ou só se tornam exercitáveis a partir de certo momento, está-se na presença de um termo inicial, suspensivo ou dilatório (dies a quo ou ex quo).

Na situação dos autos está em causa um termo, que é certo, porque se sabe antecipadamente o momento exacto em que se verificará – dia 1/1/2013 – estando por outro lado em causa relativamente à verificação deste dia, um aconteciemnto futuro, mas certo, como é próprio do termo.

Determina o art 278º CC que seja aplicavel à estipulação do termo, ainda que com as necessárias adaptações, o disposto nos art 272º e 273º.

Por isso, e por referência ao disposto no referido art 272º -  que rege a respeito da pendência da condição  - dever-se-á dizer relativamente ao prazo – e «chama-se prazo ao período de tempo que decorre entre a realização do negócio e a ocorrência do termo (...) [18] - que na pendência do mesmo, há também uma obrigação de proceder segundo a boa fé a cargo de uma e da outra das partes, de modo a não comprometer a integridade do direito da outra. Quer dizer, também aqui não pode admitir-se a «sabotagem» do termo, resultando aplicável a este – por força do referido art 272º - a doutrina do nº 2 do art 275º referente à condição, de tal modo que se poderá dizer que se a verificação do termo for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificado (e se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada).

Pires de Lima/Antunes Varela [19] em anotação ao art 272º referem que «a doutrina do nº 2 do art 275º é uma consequência deste princípio geral».

E na anotação ao art 275º dizem, por sua vez: «A doutrina do nº 2 é uma consequência da regra geral expressa no art 272º. A boa fé tem aqui um sentido ético, semelhante ao que tem no art 227º. A disposição revela que, com a celebração do negócio condicional, nascem deveres secundários ou acessórios, especiais, de conduta para uma das partes ou para ambas elas».

Aplicando-se estas ideias à situação dos autos, logo se vê que a R. não podia - sob pena de ilicitude – ter impedido que o A. mantivesse a qualidade de administrador em 31/1/2012,  provocando a respectiva destituição antes desse momento, fazendo-o sem justa causa, como está assente que fez.

Mantendo, indiscutivelemnete, como o refere, em relação a todos os membros dos seus corpos sociais que haviam sido eleitos para exercer funções até ao termo do mandato em curso, todos os seus poderes, incluindo os de os destituir, só poderia ter destituido o A., antes de 31/12/2012, se, para tanto, tivesse justa causa.

O que se vem de dizer, utilizando a doutrina do art 272º e (275º/2 CC ex vi do disposto no art 278º todos do CC), não constitui, afinal, nada, que a simples utilização do abuso de direito não permitisse concluir.

 Esta confluência de resultados  não é de  estranhar, visto que, como o frisam Pires de Lima/Antunes Varela [20], «a solução consagrada no nº 2 (do art 275º) representa, por outro lado, um corolário da ideia de que a ninguém deve ser licito tirar proveito dos actos que pratique, violando as regras da boa fé».

Ora, «a exceptuio doli generalis (...) funciona, de facto, sempre que, do recurso a interpretações tendenciosas da lei, da utilização de particularidades formais das declarações da vontade ou do aproveitamento de incompleções em regras juridicas, se pretendam obter vantagens não conferidas  pela ordem juridica e desde que tais práticas sejam contrárias à boa fé» [21].

«A imposição legal da boa fé, em sentido etico, representa, pois, a obrigatoriedade de se proceder, na vida de relação, com respeito pelas chamadas “regras do jogo”. Utilizando expressões vulgares do nosso quotidiano, que se nos afiguram elucidativas da realidade em presença, diremos que há boa fé quando se pratica jogo limpo (o “fair play” da terminologia anglo – saxonica); há ofensa da boa fé quando se recorre ao jogo sujo, ao golpe baixo (“unfair”)».[22]

A R. agiu de ma fé ao destituir o A. sem justa causa, prejudicando as legítimas expectativas que resultavem para o mesmo da sua recondução ao cargo de administrador.

 Servindo-se da prática de um acto lícito – pois que, consabidamente, é licita a destituição de administrador nas sociedades anónimas sem justa causa - praticou um acto ilícito, pois que essa destituição, sem motivo, se destinou meramente a impedir a subsistência do mandato do A. em 2013.

E que assim foi, resulta desde logo da circunstância do facto que a R.utilizou para justificar essa destituição – a de ser exigência inegociavel imposta pelo Fundo, a de que na data do negócio com o mesmo estivessem livres os cargos de administração - não ter, à data da referida destituição, 5/11/2012, qualquer urgência.

 

Daí que, a R., com a prática deste facto ilícito se tenha tornado responsável, não apenas pelos danos que causou ao A. com a não continuação do respectivo mandato até ao fim de 2012 – que pretendeu assumir com o pagamento que lhe fez da quantia de € 38.096,57 - mas também pelos s danos que implicou para ele a circunstância de dolosamente ter impedido a respectiva renovação do mandato para 2013/2016.

c) Pretende o A. a condenação da R. a pagar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu em virtude da destituição, sem justa causa, que abranja:

- A diferença entre o valor da remuneração mensal fixa que ele receberia até ao final de Dezembro de 2012 - € 63.440,00 (sessenta e três mil e quatrocentos e quarenta euros) - e a quantia entretanto paga pela Recorrida a esse titulo, no montante de € 61.771,67 (sessenta e um mil setecentos e setenta e um euros e sessenta e sete cêntimos), ou seja, € 1.628,33 (mil e seiscentos e vinte e oito euros e trinta e três cêntimos), e a que acresce, nos termos do artigo 806.° do Código Civil, juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da constituição em mora (19.11.2012) até efectivo e integral pagamento;

- O valor da remuneração mensal fixa que o Recorrente receberia a partir daquela data até ao final do mandato (Dezembro de 2016), ou seja, € 888.160,00 (oitocentos e oitenta e oito mil e cento e sessenta euros), a que acresça, nos termos do artigo 806.° do Código Civil, juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da constituição em mora (19.11.2012) até efectivo e integral pagamento.

- O pagamento de uma indemnização pelos danos não patrimoniais em virtude do modo como decorreu o processo de destituição, danos esse a fixar em montante nunca inferior a € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a que acrescerão os correspondentes juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da data da citação até efectivo e integral pagamento.

Resulta da resposta que foi dada por este tribunal ao art 16º da base instrutória que «a R. pagou ao A. a quantia líquida de 38.096,57, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, a titulo das remunerações devidas até 31 de Dezembro de 2012, não tendo pago a quantia de 381,10 €, referente ao reembolso das despesas de representação, e a quantia relativa às remunerações a receber até final do mandato em 2016 (888.160,00 €)».

Apesar de, como acima se reflectiu, o A. na réplica ter  impugnado o  facto de as remunerações que lhe eram devidas  até 31/12/2012 perfazerem o valor de 38.751,70, correspondente à quantia bruta de € 61.771,67, e não o valor liquido correspondente à quantia bruta de € 63.440,00, que peticiou na acção, a verdade é que nenhuma prova fez relativamente a eventuais erros de cálculo constantes da folha referente aos mesmos junta na contestação pela R.

Por isso, ficou este tribunal sem saber se ao A. assiste, efectivamente, no que se reporta a tais  remunerações, o valor liquido correspondente à quantia bruta a que o mesmo se refere. Consequentemente, se o A. se acha privado da quantia de € 1.628,33 e respectivos juros de mora, que ora reclama.

Este desconhecimento a respeito de efectivo dano na esfera patrimonial do A. impede este tribunal de recorrer a uma condenação genérica liquidavel subsequentemente. Fosse certo que ao A. era devida (uma qualquer) importância superior à que lhe foi paga, ao nível em referência, e ainda que este tribunal não dispusesse de elementos para quantificar essa maior quantia, poderia remeter tal quantificação para liquidação de sentença. Desconhecendo a existência do dano em causa, não pode fazê-lo.

 Pelo que a apelação improcede relativamente à condenação da R.no pagamento ao A. da quantia de, € 1.628,33 e respectivos juros de mora.

Relativamente aos danos patrimoniais que a destituição do A., sem justa causa, lhe implicou quanto ao mandato de 2013/2016, porque o valor da indemnização que a esse nível lhe é devida não foi fixada prévia e contratualmente (no contrato de sociedade ou em outro contrato entre a sociedade e o administrador), e tão pouco o foi por acordo posterior à destituição  (por contrato entre a sociedade e o ex-administrador)  - e sabe-se que houve efectivamente negociações entre uma e outra parte, protagonizadas, como é evidente, por Carlos, sem que, no entanto, as mesmas tivessem desembocado num acordo  - a indemnização será calculada «nos termos gerais de direito», mas sem que a mesma possa «exceder o montante das indemnizações que presumivelmente receberia até ao final do período para que foi eleito».

È o que resulta do nº 3 do art 430º do CSCom

Como é evidente, esse valor máximo da indemnização «não é o valor necessário desta», pois que, sendo a indemnização em causa calculada «nos termos gerais de direito», aplicar-se-lhe-á a regra geral do cálculo da indemnização decorrente da teoria da diferença, de tal modo que, se o destituído «teve rapidamente oportunidade de exercer outra actividade de nivel remuneratório idêntico» [23] não terá tido quaisquer danos.

Não sendo embora pacífico, é, tanto quanto se crê, maioritário, o entendimento segundo o qual cabe ao destituído provar a existência e o valor de tais danos. [24] 

Caberá, pois ao A., aferir a diferença de valores entre o que receberia até 31/12/2006 junto da R., e o que recebeu e vier a receber, até essa mesma data, na actividade que vem exercendo, ou noutras. 

Do que decorre que os prejuizos do A., que deverão ser calculados em função dos vencimentos que auferiria nos anos de 2013 a 2016, só poderão ser conhecidos após 2016, altura em que o A. disporá dos elementos necessários para apurar a referida diferença de valores.

Impõe-se, pois, que se remeta a liquidação desses prejuízos para momento temporal subsequente a 2016, em função da referida indeterminação das consequências danosas do facto ilicito.

Pede ainda o A. indemnização pelos danos não patrimoniais que a R. lhe causou  em virtude do modo como decorreu o processo de destituição, danos esses que entende que deverão ser fixados em montante nunca inferior a € 50.000,00 e a que acrescerão os correspondentes juros de mora à taxa de 4% calculados a partir da data da citação até efectivo e integral pagamento.

Para aferição da existência destes danos de ordem moral e para encontrar equitativamente quantia monetária que se mostre susceptível de os compensar, e visto que foi dado como provado - resposta ao art 18° da base instrutória – que «o A. sente tristeza e desgosto pela forma como foi dispensada a sua colaboração com a sociedade demandada», há que “factualizar” a “forma” utilizada pela R. para o efeito em causa.  

O primeiro acto da R. a ter em consideração para esse efeito,  deverá situar-se na decisão referente ao cancelamento do registo da deliberação da recondução para o triénio de 2013/2016, que Vasco diligenciou em representação da R., endereçando em 12/9/2012 à CRCom de Lisboa o requerimento constante de fls 119/120.

Esse acto foi logo seguido, em 20/9/2012, da deliberação, em Assembleia Geral, da alteração dos estatutos da R., no sentido de reintroduzir o cargo de Presidente do Conselho de Administração, para que, logo, foi eleito Carlos, e alterar a forma como a sociedade se passava a obrigar, passando a ser necessária a intervenção do presidente do Conselho de Administração ou de dois administradores, pelo que, tendo nesse acto a administradora Virginia Saraiva renunciado ao cargo, a sociedade deixou de se obrigar apenas com a assinatura do A., como sucedia até então.

Desconsiderando propositadamente o A., Carlos só lhe deu  conhecimento formal dessa relevantissima deliberação, em resposta a e-mail do próprio A., de 20/9/2012, fazendo-o, concretamente, em 3/10/2012 – cfr mail de fls 134

Em 30/9/2012 – cfr fls 144 - rescindiu o contrato que mantinha com Vasco Pinheiro, Director de Operações, o que motivou da parte deste mail de 17/10/2012 - cfr fls 141- referindo desconhecer “por completo” os motivos dessa rescisão, quando ainda em reunião de  22/9 tinha sido louvado pelo seu empenho e dedicação.

Tambem o contrato existente com Joana Oliveira, assistente pessoal do A., foi rescindido e com três meses de antecedência em relação ao seu termo – cfr - fls 165

Em 2/10/2012, Carlos, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da R., deu ordens para que as deslocações do A. para fora de Lisboa e fora do Algarve passassem a depender da sua autorização prévia, para que quaisquer relatórios do A. com conteúdos de informação de gestão ou de índole logistica fossem enviados para a pessoa dele, como disso foi comunicado por mail  correspondente ao de fls 163 de Manuel M. Carvalho.

Em 9/10/2012 o A teve conhecimento por intermédio de Bruno Santos – cfr fls 167 – que qualquer informação que solicitasse deveria ser requerida directamente a Carlos, não estando ele, Bruno Santos, autorizado a facultar-lhe informação sem a sua validação prévia por aquele.

Ao longo do mês de Outubro a R. procedeu à suspensão de programas culturais que o A. vinha promovendo junto de diversos hotéis – como decorre dos emails de fls  145 a 163 -fazendo-o sem o consultar e sem o informar directamente – cfr fls 145, 151, 153.

Em 28/10/2012, Carlos chamou a si todos os poderes de administração da R., deixando o A. sem qualquer pelouro, tendo convocado o A. de vespera para a reunião em que assim decidiu – cfr fls 169, 170, 171,175

E em 28/10/2010 a R. deliberou a revogação da deliberação de recondução do A. para o quadriénio 2013/2016;

Culminando o conjunto destas actuações, perante a resistência do A. em demitir-se, com a respectiva destituição, em Assembleia Geral de 5/11/2012, com alegada «justa causa objectiva».

È patente da leitura de muitos dos e-mails juntos aos autos provenientes de funcionários diversos da R. e até de outras sociedades, a forma humilhante e vexatória com que a R. tratou o A. neste processo, mostrando-se indiferente às necessárias repercussões negativas no A. dessa sua conduta, sendo evidente o seu propósito de, hostilizando-o e desconsiderando-o de forma crescente, conseguir que o mesmo abandonasse a sociedade, renunciando ao respectivo cargo.

Refere o A./apelante que esta actuação por banda da R., por si só, configura a prática de um facto ilícito – ofensa a direitos de personalidade – que consubstanciaria, se necessário fosse, fundamento autónomo de responsabilidade civil nos termos do disposto no artigo 484.° do CC, quando nele se afirma que «quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados».

E cita, com pertinência, Coutinho de Abreu [25], quando o mesmo refere: «Contudo, a sociedade pode ter de compensar danos não patrimoniais. Não simplesmente, repita-se, por ter destituído sem justa causa, mas pelo modo como o fez: v.g., alegou infundadamente violação de deveres ou a inaptidão do administrador. Aqui, a par do facto lícito-destituição, há actuação ilícita da sociedade. Há, pois, fundamento autónomo de responsabilidade (v., designadamente, os art. 483.° e 484.° do CCiv.) não previsto nos art. 403.°, 5, e 257.°, 7, do CSC. A compensação desses danos não patrimoniais [bem como a indemnização de eventuais danos patrimoniais indirectos (derivados do ataque à reputação do administrador)] não está sujeita aos limites indicados nestes preceitos societários».

Não se mostra, no entanto, necessário fazer apelo a fundamentos autónomos para a responsabilização da R. pelos referidos danos de ordem espiritual, visto que acima já se concluiu que a mesma agiu ilicitamente ao destituir o R., fazendo-o, em, última análise, em abuso de direito.

Dispõe o artigo 496°/1 CC que  «na fixação da indemnização, deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.».

Os danos que a R. inflingiu deliberadamente na pessoa do A. são graves, estando em causa um processo humilhante e revoltante, prolongado por cerca de dois meses, de o despedir.

O modo como a R. decidiu conduzir e publicitar esse processo provocou ao A. «tristeza e desgosto», e necessariamente implicou o seu desprestigio profissional e social, afectando a sua imagem profissional e reputação, o respectivo direito à honra e consideração e o direito à saúde física e mental.

No contexto em causa, entende-se constituir compensação bastante dos danos em análise, o valor de € 20.000,00, a que acrescerão juros de mora à taxa legal desde a data desta decisão (e não desde a data da citação, como vinha pedido) .

 

d)Também ao nível da reforma da decisão por responsabilidade por custas a posição da A. merece acolhimento.

Ao contrário do que o entendeu o tribunal a quo no despacho em que indeferiu  o pedido de reforma da sentença no que se refere às custas, mostra-se essencial ponderar o não conhecimento pelo A. do depósito a que a R. procedeu da quantia de € 38.096,57, precisamente na véspera da entrada em juízo da  petição da presente acção. Só o conhecimento do A., antes da propositura da acção, do referido pagamento, poderia eximir a R. das custas correspondentes ao pedido nesse montante.

Por isso, verificando-se efectiva inutilidade superveniente da lide referentemente à quantia de € 38.096,57, as custas dessa inutilidade deverão ser suportadas  pela R., tudo se passando como se esse  pagamento tivesse sido feito já na  pendência da acção.

IV – Pelo exposto, acorda este tribunal em julgar parcialmente procedente a apelação e revogar, correlativamente, a sentença recorrida,  condenando a R. a pagar ao A. a quantia que vier a ser liquidada referentemente aos prejuízos de ordem patrimonial que o mesmo sofreu em virtude da perda das remunerações referentes ao mandato de 2013/2016, calculados nos termos acima referidos, com o limite da quantia aqui pedida de € 888.160,00, valor esse que virá a ser acrescido de juros à taxa legal, desde a constituição em mora, ocorrida com a prática do facto ilicito- 5/11/2012 (cfr art 805º/2 al b) CC9, até efectivo e integral pagamento; e a quantia de € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais, em virtude do modo como decorreu o processo de destituição, que será acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da presente decisão, mantendo-se no demais a sentença recorrida.

As custas na 1ª instância e nesta serão suportadas pelo A. e pela R. na proporção de 1/4 e 3/4, respectivamente, sem prejuízo do que venha a ser liquidado, à excepção das custas referentes à parcela do pedido no valor de € 38.096,57, que serão suportadas pela R.

     Lisboa, 17 de Setembro de 2015                                                                                        

            Maria Teresa Albuquerque

          José Maria Sousa Pinto

              Jorge Vilaça

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[1] - «Sociedades por Quotas», II, p 247
[2] - «Teoria Geral da Relação Jurídica», vol II, p 414

[3] - «Deliberações dos Sócios- Comentário ao Codigo das Sociedades Comerciais»,1993, p 63


[4] - Obra citada , p 62
[5] - Obra citada, 78
[6] - Obra citada,183
[7] - Obra citada,199
[8] - Obra citada, 202
[9]  - Almedina 2005- p 594/505
[10] - Obra citada, p 495/496
[11] - «Código das Sociedades Comerciais em Comentário», I

[12] - Cfr Ac STJ 14/1/1997,CJ I, em cujo sumário se lê: «1. Assembleias gerais societárias não se confundem com deliberações. Aquelas são apenas um dos continentes possíveis de que as deliberações são os conteúdos.As deliberações podem ser tomadas, à luz do CSC, por escrito unânime dos interessados, sem a existência de qualquer assembleia. As deliberações unânimes por escrito não deixam de existir e de ser relevantes, ainda que sela inexistente a assembleia em que se dizem tomadas, desde que, enquanto deliberações, se prove que ocorreram e que foram assumidas, por escrito, pessoalmente por todos os interessados ou pelos seus representantes»

[13] - Cfr Menezes Cordeiro, «Direito Civil Português – Tomo IV -Exercício Jurídico» , p 275
[14] - Obra citada, p 282
[15] - Refere Pinto Furtado, «Deliberações das Sociedades Comerciais», p 276 que «a forma é o modo de revelação da deliberação dentro do tipo legal em que se enquadra»
[16]  - «Deliberações de Sociedades Comercias», p 134 e ss
[17]«Teoria Geral de Direito Civil», 4ª ed., Antonio Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto 2005, p 192
[18] - Obra citada
[19]- «Código Civil Anotado», 1987, I, anotação ao art 272º
[20]- Obra citada
[21] - Pinto Furtado, «Deliberações de Sociedades Comercias», p 271/272
[22]- Pinto Furtado , «Deliberações dos Sócios», p 334
[23] - Coutinho de Abreu, «Governação das Sociedades Comerciais», p 161

[24] - Crf  Pupo Correia, «Direito Comercial», 241/242; Ac RP 16/3/1998; Ac STJ 25/2/1997; Ac STJ 20/1/1999, CJ/STJ 1º-37; Ac RC 9/271999; Ac STJ 15/2/2000 BMJ 494º-358; Ac STJ 19/2/2004; Ac STJ 20/5/2004

 Em sentido contrário, Raul Ventura, «Sociedades por quotas» III, 119; Pinto Furtado, «Curso de Direito das Sociedades»,  369-370
 
[25] - «Destituição de Administradores de Sociedades», BFD 83 (2007), pág. 88.