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ACIDENTE COM MÁQUINA RETROESCAVADORA
ACIDENTE DE VIAÇÃO
SEGURO
CONCAUSALIDADE
CULPA
INDEMNIZAÇÃO
Sumário
1- É acidente de viação todo o acidente envolvendo veículos terrestres com capacidade de circulação autónoma, incluindo tratores agrícolas ou industriais, retroescavadoras, cilindros de compactação, etc., desde que não sejam utilizados em funções exclusivamente agrícolas ou industriais e, no momento do acidente, se encontrem a desempenhar a função de locomoção – transporte.
2- Todos os veículos identificados em 1), com exceção daqueles que sejam exclusivamente utilizados para fins agrícolas ou industriais e que não apresentem qualquer margem de sobreposição com utilizações próprias da circulação de viaturas, encontram-se sujeitos ao regime de seguro obrigatório.
3- As máquinas indústrias ou agrícolas que aliam à sua função industrial à função de locomoção – transporte encontram-se sujeitas ao regime do seguro automóvel obrigatório e ao seguro obrigatório de laboração. 4- A delimitação das garantias conferidas pelos dois seguros obrigatórios identificados em 3) passa pela distinção sobre se, no momento do acidente, a máquina se encontrava exclusivamente a desempenhar a sua atividade funcional que lhe é inerente enquanto máquina agrícola ou agrícola (caso em que o acidente é de laboração e atua a garantia do seguro obrigatório de laboração) ou se também ou exclusivamente se encontrava a desempenhar a sua função de locomoção – transporte (caso em que o acidente é de viação e atua a garantia do contrato de seguro obrigatório automóvel).
5- É acidente de viação o acidente provocado por uma máquina retroescavadora, que se encontrava a abrir uma vala num caminho municipal e cujo condutor, finda essa abertura, decidiu deslocar a retroescavadora para um local mais abaixo daquele em que se encontrava, a fim de picar pedra e, para o efeito, levantou as sapatas hidráulicas da retroescavadora e porque se encontrasse distraído e, também, em consequência do mau-estado da retroescavadora, passou a circular com a mesma na faixa de rodagem do caminho municipal, de forma descontrolada, percorrendo nele cerca de dez metros, altura em que foi embater com a pá da frente da retroescavadora na parte traseira de um trator, que aí se encontrava estacionado.
Texto Integral
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO. António, residente no lugar …, Ponte de Lima, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra Seguradoras X, S.A. (anteriormente com a denominação social de “Companhia de Seguros Y, S.A.”), com sede no Largo d…, Açores, J. L., Lda., com sede na Avenida … Vila do Conde, e Miguel, residente na Rua …, Vila do Conde, pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhe:
a- a quantia de 365.613,16 euros, a título de indemnização, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa de 4% ao ano, desde a propositura da ação até efetivo pagamento; b- a quantia que vier a ser liquidada em incidente de liquidação por força dos factos vertidos nos artigos 196º a 219º da petição inicial, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa de 4% ao ano, desde a citação até efetivo pagamento;
Subsidiariamente para o caso de se vir a demonstrar que não se está perante um acidente de viação, a condenação solidária dos Réus J. L., Lda. e Miguel, a pagar-lhe:
c- a quantia de 365.613,16 euros, a título de indemnização, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa de 4% ao ano, desde a propositura da ação até efetivo pagamento; d- a quantia que vier a ser liquidada em incidente de liquidação por força dos factos vertidos nos artigos 196º a 219º da petição inicial, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa de 4% ao ano, desde a citação até efetivo pagamento.
Para tanto alega, em síntese, ser proprietário do trator industrial com reboque, de matrícula NN;
No dia 11/08/2011, pelas 15h00m, foi interveniente num acidente, no Caminho Municipal da Torre, Lugar de Torre, Facha, Ponte de Lima, em que esteve envolvida a máquina industrial retroescavadora, propriedade da Ré sociedade e conduzida pelo Réu Miguel, o qual era empregado daquela sociedade Ré e que, na altura, estava a exercer a profissão de motorista/manobrador, por conta dessa sociedade;
Na altura do acidente aquela máquina retroescavadora encontrava-se em mau-estado de conservação;
Na altura do acidente, o trator industrial do Autor encontrava-se parado, sobre a faixa de rodagem do Caminho da Torre, encostado à margem direita, atento o sentido Torre/Casal, com a sua parte da frente apontada para o Casal;
Quando o Autor se encontrava apeado sobre o pavimento empedrado da faixa de rodagem, junto à parte traseira do reboque daquele trator, a fechar o taipal traseiro da caixa de carga deste, foi violentamente embatido com a pá carregadora da parte da frente da máquina retroescavadora;
Em consequência desse embate sofreu diversas lesões corporais, que lhe demandaram danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja indemnização reclama;
Na altura do acidente a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela circulação da referida máquina retroescavadora encontrava-se transferida para a Ré seguradora por contrato de seguro.
A Ré seguradora contestou impugnando parte da factualidade alegada pelo Autor, sustentando que o acidente não pode ser caracterizado como de viação, nem tão-pouco o seu local como via de circulação automóvel;
Sustentou que o contrato de seguro que celebrou se insere no âmbito do seguro automóvel obrigatório, não cobrindo os riscos inerentes à laboração do veículo e que o acidente ocorreu durante o exclusivo desempenho funcional da máquina escavadora, sem que esta se encontrasse a efetuar qualquer movimento (voluntário) de circulação;
Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente e seja absolvida do pedido.
Os restantes Réus contestaram, alegando que o acidente sobre que versam os autos é, em simultâneo, acidente de viação e de trabalho e que no âmbito dos autos de acidente de trabalho que correram termos nos serviços do Ministério Público do Tribunal de Trabalho de Viana do Castelo, sob o n.º 519/12.0TTVCT, o Autor recebeu a quantia de 8.732,86 euros a título de indemnização;
Impugnaram parte da matéria alegada pelo Autor.
Concluem pela improcedência da ação e pedindo que sejam absolvidos do pedido.
Realizou-se audiência prévia, em que se fixou o valor da ação, proferiu-se despacho saneador, fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova, não tendo sido apresentadas reclamações.
Submetido o Autor a exame pericial, realizou-se audiência final, após o que proferiu-se sentença em que se julgou a ação parcialmente procedente, absolvendo-se os Réus J. L., Lda. e Miguel dos pedidos e condenando-se a Ré seguradora em parte desse pedido, constando aquela sentença da seguinte parte dispositiva:
“Pelo exposto, decide-se:
Julgar parcialmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pelo A., condenando a R. Companhia de Seguros Y, agora Seguradoras X, no pagamento àquele da quantia líquida de 86.432,40 € (oitenta e seis mil quatrocentos e trinta e dois euros e quarenta cêntimos), assim discriminada:
- 40.000 € (quarenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efetivo e integral pagamento;
- 31.267,14 € (trinta e um mil duzentos e sessenta e sete euros e catorze cêntimos), a título de défice funcional permanente, acrescidos de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efetivo e integral pagamento;
- 15.142 € (quinze mil cento e quarenta e dois euros) a título de privação de rendimentos, acrescidos de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efetivo e integral pagamento;
- 23,26 € (vinte e três euros e vinte e seis cêntimos), pelos danos patrimoniais emergentes (despesas), acrescidos de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efetivo e integral pagamento.
Mais se decide condenar a Ré Y/Seguradoras X a pagar ao A. a quantia que vier a liquidar-se em momento posterior relativa aos danos (patrimoniais e não patrimoniais) decorrentes da matéria constante do ponto 90) dos factos provados, nos termos expostos nesta decisão.
E absolver integralmente os RR. J. L., Lda. e Miguel dos pedidos.
Inconformado com o assim decidido, o Autor interpôs o presente recurso de apelação daquela sentença, apresentando as seguintes conclusões:
1ª. - o acidente de trânsito que está na origem da presente acção ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor da máquina escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3 cx – 4T/09223533 Miguel, segurada da Ré Companhia de Seguros “Seguradoras X, S.A.”; 2ª. – por força do contrato de seguro titulado pela apólice nº. 90…, a Ré Companhia de Seguros “Seguradoras X, S.A.” (anteriormente denominada Y Seguros, S.A.)é responsável pelo pagamento da indemnização global líquida e ilíquida reclamada na presente acção e devida ao Autor/Recorrente; 3ª. - o Autor/Recorrente reclamou a quantia de 75.000,00 €, a título de indemnização/compensação pelos danos de natureza não patrimonial por si sofridos; 4ª. – a sentença recorrida fixou, a este título, a quantia de apenas 40.000,00 €; 5ª. – tal quantia, porém, é insuficiente; 6ª. – pelo que, a este título, deve ser fixada a quantia ora peticionada, de 70.000,00 €; 7ª. - a quantia de 40.00,00 €, fixada a título de indemnização pela IPP/Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 10,00 pontos – 10,00% - é insuficiente; 8ª. – justa e equitativa é a quantia de 100.000,00 €; 9ª. – que expressamente se reclama, nas presentes alegações de recurso; 10ª. – a essa quantia deverá ser deduzido o valor de 8.732,00 €, recebido pelo Autor/Recorrente, a título de capital de remição, por acidente de trabalho; 11ª. – os juros de mora são devidos desde a data da citação sobre todas as quantias indemnizatórias e compensatórias, quer relativas a danos de natureza patrimonial, quer relativas a danos de natureza não patrimonial; 12ª. – o que, expressamente, se reclama, nas presentes alegações de recurso; 13ª. - decidindo de forma diversa, fez, com o devido respeito, o tribunal de primeira instância má aplicação do direito aos factos alegados e provados e violou, além outras, as normas dos artigos 496º., nº. 1, 562º., 564º., do Código Civil, do Código Civil; 14ª. – quanto ao restante, não posto em crise nas presentes alegações de recurso, deve manter-se o doutamente decidido pelo tribunal de primeira instância; 15ª. - pode a Ré “Seguradoras X, S.A.” vir a interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância – Instância Central Cível, Juiz 2, de Viana do Castelo, para o Tribunal da Relação de Guimarães; 16ª. – se, contra o que se espera, pois não se admite, nem se aceita, na sequência de eventual recurso a interpor pela Ré Companhia de Seguros “Seguradoras X, S.A.”, por qualquer razão, vier a ser decidido que esta Seguradora não é responsável pelo pagamento da indemnização, líquida e ilíquida fixada ou a fixar, na presente acção; 17ª. - devem os Réus “J. L., LDA.” e Miguel ser solidariamente condenados a pagar, ao Autor/Recorrente António, o total das indemnizações líquida e ilíquida, reclamadas na presente ação e nas presentes alegações de recurso, acrescidas dos juros de mora, contados à taxa legal de 4% ao ano, a partir da data da citação, até efetivo pagamento; 18ª. – o que, expressamente se requer.
Também a Ré “Seguradoras X, S.A.” interpôs recurso de apelação daquela sentença, em que formula as alegações que se seguem:
1- Considerou a Mmª Juiz a quo que o condutor da retroescavadora decidiu movimentar esse veículo na direcção da qual veio a colher o A. sinistrado e que, fruto de distracção e do mau estado da máquina que tripulava, provocou o acidente em crise. 2- Não se compreende como é que se pode dar como provado que o manobrador da máquina estava completamente distraído e, ao mesmo tempo, dar como provado que intencionalmente fez a manobra que veio a resultar no infortúnio que se discute no presente processo. 3- Resulta dos pontos 41) e 42) da matéria de facto dada como provada que o manobrador da máquina, que estava a abrir uma vala com o auxílio do martelo pneumático, decidiu fazer a manobra para poder continuar o serviço um pouco mais abaixo. 4- E resulta do ponto 43) da matéria de facto dada como provada que, tendo tomado essa decisão, levantou as “sapatas” hidráulicas da máquina. 5- O simples facto de elevar as sapatas hidráulicas não é suficiente para colocar a máquina em andamento, uma vez que, como qualquer outro veículo motorizado, a escavadora necessita de impulso para se movimentar. 6- Da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento resulta claramente que o manobrador da máquina não imprimiu qualquer impulso à viatura, tampouco a acelerou. 7- Antes sim, quando se preparava para o fazer, a máquina começou a deslizar, livremente, por si, não tendo o manobrador tido qualquer possibilidade de a fazer parar pelos meios normais. 8- A escavadora não circulou pela via de trânsito. 9- Via de trânsito essa que, aliás, não se encontrava aberta ao público. 10- Os pontos 2), 37), 41), 42), 43), 45), 46) e 47) da matéria de facto dada como provada devem passar a ter a seguinte redacção:
2) No dia 11 de Agosto de 2011, pelas 15,00 horas, ocorreu um acidente, no Caminho Municipal da Torre, no lugar de Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima. 37) Momentos antes da ocorrência do acidente que deu origem à presente acção, o Miguel encontrava-se a abrir uma vala sensivelmente na linha média da faixa de rodagem do Caminho da Torre, com o auxílio do martelo pneumático, acoplado à parte traseira da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533. 41) Uma vez terminada a abertura da vala, com o auxílio do martelo pneumático, o Miguel decidiu deslocar a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533,através do Caminho Municipal da Torre. 42) A fim de picar pedra mais abaixo. 43) Para o efeito, o Miguel, através do respectivo comando manual, elevou/levantou as sapatas hidráulicas da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533. 45) Em consequência do mau estado da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 e da inclinação da via, 46) A máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, deslocou-se, por si mesma, de forma descontrolada, desde o ponto onde se encontrava a laborar até ao local do embate. 47) Desse modo, a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, percorreu, desgovernada, sem que o seu condutor o pudesse evitar, uma distância de dez metros que o separavam do tractor industrial de matrícula NN. 11- Tal alteração resulta do depoimento de parte Miguel, que se transcreve, na sessão de julgamento do dia 20-02-2017, com início às 11:14:16 e fim às 11:47:59, ficheiro n.º 20170220111310_1053476_2871823, da testemunha A. S., encarregado da obra que assistiu ao acidente qye depôs na sessão de julgamento do dia 20-02-2017, com início às 11:51:48 e fim às 12:40:42, ficheiro n.º 20170220115040_1053476_2871823, da testemunha Sr. C. S. que, na sessão de julgamento de dia 20-02-2017, com início às com início às 14:42:19 e fim às 15:31:50, ficheiro n.º 20170220144110_1053476_2871823, do depoimento da Sra. Inspectora da ACT, a Sra. V. M. que, na sessão de julgamento de dia 20-02-2017, com início às com início às 14:13:06 e fim às 14:38:23, ficheiro n.º 20170220141157_1053476_2871823, tudo conjugado com o relatório da ACT de fls.. e com os pontos 18), 19), 20), 21), 22) e 23) da matéria de facto dada como provada. 12- O acidente ocorreu não na durante a circulação do veículo, mas sim durante a sua laboração. 13- O acidente acontece quando o trabalhador estava a abrir uma vala com o auxílio do martelo pneumático e quando se preparava para ir picar mais abaixo. 14- A utilização de auxiliares no equipamento indica que o mesmo laborava com a sua função específica, no caso a abertura de uma vala para instalação do saneamento. 15- Resulta da matéria de facto dada como provada que o seguro em causa exclui os danos resultantes da laboração do veículo – ponto 118 da matéria dada como provada. 16- A sentença recorrida viola essa disposição contratual, que exclui o direito do Autor ser ressarcido pela ora recorrente dos danos emergentes do sinistro em causa nos presentes autos.
Sem prescindir, 17- Mesmo admitindo a distracção do condutor, não lhe é atribuível, mas antes aos defeitos de que a máquina apresentava ao tempo em que o seu manobrador com ela laborava. 18- A máquina operava com completa falência do sistema de travagem, bem patente nos pontos 18), 19), 20), 21), 22) e 23 da matéria de facto dada como provada e, bem assim, o facto de a mesma máquina, conforme alteração da matéria de facto requerida no presente recurso, ter vindo, antes do embate, a deslizar por si mesma. 19- Não se produziu prova, e nada disso consta do elenco de factos provados ou não provados, que se o condutor da escavadora seguisse atento o desfecho do sinistro fosse outro que não o infortúnio que se discute neste processo. 20- Pese embora tenha sido dado como provado que o condutor da escavadora seguia distraído, a verdade é que não resultou provado que o mesmo devesse ter adoptado conduta diferente. 21- A distracção, por si só, não gera culpa nem dever de indemnizar. 22- Teria que se ter alegado e provado que o condutor da escavadora, por seguir distraído, não conseguiu evitar um embate que era possível evitar. 23- O ónus de alegação e prova dessa matéria cabia ao Autor. 24- O acidente não aconteceu por culpa do condutor do veículo seguro na Ré recorrente. 25- Pelo que falha o pressuposto da culpa, fundamental para gerar o dever de indemnizar à luz da responsabilidade civil. 26- Violou, por isso, a sentença recorrida, o art.483º do C.Civil.
Sem prejuízo, 27- É o próprio Tribunal de 1ª instância que considera que o caso sub judice configura uma situação de concausalidade. 28- Seria, portanto, esta uma causa de exclusão da obrigação de indemnizar que refere o art.505º do código civil ou, no limite, uma causa de repartição dessa responsabilidade entre a R. e o terceiro (entidade patronal) causador do sinistro – causalidade indirecta.
Ainda sem prescindir, 29- Os montantes arbitrados pelo Tribunal a quo, nomeadamente no que diz respeito aos danos não patrimoniais, se reputam exagerados. 30- A indemnização por danos não patrimoniais, ou seja, o ressarcimento de danos que não se traduzem num prejuízo económico, consiste na tradução monetária do especial e anormal sofrimento do lesado com os danos físicos de que foi vítima. 31- Considerando a Portaria n.º 377/2008, com a redacção que lhe foi conferida pela Portaria 679/2009, de 25 de Junho, cabe reflectir sobre os seguintes valores: o Autor António ficou a padecer de um défice funcional permanente de 10 pontos, de um quantum doloris de 5/7 e um dano estético de 3/7, aplicando-se ao caso os valores máximos da tabela, a indemnização a arbitrar seria muito inferior àquela de cujo montante fixado recorre a apelante. 32- No caso do Autor António, denotamos que o valor arbitrado é mais do dobro do valor resultante da Portaria, o que poderá significar, salvo douto entendimento em sentido contrário, um enriquecimento sem causa da Recorrida! 33- Sendo que, ainda que não se considere que o valor deva ser fixado nos termos da Portaria, não pode deixar de considerar-se que o valor decorrente da aplicação dos seus critérios é um indicador. 34- Tendo a sentença recorrida violado, portanto, o art.496º do C.Civil.
O Autor contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação interposta pela Ré seguradora, apresentando as seguintes conclusões:
I – DO RECURSO SOBRE A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
1ª - Os elementos de prova que a Recorrente estratégica e isoladamente invoca não são susceptíveis de justificar qualquer alteração à decisão sobre a matéria de facto que foi proferida pelo tribunal “a quo”. 2ª - A fim de se valorar a exactidão, acerto e justiça da decisão recorrida, necessário se tornará ouvir integralmente todos os depoimentos prestados pelas partes bem como os depoimentos de todas as testemunhas. 3ª – A prova produzida em audiência de julgamento justifica a resposta que foi dada pelo tribunal “a quo” aos pontos 2), 37), 41), 42), 43), 45), 46) e 47) dos “Factos Provados”.
Assim concretamente:
DO PONTO 2) DOS “FACTOS PROVADOS”:
A factualidade constante do ponto dos “Factos provados” resulta claramente dos documentos nº 3 e 4 juntos com a petição inicial, designadamente do auto de notícia elaborado pela GNR na data da ocorrência, bem como do Inquérito e relatório elaborados pelo ACT e desses documentos constante.
• DO PONTO 37) DOS “FACTOS PROVADOS”:
A factualidade constante deste ponto dos “Factos Provados”, designadamente que se tratou de um acidente de viação, para além de resultar dos documentos nº 3 e 4 juntos com a p.i. (nomeadamente do auto de notícia da GNR e do Inquérito e relatório do ACT), resultou também do depoimento das testemunhas que presenciaram o sinistro, designadamente as testemunha A. S. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado a minuto 11:51:48 a 12:40:42] D. M. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado de minuto 15:34:23 a 15:49:05].
• DO PONTO 41), 42) E 43) DOS “FACTOS PROVADOS”:
Apesar de a Recorrente, no ponto 10 das suas conclusões, alegar que os pontos 41), 42) e 43) dos “Factos Provados” da sentença recorrida devem ter uma nova redacção, a verdade é que, a final, propõe, quanto a esses pontos 41) e 42), uma redacção exactamente igual àquela que foi dada pelo tribunal “a quo”, pelo que não faz qualquer sentido a impugnação destes pontos da matéria de facto que, por essa razão, deverão ser integralmente mantidos.
• DOS PONTOS 45) DOS “FACTOS PROVADOS”:
O depoimento das testemunhas que presenciaram o acidente, designadamente as testemunha D. M. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado de minuto 15:34:23 a 15:49:05] e A. S. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado a minuto 11:51:48 a 12:40:42], justifica que se mantenha a decisão quanto a este ponto da matéria de facto, pois relataram a forma distraída como o manobrador da máquina – o Réu Miguel – conduzia a mesma, sem prestar atenção à condução que exercia e às pessoas e obstáculos existentes na via.
A esse propósito, foi significativamente expressiva a expressão utilizada pelo mesmo A. S. que referiu que o condutor da máquina “só acordou quando bateu”.
• DO PONTO 46) E 47) DOS “FACTOS PROVADOS”:
Do depoimento das testemunha A. S. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado a minuto 11:51:48 a 12:40:42] D. M. [depoimento prestado na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2017, registado de minuto 15:34:23 a 15:49:05], resulta que a máquina 180 BACKOE LOADERS, Modelo 3cx-4T/0923533 não descaiu e percorreu, de forma, desgovernada a faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre, mas iniciou a sua marcha de forma intencional, tripulada pelo Réu Miguel, que a controlava mas que, atenta a forma distraída e descuidada como exercia essa condução, não se apercebeu da presença do Autor/Recorrido António indo embater contra este e contra a parte traseira do reboque de matrícula ..., acoplado ao tractor industrial de matrícula NN.
Desse modo, a resposta dada pelo tribunal “a quo” aos pontos 46) e 47) dos “Factos Provados” deverá ser mantida na íntegra.
4ª - Assim, de tudo quanto se deixou acima exposto, o recurso da Recorrente relativamente à matéria de facto deverá ser julgado totalmente improcedente.
II - DO RECURSO DA DECISÃO DE DIREITO:
5ª - Dos pontos 41), 42), 43), 44), 45), 46), 47) e 48) dos “Factos provados” resultou que o acidente “sub judice” não foi um acidente que tenha ocorrido durante a actividade de laboração da máquina escavadora, as sim ocorreu quando o Réu Miguel, após ter procedido à abertura da vala, decidiu deslocar a máquina escavadora através do Caminho Municipal da Torre para ir picar pedra num local mais abaixo. 6ª -Este acidente nada teve a ver com a laboração da máquina mas sim com a circulação da mesma, pelo que bem decidiu o tribunal “a quo” ao qualificar o acidente em discussão sub-judice como um acidente de viação e não como um acidente de laboração. 7ª - Resulta dos pontos 44), 45), 46), 47) e 48) dos “Factos Provados” que a distracção do Réu Miguel foi causal do sinistro.
Com efeito, após no ponto 44) se ter dado como provado que “O Miguel encontrava-se completamente distraído”, no ponto 45) estabelece-se que “Por essa razão e, também, em consequência do mau estado da máquina retro-escavadora” (sublinhado nosso) ocorreu o acidente (pontos 46) a 48) dos “Factos Provados”).
Ou seja, está provado que foi também devido à distracção culposa do Réu Miguel que ocorreu o sinistro. 8ª - Provado que ficou esse nexo causal, está preenchido o pressuposto da culpa a que alude o artº. 483º do Cód. Civil, pelo que recai sobre o Recorrente (seguradora da maquina que provocou o sinistro) o dever de indemnizar. 9ª - Tal como resultou provado, o acidente em discussão nos presentes autos foi indubitavelmente um acidente de viação e não de laboração, pois não ocorreu durante a laboração da máquina em questão, mas sim quando a mesma circulava pelo Caminho Municipal da Torre. 10ª – Não há, assim, qualquer concasualidade. 11ª - Sendo um acidente de viação e estando a responsabilidade indemnizatória da pelo risco de circulação da máquina transferida, por contrato de seguro obrigatório, para a Ré Seguradora, é a Recorrente “Seguradoras X, SA” a civilmente responsável pela liquidação das indemnizações por danos provocados pelo sinistro em apreciação “sub-judice”. 12ª – No entanto, e sem prescindir, se, contra o que se espera, se vier a entender que a Recorrente não é responsável pelo pagamento da indemnização a fixar na presente acção, devem os Réus “J. L., Ldª” e Miguel ser solidariamente condenados a pagar ao Autor/Recorrido António o total das indemnizações líquida e ilíquida reclamadas na presente acção, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano. 13ª - Se o montante indemnizatório fixado pelo tribunal “a quo” merece algum reparo é seguramente por ter fixado montantes baixos relativamente aos danos que resultaram provados e não o contrário. 14ª – Relevante para a apreciação desta questão é a factualidade constante dos pontos 50), 51), 52), 53,), 54), 55), 56), 57), 58), 59), 60), 61), 63), 64), 66), 67), 68), 70), 71), 72), 73), 74), 77), 78), 79), 83), 88), 89), 90), 91), 92) dos “Factos provados” 15ª - Em consequência do sinistro, o Recorrido sofreu dores físicas intensas, lesões e sequelas que lhe provocaram um sofrimento intenso, não só no momento do sinistro mas nos meses subsequentes e que ainda hoje perdura, embora em menor intensidade. 16ª - Para além do enorme susto que apanhou no momento do acidente e nos instantes que o precederam, o Autor/Recorrido sofreu dores intensas nas regiões do corpo atingidas, quer no momento do acidente, quer na sequência das intervenções cirúrgicas, no pós operatório e nos tratamentos de fisioterapia a que foi submetido, dores, essas, de que ainda hoje padece. 17ª - Para além disso, o Recorrido ficou com várias queixas e sequelas das lesões sofridas, designadamente dores persistentes no braço esquerdo, diminuição da força em todos os movimentos, edema na mão quando faz esforços, bem como diversas cicatrizes. 18ª - E além de sofrer um “Quantum doloris” de grau 5 (numa escala de 1 a 7) e um dano estético de grau 3 (numa escala de 0 a 7), o Autor ficou a padecer de uma IPP de 10 pontos, incapacitando-o para o trabalho, uma vez que as sequelas implicam esforços suplementares. 19ª - Todos os factos acima relatados deixaram o Recorrido profundamente desgostoso (ponto 83) dos “Factos provados”). 20ª - Ora, tendo em conta as lesões e sequelas sofridas pelo Recorrente e os sofrimentos por ele vivenciados - quer no momento do sinistro, quer nos dos períodos de internamentos e tratamentos que se lhe seguiram -, bem como daqueles que passou a vivenciar diariamente face à condição físico-psíquica permanente de que padece, estamos perante danos de natureza não patrimonial graves, que merecem a tutela do direito e que justificam uma indemnização considerável. 21ª - Face a tais limitações e prejuízos físico-psíquicos graves, a quantia de € 40 000,00 arbitrada pelo tribunal “a quo”, se peca por alguma coisa, será seguramente por defeito. 22ª – Deve, pois, a apelação interposta pela Recorrente “Seguradoras X, SA” ser julgado totalmente não provado e improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação das recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
No seguimento desta orientação, as questões que se encontram submetidas à apreciação desta Relação resumem-se ao seguinte:
Recurso interposto pelo Autor:
a- se o tribunal a quo incorreu em erro de direito ao arbitrar ao Autor, a título de compensação por danos não patrimoniais sofridos, 40.000,00 euros, em virtude dessa quantia pecar por defeito, carecendo de ser elevada para 70.000,00 euros; b- se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao fixar a indemnização devida ao Autor, a título de perda da sua capacidade aquisitiva, em 40.000,00 euros, por via do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos com que ficou afetado em consequência direta e necessária do acidente, e se essa indemnização carece de ser elevada para 100.000,00 euros; c- se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao fixar os juros de mora, a calcular sobre a compensação arbitrada ao Autor pelos danos não patrimoniais sofridos, desde a data da prolação da sentença, e se antes esses juros de mora devem incidir sobre todas as indemnizações arbitradas ao Autor desde a data da citação dos Réus para os termos da presente ação; d- subsidiariamente, a não ser o acidente qualificado como de viação, se os Réus J. L., Lda. e Miguel são solidariamente responsáveis pela satisfação dos créditos indemnizatórios devidos ao Autor;
Recurso interposto pela Ré seguradora:
e- se o tribunal a quo incorreu em erro de direito na fixação da matéria dada como provada sob os pontos 2, 37, 41, 42, 43, 45, 46 e 47; f- se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao qualificar o acidente como de viação e a condenar a Ré seguradora no pagamento da indemnização devida ao Autor; g- se independentemente daquela qualificação do acidente como de viação, aquele tribunal incorreu em erro de direito ao julgar com verificado o requisito da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos relativo à culpa do condutor da retroescavadora na eclosão desse acidente e se esse requisito não se verifica e leva à improcedência da ação; h- a verificar-se o requisito da culpa, se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao imputar a culpa exclusiva pelo eclodir do acidente ao condutor da retroescavadora, quando o acidente é resultado da culpa desse condutor, concorrentemente com a falta de condições da retroescavadora para laborar/circular, e se essa concausalidade exclui a obrigação de indemnizar por parte da seguradora ou conduz a uma repartição de responsabilidades entre esta e a entidade patronal do condutor daquele retroescavadora; e i- se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao fixar a compensação por danos não patrimoniais sofridos pelo Autor em 40.000,00 euros, quando essa quantia compensatória peca por excesso, designadamente à luz dos critérios enunciados na Portaria nº 377/2008, devendo ser reduzida.
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A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo julgou provados e não provados os seguintes factos:
1. Factos provados:
1) O Autor – António – era, à data de 11 de agosto de 2011, dono e legítimo proprietário do Tractor Industrial, com reboque, de matrícula NN. 2) No dia 11 de agosto de 2011, pelas 15,00 horas, ocorreu um acidente de trânsito, no Caminho Municipal da Torre, no lugar de Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima. 3) Nesse acidente, foram intervenientes:
– a máquina industrial retroescavadora, de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, construída no ano de 2001;
– o peão António, residente no lugar de …, freguesia de …, comarca de Ponte de Lima, Autor na presente acção. 4) A máquina industrial retroescavadora, de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, era propriedade da sociedade “J. L., LDA.”. 5) E, na altura da ocorrência do acidente que deu origem à presente acção, era conduzida/tripulada por MIGUEL, residente na Rua …, VILA DO CONDE. 6) O Miguel era empregado da sociedade “J. L., Lda.”. 7) Desempenhava a profissão de motorista/manobrador, por conta da referida sociedade comercial “J. L., Lda”. 8) Dentro do seu horário de trabalho. 9) Em consequência de prévio contrato de trabalho celebrado entre ele – Miguel – e a referida sociedade comercial “J. L., Lda.”. 10) Através do qual o referido Miguel se obrigou a colocar à disposição da sociedade comercial “J. L., Lda.” a sua força de trabalho. 11) E a sociedade comercial “J. L., Lda.” se obrigou, como contrapartida dessa força de trabalho, a pagar ao referido Miguel, as quantias correspondentes ao seu ordenado, entre eles, previamente, ajustado. 12) Na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Miguel tripulava/manobrava, assim, a máquina industrial retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, construída no ano de 2001, com conhecimento, com autorização, à ordem, por conta, no interesse e sob a direcção efectiva da sociedade comercial “J. L., Lda.”. 13) A máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, tem um comprimento de 5,62 metros. 14) E tem uma largura de 2,23 metros. 15) Estava equipada com uma pá escavadora, de comandos hidráulicos, na sua retaguarda. 16) Estava equipada com uma pá carregadora, de comandos hidráulicos, na sua parte frontal. 17) E tem um peso bruto total de 8.000,00 quilogramas. 18) A referida máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, construída no ano de 2001, estava equipada com sapatas de fixação ao solo, na parte traseira. 19) A referida máquina retro-escavadora, na altura da deflagração do acidente que deu origem à presente acção, encontrava-se em mau estado de conservação e de manutenção. 20) Os pneumáticos dos rodados da frente encontravam-se enrijecidos pelo decurso do tempo, com os seus pisos gastos e completamente “carecas”. 21) O travão de lança encontrava-se avariado, completamente inoperacional, com o respectivo cabo partido e rebentado. 22) Os comandos accionados com os pés do motorista/manobrador encontravam-se “duros” e não accionavam o travão do eixo da frente. 23) O sistema da travagem, quer às rodas traseiras, quer às rodas dianteiras, encontrava-se avariado. 24) Os sistemas de comando hidráulico encontravam-se a derramar óleo, para o solo. 25) O Caminho Municipal da Torre apresentava um traçado ligeiramente curvilíneo, descrito para o lado direito, tendo em conta o sentido Sul-Norte, ou seja, lugar de Torre-lugar de Casal. 26) A faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre tem uma largura de cinco metros. 27) O seu piso, na altura da ocorrência do acidente que deu origem à presente acção, era pavimentado a blocos de granito, do tipo “calçada à portuguesa”. 28) O tempo estava bom e seco. 29) A faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre apresentava-se em plano acentuadamente descendente. 30) Com uma percentagem de inclinação superior a dez por cento. 31) No dia 11 de Agosto de 2011, pelas 15,00 horas, o tractor industrial, com reboque, de matrícula NN – propriedade do Autor -, encontrava-se, imobilizado e parado, sobre a faixa de rodagem do Caminho da Torre. 32) Encostado à margem direita do Caminho da Torre, tendo em conta o sentido descendente, ou seja Sul-Norte: lugar de Torre-lugar de Casal. 33) Com a sua parte frontal apontada no sentido descendente: Norte: lugar de Casal. 34) O Autor havia acabado de proceder à operação de descarga de uma tampa de saneamento, da caixa de carga do reboque de matrícula …, para o solo. 35) E encontrava-se – o Autor – apeado, sobre o pavimento empedrado da faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre, junto à parte traseira do reboque de matrícula ..., a fechar o taipal traseiro da caixa de carga desse reboque. 36) Quando se encontrava assim apeado, sobre a faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre, o Autor – António – foi violentamente embatido pela pá carregadora da parte frontal da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, propriedade da Ré “J. L., Lda.” e, na altura, tripulada pelo Réu Miguel. 37) Momentos antes da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Miguel encontrava-se a abrir uma vala sensivelmente na linha média da faixa de rodagem do Caminho da Torre, com o auxílio do martelo pneumático, acoplado à parte traseira da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533. 38) A máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 encontrava-se sobre a faixa de rodagem do Caminho da Torre. 39) E com as sapatas hidráulicas apoiadas sobre o pavimento da faixa de rodagem do Caminho da Torre. 40) A uma distância de dez metros a montante – do lado de Sul/lugar de Torre - do local onde se encontrava o tractor industrial, com reboque, de matrícula NN e do local onde se encontrava, apeado, o próprio Autor António. 41) Uma vez terminada a abertura da vala, com o auxílio do martelo pneumático, o Miguel decidiu deslocar a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, através do Caminho Municipal da Torre. 42) A fim de picar pedra mais abaixo. 43) Para o efeito, o Miguel, através do respectivo comando manual, elevou/levantou as sapatas hidráulicas da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533. 44) O Miguel encontrava-se completamente distraído. 45) Por essa razão e, também, em consequência do mau estado da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 e da inclinação da via, 46) O Miguel passou a circular, com a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, através da faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre, no sentido descendente: Sul-Norte, ou seja, lugar de Torre-lugar de Casal, de forma descontrolada. 47) Desse modo, o Miguel percorreu, com a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, através da faixa de rodagem do Caminho Municipal da Torre, uma distância de dez metros que o separavam do tractor industrial de matrícula NN. 48) Foi embater com a pá carregadora, acoplada na parte frontal da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533, contra o corpo do Autor – António – e contra a parte traseira – taipal de trás – do reboque de matrícula ..., acoplado ao tractor industrial de matrícula NN. 49) Esse embate ocorreu entre a pá carregadora da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 e o braço esquerdo do Autor António. 50) Após este embate, o Autor ficou com o seu braço esquerdo entalado entre a pá carregadora da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 e o taipal traseiro do reboque de matrícula ..., acoplado ao tractor industrial de matrícula NN. 51) Como consequência directa e necessária do acidente, resultaram, para o Autor lesões corporais várias, nomeadamente, traumatismo do membro superior esquerdo, fractura diafisária do rádio do braço esquerdo, esfacelo do membro superior esquerdo e lesão/seccionamento da artéria braquial do braço esquerdo. 52) O Autor foi transportado, de ambulância (do I.N.E.M.), para a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE – ULSAM, EPE -, de Viana do Castelo. 53) Onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência. 54) Foram-lhe, aí, efectuados exames radiológicos à região do braço esquerdo. 55) Foram-lhe, aí, efectuadas limpezas cirúrgicas ao esfacelo do braço esquerdo. 56) Foram-lhe, aí, efectuadas desinfecções ao esfacelo do braço esquerdo. 57) E foram-lhe, aí, efectuados curativos ao esfacelo do braço esquerdo. 58) Dada a gravidade das lesões sofridas, o Autor foi, de imediato, transferido para o Hospital de São João, do Porto. 59) A fim de ser observado e tratado pela Especialidade de Cirurgia Vascular. 60) O Autor manteve-se, internado, no Hospital de São João, do Porto, ao longo de um período de tempo de seis dias, na Especialidade de Cirurgia Vascular. 61) Ao longo desse período de tempo de internamento, no Hospital de São João, do Porto, o Autor foi submetido a duas intervenções cirúrgicas, uma de ortopedia e outra de cirurgia vascular. 62) Durante esse período de tempo de internamento, no Hospital de São João, do Porto, o Autor manteve-se, sempre, retido no leito. 63) Ao fim desse período de tempo de internamento, o Autor obteve alta do Hospital de São João do Porto e regressou à Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE – ULSAM, EPE - de Viana do Castelo. 64) Onde se manteve, internado, ao longo de um período de tempo de três dias. 65) No dia 19 de Agosto de 2011, o Autor obteve alta hospitalar, da Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE – ULSAM, EPE -, de Viana do Castelo. 66) E regressou à sua de habitação, sita no lugar de …, freguesia de …, comarca de Ponte de Lima, onde se manteve, doente, combalido e retido no leito, ao longo de um período de tempo de uma semana. 67) Após o seu levante do leito, o Autor passou a ser seguido, acompanhado e tratado nos Serviços Clínicos da Companhia de Seguros “L. Seguros, S.A.”, na Clínica Médica, em Ponte de Lima e no Hospital L., na cidade do Porto. 68) Na Clínica Médica, o Autor foi sujeito a limpezas cirúrgicas, desinfecções, tratamentos, aplicação e mudança de pensos, na região do esfacelo do seu braço esquerdo. 69) E fez tratamento de fisioterapia ao braço esquerdo desde Setembro de 2011 até Janeiro de 2012. 70) Em Abril de 2012, o Autor foi submetido a uma nova intervenção cirúrgica aos tendões da região do punho esquerdo, no Hospital L.. 71) No momento do acidente e nos instantes que o precederam, o Autor sofreu um enorme susto. 72) O Autor sofreu dores intensas, em todas as regiões do seu corpo atingidas, nomeadamente, ao nível do seu braço esquerdo. 73) Essas dores ainda afectam o Autor, na presente data. 74) O A. sofreu as dores inerentes às intervenções cirúrgicas a que foi submetido e aos períodos pós-operatórios. 75) Sofreu os incómodos inerentes aos períodos de acamamento, no Hospital de São João do Porto, na Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE – ULSAM, EPE -, de Viana do Castelo e na sua casa de habitação. 76) Sofreu a privação da sua liberdade pessoal, inerente a esses períodos de tempo de acamamento. 77) Sofreu as dores e os incómodos inerentes aos tratamentos de Medicina Física de Reabilitação - fisioterapia – a que foi submetido. 78) Como QUEIXAS das lesões sofridas, o Autor apresenta:
. a nível funcional:
. dores persistentes, na face radial do antebraço esquerdo, principalmente quando faz esforços;
. diminuição subjectiva da força em todos os movimentos;
. edema na mão e punho quando faz esforços;
. a nível situacional:
. vida profissional ou de formação:
. não retomou a actividade profissional, estando desempregado; não consegue fechar os taipais dos atrelados por falta de força na mão, embora consiga conduzir um tractor. 79) Como SEQUELAS das lesões sofridas, o Autor apresenta:
. membro superior esquerdo:
. duas cicatrizes na face interna do braço lineares com 6 e 7 cm ao longo do maior eixo do membro. Cicatriz com 17 cm na face anterior do cotovelo perpendicular ao meio eixo do membro. Cicatriz cirúrgica com 8 cm na face anterior do antebraço sem aderências, cicatriz cirúrgica com 2 cm na face radial do punho ao nível do primeiro compartimento extensor. Pulsos radial e cubital palpáveis com normal amplitude. Sem alterações circulatórias na mão e antebraço. Rigidez no último 5º de extensão do cotovelo. Flexão completa. Supinação completa, pronação de 70º.
. membro inferior esquerdo:
. cicatriz linear nacarada não aderente aos planos profundos localizada na face antero interna do terço médio da coxa com cerca de 15 cm de comprimento. 80) O Autor contava, à data da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, cinquenta e nove anos de idade, pois nasceu no dia 18 de Novembro de 1952. 81) Era um homem ágil, forte, dinâmico e robusto. 82) E nunca havia sofrido qualquer outro acidente. 83) A situação em que o A. ficou causa-lhe um profundo desgosto. 84) O Autor obteve a sua consolidação médico-legal no dia 12 de Junho de 2012. 85) As lesões sofridas e as sequelas delas resultantes determinaram, para o Autor, um período de tempo de doença de dez dias, de Défice Funcional Temporário Total. 86) Um período de tempo de doença de duzentos e noventa e sete dias, com Défice Funcional Temporário Parcial. 87) Um período de tempo de doença de duzentos e noventa e dois dias, com Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total. 88) O Autor sofreu um “Quantum Doloris” de grau 5, numa escala de 1 a 7. 89) Sofre de um “Dano Estético” de grau 3, numa escala de 0 a 7. 90) O A. vai necessitar permanentemente de ajudas técnicas, medicamentosas; tem de ser vigiado em consultas de cirurgia vascular e tem de tomar anti-coagulantes com frequência. 91) E, a final, ficou a padecer de um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica - Incapacidade Parcial Permanente Geral, de 10 pontos. 92) As sequelas descritas são, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares. 93) O Autor exercia, à data da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, por conta própria, como trabalhador independente e com fins lucrativos, a profissão de tractorista. 94) Para o efeito, era proprietário de um tractor, de características industriais, de um reboque para o carregamento, remoção e transporte de carga e de uma cisterna. 95) E dedicava-se a trabalhos – com o seu referido tractor industrial, reboque e cisterna – de carregamento, remoção e transporte de toda a espécie de materiais do sector da construção civil e obras públicas. 96) E, ainda, ao carregamento, remoção e transporte de toda a espécie de escombros, no sector da construção civil e obras públicas. 97) E, em geral, dedicava-se à execução dos referidos trabalhos de carregamento, remoção e transporte de escombros e de materiais do sector da construção civil e obras públicas, com o seu tractor industrial, reboque e cisterna, para a sociedade “MA, S.A.”, com sede na cidade do Porto. 98) O A. trabalhava nunca menos do que oito horas por dia, ao longo de cinco dias por semana. 99) Ao preço, ajustado, de 17,00 €, por cada hora de trabalho. 100) Do montante ganho 30% são despendidos em combustível e desgaste de material: pneus, mudanças de óleo, revisões do equipamento, além de outras. 101) Sendo certo que o Autor tinha garantido trabalho para todos os dias úteis da semana e por tempo indeterminado. 102) Além disso, nas horas vagas deixadas pelo desempenho da profissão de tractorista, o Autor dedicava-se à actividade/profissão de agricultor em terrenos de sua propriedade, sitos na freguesia de …, comarca de Ponte de Lima, com uma área não concretamente apurada, onde cultivava e colhia milho e vinho. 103) Parte do vinho que colhia era destinado à venda. 104) E o excedente, bem como os restantes produtos cultivados e colhidos em consequência da sua actividade agrícola, eram destinados ao consumo pelo seu agregado familiar. 105) A partir da data da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem aos presentes autos, o A. não desempenhou mais a sua profissão. 106) O Autor efectuou as seguintes despesas, não reembolsadas:
. taxas moderadoras 15,10 €;
. custo de 1 certidão 8,16 €. 107) O A. é portador do material de osteossíntese que lhe foi aplicado, nos ossos (rádio) do braço esquerdo – placa de platina e parafusos de platina, mas não tem indicação para remoção. 108) O Réu Miguel manobrava a máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 no Caminho Municipal da Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima. 109) Essa máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 beneficiava, na altura da ocorrência do sinistro que deu origem à presente acção, de contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatório, titulado pela apólice nº. 90…. 110) Esse contrato de seguro era válido e eficaz e encontrava-se em vigor. 111) Através do qual a sociedade proprietária da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 - “J. L., LDA.” havia transferido a responsabilidade civil por danos causados a terceiros para a Ré Companhia de Seguros “Y SEGUROS, S.A.”. 112) À data do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533 estava transferida para a Ré Companhia de Seguros “Y SEGUROS, S.A.”, através de contrato de seguro, válido e eficaz, titulado pela apólice nº. 90…, em vigor à data dos factos. 113) Contactada a Companhia de Seguros “Y Seguros, S.A.”, a mesma, através de carta datada de 21 de Julho de 2012, confirmou a existência, validade e eficácia do contrato de seguro titulado pela apólice nº. 90..., através do qual se encontra, para si transferida a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela circulação da máquina retro-escavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3cx-4T/0923533. 114) Através dessa mesma carta, datada de 21 de Julho de 2012, a Ré Companhia de Seguros “Y Seguros, S.A.” afirma que o sinistro dos presentes autos “ … configurou um acidente de trabalho …”. 115) Que “ … aquele local (local do sinistro) estava interdito ao trânsito automóvel, em virtude de obras de beneficiação que decorriam …”. 116) Informa, ainda, que “Ao levantar as sapatas tendo em vista picar pedra em vala de saneamento aberta, a retro escavadora a que acima aludimos entrou em desequilíbrio, deslizando e acabando por colher o sinistrado que também laborava no local”. 117) Acabando por concluir que: ”As circunstâncias supra descritas permitem concluir que o acidente reclamado não foi um acidente de viação, sendo certo que o sinistro em apreço claramente consubstancia um acidente de laboração, motivo pelo qual não tem enquadramento na nossa apólice (Responsabilidade Civil Automóvel Obrigatória) o que impossibilita a regularização dos prejuízos reclamados”. 118) O seguro em causa exclui os danos resultantes da laboração do veículo. 119) O relatório do ACT junto aos autos refere que o acidente parece resultar da conjugação de três factores: anomalias no sistema de travagem, declive do terreno e incapacidade do condutor perante o equipamento descontrolado, por não ter sido capaz de accionar os sistemas de paragem, sendo que a zona estava interditada por causa das obras de saneamento. 120) O presente acidente foi também de trabalho e deu origem ao processo nº 519/12.0 TTVCT que correu termos nos Serviços do MP do Tribunal de Trabalho de Viana do Castelo, onde foi atribuída ao sinistrado/aqui A. uma IPP de 11,82 com a qual concordou. 121) O A. apresentou uma retribuição de 728,00 € e, em 12/07/2014, recebeu da L. Seguros a quantia de 8.732,86 € em relação aos danos patrimoniais futuros. 122) Recebeu ainda da L. Seguros a quantia de 5.798,00 € a título de indemnizações salariais.
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2. Factos não provados:
1. O R. Miguel não manobrou a caixa de velocidades da máquina que tripulava. 2. O R. Miguel travou com o pé esquerdo no travão de pé, quando destravou o travão de mão e a máquina não obedeceu. 3. O condutor Miguel agiu com destreza e perícia. 4. O Autor dirigiu-se por onze vezes ao Hospital L., para consultas de controlo e para exames complementares de diagnóstico. 5. As sequelas que o A. apresenta são absolutamente incompatíveis com o exercício da actividade/profissão habitual de tractorista. 6. Pelo que, na prática, o Autor ficou a padecer de uma Incapacidade Total, Permanente e Absoluta – de 100,00% -, para o trabalho. 7. O A. cultivava e colhia milho e vinho, num total de:
. vinho - 6 pipas;
. milho - 2 carros. 8. Em média, o Autor trabalha, no sector da agricultura, duas horas por dia, nos dias úteis. 9. Nunca menos do que oito horas, aos sábados. 10. E não menos do que quatro horas aos domingos e dias-santos. 11. O resultado da actividade/profissão de agricultor, desempenhada pelo Autor não pode computar-se em menos de 10,00 € por dia. 12. Em consequência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Autor ficou totalmente – 100,00% - incapacitado para o desempenho das suas actividades/profissões de tractorista e de agricultor. 13. No futuro, vai necessitar de se submeter a uma ou mais intervenções cirúrgicas, para extracção desse material de osteossíntese, à região dos ossos (rádio) do braço esquerdo – placa de platina e parafusos de platina. 14. Vai necessitar de se submeter a periódicas e constantes sessões de fisioterapia, ao longo de toda a sua vida – Medicina de Reabilitação Física. 15. O Autor vai necessitar de adquirir, por compra, um veículo automóvel ligeiro de passageiros adaptado à sua condição de deficiente. 16. Esse veículo automóvel de substituição custa não menos do que 25.000,00 €. 17. Esse veículo automóvel tem uma duração não superior a cinco anos. 18. O Autor vai necessitar de trocar esse veículo automóvel, adaptado à sua condição de deficiente, pelo menos, de cinco em cinco anos.
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C- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Perante as diversas questões que foram submetidas pelos apelantes à apreciação desta Relação, a primeira que cumpre tratar é a da impugnação da matéria de facto dado que a sorte dessa impugnação contende com as demais questões a apreciar, uma vez que estas se reconduzem a questões exclusivamente jurídicas, cujo tratamento se encontra, por conseguinte, dependente da factualidade que vier a ser julgada provada e não provada.
Sem prejuízo do que infra se dirá em relação à impugnação da matéria de facto operada pela apelante seguradora em relação aos pontos 2, 37, 41, 42 e 43 dos factos julgados como provados, que, conforme infra se verá, não encerra uma efetiva impugnação da matéria de facto, cumpre abordar os ónus a que a apelante seguradora se encontra submetida em sede de impugnação da matéria de facto e enunciar os critérios que presidem à reapreciação da prova produzida e os termos em que o tribunal ad quem pode e deve alterar a matéria de facto julgada como provada e não provada pela 1ª Instância.
B.1-Da impugnação da matéria de facto em geral.
(…)
Enunciados que estão os ónus a que a apelante seguradora se encontra subordinada em sede de impugnação da matéria fáctica, urge apreciar se aquela cumpriu com os mesmos e, no caso positivo, se procede a sua pretensão.
B.1.1- Da impugnação da matéria de facto dada como provada sob os pontos 2 e 37.
Sustenta a apelante seguradora que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na fixação da matéria que julgou como provada nos pontos 2 e 37 e pretende que perante a reapreciação da prova que identifica (depoimento de parte do Réu Miguel e depoimentos das testemunhas A. S., C. S. e V. M., bem como teor do relatório da ACT) se altere aquela matéria no sentido de ao invés de se julgar como provado que:
“2- No dia 11 de agosto de 2011, pelas 15h00, ocorreu um acidente de trânsito, no Caminho Municipal da Torre, no lugar de Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima; 37- Momentos antes da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, o Miguel encontrava-se a abrir uma vala sensivelmente na linha média da faixa de rodagem do caminho da Torre, com o auxílio do martelo pneumático, acoplado à parte traseira da máquina retroescavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3 cx-4T/0923533”, passe a julgar-se como provado o seguinte:
“2- No dia 11 de agosto de 2011, pelas 15h00, ocorreu um acidente, no Caminho Municipal da Torre, no lugar de Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima;
37- Momentos antes da ocorrência do acidente que deu origem à presente ação, o Miguel encontrava-se a abrir uma vala sensivelmente na linha média da faixa de rodagem do caminho da Torre, com o auxílio do martelo pneumático, acoplado à parte traseira da máquina retroescavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3 cx-4T/0923533”.
Acontece que, como é bom de ver, a enunciada alegação da apelante não encerra uma efetiva impugnação da matéria de facto, na medida que o único extrato da factualidade que a mesma coloca em crise é a circunstância do tribunal a quo ter considerado nos enunciados pontos como facto provado que o acidente “é de trânsito”.
Sucede que “acidente de trânsito” é uma qualificação jurídica, isto é, uma conclusão que há-de ser extraída ou não da matéria de facto que se quedar como provada e sua subsunção ao direito aplicável.
Em síntese, “acidente de trânsito” não é um facto, mas uma conclusão, um conceito jurídico, que há-de ou não ser extraído dos factos que vierem a ser apurados e respetiva subsunção jurídica.
Em sede de factos provados e não provados o tribunal encontra-se obrigado a julgar “factos”, isto é, eventos concretos da vida real, sendo precisamente esses eventos que terão de ser julgados como provados ou não provados e não conceitos jurídicos e/ou conclusões.
Se é certo que, por vezes, se assiste a dificuldades em cindir o que é “facto” de “conceito jurídico” e se é verdade que, noutros casos, determinados conceitos jurídicos já foram apreendidos e se entranharam na linguagem comum e corrente (como é o caso, por exemplo, de “empréstimo”), de modo que nela, tais conceitos, têm uma conotação fáctica concreta, conhecida pela generalidade das pessoas, de modo que é admissível que, em tais casos, se dêem como provados ou não provados o próprio “conceito jurídico” no sentido comum e corrente que lhes é atribuído, sobretudo quando ninguém discute nesses autos o sentido desses conceitos, sequer essa matéria está em discussão, já não é admissível semelhante prática quando, como sucede nos presentes autos, se discute se o concreto evento sobre que versam os autos é ou não suscetível de ser qualificado como “acidente de trânsito”.
Na verdade, nessas situações, não é admissível que se leve aos factos julgados como provados e não provados o conceito jurídico, mesmo no sentido comum e corrente atribuído ao conceito, uma vez que o objeto do processo incide precisamente sobre se determinadas realidades concretas da vida (os factos) integram ou não aquele conceito jurídico.
Resulta do que se vem dizendo que as respostas dadas pelo tribunal a quo aos pontos 2 e 37 dos factos julgados como provados, porque encerram o aludido conceito jurídico – “acidente de trânsito” -, que não é “facto” e quando precisamente nestes autos está em discussão se o acidente merece ou não essa qualificação jurídica, carece de dele ser expurgado.
Deste modo, embora com fundamentos distintos dos aduzidos pela apelante seguradora que, como dito, formulou aquela sua pretensão como se tratasse de uma verdadeira impugnação da matéria de facto, quando não é manifestamente o caso, essa sua pretensão tem que proceder.
Termos em que se altera as respostas dadas aos enunciados pontos 2 e 37 dos factos julgados como provados pelo tribunal a quo, que passam a constar da seguinte redação:
2- No dia 11 de agosto de 2011, pelas 15h00, ocorreu um acidente, no Caminho Municipal da Torre, no lugar de Torre, freguesia de Facha, comarca de Ponte de Lima;
37- Momentos antes da ocorrência do acidente que deu origem à presente ação, o Miguel encontrava-se a abrir uma vala sensivelmente na linha média da faixa de rodagem do caminho da Torre, com o auxílio do martelo pneumático, acoplado à parte traseira da máquina retroescavadora de marca 180 BACKOE LOADERS, MODELO 3 cx-4T/0923533.
B.1.2- Da impugnação da matéria de facto dada como provada sob os pontos 41, 42 e 43.
A apelante seguradora impugna a matéria de facto julgada como provada sob os pontos 41, 42 e 43, sustentando que em face da prova produzida que identifica e que pretende ver reponderada, se altere a matéria neles julgada como provada.
Acontece que a decisão que, no entender da apelante, devia ser proferida em relação a essa concreta matéria fáctica coincide precisamente com aquela que foi julgada como provada pelo tribunal a quo.
Destarte, sem maiores delongas, improcede a impugnação da matéria de facto operada pela apelante seguradora em relação aos enunciados pontos 41, 42 e 43 da matéria julgada como provada na sentença recorrida.
B.1.3- Da impugnação da matéria de facto dada como provada nos pontos 45, 46 e 47.
(…)
Resulta do que se vem dizendo que nenhuma censura nos merece o julgamento feito pelo tribunal a quo quanto aos factos dados como provados sob os pontos 45, 46 e 47, que assim se mantém inalterados.
Introduzidas as alterações acima enunciadas à matéria julgada como provada em relação aos pontos 2 e 37, resta analisar os restantes fundamentos que a apelante seguradora, mas também o apelante Autor, assacam à sentença recorrida.
B.2- Da qualificação do acidente como de viação.
Sustenta a apelante seguradora que a sentença recorrida padece de erro de direito ao qualificar o acidente como de “viação” e ao considerar que este se encontra abrangido pela garantia conferida pelo contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel que tinha celebrado com a Ré J. L., Lda., quanto o mesmo não ocorreu durante a circulação da retroescavadora, mas antes, durante a laboração desta, e quando, nos termos das condições particulares da apólice daquele contrato de seguro se exclui expressamente os “danos resultantes da laboração do veículo”.
Vejamos se assiste razão à apelante.
A Ré seguradora é demandada nestes autos com fundamento no contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel celebrado entre aquela e a Ré sociedade, tendo por objeto a retroescavadora, contrato de seguro esse que se encontrava em vigor à data do acidente (pontos 109 a 112 dos factos apurados).
Nos termos das condições particulares daquele contrato de seguro “encontram-se excluídos os danos resultantes de laboração do veículo” (cfr. doc. de fls. 529 e ponto 118 dos factos provados).
Coloca-se assim a questão de saber se o acidente sobre que versam os autos é de qualificar como “acidente de viação” e se, consequentemente, se encontra abrangido pela garantia conferida pelo enunciado contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel (solução jurídica essa que foi a adotada na sentença recorrida), ou se antes, é um acidente de laboração, com a consequente exclusão do acidente da garantia conferida por aquele contrato, tal como vem propugnado pela Ré.
A resposta a essa questão carece de ser solucionada por recurso ao Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08, na redação vigente à data do acidente, que é a introduzida pelo Decreto-Lei n.º 153/2008, de 06/08, e que é a versão que continua atualmente a vigorar, bem como às Diretivas da União Europeia sobre esta matéria, sabendo-se que aquele regime legal nacional resulta da transposição de Diretivas para a ordem jurídica interna nacional e que a interpretação do direito nacional deve efetuar-se em conformidade com essas Diretivas, independentemente da sua transposição ou não para o direito interno, funcionando como conformidade com as Diretivas a interpretação destas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) (1), como este tribunal tem repetidamente sustentado, designadamente, no acórdão proferido em reenvio prejudicial, no caso Vnuk, de 4/9/2014, onde considera que a diversidade linguística eventualmente verificada nos diplomas de transposição de Diretivas ou mesmo nas traduções, não pode legitimar resultados diversos dentro da União Europeia ou mesmo em cada Estado integrante que contrariem, por um lado, a livre circulação de pessoas e bens e, por outro, o princípio da igualdade cuja violação seria potenciada por interpretações casuísticas em função das idiossincrasias de cada Estado Membro, entendimento este que é o que merece acolhimento constitucional em face do estatuído no art. 8º, n.º 4 da CRP.
Precise-se que visando o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatório, primordial e essencialmente, tutelar os interesses de terceiros e dotado, inclusivamente, de um forte pendor social, conforme entendimento jurisprudencial e doutrinal uniforme, a apreciação da responsabilidade da seguradora deve resultar do confronto direto com a lei do seguro obrigatório e não com o teor do clausulado contratual, pelo que “a inclusão ou exclusão de sinistros (assim como a prévia obrigatoriedade ou não de transferência da responsabilidade) não deve ser apreciada em função do clausulado geral ou particular, antes do confronto entre a realidade e modo como o legislador – comunitário e nacional – procurou a sua regulação abstrata através da formulação de preceitos legais que se sobrepõem aos interesses individualizados” (2).
Significa isto que não é pelo facto de nas condições particulares do contrato de seguro celebrado entre a apelante seguradora e a apelada “J. L., Lda.”, se ter incluído uma cláusula em função da qual “encontram-se excluídos os danos resultantes da laboração” da retroescavadora, que caso o acidente objeto dos autos tenha ocorrido quando esta se encontrava em laboração que se seguirá automaticamente a exclusão da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos da apelante seguradora pelos danos emergentes para o Autor em consequência desse acidente – essa exclusão ocorrerá apenas e tão-somente caso essa seja a solução jurídica que emana do direito comunitário e nacional aplicável ao caso.
Enuncie-se que a discussão suscitada pela seguradora assume particular relevância quando se verifica que a par do seguro de responsabilidade civil obrigatória, o legislador nos termos dos arts. 7º do Decreto-Lei n.º 209/2008, de 29/10, e 4º da Portaria n.º 307/2015, de 24/9, estabelece um seguro obrigatório de responsabilidade civil de exploração, a que se refere o art. 4º do Sistema da Indústria Responsável, aprovado em anexo do Decreto-Lei n.º 169/2012, de 01/08, onde se insere a apelada sociedade, seguro este que nos termos do art. 4º, n.º 2, al. c) daquela Portaria, garante o pagamento de indemnizações exigíveis ao segurado por danos patrimoniais e/ou materiais derivados da atividade de exploração do estabelecimento que decorram de veículos utilizados pelo segurado no exercício da sua atividade industrial e quando se verifica que, nos termos do disposto nos arts. 105º e 107º do Cód. Est., uma retroescavadora é sem dúvida alguma um veículo automóvel, mais concretamente, uma máquina industrial.
Assim, reafirma-se, em face do que se vem enunciado, impõe-se verificar se o acidente a que se reportam os autos é acidente de viação, abrangido pelo contrato de seguro de responsabilidade civil obrigatório automóvel, ou se antes é um acidente de laboração/exploração, sujeito ao seguro obrigatório de responsabilidade civil de exploração.
Estabelece o art. 4º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08, que “toda a pessoa que possa ser civilmente responsável pela reparação de danos corporais ou materiais causados a terceiros por um veículo terrestre a motor para cuja condução seja necessário um título específico e seus reboques, com estacionamento habitual em Portugal, deve, para que esses veículos possam circular, encontrar-se coberta por um seguro que garanta tal responsabilidade, nos termos do presente decreto-lei”.
O n.º 4 daquele preceito, exclui do regime do seguro obrigatório as “situações em que os veículos são utilizados em funções meramente agrícolas ou industriais”.
Embora aquele n.º 1 fale em circulação de veículo terrestre a motor e, consequentemente, inculque a ideia de que só é “acidente de viação” os acidentes ocorridos quando o veículo envolvido no acidente se encontre em circulação e que só se encontra, consequentemente, abrangido pela obrigação de efetuar seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e são abrangidos pela garantia conferida por esse contrato, os veículos de circulação terrestre quando em circulação, é pacífico que no conceito de acidente de viação e para efeitos de obrigatoriedade de celebrar aquele contrato de seguro e a garantia conferida pelo mesmo abrange qualquer utilização de um veículo de circulação terrestre a motor, em conformidade com a sua função habitual (3).
Este entendimento mostra-se em consonância com o regime legal enunciado no n.º 1 do art. 503º do CC. que em sede de responsabilidade objetiva, estabelece que aquele que tiver a direção efetiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação.
Com efeito, conforme adverte Antunes Varela, dentro desta “fórmula legal cabem, tanto os danos provenientes dos acidentes provocados pelo veículo em circulação (…), como os causados pelo veículo estacionado (…)”, tanto fazendo que o veículo “circule em via pública, aberta ao trânsito e geral, como em qualquer recinto privado (…) e pouco importa mesmo que o veículo circule fora de qualquer via, como o jeep que caminha sobre terrenos que outras viaturas não podem percorrer. O espírito da lei cobre manifestamente todas essas situações (…)” e parafraseando Dário M. de Almeida, continua “no risco compreende-se tudo o que se relaciona com a máquina enquanto engrenagem de complicado comportamento, com os excessos ou desequilíbrios da carga do veículo, com o seu maior ou menor peso ou sobrelotação, como maior ou menor desgaste das suas peças, ou seja, com a sua conservação (…). É o pneu que pode rebentar, o motor que pode explodir, a manga de eixo ou a barra de direção que pode partir, a abertura imprevista de uma porta em andamento (…), a pedra ou gravilha ocasionalmente projetadas pela roda do veículo …”, cabendo dentro dessa fórmula, ainda “… os ligados ao termo do binómio que assegura a circulação desse veículo (o condutor). Também o perigo de síncope, de congestão, de colapso cardíaco ou qualquer outra doença súbita de quem conduz faz realmente parte dos riscos próprios do veículo (…). Fora do círculo (…)” ficam apenas “os que não têm conexão com os riscos específicos do veículo; os que são estranhos aos meios de circulação ou transporte terrestre” (4).
Este entendimento que, como dito, era o seguido pela jurisprudência e doutrina nacionais, que desde há muito vem entendendo que “acidentes de viação” não são apenas os típicos acidentes de viação com intervenção de veículos automóveis a que é dada a comum utilização rodoviária, mas ainda os acidentes em que sejam intervenientes quaisquer outros veículos com capacidade de circulação autónoma, incluindo tratores agrícolas ou industriais, retroescavadoras, bulldozers, cilindros de compactação, empilhadores, dumpers ou outras máquinas, desde que não sejam utilizados em funções meramente agrícolas ou industriais (art. 4º, n.º 4 do citado Decreto-Lei n.º 291/2007) e que, consequentemente, todos eles, com exceção das máquinas agrícolas ou industriais enunciadas neste art. 4º, n.º 4, se encontram abrangidos pelo regime do seguro obrigatório (5), foi a solução que veio a ser consagrado pelo TJUE.
Com efeito, no seu acórdão de 04/09/2014, já atrás enunciado, o TJUE considerou que o art. 3º, n.º 1 da Diretiva n.º 72/166/CEE deve ser interpretado no sentido de que o conceito de “circulação de veículo”, para efeitos da obrigação de segurar, abrange qualquer utilização de um veículo, em conformidade com a sua função habitual, podendo ser abrangido pelo referido conceito a manobra de um trator com reboque no terreiro de uma quinta para colocar esse reboque num celeiro, vinculando todos os estados membros a adotar uma interpretação idêntica, quando sejam confrontados com uma questão substancialmente similar, quanto à interpretação daquele normativo da referida Diretiva.
Significa isto que a exclusão a que alude o n.º 4 do art. 4º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08, quanto ao seguro obrigatório automóvel, apenas abrange os veículos com capacidade de circulação terrestre autónoma, que sejam exclusivamente utilizados para fins industriais ou agrícolas e que não apresentem qualquer margem de sobreposição com utilizações próprias da circulação de viaturas que gerem a obrigação de segurar no domínio do seguro obrigatório, isto é, que sejam insuscetíveis de desempenharem uma função de circulação/transporte (6).
Quanto às máquinas industriais e agrícolas que aliam à sua utilização industrial ou agrícola a função de circulação/transporte, as mesmas encontram-se sujeitas à celebração de seguro automóvel obrigatório e, bem assim a seguro obrigatório de laboração.
A delimitação da garantia conferida por cada um dos enunciados contratos de seguro obrigatórios passa pela distinção sobre se, no momento do acidente, a máquina se encontrava a desempenhar exclusivamente a atividade funcional que lhe é inerente enquanto máquina ou se, ao invés, os danos por ela provocados estão relacionados com os riscos da atividade viária, atividade essa que “é delimitada pelos casos em que algum veículo circula ou é usado na sua função de locomoção-transporte (7).
Precise-se, no entanto que tal se pondera no Ac. do STJ. de 23/11/2006, Proc. 06B3445, quando os danos, ainda que emergentes do desempenho funcional da própria máquina, mas que derivam também dos riscos dela relativamente à segurança, esses danos encontram-se cobertos pela garantia conferida pelo contrato de seguro obrigatório automóvel.
Aliás, neste aresto sustenta-se que ocorrendo o acidente com uma máquina que se desloca para trás e para a frente em terraplanagem de ampliação dum caminho público e, num desse movimentos, colhe o menor, “se o acidente ocorreu porque a máquina se movimentava, mal se compreenderia a isenção de seguro, só porque o fazia em movimentos próprios da sua funcionalidade. É que, nestes casos, vem ao de cima, tanto como em circulação normal, o risco especial causado por veículos de que fala Vaz Serra no local citado, em palavras que nos parecem atuais. Para os demais utentes da via, potenciais sinistrados, tanto importa que a máquina se desloque porque o condutor pretende seguir para outro local, como que se desloque porque o condutor apenas quer terraplanar a zona. Só vista pelo prisma destes, a medida traduzida pelo seguro obrigatório atinge os fins de alcance social e de tutela dos interesses dos lesados a que supra aludiu”.
Refira-se que esta jurisprudência se revela deveras pertinente quando se pondera que quem circula na via pública deve poder legitimamente contar que se for vítima de acidente provocado por veículo de circulação terrestre, independentemente deste se encontrar ou não a desempenhar trabalhos específicos da sua atividade funcional enquanto máquina, estacionado ou a circular (factos a que é totalmente alheio e que nem sequer controla), tem a sua indemnização assegurada, seja por via do funcionamento do seguro obrigatório da viatura, seja, na ausência desse seguro, através do Fundo Garantia Automóvel, o que não lhe estará necessariamente assegurado caso se entenda que estando, na altura do acidente, a máquina a desempenhar a sua função específica enquanto máquina, tal facto gera a exclusão da garantia do seguro obrigatório automóvel. É que apesar da obrigatoriedade do seguro de laboração, como é do conhecimento geral, o dono das referidas máquinas nem sempre cumpre com essa imposição legal e nem sempre dispõe de meios económicos para cumprir com as inerentes responsabilidades indemnizatórias.
Semelhante entendimento descura que mesmos nos casos em que uma máquina de circulação terrestre, no momento do acidente, se encontra a laborar no desempenho da sua funcionalidade específica enquanto máquina, não deixa de manifestar o risco especial enquanto máquina de circulação terrestre e que, consequentemente, o acidente por ela provocado é necessariamente a concretização desse risco.
Acresce que esse entendimento descura a vertente social do seguro obrigatório e é suscetível de criar graves distorções entre lesados, violadoras do princípio da igualdade constitucionalmente consagrado no art. 13º, n.º 1 da CRP.
Assentes nestes premissas, resulta da matéria apurada que o acidente sobre que versam os autos envolveu uma retroescavadora e o Autor, quando ambos se encontravam num caminho municipal e, consequentemente, numa via pública, onde decorriam trabalhos de abertura de uma vala.
Esses trabalhos de abertura de vala estavam a ser levados a cabo pela referida retroescavadora que, na altura, era tripulada pelo Réu Miguel.
Sucede que terminada a abertura da vala, o Réu Miguel decidiu deslocar aquela retroescavadora a fim de picar pedra mais abaixo, tendo para o efeito levantado as sapatas hidráulicas da retroescavadora, e porque se encontrasse completamente distraído e, também, em consequência do mau estado daquela máquina, passou a circular com a mesma, na faixa de rodagem do caminho municipal, de forma descontrolada, percorrendo nele uma distância de cerca de dez metros, indo embater com a pá carregadora acoplada, na parte frontal da retroescavadora, na parte traseira de um trator, que aí se encontrava estacionado e junta à qual se encontrava o Autor a fechar o taipal da caixa de carga desse trator, após descarga de uma tampa de saneamento.
Resulta do factualidade que se acaba de traçar que se é certo que na altura do acidente, a retroescavadora se encontrava a exercer a sua função específica enquanto retroescavadora – abertura de vala -, também não é menos certo que, no preciso momento em que eclodiu o acidente, aquela máquina encontrava-se concomitantemente a exercer a sua função de circulação, tanto assim que o Réu Miguel colocou-a em movimento e com ela percorreu cerca de dez metros na via pública, até atingir o trator, em cujo exterior se encontrava o Autor, onde a retroescavadora se imobilizou após ferir o último.
Neste contexto, prefigura-se-nos não colher a posição da apelante seguradora quando pretende que a retroescavadora se encontrava tão só a desempenhar a sua função especifica de laboração enquanto retroescavadora, olvidando que o Réu Miguel a pôs em circulação (logo, aquela desempenhou a sua função de circulação enquanto veículo), percorrendo com ela cerca de dez metros na via pública e com isso potenciando o risco de acidente, pelo que o concreto acidente sobre que versam os autos não deixa de ser uma manifestação própria dos riscos da atividade viária.
Destarte, não podemos deixar de subscrever a sentença recorrida quando nela se qualifica o concreto evento objeto dos autos como acidente de viação e, consequentemente, abrangido pela garantia conferida pelo contrato de seguro automóvel obrigatório celebrado entre a apelante seguradora e a Ré J. L., Lda.
B.3- Da ausência do requisito da culpa.
Sustenta a apelante seguradora que claudica a pretensão indemnizatória deduzida pelo Autor, por ausência de prova do requisito da culpa do condutor da retroescavadora na eclosão do acidente, em virtude de não se ter provado que caso aquele condutor seguisse atento, o desfecho do sinistro fosse outro, que não o infortúnio que se discute no processo, além de que a distração, por si só, não gera culpa, sequer dever de indemnizar, concluindo que para que tal acontecesse, teria o Autor de ter alegado e provado, que o condutor da retroescavadora por ir distraído, não conseguiu evitar o embate, o que não aconteceu.
Antecipe-se desde já, que semelhante argumentação é manifestamente artificiosa e improcedente.
Com efeito, como é sabido, a culpa, em sentido lato, abrange as vertentes do dolo e da culpa strictu sensu, ou seja, a negligência.
O dolo traduz-se na intenção do agente de concretizar o resultado desvalioso, que previu e configurou como consequência direta (dolo direto) ou necessária (dolo necessário) da sua conduta, ou conformando-se como esse resultado, isto é, o agente não agiu com o fito de alcançar aquele resultado desvalioso, mas com outro objetivo, mas prevendo-o como consequência possível do seu comportamento, conforma-se com essa possibilidade e prossegue com a sua conduta (dolo eventual).
Já a culpa strictu sensu – negligência - exprime um juízo de reprovação pessoal em relação à pessoa do agente por este, em face das circunstâncias específicas do caso, estar legalmente obrigado a observar determinado dever objetivo de cuidado, que podia e tinha condições efetivas de observar, mas que omitiu, com o que provocou o resultado desvalioso.
Essa negligência pode ser consciente ou inconsciente.
Na culpa consciente o agente prevê a produção do resultado desvalioso como consequência da sua conduta, mas por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria acredita na sua não verificação e só, por isso, não toma as providências necessárias para o evitar. Já na culpa inconsciente o agente, por imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão nem sequer chega a prever/representar a produção do resultado desvalioso como consequência do seu comportamento, mas podia e devia prevê-lo caso tivesse usado da diligência de um agente médio que se encontrasse na concreta situação em que aquele se encontrava.
Resulta do que se vem dizendo que o requisito da culpa assenta num juízo sobre o nexo existente entre o facto e a vontade do agente e significa que este “atuou de forma a merecer a reprovação ou censura do direito, porque, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo” (8).
Quanto ao critério da avaliação da conduta do agente, esta deve ser aferida, na falta de outro critério legal, por um padrão objetivo, o qual seja, a diligência de um agente medianamente precavido e cauteloso em face das circunstâncias do caso concreto (art. 487º,n.º 2 do CC.).
Como é bom de ver, em sede de acidentes estradais, a culpa do agente traduz-se, em regra, na circunstância daquele por mero desleixo, desatenção, imprudência ou imperícia, por ação ou omissão, ter infringido deveres objetivos de cuidado consagrados nas regras estradais e que, consequentemente, lhe era imposto, ex lege, que observasse e que podia efetivamente ter observado, de acordo com o grau de diligência de um agente médio que se encontrasse nas circunstâncias específicas em que aquele se encontrava, isto é, a modalidade da culpa que está em causa é, por via de regra, a negligência inconsciente.
É assim que se entende que em matéria de trânsito rodoviário a prova da inobservância de leis ou regulamentos faz presumir a culpa na produção dos danos delas decorrentes, dispensando-se a correta comprovação da falta de diligência, impendendo antes sobre o agente a prova de que não obstante a violação dessas normas, não agiu com culpa (9).
No caso, a circunstância de se ter apurado que o Réu Miguel, condutor de retroescavadora, na altura do acidente que vitimou o Autor seguia completamente distraído, viola, de per si, o comando legal enunciado no art. 11º, n.º 2 do Cód. Est..
Acresce que a circunstância daquele condutor ter colocado a restroescavadora em circulação, indo embater com a mesma no trator, que se encontrava encostado à margem direita do caminho municipal, em cuja traseira se encontrava o Autor, viola o comando legal enunciado no art. 12º, n.º 1 do CE.
Significa isto que as enunciadas violações pelo Réu Miguel dos referidos preceitos estradais é condição suficiente para que se presuma judicialmente que o mesmo contribui culposamente para a eclosão do acidente.
Acresce relembrar que independentemente da violação das enunciadas regras estradais, nos termos do art. 503º, n.º 3 do CPC, a culpa do Réu Miguel na eclosão do acidente sempre se teria de presumir por via da relação de comissão existente entre ele e a Ré J. L. Lda. e a circunstância de ter provocados os danos sofridos pelo Autor no exercício dessa relação (cfr. pontos 5 a 12 da matéria apurada).
Destarte, improcede o referido fundamento de recurso.
B.4- Da concausalidade.
Sustenta a apelante seguradora que a sentença recorrida padece de erro de direito ao imputar ao condutor da retroescavadora a culpa exclusiva do acidente, quando este é resultado da culpa daquele condutor e concorrentemente com a falta de condições da retroescavadora para laborar/circular, concausalidade essa que, na sua perspetiva, leva à exclusão da sua obrigação de indemnizar ou, pelo menos, a uma repartição de responsabilidades entre aquela e a entidade patronal do condutor da retroescavadora.
Precise-se que é indiscutível que perante os factos que se apuraram nos pontos 19 a 24, a retroescavadora não cumpria com as condições de segurança legalmente impostas.
É igualmente indiscutível que a conduta ilícita e culposa do condutor da retroescavadora não foi a única e exclusiva causa do acidente que vitimou o Autor, posto que, conforme resulta claramente da factualidade apurada sob o ponto 45, este também tem por causa o comportamento da Ré “J. L.”, que contrariamente ao que era sua obrigação legal fazer, não cuidou em dotar a retroescavadora das condições legalmente exigíveis para que esta pudesse laborar e circular em segurança.
Apesar de se estar perante um situação de concorrência de culpas entre o condutor da retroescavadora e da sua entidade empregadora, esse facto não é oponível ao Autor em sede de seguro obrigatório automóvel, conferindo, eventualmente, à apelante seguradora, uma vez satisfeita a indemnização ao Autor, o direito de regresso sobre a Ré J. L., Lda., na medida em que a quantia indemnizatória por si paga corresponda ao contributo daquela para o eclodir do acidente (art. 27º do Decreto-Lei n.º 291/2007).
Termos em que improcede este fundamento de recurso.
B.5- Da compensação por danos não patrimoniais.
Insurge-se a apelante seguradora contra a sentença recorrida sustentando que a compensação arbitrada ao Autor, no montante de 40.000,00 euros, peca por excesso, atenta a dimensão e gravidade dos danos não patrimoniais por ele sofridos e os critérios enunciados na Portaria n.º 377/2008.
Já o apelante Autor reputa essa compensação por insuficiente e pretende que seja elevada para 70.000,00 euros.
Antes de avançarmos na fixação desta compensação, impõe-se ter presente que os danos não patrimoniais não atingem o património do lesado e são insuscetíveis de avaliação pecuniária e correspondem à angústia, à dor física, à doença, ao vexame, à perda de prestígio ou de reputação, ao abalo psíquico-emocional, ao luto, à dor da perda de um ente amado.
A indemnização por danos não patrimoniais revesteuma natureza acentuadamente mista: por um lado visa reparar, de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada, e por outro não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, o agente (10).
Nos termos do disposto no art. 496º, n.º 1 do Cód. Civil, nem todos os danos não patrimoniais são compensáveis, mas apenas aqueles que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
Essa gravidade deve aferir-se por um grau objetivo e não por um padrão subjetivo, derivado de uma sensibilidade requintada ou embotada, mas a compensação a arbitrar deverá ser significativa, até para se atingir aquela finalidade sancionatória.
Por outro lado, concluído que seja que um determinado dano não patrimonial é suscetível de ser compensado, nos termos do disposto no art. 496º, n.º 3, a compensação será fixada pelo tribunal por recurso à equidade, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º, designadamente o grau de culpabilidade do agente, a situação económica do lesante e a do lesado.
Significa isto que, contrariamente ao pretendido pela apelante seguradora, que postula a aplicação ao caso dos critérios enunciados na Portaria n.º 377/2008, de 26/05, a compensação por danos não patrimoniais não obedece a critérios matemáticos, designadamente, aos enunciados nesse diploma, mas à equidade, único critério erigido pelo legislador para a fixação dessa compensação.
Na verdade, o n.º 4 do art. 496º do CC. é expresso que a compensação por danos não patrimoniais é fixada por recurso à equidade, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no seu art. 494º, pelo que o recurso a critérios matemáticos, incluindo, os enunciados na dita Portaria, seria ilegal, por infringir, direta e frontalmente, o comando do art. 496º, n.º 4.
Precise-se que caso fosse pretensão do legislador que os tribunais passassem a aplicar os critérios estabelecidos naquele diploma, essa sua intenção resultaria frustrada, uma vez que tendo o CC. sido aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47.344, de 25/11/1966, o regime legal que estatui não é suscetível de ser derrogado por uma Portaria, uma vez que esta, enquanto ato regulamentar do Governo, ocupa na hierarquia das fontes normativas, uma posição inferior a um Decreto-Lei, conforme decorre do art. 112º, n.ºs 1, 6 e 7 da CRP., pelo que qualquer Portaria que pretendesse revogar ou alterar o regime jurídico aprovado por Lei ou Decreto-Lei seria materialmente inconstitucional (11).
Acontece que ao aprovar aquela Portaria n.º 377/2008, de 28/05, conforme resulta claramente da leitura do seu Preâmbulo e do regime legal que estatui, não foi manifestamente intenção do legislador revogar ou alterar o regime jurídico fixado no CC. a propósito dos critérios indemnizatórios que estabelece, mas tão só concretizar o comando legal enunciado nos arts. 20º-F e 20º-G, do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31/12, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 83/2006, de 29/07.
Com efeito, o referido Decreto-Lei n.º 83/2006, de 29/07, introduziu no regime jurídico de responsabilidade civil resultante de circulação automóvel, vinculações das empresas de seguros a deveres de diligência e prontidão na regularização de sinistros e organizou um procedimento obrigatório de proposta razoável para a regularização do dano material, tendo sido, neste contexto, que surgiu a enunciada Portaria n.º 377/2008, a qual tem por finalidade prosseguir, concretizar e densificar essa proposta razoável.
Trata-se, assim, de fixar os critérios da enunciada proposta razoável a apresentar obrigatoriamente pelas seguradoras às vitimas de acidente de viação que sofram, em consequência direta e necessária de acidente, dano corporal, ou seja, critérios para cálculo da “proposta razoável de indemnização”, numa fase extra e pré-judicial, que se esgotam, naturalmente, nessa fase.
Tal regime jurídico tem em vista a prossecução da salvaguarda do interesse da vítima, permitindo-lhe que obtenha rápida e célere indemnização e, a título secundário, aliviar o aparelho de justiça, permitindo que numa fase extrajudicial se ponha termo a eventuais conflitos entre seguradoras e lesados, desanuviando-se os tribunais de um número elevado de ações, que de contrário, seriam instauradas.
Esse sistema prossegue também o interesse da Segurança Social. É que ao estabelecer-se o enunciado mecanismo célere do lesado ser indemnizado, evita-se que, em caso de danos corporais sofridos em consequência de acidente de viação, de que resulte a incapacidade temporária ou definitiva, ou a morte do lesado, a Segurança Social tenha de arcar com as consequências decorrentes do acidente de que é responsável terceiro (em relação ao qual ficará sub-rogada nos direitos do lesado perante esse terceiro, na medida das quantias pagas ao lesado), ao ter de pagar as prestações sociais de que o lesado e respetivos familiares, enquanto beneficiários da Segurança Social, têm direito a dela receberem enquanto o litígio com a seguradora não for solucionado.
Essa “proposta razoável” poderá naturalmente ser aceite ou não pelo lesado.
Caso essa proposta razoável de indemnização não seja aceite, esgotada que está a finalidade prosseguida pelo legislador, evidentemente que os critérios indemnizatórios que a Portaria estatui não vinculam os tribunais, sequer estes podem calcular a compensação por danos morais por recurso aos critérios nela elencados sob pena de incorrerem em flagrante violação do regime jurídico do art. 496º, n.º 1 do CC (12).
No entanto, porque “equidade” não significa “arbitrariedade”, mas antes resolução do litígio de acordo com “um critério de justiça”, isto é, “dar ao conflito a solução que se entenda mais justa, atendendo às características concretas da situação”, tal reclama não só que se atenda às especificidades do caso e, em particular, em sede de fixação da compensação por danos morais, em obediência ao referido n.º 4 do art. 496º, sempre aos critérios enunciados no art. 494º, às conceções de justiça dominantes em cada sociedade e em cada momento histórico (13) e, em particular, ao princípio da igualdade, pedra angular do sistema jurídico-constitucional nacional (art. 13º da CRP).
Desse princípio decorre naturalmente que não obstante os tribunais não se encontrem subordinados aos critérios indemnizatórios enunciados na Portaria n.º 377/2008, não se podem abstrair totalmente deles, sob pena de incorrerem em violações desse princípio.
No entanto, atento o campo de aplicação da enunciada Portaria, o princípio da igualdade tem como decorrência que os tribunais se encontram, em primeira linha, subordinados, na fixação da compensação por danos não patrimoniais, aos critérios jurisprudenciais seguidos nesta matéria em casos idênticos/semelhantes.
É certo que nos sistemas jurídicos continentais europeus, em que se insere o nacional, contrariamente ao que acontece nos anglo-saxónicos, não vigora a regra do precedente.
No entanto, ordenando a lei que a compensação por danos morais seja fixada de acordo com a equidade, isto é, a justiça material, imanente a essa ideia está necessariamente o tratamento igual de situações iguais/idênticas.
Significa isto que apesar das dificuldades que se impõem ao julgador na fixação de uma compensação justa, aquele terá de analisar o caso concreto e compará-lo por referência a casos idênticos/semelhantes tratados na jurisprudência, por forma a não cair em subjetivismos e em violações dos princípios da igualdade e, inclusivamente, da segurança jurídicas.
Nessa fixação, o aplicador terá de ter em conta, além dos padrões adotados pela jurisprudência, a flutuação do valor da moeda, a gravidade do dano tendo em conta as lesões sofridas, as suas sequelas e o sofrimento físico-psíquico experimentado pela vítima, bem como outras circunstâncias do caso que se mostrem pertinentes (14).
No caso, releva na fixação da compensação por danos não patrimoniais sofridos pelo Autor os factos apurados nos pontos 50 a 92, onde se destaca o seguinte:
- o Autor contava 59 anos à data do acidente e era pessoa ágil, forte, dinâmica e robusta, que nunca tinha sofrido acidente;
- em consequência do acidente sofreu traumatismo do membro superior esquerdo, fratura diafisária do rádio do braço esquerdo, esfacelo do membro superior esquerdo e lesão/seccionamento da artéria braquial do braço esquerdo;
- foi sujeito a 3 cirurgias – uma de ortopedia, outra de cirurgia vascular e a última aos tendões da região do punho;
- teve 9 dias de internamento hospitalar e, após alta, uma semana de retenção no leito;
- fez tratamento vários e realizou fisioterapia ao braço esquerdo de setembro de 2011 a janeiro de 2012;
- no momento do acidente e nos instantes que o precederam sofreu um enorme susto;
- sofreu dores intensas, sendo o quantum doloris fixável no grau 5 numa escala de 7 graus de gravidade crescente;
- continua a sofrer dores;
- apresenta duas cicatrizes na face interna do braço, outra na face anterior do cotovelo, uma quarta na face anterior do antebraço, e uma última, a quinta, na face antero interna, que lhe determinam um dano estética fixável no grau 3, numa escala de 7 graus de gravidade crescente;
- sente desgosto pela situação em que ficou;
- as lesões sofrias e as sequelas delas resultantes determinaram-lhe um período de doença de dez dias de défice funcional temporário total e um período de doença de 297 dias de défice funcional parcial, dos quais 292 com repercussão temporária para a atividade profissional total;
- vai necessitar de ajudas técnicas e medicamentosas permanentes, tendo de ser vigiado em consultas de cirurgia vascular e necessita de tomar anti-coagulantes com frequência; e
- ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos.
Como referido, impõe-se apelar aos critérios seguidos pela jurisprudência para situações iguais/semelhantes.
Assim, no Ac. da R.P. de 15/01/2013, Proc. 1949/06.2TVPRT.P1, considerou-se que a compensação de 15.000,00 euros era adequada a compensar um lesado que sofreu um quantum doloris de grau 4 em 7, com perda de vários dentes e demais tratamentos dentários, ficando com uma cicatriz notória no lábio superior e com dificuldade em lidar com tal situação.
No Ac. RP. de 11/05/2016, Proc. 805/15.8T8PNF.P1, foi arbitrada uma compensação de 12.500,00 euros a um lesado de 36 anos de idade, que foi sujeito a intervenções cirúrgicas, a internamento hospitalar por três dias, foi sujeito a consultas de ortopedia, tratamentos nos serviços clínicos da Ré, incluindo fisioterapia, tendo ficado com cicatriz na região posterior do antebraço, com 15 cms., que lhe determina um dano estético no grau 3 em 7, padeceu dores fixáveis no grau 4 em 7, sofreu grandes incómodos e provações e continua com dores e que, durante 60 dias, esteve dependente de terceira pessoa para assistência básica, uma vez que não se conseguia deitar, levantar, vestir, calçar, alimentar e fazer a sua higiene pessoal sozinho.
E no Ac. STJ de 29/06/2011, Proc. 345/06.6PTPDL.L1.S1, a um jovem de 19 anos de idade, que ficou a padecer de um IPG de 11,73 pontos que teve um período de 30 dias de incapacidade temporária geral e profissional total, seguido de um período de 177 dias de incapacidade temporária geral e profissional parcial e a quem foi fixado um quantum doloris de grau 5 em 7, o dano estético, constituído por uma cicatriz de 14 cms., que lhe determina um dano estético de 3, em 7, arbitrou-se uma compensação de 25.000,00 euros.
Deste modo, tendo por base os critérios jurisprudenciais seguidos nesta matéria e sopesando os danos não patrimoniais acima descritos e respetiva gravidade, bem como as circunstâncias em que o Autor sofreu o acidente, para o qual não contribuiu, afigura-se-nos que a quantia de 20.000,00 euros se mostra proporcional, necessária, mas suficiente para o compensar de todos esses danos morais.
Decorre do exposto que o recurso interposto pela apelante seguradora procede nesta parte e improcede o do Autor.
B.3- Da indemnização pela perda da capacidade aquisitiva.
Insurge-se o Autor contra a quantia de 40.000,00 euros que lhe foi arbitrada, a título de indemnização pelo défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos com que ficou afetado em consequência direta e necessária das sequelas que para si emergiram do acidente, sustentando que esse valor se mostra desajustado, pretendendo que seja aumentado para 100.000,00 euros.
A indemnização em referência terá de ser quantificada pelo recurso à equidade (arts. 564º, n.º 2 e 566º, n.º 3 do CC.).
A jurisprudência é uniforme que uma justa indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir e que se extinguirá no final do período provável da sua vida (não da vida ativa deste, já que não é razoável ficcionar-se que a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as suas necessidades), posto que só assim se logrará, na verdade, reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (15).
Mais se tem considerado que a “equidade intervém, necessariamente, na medida em que há que assentar no tempo provável de vida da vítima, na diferença que, em cada época futura, existirá entre o rendimento auferido e o que auferiria se não tivesse sido a lesão e, por fim, na evolução da unidade monetária em que a indemnização se irá exprimir” (16).
Na concretização desta indemnização, porém, uns têm recorrido a fórmulas matemáticas e financeiras (o que possibilita a uniformidade de julgados e uma maior facilidade de cálculo), outros à equidade, e outros, ainda, a ambas as possibilidades, conjugando-as (17).
Contudo, a posição jurisprudencial maioritária é aquela que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no art. 566º, n.º 3 do CC (18), posição que sufragamos.
Deste modo e na senda do que se vem dizendo, no cálculo da indemnização, com recurso à equidade, iremos socorrer-nos, como critério objetivador, aferidor e orientador, com vista a evitar subjetivismos, de várias fórmulas matemáticas, a saber: a enunciada no Ac. STJ. de 04/12/2007, Proc. 07A3836, in base de dados da DGSI, a prevista nos estudos efetuados pelo Dr. Sousa Dinis, in CJ/STJ, 1997, t. II, págs. 11 e ss. e as enunciadas na Lei dos Acidentes de Trabalho.
Precise-se que o recurso a essas fórmulas é meramente indicador e instrumental, já que o critério que vai presidir, até por imposição legal, à fixação desta concreta indemnização é a equidade.
No cálculo da indemnização impõe-se considerar, a idade do Autor à data do acidente: 59 anos;
A esperança média de vida daquele à data do acidente: 76,9 anos (cfr. sitio na internet da Pordata);
O salário mensal auferido, que perante os factos apurados sob os pontos 93 a 104, se apura nos 2.094,00 euros;
O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica com que se encontra afetado: 10 pontos;
O facto de que irá receber de uma só vez a totalidade da indemnização, a qual se reporta, em grande medida, a um dano futuro, o que lhe permitirá rentabilizar a quantia recebida em termos financeiros, pelo que se irá considerar a taxa de juro de 1% (note-se que a circunstância dessas taxas de juro atualmente estarem próximas do 0%, não significa que as mesmas não irão subir no futuro, até porque o BCE e o Ministro das Finanças alertaram para esse aumento futuro previsível dessa taxa); e
A circunstância daquela remuneração mensal não se ir manter estática no tempo, mas sofreria inevitáveis atualizações.
Tudo ponderado e sopesado, apelando ao critério da equidade que deverá presidir à fixação da indemnização pela perda da capacidade aquisitiva futura e às várias fórmulas matemáticas seguidas pela jurisprudência em relação a esta concreta matéria, entende-se que a quantia de 40.000,00 euros que foi arbitrada ao Autor na sentença recorrida se mostra justa, adequada e proporcional, que assim se mantém inalterada.
B.5- Dos juros de mora.
Insurge-se o apelante Autor contra o facto de na sentença recorrida se ter determinado que os juros de mora a calcular sobre a compensação arbitrada a título de compensação pelos danos patrimoniais sofridos serem contados desde a data da prolação da sentença, sustentando que tal decisão viola o disposto no n.º 3 do art. 803º do CC, além de que naquela sentença não se procedeu a uma verdadeira e própria atualização da referida compensação, reclamando que os juros de mora sobre todas as quantias indemnizatórias que lhe assistem receber da Ré sejam contabilizados desde a citação desta para os termos da presente ação.
Como é sabido, nos termos do disposto no art. 566º, n.º 2 do CC, sem prejuízo do preceituado noutras disposições legais, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
Por sua vez, o art. 805º, n.º 3 do CC, estabelece que nos casos de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora.
Conjugando estes normativos, na sequência do Ac. de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, do STJ, de 09/05/2002 (19), tem-se considerado que se no momento da prolação da decisão o juiz atualizou o montante do dano liquidado para reparar o prejuízo que o lesado efetivamente sofreu, os juros moratórios a serem concedidos desde a citação para a ação, representarão uma duplicação de parte do ressarcimento e este excederá o prejuízo efetivamente verificado, impondo-se, consequentemente, nesses casos, interpretar restritivamente o art. 805º, n.º 3 do CC, no sentido de apenas se arbitrar juros de mora a partir da decisão atualizadora da indemnização (20).
Significa isto, que se impõe verificar se na sentença recorrida se atualizou os montantes indemnizatórios devidos ao Autor por referência à data da prolação da mesma, caso em que a indemnização apenas vencerá juros de mora desde a prolação da sentença. De contrário, vencem-se juros de mora desde a citação da Ré seguradora para os termos da presente ação em conformidade com o art. 805º, n.º 3 do CC.
Analisada a sentença recorrida, verifica-se que quanto à compensação por danos morais aquela é expressa no sentido de que procedeu a essa atualização e analisado o seu teor, verifica-se que a mesma procedeu efetivamente a essa atualização, tanto assim que fixou uma compensação manifestamente excessiva atentos os critérios jurisprudenciais que vigoravam (e que continuam a vigorar) em sede de danos não patrimoniais à data da sua prolação, razão pela qual nenhuma censura nos merece o que nela foi decidido.
Resulta do exposto que a apelação interposta pela Ré seguradora procede parcialmente (quanto à compensação a título de danos não patrimoniais), improcedendo a apelação do Autor na sua totalidade.
**
Decisão:
Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em:
- julgar o recurso interposto pelo Autor totalmente improcedente;
- julgar o recurso interposto pela Ré “Seguradoras X, S.A.” parcialmente procedente e, em consequência, revogam a decisão recorrida na parte em que condena a Ré a pagar ao Autor a quantia líquida de 86.332,40 euros, dos quais 40.000,00 euros, a título de danos não patrimoniais e condenam aquela Ré a pagar ao Autor a quantia líquida de 66.432,40 euros (sessenta e seis mil quatrocentos e trinta e dois euros e quarenta cêntimos), dos quais 20.000,00 (vinte mil) euros, a título de danos não patrimoniais, confirmando o demais decidido na sentença recorrida.
*
Custas da apelação da Ré “Seguradoras X, S.A.”, por esta e pelo Autor, na proporção dos respetivos decaimentos (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Custas da apelação do Autor, por este.
Notifique.
*
Guimarães, 15 de fevereiro de 2018
(Dr. José Alberto Moreira Dias)
(Dr. António José Saúde Barroca Penha)
(Dra. Eugénia Maria Marinho da Cunha)
1. Ac. STJ. de 17/12/2015, Proc. 312/11.8TBRGR.L1.S1, in base de dados. 2. Ac. STJ de 17/12/2015. Pedro Romano Martinez, Leonor Cunha Torres e outros, in “Lei do Contrato de Seguro Anotada”, 2106, 3ª ed., págs. 465 e 466. 3. Ac. STJ. de 17/12/2015, já anteriormente citado, Ac. R.L. de 02/06/2016, Proc. 758-11.1TBAGH.L1-8, base de dados da DGSI. 4. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., Almedina, págs.690 a 693. 5. Acs. STJ de 18/01/2000, CJ/STJ, 2000, I, pág. 34; de 23/11/2006, Proc.06B3445; 13/03/2207, Proc. 07A197; RP. de 31/05/1999, BMJ, 487º, pág. 369; 27/03/2003; Proc. 02333073; RE de 09/04/2006, Proc. 1491/05-2, estes in base de dados da DGSI: 6. Neste sentido vide Ac. RC. de 10/03/2015, Proc. 1533/12.1TBRD.C1,in base de dados da DGSI, onde se lê que “a exclusão do âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel de máquinas utilizadas em funções meramente industriais ou agrícolas, exclusão decorrente do art. 4º, n.º 4 do DL 291/2007, correspondendo essa máquina ao conceito de veículo para o efeito do art.1º, n.º 1 da Diretiva 72/166/CEE significa que essa exclusão constante da lei nacional só subtrai ao sistema de seguro obrigatório automóvel as utilizações daquelas máquinas “apenas” (meramente) ligas ao próprio uso industrial (ou agrícola), em si mesmo, que não apresentem qualquer margem de sobreposição com utilizações próprias da circulação de viaturas que gerassem a obrigação de segurar no quadro de seguro automóvel” e onde se conclui que “o acidente provocado por um trator industrial (empilhador) consistente no atropelamento e um peão quando a máquina executava uma manobra de marcha atrás, no espaço exterior circundante de um armazém, local onde se realizavam operações de carga e descarga e que é considerado via pública (tal acidente), deve ser abrangido pelo seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, por referência à obrigação de segurar prevista no art. 4º, n.º 1 do DL 291/2007, de 21 de agosto”. No mesmo sentido vide Acs. STJ. de 17/06/2010, Proc. 3174/03.5TBGDM.P1.S1, “o acidente num armazém de mercadorias aberto ao público ocorrido com uma empilhadora, veículo de circulação terrestre que, quando o seu condutor efetuava manobre de marcha atrás, atingiu o lesado no momento em que este escolhia mercadoria exposta para venda, tal acidente subsume-se ao disposto no art. 503º do CC.”. Ac. STJ. de 23/11/2006, Proc. 06B3445, “Está abrangido pelo seguro obrigatório um acidente em que uma máquina se desloca para trás e para a frente em terraplanagem de ampliação dum caminho público e, num desses movimentos, colhe um menor”. Ac. STJ. 07/11/2006, Proc. 06A2617, “Considerando que, no momento do sinistro, a retroescavadora, propriedade da 1ª Ré, não se encontrava na sua função específica de escavação, antes transitava pela via pública, enquanto veículo circulante, com os riscos de circulação inerentes ao comum dos veículos terrestres a motor, deve ser caracterizado como acidente de viação o seu embate num muro de pedra do prédio dos Autores, ocasionado pela perda de controlo da máquina por parte do respetivo condutor. Insto não obstante a máquina circulasse de um local de trabalho para outro local de trabalho, de uma margem para a outra do rio a fim de prosseguir os trabalhos de limpeza que acabar de concluir numa delas e tivesse de passar pelo local do acidente para aceder à outra margem, pois tal situação não se distingue de outra em que termina um trabalho e se circula, pela via pública, até ao local onde se vai dar início a um novo trabalho ou se vai estacionar a máquina”. Ac. RL. de 02/06/2016, Proc. 758-11.1TBAGH.L1-8 “são abrangidos pelo seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel acidentes em que intervêm tractores ou máquinas agrícolas ou industriais, determinando riscos causalmente ligados ao funcionamento do veículo enquanto tal”, num caso em que estando um trator agrícola a realizar trabalhos agrícolas, mais concretamente de apanha de erva, no interior de um prédio rústico composto de terra lavradia, embateu num poste de média tensão. 7. Ac. STJ. de 17/12/2015, Proc. 312/11.8TBRG.L1.S1; e de 07/11/2006, Proc. 06A2617, já atrás enunciados, e Ac. RL de 09/09/2010, Proc. 2027/08/5TBPDL.L1-8, ambos in base de dados da DGSI. 8. Antunes Varela, ob. cit., pág. 582. 9. Ac. STJ. 10/03/1998, BMJ, 475º, pág. 635. 10. Ac. STJ de 29/04/2004, in base de dados da DGSI. 11. Neste sentido Ac. n.º 325/2013 do TC. de 12/06/2013, Proc. 478/06, 3ª Secção, in base de dados, jurisprudência do TC., onde se lê: que é “doutrina constante do Tribunal Constitucional que interdita a uma lei que permita a sua própria alteração por ato sem natureza legislativa. Por conseguinte, a norma constitucional dirige-se ao conteúdo do ato legislativo e não à competência e forma dos atos normativos, ou seja, proíbe os diplomas legislativos de autorizarem a sua revogação, modificação, interpretação ou de suspenderem a sua eficácia através de ato sem força e valor de lei, designadamente por via de regulamento”. No mesmo sentido vide Ac. RC. de 08/05/2013, Proc. 1486/08.PVIS.C1, in base de dados da DGSI. 12. Neste sentido vide, entre muitos, Acs. STJ. de 03/04/2014, Proc. 436/07.6TBVRL.P1.S1; de 09/09/2010, Proc. 2572/07.0TBTVD.L1; RL. de 11/04/2013, Proc. 25024/10.6T2SNT.L1-2; RC de 05/03/2013, Proc. 201/10.3TBTBU.C1; RE de 20/12/2012, Proc. 853/09.7TBEVR.E1; RG. de 12/01/2012, Proc. 282/09.2TCGMR-A.G1, todos in base de dados da DGSI. Note-se que a jurisprudência é absolutamente pacífica no sentido de que os critérios enunciados na Portaria n.º 377/2008, de 28/05, e sucessivas alterações, não vincula os tribunais. 13. Ana Prata, “Dicionário Jurídico”, 5ª ed., Almedina, 5ª ed., pág. 600. 14. Ac. STJ. de 13/07/2004, Salvador da Costa, in base de dados da DGSI. 15. Acs. STJ. de 10/11/2016, Proc. 175/05.2TBPSR.E2.S1; de 10/10/2012; de 03/12/200719/02/2004, RL. de 21/03/2012, Proc. 4129/06.3, todos in base de dados da DGSI; de 28/09/95, CJ/STJ, t. 3º, pág. 36, e de 25/09/2007, in base de dados do ITIJ. 16. Ac. STJ., de 25/06/2002, CJ/STJ, t. 2º, pág. 132. 17. Sousa Dinis, in “Dano Corporal em Acidentes de Viação, Cálculo de indemnizações, Situações de Agravamento”, in CJ/STJ, 1997, t. II, págs. 11 e ss. 18. Ac. STJ., 04/03/93, in AC/STJ, t. 1º, pág. 129. 19. DR. I Série A, de 27/06/2002. 20. Neste sentido vide Acs. STJ de 11/02/2015, Proc. 6301/13.0TBMTS.S1; de 25/10/2007, Proc. 07B3028; RG de 10/04/2014, Proc. 320/12.1TBVCT.G1; e de 10/09/2013, Proc. 2686/10.9TBVCT.G1, todos in base de dados da DGSI.