CONTRATO DE MANUTENÇÃO DE ELEVADORES
CONDOMÍNIO
PROPRIEDADE HORIZONTAL
Sumário

1.Os ascensores estão sujeitos a manutenção regular, que é assegurada por uma empresa de manutenção de ascensores (EMA), a partir do momento em que essa instalação é colocada à disposição dos utilizadores, incumbindo ao proprietário da instalação a obrigação de celebrar com a EMA o respetivo contrato de manutenção (art. 4º do Dec. Lei 320/2002 de 28/12);
2.Trata-se, pois, de contrato cuja celebração é imperativa, motivada por interesses de ordem pública, incorrendo o condomínio em responsabilidade contra-ordenacional, enquanto proprietário dessas instalações, se permitir o funcionamento do ascensor “sem existência de contrato de manutenção” (art. 13º, nº1, alínea c) do mesmo diploma).
3.Constituído o prédio em propriedade horizontal (art. 1414º do Cód. Civil), tendo a empresa construtora, proprietária das frações representativas da maioria do capital investido, na qualidade de administrador provisório (art. 1435ºA do Cód. Civil), celebrado com outra empresa um contrato de prestação de serviços relacionados com a manutenção dos elevadores que constituem parte comum do prédio, é o condomínio responsável pelo pagamento do preço dos serviços prestados por essa empresa e recebidos, sem reclamações, pelo condomínio, ainda que entretanto a assembleia dos condóminos eleja nova administração, que celebra novo contrato com a mesma empresa.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

  
I-Relatório:


E. – Elevação e Equipamentos Industriais, Lda. intentou a presente ação contra o Condomínio sito na Praceta ….., nº ... (ex-lote …), em Alfragide, peticionando a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 12.841,49€, sendo 11.477,73€ de capital, acrescido de 1.261,76€ a título de juros de mora e do valor de 102,00€ da taxa de justiça paga.

Em audiência de julgamento a autora reduziu o pedido, no que ao capital diz respeito, ao montante de 7.914,56€ [ [1] ].

Para fundamentar a sua pretensão invoca que prestou ao réu serviços de manutenção e assistência técnica nos elevadores instalados nas partes comuns do prédio, expressos nas faturas que indica, vencidas no período de 15-6-2009 a 10-10-2013.

O réu deduziu oposição.

Por exceção invoca a ilegitimidade material; entende que relativamente a parte das faturas, vencidas antes de 1-12-2010, não é responsável pelo respetivo pagamento, na medida em que só contratou com a autora naquela data a manutenção de elevadores e o contrato anterior para o mesmo efeito foi celebrado entre a autora e E. & Cruz, Lda; conclui, portanto, pela improcedência do pedido nesta parte.

Exceciona ainda, de forma subsidiária, a sua ilegitimidade; alega que os serviços prestados relativamente às faturas vencidas antes de 1-12-2013, dizem respeito a serviços prestados pela autora a uma terceira pessoa. Assim, o réu não tem qualquer interesse em contradizer, sendo parte ilegítima relativamente a tais faturas, com a consequente absolvição da instância relativamente a esses valores.

Por último, exceciona o pagamento de 767,52€ relativos à fatura nº 21937, paga em 28-3-2014.

Por impugnação, invoca que as faturas anteriores a dezembro de 2013 não lhe podem ser imputadas e desconhece se as faturas posteriores a dezembro de 2010 ainda se encontram em dívida, uma vez que sempre vai depositando quantias por conta da dívida à autora; invoca ainda dificuldades económicas do condomínio para efetuar o pagamento, dificuldades que deu a conhecer à autora.

A autora pronunciou-se sobre as exceções invocadas.

Proferiu-se despacho de aperfeiçoamento nos termos constantes de fls. 80, na sequência do que a autora veio juntar certidão da descrição de cada uma das frações e de todas inscrições em vigor.
Procedeu-se a julgamento.

Proferiu-se decisão, que, com referência à exceção invocada, concluiu que “as partes são legítimas”.

Quanto ao mérito da causa, a sentença conclui nos seguintes termos:
Pelo exposto, julgo a ação procedente, por provada, e, em consequência condeno o réu Condomínio do Prédio sito na Praceta ….., nº ... (anterior lote …), em Alfragide a pagar à autora E. – Elevação e Equipamentos Industriais, Lda., o montante de € 7.914,56, acrescido de juros de mora a contar do respetivo vencimento e até integral pagamento, calculados à taxa de juro resultante da aplicação sucessiva das Portarias 1105/2004, de 16/10 e 597/2005, de 19 de Julho e sucessivos Avisos publicados pela Direção Geral do Tesouro, sobre:

- parte da fatura n.º 91117 com vencimento em 06/07/2009, pela importância de 390,53;
- o valor das faturas n.º 91516 com vencimento em 06/10/2009 pelo valor de €972,48, n.º 90456 com vencimento em 09/11/2009 pelo valor de € 64,87, n.º 10375 com vencimento em 05/01/2010 pelo valor de € 972,48, n.º 10798 com vencimento em 05/04/2010 pelo valor de € 972,48, n.º 10123 com vencimento em 04/05/2010 pelo valor de € 347,58, n.º 11231 com vencimento em 20/07/2010 pelo valor de € 980,58, n.º 10362 com vencimento em 08/09/2010 pelo valor de € 315,37, n.º 10399 com vencimento em 01/10/2010 pelo valor de € 65,41, n.º 11679 com vencimento em 19/10/2010 pelo valor de € 980,58, n.º 10423 com vencimento em 28/10/2010 pelo valor de € 218,74, n.º 10477 com vencimento em 21/12/2010 pelo valor de € 65,41, n.º 31389 com vencimento em 16/07/2013 pelo valor de € 821,25; e
- parte das faturas n.º 10424 com vencimento para 07/11/2010 pelo valor de 82,46€ e n.º 31926 com vencimento para 16/10/2013 pelo valor de 664,34€ .
Custas pelo réu.
Fixa-se o valor à ação em 12.841,49€ (cf. art. 297, nº 1 do CPC).
Registe e notifique”.

Não se conformando, o réu apelou formulando as seguintes conclusões:

“1.O ora Recorrente foi condenado a proceder ao pagamento da quantia de € 7.914,56 (Sete Mil Novecentos e Catorze Euros e Cinquenta e Seis Cêntimos) relativamente a faturas emitidas pela Recorrida ao abrigo de dois contratos de manutenção de elevadores.
2.Sendo que estamos perante a questão jurídica de verificar se o Recorrente é responsável ou não por um contrato que não foi celebrado por si, ainda que seja relativamente a uma parte presumivelmente comum.
3.O Tribunal a quo não andou bem ao considerar que o contrato celebrado pelo construtor do prédio vinculava o Recorrente, enquanto condomínio, considerando que a dívida pela conservação e manutenção de elevadores é uma obrigação propter rem ambulatória.
4.No caso vertente, estamos perante dois contratos celebrados com a ora Recorrida, o primeiro contrato foi celebrado em 28 de Outubro de 2008 entre a Recorrida e a sociedade construtora E. e Cruz, Lda. e que implicava a manutenção simples dos elevadores e o segundo contrato foi celebrado em 01 de Dezembro de 2010, após a constituição do Condomínio com a realização da primeira assembleia de condóminos, com a mesma empresa de elevadores.
5.Sucede que, o primeiro contrato ainda se encontrava em vigor, quando entre a Recorrida e o Recorrente foi decidido no âmbito da sua liberdade contratual revogar o contrato anterior e celebrar um novo.
6.O Tribunal a quo através da prova documental e pela prova testemunhal trazida aos autos pode observar que o Condomínio, aqui Recorrente nunca ratificou o contrato celebrado entre a Recorrida e empresa construtora E. e Cruz, Lda. (Cfr. Sentença Recorrida “Esta testemunha disse ter celebrado a escritura de compra da sua fração autónoma no prédio, em agosto de 2008; e também referiu que antes da constituição do condomínio a autora procedia à manutenção e assistência dos elevadores do prédio; porém, entendia que deveria ser o construtor o responsável pelo pagamento desse serviço.”)
7.Sendo que, não existindo uma cessão de posição contratual entre a empresa construtora e o condomínio, a Recorrida não poderia ter reclamado o pagamento das faturas que ficaram em dívida, na vigência de tal contrato.
8.Por outro lado, verifica-se que no caso sub judice que a própria Recorrida tinha pleno conhecimento de que não existia qualquer cessão de posição contratual ou ratificação do contrato, pois celebrou um novo contrato com o Condomínio, após a sua constituição, em termos e condições diferentes do contrato anterior.
9.A obrigação propter rem, decorrente de ser proprietário de prédio com elevador obrigatório, não legitima que uma vinculação acordada por anterior dono seja alargada ao absurdo e atinja desse modo os futuros adquirentes.
10.Pois, o construtor podia vincular-se como entendesse, mas essa vinculação não podia atingir futuros condóminos, sem que estes ratificassem a concreta vinculação.
11.Nesse entendimento, o Tribunal da Relação do Porto no seu acórdão de 10-03-2014 refere que “I – A obrigação prevista n.º 1 do artigo 1424.º do Código Civil, no sentido dos condóminos contribuírem monetária e proporcionalmente para o pagamento das despesas relativas às partes comuns, é uma obrigação propter rem, na medida em que resulta da manutenção da funcionalidade da própria coisa independentemente de quem seja o dono. II – Visando esta obrigação a satisfação dos interesses e necessidades comuns dos condóminos, quanto à funcionalidade do prédio, os seus sujeitos são, do lado passivo, cada um dos condóminos e, do lado activo, a universalidade dos condóminos (condomínio). III – Uma empresa contratada para prestar os serviços de interesse comum não é contraparte nesta obrigação propter rem, mas apenas na obrigação que resulta do respectivo contrato. IV – O contrato relativo à manutenção de ascensores, previsto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 320/2002, de 28 de Dezembro, celebrado entre o construtor do imóvel e uma empresa prestadora de tais serviços, não se transmite ao condomínio, salvo se existir cessão da posição contratual ou ratificação do contrato por parte do condomínio, nos termos do artigo 268.º, n.º 1, do Código Civil.” (sublinhado nosso)
12.A obrigatoriedade no que respeita à contratação de empresas autorizadas em matéria de conservação de ascensores, como requisito para a constituição da propriedade horizontal, não implica que o contrato celebrado para tal fim, por parte da entidade construtora e proprietária do edifício, vincule futuramente quem nele não tomou parte.
13.Não existindo nenhuma cláusula ou disposição legal que implica a obrigatoriedade de tal transmissão.
14.Ora, a seguir o entendimento do Tribunal a quo ao caso sub judice, o Condomínio estaria acorrentado a tal contrato, não se podendo desvincular, mesmo que o nascimento do Condomínio apenas ocorresse daí a 1 ano, 5 ou mais.
15.O Recorrente, Entidade Equiparada a Pessoa Coletiva com número de contribuinte próprio NUNCA RATIFICOU o contrato celebrado entre a EMA e o Construtor!
16.O Condomínio no exercício da sua liberdade contratual celebrou um novo contrato com a empresa de manutenção de elevadores (EMA), aqui Recorrida, tal como poderia ter feito com qualquer das dezenas empresas de manutenção de elevadores existentes no mercado.
17.Nesse entendimento, refere o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/03/2013 que “1.A cláusula penal, aposta num contrato de manutenção de elevadores, para 20 anos, relativos a prédio constituído em regime de propriedade horizontal depois daquele negócio, para o seu incumprimento resultante da sua cessação antecipada, subscrita pelo construtor, depois administrador provisório do condomínio, não vincula os futuros condóminos enquanto estes a não ratificarem (art.268º do Código Civil).”
18.Pelo que, não existindo a ambulatoriedade da obrigação propter rem, o Tribunal a quo andou mal ao condenar o ora Recorrente ao pagamento das faturas que dizem respeito ao contrato celebrado pelo construtor.
19.Nessa medida, deverá ser revogada parcialmente a sentença proferida, devendo o Recorrente ser absolvido do pagamento das faturas vencidas na vigência do contrato celebrado entre a Recorrida e o Construtor do prédio.
Nestes termos e nos demais de direito, deverá ser admitido o presente recurso, o qual deverá ter efeitos suspensivos, devendo ser a presente Apelação considerada procedente, por provada e revogada a sentença proferida.
Assim se fará a acostumada Justiça!”

Foram apresentadas contra-alegações.

Cumpre apreciar.

II.-FUNDAMENTOS DE FACTO.

Releva o seguinte circunstancialismo, que a primeira instância deu por assente:

1.A autora prestou serviços de manutenção e assistência técnica nos elevadores das partes comuns do prédio onde se situa o réu.

2.Existe um escrito do qual consta “CONTRATO DE CONSERVAÇÃO SIMPLES – SN ENTRE NOME: PROPRIETÁRIO EM REPRESENTAÇÃO DO CONDOMÍNIO MORADA: PRACETA ….. ALFRAGIDE (…) ADIANTE SIMPLESMENTE DESIGNADO COMO CLIENTE E: E. elevação e equipamentos industriais, Lda. (…) INSCRITA COMO EMPRESA DE MANUTENÇÃO DE ASCENSSORES ADIANTE DESIGNADA COMO E., É CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO DE ASCENSSORES INSTALADO EM: EDIFICIO UTILIZADO PARA:
HABITAÇÃO SITO EM: PRACETA ……, LOTE 25 (…)”.

3.Na zona reservada às assinaturas consta: de um lado “ACEITE DO CLIENTE NOME: E. & CRUZ, LDA (…)” e por debaixo uma assinatura; e do outro lado, “PRESTADOR DE SERVIÇOS E., LDA.
(…)” e por debaixo uma assinatura.

4.Tal escrito encontra-se datado de “28 de Outubro de 2008”.

5.Da certidão da Conservatória do Registo Predial junta aos autos relativa ao prédio onde se situa o réu consta, além do mais, “SITUADO EM: Alfragide Praceta ……, lote 25 (…) AP. 17 de 2005/02/14 – Aquisição (…) CAUSA: Compra SUJEITO(S) ATIVO(S): EMPREENDIMENTOS URBANISTICOS – E. & CRUZ, LDA
(…)”.

6.Da mesma certidão consta: “AP. 7 de 2007/11/30 – Constituição da Propriedade Horizontal
FRAÇÃO: A PERMILAGEM: 38
FRAÇÃO: B PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: C PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: D PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: E PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: F PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: H PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: I PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: J PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: M PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: N PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: O PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: P PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: Q PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: R PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: S PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: T PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: T PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: U PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: V PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: X PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: Z PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: AA PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: AB PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: AC PERMILAGEM: 37
FRAÇÃO: AD PERMILAGEM: 37”.

7.Da referida certidão consta que na data referida em 4., relativamente às frações A, B, C, D, E, G, I, J, L, M, N, O, P, R, S, T, U, V, X, Z, AB, AC encontrava-se em vigor a inscrição de aquisição referida em 5.

8.Os serviços prestados pela autora deram origem à emissão das seguintes faturas:

n.º 90741 com vencimento para 15/06/2009 pelo valor de € 324,16;
n.º 91117 com vencimento para 06/07/2009 pelo valor de € 972,48;
n.º 91516 com vencimento para 06/10/2009 pelo valor de € 972,48;
n.º 90456 com vencimento para 09/11/2009 pelo valor de € 64,87;
n.º 10375 com vencimento para 05/01/2010 pelo valor de € 972,48;
n.º 10798 com vencimento para 05/04/2010 pelo valor de € 972,48;
n.º 10123 com vencimento para 04/05/2010 pelo valor de € 347,58;
n.º 11231 com vencimento para 20/07/2010 pelo valor de € 980,58;
n.º 10362 com vencimento para 08/09/2010 pelo valor de € 315,37;
n.º 10399 com vencimento para 01/10/2010 pelo valor de € 65,41;
n.º 11679 com vencimento para 19/10/2010 pelo valor de € 980,58;
n.º 10423 com vencimento para 28/10/2010 pelo valor de € 218,74;
n.º 10424 com vencimento para 07/11/2010 pelo valor de € 474,66 da qual o réu já pagou € 392,20;
n.º 10477 com vencimento para 21/12/2010 pelo valor de € 65,41;
n.º n.º 31389 com vencimento para 16/07/2013 pelo valor de € 821,25;
n.º 31926 com vencimento para 16/10/2013 pelo valor de € 821,25, da qual o réu já pagou 156,91€.

9.Existe um escrito, designado “Acta número um”, do qual se pode ler, “Ao vigésimo dia do mês de Novembro do ano de mil e dez, em segunda convocatória, reuniu-se em Assembleia Geral Ordinária de Condóminos do edifício na Praceta das ... nº 3/lote 25, na Amadora com a seguinte ordem de trabalhos: 1. Eleição da administração (…) Iniciada a reunião pelo primeiro ponto da ordem de trabalhos, depois dos presentes terem sido elucidados quantos às metodologias que a M.S.Reinhardt Lda iria implementar durante o exercício de 2011, foi de imediato eleita por unanimidade (…) para assegurar os destinos do condomínio enquanto perdurasse a anuidade de 2010 e 2011”.

10.No dia 1 de dezembro de 2010, a autora E. celebrou com o réu, representado pela administração de condomínio, um novo contrato de manutenção simples dos elevadores ali existentes.

III-FUNDAMENTOS DE DIREITO.

1.-Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635º e 639º do novo C.P.C. [ [2] ] – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3 do mesmo diploma.
Ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apenas responder à seguinte questão: sobre quem impende a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações decorrentes de um contrato de prestação de serviços de manutenção dos ascensores de um prédio, no que concerne ao pagamento do preço pelos serviços prestados, nos casos em que esse contrato é celebrado pelo administrador provisório do prédio constituído em propriedade horizontal, administrador que subscreveu o contrato em representação do condomínio?

2.-Vejamos a dinâmica das relações que emergem da factualidade dada por provada e que não foi colocada em crise:

-Em 28-10-2008 a autora e a sociedade E. & Cruz, Lda acordaram conforme consta dos nºs 1 e 2 dos factos assentes, tendo esta sociedade subscrito o documento arrogando-se a qualidade de “proprietário em representação do condomínio morada: Praceta das ... lote 25 Alfragide”, na sequência do que a autora prestou serviços de manutenção e assistência técnica nos elevadores do prédio; nessa data a sociedade era proprietária das frações representativas da maioria do capital investido; 
-Em 01-12-2010 a autora e o réu outorgaram o “contrato de manutenção simples de elevadores”, clausulando conforme consta do documento de fls. 29-34.
Assenta-se na caracterização dos contratos celebrados como de prestação de serviços, qualificação que as partes não discutem.

O apelante insurge-se contra a decisão porquanto, insistindo na tese que já havia sustentado no articulado de oposição, entende que o condomínio não pode ser responsabilizado pelas dívidas contraídas por outra entidade que não o condomínio, a saber, a aludida sociedade E. e Cruz Lda, dívidas reportadas a período anterior à outorga do contrato com o réu, celebrado apenas em 1 de dezembro de 2010.

Que dizer?

O Dec. Lei 320/2002 de 28/12 “[e]stabelece o regime de manutenção e inspecção de ascensores, monta-cargas, escadas mecânicas e tapetes rolantes, após a sua entrada em serviço, bem como as condições de acesso às actividades de manutenção e de inspecção”.

Os ascensores estão sujeitos a manutenção regular, que é assegurada por uma empresa de manutenção de ascensores (EMA), a partir do momento em que essa instalação é colocada à disposição dos utilizadores [ [3] ], incumbindo ao proprietário da instalação a obrigação de celebrar com a EMA o respetivo contrato de manutenção (art. 4º do mesmo diploma) [ [4] ], numa das modalidades a que alude o art. 5º [ [5] ], tratando-se de contrato cuja celebração é imperativa, motivada por interesses de ordem pública, incorrendo o condomínio em responsabilidade contra-ordenacional, enquanto proprietário dessas instalações, se permitir o funcionamento do ascensor “sem existência de contrato de manutenção” (art. 13º, nº1, alínea c) do mesmo diploma).

No caso, estamos perante prédio urbano que foi constituído em propriedade horizontal [ [6] ], estando a mesma registada na CRP por apresentação de 30-11-2007, não se questionando que pelo menos desde 28-10-2008 os elevadores existentes no prédio estivessem em funcionamento, atento o contrato outorgado nessa data e aludido no número 2 dos factos provados, sendo evidente que, presumindo-se que os ascensores integram as partes comuns do prédio (art. 1421º, nº2, alínea b) do Cód. Civil) é sobre os condóminos que recai a obrigação de suportar os encargos com a sua conservação e fruição, nos termos do art. 1424º do Cód. Civil – cfr. os nºs 1 e 4.

Ainda que se entenda que a constituição do prédio em regime de propriedade horizontal exige mais do que a mera constatação de existência de um título constitutivo e que o condomínio só nasce com a primeira alienação de uma das frações autónomas do prédio, em face do que dispõe o 1414º do Cód. Civil [ [7]  ], ainda assim, no caso em apreço, à data em que o contrato aludido foi outorgado já haviam sido vendidas pelo menos quatro frações (frações H), Q) AA) e D), como infra melhor se aludirá, pelo que é indiscutível estarmos perante verdadeira hipótese em que já se mostrava constituída a propriedade horizontal.    
 
Da factualidade assente resulta que a primeira assembleia de condóminos reuniu em 20-11-2010 – conforme “acta número um”, aludida no nº 9 dos factos provados –, tendo aí sido eleita a administração do condomínio para a “anuidade de 2010 e 2011”. Infere-se, pois, que até essa data, os condóminos não elegeram o administrador, como se impunha – art. 1435º do Cód. Civil – sendo que nunca o réu invocou que o administrador tenha sido judicialmente nomeado.

Rege, pois, o disposto no art. 1435º-A do Cód. Civil [ [8] ], sendo as funções de administrador exercidas, obrigatoriamente e a título provisório, pelo condómino cuja fração ou frações representem a maior percentagem do capital investido, salvo se outro condómino houver manifestado vontade de exercer o cargo e houver comunicado tal propósito aos demais condóminos – acrescente-se que esta última hipótese também nunca foi equacionada nos autos, mormente pelo réu.

Ora, em 28-10-2008, data em que foi celebrado o contrato de prestação de serviços com a autora, era a aludida sociedade quem, necessariamente, desempenhava as funções de administrador.

Assim, ponderando a factualidade dada por assente sob os números 5 a 7 e o disposto no art. 7º do Cód. do Registo Predial, era a E. e Cruz Lda que representava a maior percentagem do capital investido. Bem se compreende, pois, que tenha celebrado tal contrato enquanto “proprietário em representação do condomínio” e arrogando-se essa qualidade, como expressamente vertido no documento que titula o contrato (cfr. o documento de fls. 69 a 74 dos autos) [ [9]  ].

E podia fazê-lo?

O que vale por perguntar se se circunscreve no âmbito das funções do administrador a celebração de um contrato de manutenção dos ascensores existentes no prédio.

Considerando que a administração das partes comuns do edifício compete à assembleia dos condóminos e a um administrador (art. 1430º, nº1 do Cód. Civil) e abstraindo-nos do específico conteúdo desse contrato de prestação de serviços [ [10] ], tendemos a responder afirmativamente, porquanto não encontramos razões para considerar, in limine, que se trata de matéria da exclusiva competência da assembleia dos condóminos; o que não significa, obviamente, que a assembleia não possa deliberar quanto a tal matéria, tendo até poderes para conformar a atuação do administrador.

Nos termos do art. 1436º do C.Civil são funções do administrador, nomeadamente, cobrar as receitas e efetuar as despesas comuns (alínea d) [  [11] ], realizar os atos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns (alínea f), regular o uso das coisas comuns e a prestação dos serviços de interesse comum (alínea g) [ [12] ] e ainda assegurar a execução do regulamento e das disposições legais e administrativas relativas ao condomínio (alínea l). É no âmbito destas funções que usualmente se enquadram os contratos celebrado pelo administrador incidindo sobre a prestação de serviços de limpeza, manutenção e reparação das partes comuns do edifício, não se encontrando razões, como se disse, para liminarmente excluir os contratos de manutenção de elevadores nos casos em que estes constituem uma parte comum do prédio, tanto mais que o legislador impõe a celebração desses contratos.

Isto sem prejuízo de também não podermos, aprioristicamente, afastar que em determinadas situações, se possa concluir pela competência exclusiva da assembleia para deliberar sobre os termos em que o condomínio se vincula sendo, então, o administrador mero executor da deliberação; nesta sede, haverá que apreciar casuisticamente, em função do específico programa contratual em presença e relevando, nomeadamente, o clausulado no regulamento do condomínio.

No caso, porém, o réu nem sequer organizou a sua defesa nesses termos, não suscitando, a esse propósito, qualquer questão, nem sequer cuidando de invocar a excessiva onerosidade para o condomínio do primeiro contrato celebrado, ou que este tivesse cláusulas contratuais abusivas.

Em bom rigor, a defesa do apelante resume-se à invocação factual de que o condomínio não é responsável pelo pagamento das quantias peticionadas e vencidas “anteriormente à data do contrato com o Requerido” – art. 32º da oposição –, isto é, anteriores a 01-12-2010, porquanto são quantias que se reportam ao contrato que a sociedade E. e Cruz Lda – uma “empresa terceira”, na terminologia da autora –, celebrou com a autora, não tendo ocorrido qualquer cessão da posição contratual para o condomínio – cfr. o art. 4º do requerimento de fls. 77-78, em que o réu se pronuncia quanto ao documento junto.

Aliás, paradoxalmente, se bem que o réu indique que os serviços foram prestados pela autora a uma terceira pessoa, para fundar a exceção (processual) de ilegitimidade passiva, nunca impugnou que a atividade da autora tenha tido por objeto os ascensores pertencentes ao condomínio, sendo que dificilmente se alcança que os condóminos possam ignorar uma regra básica da experiência e que decorre da normalidade da vida quotidiana, a saber, que os ascensores de um edifício carecem de manutenção regular.

Conclui-se, pois, relativamente ao contrato outorgado em 28-10-2008, que este acordo foi celebrado pela entidade que tinha poderes para vincular o condomínio, obrigando-o ao pagamento do preço correspondente aos serviços prestados pela autora.

Assim sendo, a posterior alteração da identidade de alguns dos condóminos, titulares das frações que compõem o edifício e a eleição pela assembleia dos condóminos de um (novo) administrador, não se reflete na eficácia daquele contrato nem na sua força vinculativa, obrigando o condomínio ao pagamento do preço dos serviços que comprovadamente a empresa tenha prestado e o condomínio recebido, ao abrigo daquele contrato, como aconteceu no caso, em que o condomínio, réu na ação, nunca questionou ter sido o beneficiário daquela prestação realizada pela autora.

Acrescente-se que não é juridicamente aceitável penalizar a autora por eventuais conflitos atinentes às relações estabelecidas entre aquela sociedade que, segundo alega o réu, foi a “empresa construtora do prédio” [ [13]  ] e o condomínio, conflitos e queixas que o réu dá conta na missiva cuja cópia foi junta a fls. 38 e que terá sido dirigida aos mandatários da autora [ [14] ], conflitos a que a autora é alheia.

Por último e decorrendo do que supra se expôs, a solução propugnada pelo apelante/réu não é conforme aos ditames da boa-fé. É que o réu nunca discutiu – nem discute – que a autora tenha prestado os serviços aludidos, nos moldes e pelos preços indicados e que tenha sido o condomínio a beneficiar dos mesmos, ao longo do tempo; e, à data a que se reportam as faturas cujos valores a apelante entende não dever pagar, reportadas ao ano de 2010 – o segundo contrato de manutenção foi celebrado no fim desse ano, em dezembro –, já se mostrava registada a aquisição de várias frações a favor de entidades que não a aludida sociedade construtora [ [15] ], pelo que há muito que alguns dos proprietários/condóminos podiam ter colocado as questões pertinentes a propósito da aludida prestação de serviços, nomeadamente convocando uma assembleia extraordinária para efeito de discussão desse contrato, não podendo uma terceira entidade ser prejudicada com a inércia e omissão dos condóminos.
Adere-se, pois, ao entendimento sufragado no ac. STJ de 14-09-2010 [ [16]  ] que decidiu em caso similar ao ora em apreço [ [17] ], sendo que nesse aresto, como nos presentes autos, não se colocava qualquer questão alusiva à responsabilidade de cada condómino em particular, nomeadamente na sequência de alteração da titularidade da fração respetiva. Efetivamente, a decisão do litígio não passa pela aferição da responsabilidade de cada condómino, individualmente considerado, enquanto titular de cada fração, questão que nunca foi colocada à apreciação do tribunal [ [18] ].
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Por todo o exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.


Lisboa, 10 de maio de 2016

                                       
(Isabel Fonseca)                                      
(Maria Adelaide Domingos)   
(Eurico José Marques dos Reis)

                                                          
[1]Na sequência de invocação da ré de que após a entrada da ação foram integralmente pagas as faturas nº 21937, 20729 e 30264 e parcialmente paga a fatura 31926, sendo que no que a esta última respeita ainda se encontra em dívida a quantia de 664,34€.
[2]Aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06, em vigor desde 1 de Setembro de 2013.
[3]Dispõe o art. 2º do diploma, sob a epígrafe “[d]efinições”:
Para efeitos do presente diploma, entende-se por:
a)Entrada em serviço ou entrada em funcionamento o momento em que a instalação é colocada à disposição dos utilizadores;
b)Manutenção o conjunto de operações de verificação, conservação e reparação efectuadas com a finalidade de manter uma instalação em boas condições de segurança e funcionamento;
c)Inspecção o conjunto de exames e ensaios efectuados a uma instalação, de carácter geral ou incidindo sobre aspectos específicos, para comprovar o cumprimento dos requisitos regulamentares;
d)Empresa de manutenção de ascensores (EMA) a entidade que efectua e é responsável pela manutenção das instalações, cujo estatuto constitui o anexo I a este diploma e que dele faz parte integrante;
e)Entidade inspectora (EI) a empresa habilitada a efectuar inspecções a instalações, bem como a realizar inquéritos, peritagens, relatórios e pareceres, cujo estatuto constitui o anexo IV a este diploma e que dele faz parte integrante.
[4]Artigo 4.º
Contrato de manutenção
1-O proprietário de uma instalação em serviço é obrigado a celebrar um contrato de manutenção com uma EMA.
2-O contrato de manutenção, no caso de instalações novas, deverá iniciar a sua vigência no momento da entrada em serviço da instalação, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3-Durante o primeiro ano de funcionamento da instalação, a entidade instaladora fica obrigada, directamente ou através de uma EMA, a assegurar a sua manutenção, salvo se o proprietário a desobrigar, através da celebração de um contrato de manutenção com uma EMA.
[5]Artigo 5.º
Tipos de contrato de manutenção
1-O contrato de manutenção, a estabelecer entre o proprietário de uma instalação e uma EMA, pode corresponder a um dos seguintes tipos:
a)Contrato de manutenção simples, destinado a manter a instalação em boas condições de segurança e funcionamento, sem incluir substituição ou reparação de componentes;
b)Contrato de manutenção completa, destinado a manter a instalação em boas condições de segurança e funcionamento, incluindo a substituição ou reparação de componentes, sempre que se justificar.
2-Nos contratos referidos no número anterior devem constar os serviços mínimos e os respectivos planos de manutenção, identificados no anexo II ao presente diploma e que dele faz parte integrante.
3-Na instalação, designadamente na cabina do ascensor, devem ser afixados, de forma bem visível e legível, a identificação da EMA, os respectivos contactos e o tipo de contrato de manutenção celebrado.
[6]Nos termos do art. 1417º do Cód. Civil, a propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico, usucapião ou decisão judicial (nº1).
[7]Refere Carvalho Fernandes (Lições de Direitos Reais, Quid Juris, 3ª edição, reimpressão, 2001, p.355) :”O problema que aqui pode surgir é outro e consiste em saber qual a eficácia do negócio constitutivo da propriedade horizontal, num momento em que todo o edifício (todas as suas fracções, entenda-se) pertencem a uma única pessoa, não se verificando, ainda, a pluralidade de titulares que normalmente corresponde a esta situação.
Se bem que a resposta não receba o voto unânime da doutrina, temos como melhor solução a que aponta no sentido da validade do acto, ficando embora a sua eficácia, em tudo o que pressuponha a pluralidade de condóminos, dependente da condicio iuris da alienação de alguma fracção”.     
[8]Artigo 1435.º-A
Administrador provisório
1-Se a assembleia de condóminos não eleger administrador e este não houver sido nomeado judicialmente, as correspondentes funções são obrigatoriamente desempenhadas, a título provisório, pelo condómino cuja fracção ou fracções representem a maior percentagem do capital investido, salvo se outro condómino houver manifestado vontade de exercer o cargo e houver comunicado tal propósito aos demais condóminos.
2-Quando, nos termos do número anterior, houver mais de um condómino em igualdade de circunstâncias, as funções recaem sobre aquele a que corresponda a primeira letra na ordem alfabética utilizada na descrição das fracções constante do registo predial.
3-Logo que seja eleito ou judicialmente nomeado um administrador, o condómino que nos termos do presente artigo se encontre provido na administração cessa funções, devendo entregar àquele todos os documentos respeitantes ao condomínio que estejam confiados à sua guarda.
[9]O réu não impugnou esse documento, mais precisamente, não impugnou que esse contrato tenha sido celebrado nem o respetivo conteúdo, questionando apenas que esse elemento de prova sirva para fundar a sua responsabilidade, nos moldes que equaciona no articulado de fls. 77-78.
[10]Refira-se que, no caso, o prazo de duração do contrato celebrado pelo administrador provisório foi fixado pelas partes na cláusula 6ª, com início em 01-11-2008 e termo a 31-10-2011, o que significa que o segundo contrato celebrado com a autora o foi em plena vigência daquele (01-12-2010), operando as partes, verdadeiramente, a substituição de um contrato por outro. Aliás, confrontando os dois contratos, encontramos notórias similitudes entre ambos, sendo que no primeiro contrato se convencionou como preço uma mensalidade de 270,13€ e no segundo uma mensalidade de 200,00€, tendo o segundo contrato um período de duração de dois anos, suscetível de prorrogação.     
[11]Refere Sandra ..., a propósito desta alínea (A assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª edição, 2ª Reimpressão da 2ª edição de janeiro/2002, Almedina, p. 316) que [t]ambém cabe ao administrador a responsabilidade pelo pagamento das despesas comuns: água, luz, despesas de limpeza, salários do pessoal dependente, manutenção do elevador”.
[12]A mesma autora, a propósito da alínea g), refere:
“A disciplina do uso das coisas comuns e a prestação dos serviços comuns é o campo de realização, por excelência, dos poderes administrativos autónomos do administrador. Este poder administrativo não é uma mera e plana execução das deliberações aprovadas pela assembleia ou do regulamento condominial (senão esta alínea seria uma mera repetição das alíneas h) e l), primeira parte), mas actividade que concretiza e traduz o desenvolvimento de um certo poder discricionário. Ainda que o uso das coisas comuns e a articulação dos serviços fosse disciplinada minuciosamente pelas normas regulamentares, restaria sempre uma margem de autonomia para o administrador, so menos nos meios de actuação dessas mesmas normas” (obr. cit., p. 324).
[13]Art. 2º do requerimento de fls. 77-78.
[14]Aí se indicando como segue:
“O condomínio possui uma grave e complexa situação difícil de resolução, atendendo à circunstância do construtor, entidade credora com inúmeras empresas de prestação de serviços bem como titular de insolvências e penhoras de estado, a mesma é titular de um considerável número de fracções autónomas, sobre as quais nunca liquidou qualquer comparticipação nas despesas correntes do condomínio”. 
[15]A certidão junta pela autora, na sequência de convite expresso do tribunal, junta a fls. 89 a 134, que o réu não impugnou, dá-nos conta do seguinte:
-a fração A (rés do chão, loja comercial, com 3 lugares de estacionamento e permilagem:38) tem o registo de aquisição a favor da Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo por ap. de 08-04-2010 (fls. 95);
-a fração D (2º andar direito, habitação, com 2 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de Laura ... por ap. de 26-11-2010 (fls. 99);
-a fração F (3º andar direito, habitação, com 4 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de Catarina ... e João... por ap. de 16-01-2008 (fls. 102);
-a fração H (4º andar direito, habitação, com 4 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de Amin ... por ap. de 04-03-2008 (fls. 106);
- a fração I (4º andar esquerdo, habitação, com 3 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de David ... e Tânia... por ap. de 14-10-2008 (fls. 108);
-a fração Q (8º andar direito, habitação com 4 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de Fernando ... e Ana... por ap. de 29-04-2008 (fls. 118);
-a fração AA (12º andar direito, habitação com 2 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de José ... e Teresa .... por ap. de 05-09-2008 (fls. 128);
-a fração AC (13º andar direito, habitação com 4 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de Rodrigo ... e Paula ... por ap. de 30-11-2007 (fls. 130);
-a fração AD (13º andar esquerdo, habitação com 4 lugares de estacionamento e permilagem:37) tem o registo de aquisição a favor de António ... e Paula ... por ap. de 26-08-2008 (fls. 133).
[16]Proferido no processo 4955/07.6TVLSB (Relator: Moreira Camilo) acessível in www.dgsi.pt. Com interesse e no mesmo sentido, veja-se ainda o ac. TRC de 27-05-2014, proferido no processo: 1024/12.0T2AVR.C1 (Relator: Moreira do Carmo), acessível in www.dgsi.pt.
[17]Refira-se, no entanto, que na hipótese aí em análise o contrato de prestação de serviços tinha sido celebrado antes da constituição da propriedade horizontal, o que não acontece no caso ora em apreço, em que a solução, pois, se nos apresenta ainda com mais nitidez.
[18]Pode ler-se nesse aresto, depois de exposição alusiva ao conceito de obrigações propter rem, a que o Meritíssimo Juiz, no caso dos autos, também alude, mas que consideramos não constituir o cerne da questão a decidir :
“As obrigações em causa nos presentes autos, decorrentes da mera conservação dos elevadores, revestem, pois, atento o já exposto, a natureza de não ambulatórias (ainda Autor e obra citados, pág. 338).
A distinção entre obrigações ambulatórias e não ambulatórias é aqui irrelevante, porquanto não se está perante quaisquer alienações de fracções, sendo, aliás, certo que todos os condóminos aceitam que beneficiaram com as reparações.
O problema situa-se, portanto, noutro patamar, devendo questionar-se se foi ou não o condomínio (o conjunto dos condóminos) que contratou a Autora, ora recorrente, para a prestação de serviços dos quais resultaram despesas relacionadas com o uso de partes comuns do imóvel (os elevadores).
Temos de reconhecer que foi.
A obrigação constitui-se por causa da rés, do condomínio, que, no fundo, é de todos, pelo que é justo que o condomínio seja responsável pelo pagamento da dívida ora peticionada.
Logo, tendo aqui havido uma situação de transmissão da sociedade construtora/vendedora para os adquirentes das fracções a que a constituição da propriedade horizontal deu origem, os novos titulares do direito real, ou seja, os aqui condóminos, ficaram colocados, relativamente a esse estatuto, na mesma situação em que se encontrava a anterior titular, isto é, as obrigações transmitiram-se com o direito real de que elas decorrem.
Conclui-se, assim, que o Condomínio, aqui Réu, como representante dos condóminos, passou a ser responsável pelo pagamento dos serviços prestados pela Autora, durante todo o período em que vigoraram os contratos celebrados pela sociedade construtora, na qualidade de “Administradora Provisória do Edifício”.
Um outro problema se colocará a jusante: o de saber da quota-parte de cada um dos condóminos.
Porém, sendo embora de fácil solução, atenta a clareza da lei a este respeito (cfr. artigo 1424º, nº 1, do Código Civil), é questão que aqui não nos ocupa nem preocupa, porque não foi essa a
questão submetida à nossa apreciação”.