HERANÇA INDIVISA
ENCARGOS DA HERANÇA
Sumário

-Os encargos existentes na herança já aceite mas ainda não partilhada, herança indivisa, deverão ser pagos pelos bens da herança, enquanto património autónomo.
-Os herdeiros representam a herança indivisa, mas não respondem pelos encargos desta com o seu próprio património.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Parcial

Acordam os Juizes, no Tribunal da Relação de Lisboa.



I-Relatório:


Nos presentes autos de ação declarativa com processo sumário, em que é autora A... e réus R... e M..., veio aquela pedir:
a)reconhecimento da capacidade sucessória de R... e de M... na qualidade de herdeiros quanto à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de M...;
b)condenação da herança de M..., aqui representada pelos seus herdeiros, a pagar à autora a quantia de € 6.601,50, valor ao qual acresce Iva de 23%;
c)condenação da herança de M..., aqui representada pelos seus herdeiros, a pagar à autora a quantia de € 978,61, referente a despesas em dívida;
d)condenação da herança de M..., aqui representada pelos seus herdeiros, a pagar à autora os juros de mora calculados à taxa de 4% ao ano desde a data de citação dos réus e até efetiva pagamento da quantia em dívida.

Alegou, para tanto e em síntese, que:
-A autora é advogada na comarca de Lisboa, tendo o seu escritório ...;
-No ano de 2004, M... e R... contactaram a autora solicitando que as patrocinasse na ação declarativa com vista à anulação da escritura de cessão hereditária que a falecida outorgara em favor de M..., ação à qual o presente pleito corre por apenso;
-Para o efeito, conferiram à autora procuração forense datada de 03.05.2004, a qual se encontra junta à ação principal;
-M... faleceu em 15.11.2009, tendo deixado como únicos herdeiros a sua neta R...  e o seu irmão M..., os quais são respetivamente herdeira legitimária e herdeiro testamentário;
-A habilitação por óbito de M... foi efetuada na ação principal;
-No desempenho do mandato conferido pela falecida M..., a autora prestou serviços e fez despesas constantes da nota de despesas e honorários anexa e que, em janeiro de 2012, apresentava um saldo da responsabilidade da herança de M... a favor da autora de € 7.580,11;
- A referida nota de honorários e despesas foi notificada aos réus, na sua qualidade de herdeiros, em 23.01.2012, através de cartas registadas;
-As verbas referentes a honorários foram apuradas com moderação e segundo as práticas correntes do meio forense;
-A falecida apenas pagou a quantia de € 2.073,61, tendo este valor sido descontado na conta apresentada, dos quais € 1.500,00 se destinaram a provisão para honorários e € 573,61 a despesas;
-A conta de honorários apresentada à herança contempla os honorários e despesas em dívidas atinentes ao processo desde o mês de maio de 2004 até dezembro de 2010, data do trânsito em julgado do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa;
-Acontece que a herança não efetuou qualquer pagamento.  

Citado para contestar, veio o réu M..., a fls. 64/65 dos autos, pedir a improcedência da ação, ou pelo menos, a improcedência parcial da presente ação.

Alegou, para tanto e em síntese, que:
-A autora patrocinou conjuntamente na ação a falecida M..., irmã do réu, e a ré R... pelo que não podem ser inteiramente imputados à herança de M... quer as despesas quer os honorários relacionados com os serviços prestados no âmbito da ação principal.
No mais, impugnou os factos articulados pela autora.  

Citada para contestar, veio a ré R..., a fls. 73/76 dos autos, pedir a improcedência da ação por procedência da exceção da prescrição ou, caso assim não se entenda, a improcedência da ação pela procedência da exceção do pagamento ou, caso assim não se entenda, improcedência da presente ação por considerar-se não exigível o pagamento de serviços prestados após o óbito da autora da herança.
Alegou, para tanto e em síntese, que: - Os serviços à autora sempre lhe foram pagos;
-Foram pagos à mandatária ora autora aproximadamente € 20.000,00, dos quais nunca foi passado qualquer recibo;
-A autora teve conhecimento do falecimento de M... dias depois do falecimento desta, que ocorreu em 15.11.2009;
-A nota de honorários foi emitida em 23.01.2012, pelo que a herança aceite deve beneficiar da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317°, do Cód. Civil;
-Na nota de honorários junta ao processo surgem contabilizados serviços prestados após a data de óbito da mandante M...;
-Os valores peticionados após a data do falecimento, no montante de e 5.014,97 não podem ser exigidos à herança.  
A fls. 82/87 dos autos, a autor veio apresentar a sua resposta, pedindo a improcedência das invocadas exceções.
Realizou-se o julgamento, vindo a ser proferida sentença que julgou a ação parcialmente provada e procedente, condenando os Réus habilitados a pagar à Autora a quantia de € 5.351,50 a título de honorários, com acréscimo de IVA e a quantia de € 978,61 a título de despesas, tudo com acréscimo de juros de mora.

Foram dados como provados os seguintes fatos:
1)A autora é advogada na comarca de Lisboa, tendo o seu escritório ..., fazendo da advocacia profissão habitual e lucrativa.
2)No ano de 2004, M... e R... contactaram a autora e solicitaram-lhe que as patrocinasse na ação declarativa com vista à anulação da escritura de cessão do quinhão hereditário outorgada, a 14.05.2004, por M... a favor de M....
3)Com data de 03.05.2004, M... e R... conferiram à autora a procuração cuja cópia consta a fls. 13 dos autos de que a presente ação é um apenso.
4)M... faleceu em 15.11.2009.
5)Em 17.05.2010 foi proferida sentença que julgou R... e M... habilitados para com eles, na posição anteriormente ocupada pela falecida M..., prosseguir seus termos a ação principal, conforme consta a fls. 16/17 dos autos de habilitação de herdeiros, sob o apenso "B", da ação principal.
6)No desempenho do mandato conferido pela falecida M..., a autora prestou os serviços e fez as despesas, no período compreendido entre maio de 2004 e dezembro de 2010, descritas na "Conta de Honorários" cuja cópia consta a fls. 25/53 dos autos.
7)Por conta dos serviços e despesas efetuados pela autora a M..., foi entregue a quantia de € 2.073,61.
8)Na "Conta de Honorários", cuja cópia consta a fls. 25/53 dos autos, consta, para além do mais, "(...) 16 consultas com a Exm" Cliente no âmbito deste processo: € 1.120,00; Despesas de secretaria: € 750,00; Despesas com certidões: € 260,70; Despesas com transporte em deslocações a: Tribunal, Arruda dos Vinhos e Lar da Bafureira: € 284,00; Despesas Judiciais: € 1.223,77; Despesas com papelaria, fotocópias, faxes, e.mails e CTT: € 156,00; Honorários por todos os serviços prestados no âmbito deste processo até novembro de 2009: € 10.498,00; Total: € 14.292,47. (...). Honorários e despesas a partir de novembro de 2009: (...); majoração pela dificuldade do assunto e pelo resultado obtido: é 2.500,00; Total: € 5.014,97; Total € 14.292,47 + € 5.014,97= é 19.307,44. Cada uma das autoras é responsável por metade deste pagamento: € 9.653,72. Considerando que: A Srª Dona M... pagou a este escritório (é 1.500,00 + € 573,61) = € 2.073,61, (...)".
9)A autora enviou, através de carta registada, à ré R..., para a morada ..., a carta datada de 23.01.2012, cuja cópia consta a fls. 16/17 dos autos, onde consta, para além do mais, "(...). Venho pela presente solicitar o pagamento da minha conta de honorários e despesas, documento que ora anexo, referente ao Processo n° 3379/04.1TVLSB - 7ª Vara Cível de Lisboa - 3° secção, na qual representei a falecida Sra. Dª M... e R... . Constituindo esta conta uma dívida da herança da falecida M..., venho interpelar os herdeiros para o seu pagamento, com a brevidade possível e de acordo com a descriminação nela contida.”

10)A autora enviou, através de carta registada, ao réu M..., para a morada ..., a carta datada de 23.01.2012, cuja cópia consta a fls. 18/19 dos autos, onde consta, para além do mais, "(...) Venho pela presente solicitar o pagamento da minha conta de honorários e despesas, documento que ora anexo, referente ao Processo n° 3379/04. 1TVLSB 7ª Vara Cível de Lisboa - 3° secção, na qual representei a falecida Sra. Dª M... e R... Constituindo esta conta uma dívida da herança da falecida M..., venho interpelar os herdeiros para o seu pagamento, com a brevidade possível e de acordo com a descriminação nela contida. (...)".

Inconformado, recorre o Réu M..., concluindo que:
-O Tribunal a quo decidiu no sentido de que "os réus habilitados na herança por óbito de M..., R... e M..., a pagar à autora a quantia de ... ";                                             
-A herança de M... encontra-se indivisa, ou seja, ainda não foi partilhada pelos Réus herdeiros, encontrando-se o processo de inventário para partilhas a correr termos na Comarca de Lisboa;
-De acordo com o disposto no art. 515.°, nº 1 do CC, os herdeiros do devedor solidário respondem coletivamente pela totalidade da dívida e, uma vez efetuada a partilha, cada co-herdeiro responde nos termos do artigo 2098.° do CC;
-Até à integral liquidação e partilha, vale a regra, estabelecida no art. 2074.° do CC, de não confusão dos poderes e vinculações próprios do herdeiro com os próprios da herança;
-Os bens da herança indivisa respondem coletivamente pela satisfação dos respetivos encargos nos termos do art. 2097.° do CC;
-Como a herança consiste num verdadeiro património autónomo, responde toda ela sem discriminação de bens pelo cumprimento dos respetivos encargos, pelo que a regra é a de que os direitos relativos à herança (indivisa) só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros (art. 2091.° do CC);
-Os herdeiros são parte legítima na ação contra eles intentada, para os credores da herança verem os seus créditos pagos pelos bens da mesma, no entanto não podem ser condenados a pagar as dívidas;
-Os herdeiros não são devedores, mas como a herança não pode ser demandada nem condenada porque não tem personalidade, os herdeiros serão demandados e condenados, mas não a pagar os créditos, tão somente a reconhecerem a sua existência, ou a verem satisfeitos pelos bens da herança os créditos dos credores do de cujus;
-Deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra decisão que cumpra o disposto nos art.s 2091.°,2097.°,2068.° e 2069.° do CC.
-M... (falecida em 15.11.2009) e R... (Ré) contrataram em 2004 os serviços jurídicos da ora Recorrida;
-O aqui Recorrente nada contratou com a Recorrida;
-Na nota de honorários constante a folhas 25/53 dos autos, a final a Recorrida escreveu: "Cada uma das Autoras é responsável por metade do pagamento;
-A obrigação de pagamento dos serviços jurídicos assumida por cada uma das mandantes (Ré R... e falecida M...)  é conjunta, quer porque resulta da própria Nota de Honorários, quer porque é o regime regra da lei;
-Sendo a obrigação plural, a conjunção constitui o regime regra, visto a solidariedade existir se for determinada por lei ou estipulada pelos interessados (art. 513º do CC);
-Segundo o parecer técnico emitido pela Ordem dos Advogados, mereceram laudo favorável os honorários da Recorrida no montante de € 11.618,00 correspondente a uma compensação económica adequada por todos os serviços prestados entre Maio de 2004 e Novembro de 2009 e o montante de € 2.085,00 correspondente a uma compensação económica adequada por todos os serviços prestados após Novembro de 2009, o que perfaz um total de € 13.703,00;
-M... faleceu em 15.11.2009, pelo que, nos termos do art. 1174.°, al. a) do CC, o mandato conferido à Recorrida caducou, sendo que todas as despesas e honorários contabilizados pela Recorrida após essa data (€ 2.085,00) apenas constituem obrigação da Ré R... (o que até resulta da separação temporal feita no próprio parecer da Ordem dos Advogados);

- Significa isto que, quanto a honorários:
a)cabe à Ré R... o pagamento de 1/2 dos honorários devidos até ao falecimento da outra mandante M... (€ 11.618,00) devidos à Recorrida, ou seja, € 5.809,00;
b)cabe à Ré R... o pagamento da totalidade dos honorários calculados após o falecimento da outra mandante M... - ou seja, € 2.085,00;
c)caberia à falecida M... o pagamento de 1/2 dos honorários da Recorrida antes da cessação do mandato - Novembro de 2009 -, ou seja, € 5.809,00 ( 1/2 de € 11.618,00);

-Uma vez que a Recorrida confessou (vd. Nota de Honorários) que a falecida M... pagou por conta de honorários € 1.500,00, apenas ficou em falta a quantia de € 4.309,00;
-No que respeita a despesas, a Recorrida contabilizou um total de € 1.552,22, sendo que dessa quantia a falecida M... pagou € 573,61 (vd. Nota de Honorários), pelo que, a Ré R... era devedora de 1/2 da totalidade das despesas (€ 776,11) e a falecida M... de outra 1/2, mas como liquidou parcialmente aquele dívida, apenas deve € 202,50 (€   776,11 - € 573,61);
-Em suma, a Recorrida apenas poderia reclamar em juízo aos herdeiros de M... a quantia de € 4.511,50 (€ 4.309,00 + € 202,50);
-E nem se tente argumentar, como fez o Tribunal a quo, que "são os réus habilitados por sentença judicial responsáveis pelo pagamento à autora das quantias devidas a titulo de honorários e despesas quer antes do falecimento de M... quer após o falecimento desta, pois tais serviços continuaram a ser prestados e as despesas continuaram a ser efetuadas por conta e no interesse da herança de M... " (vd. último paragrafo pág. 7 da sentença);
-Por um lado, porque o mandato conferido por M... à Autora foi no seu próprio interesse e não no da sua futura herança e, por outro lado, sendo o fator determinante no cálculo dos honorários da Autora o número de horas despendidas, terá que ser com nele que se apuram os valores;
-A divida reclamada à herança de M..., apenas pode ser quantificada em função do número de horas de trabalho despendidas até ao falecimento da mandante, cumprindo assim o disposto no art. 100º, 3 do Ant. EOA e o teor da Nota de Honorários;
-Após o falecimento da mandante M... o contrato de mandato extinguiu-se e, a partir daí, nada mais pode ser reclamado à herança da falecida, mas tão somente à outra mandante R..., que decidiu prosseguir a ação; já diferente seria se a Ordem dos Advogados tivesse dado laudo favorável à majoração dos honorários da Autora, em função do resultado, no valor de € 2.500,00.
-Deve a sentença ser revogada e substituída por outra que apenas condene os herdeiros a reconhecer a divida da herança de M... no valor de € 4.511,50 (€ 4.309,00 de honorários + € 202,50 de despesas).  

Cumpre apreciar.

O presente recurso incide sobre duas questões:

A primeira, respeita à perspectiva do recorrente de que a sentença deveria apenas ter condenado os RR a reconhecerem a dívida, sendo a herança indivisa que deverá responder pelos créditos da Autora;
Segunda questão, o facto de o mandato ter sido concedido à Autora pela falecida M... e pela co-ré R..., pelo que o pagamento dos honorários da Autora deverá ser repartido em partes iguais por ambas até à data da morte de M... e exclusivamente por R... após esta data.

Uma vez que a primeira questão tem a ver com os termos da própria condenação, será mais lógico e coerente começarmos pela segunda.

Na conta de honorários apresentada pela Autora a fls. 25 e seguintes, é apresentado um valor total de € 19.307,44, referindo a Autora que cada uma das mandantes é responsável por metade desse valor. Tendo em atenção que M... já havia pago a verba de € 2.073,61, do total que lhe cabia, de € 9.653,72, a verba a cargo da herança – por morte da mesma M... - seria de € 7.580,11.

Ou seja, a conta de honorários já prevê a responsabilidade de cada uma das mandantes por 50% do valor global.

Daí que o pedido formulado nesta acção, a título de honorários, corresponda já à parte que estava a cargo de M... e que, após o seu falecimento, constitui encargo da herança.

Do  mesmo modo, o Parecer do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, a fls. 92 e seguintes, é igualmente claro ao considerar que o montante global de € 19.307,44 seria a liquidar em partes iguais pela herança aberta por morte de M..., e por R....

O mencionado Conselho Superior da OA, não deu parecer favorável aos honorários peticionados pela Autora, Dra. A..., sugerindo antes uma verba de € 13.703,00 acrescida de IVA (não contando as despesas).

A quantia peticionada pela Autora à herança sempre visou metade dos honorários e despesas, como se depreende facilmente do exposto, pelo que, neste ponto, não tem razão de ser a apelação.
 
Mas, pretende igualmente o Réu que não sejam considerados em tal conta de honorários (e despesas) as verbas resultantes de serviços prestados após o falecimento de M..., dado que o mandato cessa com a morte do mandante.

A procuração foi concedida à Autora por M... e R..., em 03/05/2004. M... faleceu em 15/11/2009.

No caso dos autos estamos perante um contrato de mandato, que tem por objecto actos que o mandatário prática no âmbito da sua profissão. Trata-se pois de um mandato oneroso – art. 1158º nº 1 do Código Civil e artigos 62º e 100º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

Em princípio o mandato caduca com a morte do mandante, nos termos do art. 1174º a) do Código Civil.

Os serviços de advocacia prestados pela Autora às mandantes M... e R... (avó e neta) respeitaram ao estudo e apreciação da legalidade da escritura de cessão de quinhão hereditário outorgada por M... em favor de M..., a que se seguiu acção judicial de anulação de tal cessão.

A Autora nunca recebeu procuração do ora Réu e recorrente, contra o qual havia sido deduzida – e com êxito – aquela acção de anulação.

Contudo, tendo existido habilitação de herdeiros, após a morte de M..., a acção prosseguiu com os habilitados. Tal continuação da acção até ser proferido acórdão neste Tribunal da Relação de Lisboa e ter o mesmo transitado em julgado, só seria viável caso o mandato forense não houvesse caducado. A acção de anulação de cessão não prosseguiu os seus termos apenas com a Autora R... mas com os habilitados por morte de M..., dado que é esse o objecto da habilitação.

Com efeito, o objectivo da habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa é o de com eles prosseguirem os termos da demanda (art. 351º nº 1 do CPC).

Visando a acção a anulação da cessão e consequentemente o regresso do bem ou direito cedido ao património de M..., com a sua morte na pendência da causa tal bem ou direito, em caso de ser decretada a anulação, passa  a integrar a herança da falecida, em benefício dos sucessores. E o ora recorrente é sucessor testamentário de M....

É neste sentido que se pode dizer, como na sentença recorrida, que com a morte de M... os serviços continuaram a ser prestados pela mandatária por conta e no interesse da herança daquela e em representação dos sucessores judicialmente habilitados.
 
Quanto à responsabilidade do pagamento dos honorários aqui peticionados.

A Autora pediu a condenação da herança, aqui representada pelos herdeiros, ora Réus, a pagar metade do valor global dos honorários incluindo despesas.

Na sentença recorrida, foram condenados os Réus, pessoalmente, em tal pagamento.

A herança em causa ainda não foi partilhada, embora haja sido aceite pelos sucessores ora Réus.

Por outro lado tenha-se em conta que, no caso do ora recorrente, o mesmo figura na acção enquanto sucessor habilitado de M... e não porque tenha passado procuração à advogada Autora – contrariamente à Ré R..., que outorgou procuração a favor da mesma senhora advogada.

É por isso, que o montante peticionado pela Autora corresponde a metade do valor global dos honorários. A outra metade está exclusivamente a cargo de R..., enquanto mandante.

Ou seja, os montantes aqui peticionados são encargos da herança. E é exactamente por isso que considerámos que os honorários da Autora eram devidos mesmo depois da morte da mandante M..., já que efectuada habilitação de herdeiros para com eles prosseguir a acção de anulação, a ilustre advogada passava a representar os habilitados por conta e no interesse da herança.

Nos termos do art. 2097º do Código Civil, “os bens da herança indivisa respondem colectivamente pela satisfação dos respectivos encargos”.

Como refere R. Capelo de Sousa – Lições de Direito das Sucessões”, 2º, pág. 113/114 - “estamos perante uma universalidade composta por património autónomo, em que os herdeiros não detêm direitos próprios sobre cada um dos bens hereditários e nem sequer são comproprietários desses bens, mas apenas titulares em comunhão de tal património.”

A herança indivisa é pois um património autónomo, sendo o seu activo que responde pelas respectivas dívidas e não o património pessoal de cada um dos herdeiros.

Razão pela qual a Autora dirigiu o seu pedido contra a herança, aqui representada pelos RR, como herdeiros.

Ao condenar os Réus pessoalmente, ou seja, fazendo responder os patrimónios de ambos pelos créditos da Autora, a sentença, a nosso ver, violou os limites estabelecidos pelo art. 609º nº 1 do CPC. Não tinha sido pedida a condenação dos Réus a pagar a conta de honorários, mas sim o património autónomo que é a herança indivisa representada pelos Réus.

Entendemos que aqui assiste razão ao recorrente, devendo a decisão respeitar os termos e enquadramento em que o pedido é formulado.

Conclui-se assim que:
-Os encargos existentes na herança já aceite mas ainda não partilhada, herança indivisa, deverão ser pagos pelos bens da herança, enquanto património autónomo.
-Os herdeiros representam a herança indivisa, mas não respondem pelos encargos desta com o seu próprio património.

Termos em que se julga a apelação parcialmente procedente, condenando a herança de M..., aqui representada pelos Réus R... e M..., enquanto herdeiros habilitados, a pagar à Autora, a título de honorários a quantia de € 5.351,50, acrescida de IVA à taxa legal, e a quantia de € 978,61 a título de despesas, acrescendo em ambos os casos juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde citação e até integral pagamento.
Custas na proporção de ½ pela Autora e ½ pelo Réu apelante.



LISBOA, 13/10/2016



António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais