ALEGAÇÕES DE RECURSO
CONCLUSÕES
FALTA
Sumário

A reprodução integral, mediante aquilo que se pode designar por “copy-past” do anteriormente alegado no corpo das alegações, ainda que apelidada pelo recorrente de “Conclusões”, não pode ser considerada para efeito do cumprimento do dever de apresentação das conclusões do recurso (proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação), nem podem ser consideradas deficientes (motivação insuficiente, contraditória, incongruente ou mesmo excessiva), obscuras ou complexas, equivalendo, ao invés, à ausência de conclusões, pois é igual a nada dizer, repetir o que antes se disse na motivação, o que sempre dará lugar à rejeição do recurso, nos termos do artigo 641º, nº 1, alínea b) do CPC.

Texto Integral

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

I. RELATÓRIO

SEBASTIÃO ….. e MIGUEL ……, intentaram acção declarativa contra COMPANHIA DE SEGUROS F…... e COMPANHIA DE SEGUROS T…..., através da qual pedem a condenação:

a)Da ré «F…» a pagar ao primeiro autor a quantia de € 15.116,44, bem como os juros à taxa legal de 4%, contados da citação e até integral pagamento;

b)Da ré «F…» a pagar ao segundo autor a quantia de € 7.052,58, bem como os juros de mora à taxa de 4%, contados da citação e até integral pagamento;

Subsidiariamente, para a hipótese de se concluir que o primeiro autor também é responsável pela produção do sinistro:

c)Das rés «F…» e «T…», sem prejuízo da medida da responsabilidade de cada uma, condenadas a pagarem ao segundo autor a quantia de € 7.052,58, bem como os juros à taxa legal de 4%, contados da citação e até integral pagamento.

Em 21.10.2015 foi proferida sentença, constando do seu Dispositivo, o seguinte:

Com base nos fundamentos fáctico-jurídicos que ficaram precedentemente exarados, julgo a acção parcialmente procedente, por provada em parte, e, em consequência:

a) Condeno a ré « F...» a pagar ao autor Sebastião ….. a quantia global de € 11.496,99 (onze mil e quatrocentos e noventa e seis euros e noventa e nove cêntimos), ao que acrescem juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde a citação e até integral pagamento;

b) Condeno a ré « F…..» a pagar ao autor Miguel ….. a quantia global de € 3.426,91 (três mil e quatrocentos e vinte e seis euros e noventa e um cêntimos), ao que acrescem juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde a citação e até integral pagamento;

c) Absolvo a ré « F….» do restante pedido contra si deduzido pelos autores;

d) Absolvo a ré « T…..» do pedido contra a mesma deduzido pelo autor Miguel …..;

(…)

Inconformada, a ré F….., interpôs recurso de apelação, com reapreciação da prova gravada.

Apresentou a recorrente a respectiva motivação de recurso, e no final destas, encimada pela designação de “Conclusões”, transcreveu exactamente o que consta do corpo das alegações, antecedida de numeração.

O recurso foi admitido no Tribunal recorrido, como apelação, a subir nos autos, e com efeito meramente devolutivo.      

Pela relatora, ao abrigo do preceituado no artigo 652º, nº 1, alínea b) do CPC, e por entender que lhe cabia verificar, ainda que oficiosamente, se ocorria alguma circunstância que obstasse ao conhecimento do objecto do recurso, foi ordenado o cumprimento ao disposto no artigo 655º, nº 1 do CPC.

A apelante pronunciou-se nos seguintes termos:

1.-Com o devido respeito, e que é muito, não pode concordar com o teor do despacho da Exma. Juíza Desembargadora Relatora, quanto à apreciação efectuada no que diz respeito às conclusões constantes do recurso apresentado pela ora apelante.
2.-Em primeiro lugar, porque a matéria em litígio, tem a ver com a dinâmica de um acidente de viação.
3.-Do qual resultaram alegadamente danos corporais para o condutor e ocupante de um motociclo.
4.-Tudo "matéria" com muitas particularidades e especificidades com muitos pormenores.
5.-Pelo exposto, a dinâmica do acidente de viação em causa, teve muitas especificidades factuais que no parecer da recorrente importava sublinhar.
6.-Muitos pormenores relacionados com a dinâmica do acidente que foram colocados em causa pelo presente recurso.
7.- E que não poderiam passar em claro no presente recurso, sob pena de ficar não ficar suficientemente espelhadas as contradições e incoerências entre os depoimentos.
8.-Ao que acrescem muitos factos considerados provados, e outros considerados não provados, e que foram colocados em crise com o presente recurso.
9.-E que teriam necessariamente que ser especificados em sede de conclusões sob pena de não fazer sentido o objecto do presente recurso, nem tão pouco os factos considerados provados/não provados na decisão a quo com os quais a apelante não concorda.
10.-Impondo a alínea a) do n.° 1 do art. 640.° do C.P.C. que se concretizem os pontos de facto que se considera incorrectamente julgados.
11.-Bem como também na alínea b) do mesmo artigo, se impõem que se indiquem os meios probatórios que impunham decisão diversa.
12.-Ao que acresce o dever de se indicar a decisão que no entender da recorrente deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
13.-Além do mais, a produção de prova dos presentes autos, comportou as declarações de parte dos dois autores e os depoimentos de nove testemunhas!
14.-Tendo a produção de prova ocupado toda a manhã e maior parte da tarde !
15.-Sendo que, só com a reprodução da matéria de facto dada como assente e não assente pela decisão a quo a recorrente nas suas conclusões utilizou 26 alíneas e nesta caso sim, limitou-se a reproduzir as mesmas uma vez que aquelas não comportavam qualquer tipo de síntese.
16.-Não concordando com o teor do despacho da Veneranda Relatora, com todo o respeito, quando refere que a apelante "repetiu as mesmas ipsi verbis.", como é constatável.
17.-Poder-se-á não concordar ou apreciar o estilo de alegar do mandatário da recorrente.
18.-Com o estilo considerado pela Meritíssima Veneranda como demasiado alongada e pouco sintético.
19.-Situação que desde já se lamenta, e se requer humildemente que seja relevado.
20.-Contudo, é o estilo que utiliza naquilo que considera ser a melhor forma de defender os interesses da sua constituinte.
21.- Sempre na defesa do que acha ser o dever de patrocínio.
22.-Considerando-se que a alínea b) do n.° 2 do art.641.° do C.P.C. se refere aos casos em que as alegações de recurso não contenham as conclusões.

Entendendo-se pelo exposto, não ser o presente caso, uma vez que as presentes alegações contem conclusões.              

Os apelados não se pronunciaram.

Pela relatora foi proferida decisão, em 08.06.2016, constando do seu Dispositivo o seguinte: 

Pelo exposto, e considerando que as alegações apresentadas pela ré/recorrente, não contêm verdadeiras conclusões, rejeita-se o recurso por si interposto, ao abrigo do disposto no artigo 641º, nº2, alínea b), do CPC, condenando-se a mesma nas respectivas custas.

Notificada da aludida decisão, a recorrente, F…., com ela se não conformando, veio reclamar para a conferência, nos termos do artigo 652.º, n.º 3 do CPC.

Invocou, para tanto, o seguinte:
i.- A presente reclamação para a Conferência, vem no seguimento da recepção da douta decisão singular proferida pela Exma. Juíza Desembargadora Relatora, notificada em 15 de Junho de 2016.
ii.- Na referida decisão singular, a Exma. Juíza Desembargadora Relatora rejeitou o recurso interposto ao abrigo do disposto no art. 641, n.° 2, alínea b) do C.P.C.
iii.-Ao contrário do afirmado pela Desembargadora Relatora na sua douta Decisão Singular, o apelante releu as suas alegações, e mantém, que não fez o alegado "copy-past" da sua motivação.
iv.-Relembra-se nesta sede, que o objecto do litígio dos presentes autos se consubstanciava no apuramento da responsabilidade civil automóvel na sequência de um acidente de viação.
v.-Sendo que o recurso de apelação apresentado requeria a reapreciação da prova gravada, nuns autos onde na audiência de discussão e julgamento se ouviram muitas testemunhas alegadamente oculares e se discutiam alegados danos corporais, alegadamente também resultantes do acidente dos autos.
vi.-Pelo exposto, mas sempre com o devido respeito, e que é muito, não pode concordar com o teor do despacho da Exma. Juíza Desembargadora Relatora, quanto à apreciação efectuada, no que diz respeito às conclusões constantes do recurso apresentado pela ora apelante.
vii.-A apelante não se pode conformar assim com a douta Decisão Singular de que foi notificada, considerando-se obviamente prejudicada com o sentido da mesma, sendo que essa decisão não foi de mero expediente.
viii.-Quanto à motivação da presente:
ix.-Ora, repete-se que a matéria em litígio nos presentes autos, tem a ver com a dinâmica de um acidente de viação, entre um motociclo com dois ocupantes e um veículo ligeiro de passageiros, ao que acresce que o mesmo ocorreu num cruzamento.
x.-Do acidente discutiam-se nos presentes autos alegadamente danos corporais para o condutor e ocupante do motociclo interveniente e autores nos presentes autos.
xi.-Consubstanciando-se toda essa temática em muitas particularidades, e em muitas especificidades e pormenores.
xii.-Pelo exposto, a dinâmica do acidente de viação dos presentes autos teve muitas especificidades factuais, que no parecer da recorrente importava sublinhar e realçar como alvo de recurso.
xiii.-Muitos pormenores relacionados com a dinâmica do acidente que foram colocados em causa pelo presente recurso.
xiv.-E que não poderia correr o risco que passassem em claro, sob pena de ficar não ficar suficientemente espelhadas as contradições e incoerências entre os depoimentos testemunhais.
xv.-Ao que acrescem muitos factos considerados provados, e outros considerados não provados, e que foram colocados em crise com o presente recurso.
xvi.-E que teriam necessariamente que ser especificados em sede de conclusões sob pena de não fazer sentido o objecto do presente recurso, nem tão pouco os factos considerados provados/não provados na decisão a quo com os quais a apelante não concordou.
xvii.-Impondo a aliena a) do n.° 1 do art. 640.° do C.P.C. que se concretizem os pontos de facto que se considere incorrectamente julgados.
xviii.-Bem como também na alínea b) do mesmo artigo, se impõem que se indiquem os meios probatórios que impunham decisão diversa.
xix.-Ao que acresce o dever de se indicar a decisão que no entender da recorrente deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
xx.-Além do mais, a produção de prova dos presentes autos, comportou as declarações de parte dos dois autores e os depoimentos de nove testemunhas!
xxi.-Tendo a produção de prova ocupado toda a manhã e a parte da tarde !
xxii.-Sendo que, só com a reprodução da matéria de facto dada como assente e não assente pela decisão a quo a recorrente nas suas conclusões utilizou 26
alíneas, e neste caso sim, limitou-se a reproduzir as mesmas uma vez, que aquelas não comportavam qualquer tipo de síntese.
xxiii.-Poder-se-á não concordar, ou apreciar o estilo de alegar do mandatário da recorrente.
xxiv.-Com o estilo considerado pela Meritíssima Veneranda como demasiado alongada e pouco sintético.
xxv.-Situação que desde já se lamenta, e se requer humildemente que seja relevado.
xxvi.-Contudo, é o estilo que utiliza naquilo que considera ser a melhor forma de defender os interesses da sua constituinte.
xxvii.-Sempre na defesa do que acha ser o dever de patrocínio.
xxviii.-Considerando-se que a alínea b) do n.° 2 do art. 641.° do C.P.C. se refere aos casos em que as alegações de recurso não contenham as conclusões.
xxix.-Entendendo-se pelo exposto, não ser o presente caso, uma vez que as presentes alegações contem conclusões, passe a redundância.
xxx.-Conclusões essas, alvo de crítica pela Meritíssima Desembargadora Relatora, mas que não deixam de ser conclusões no entendimento da apelante.
xxxi.-Por último, apela-se aos princípios processuais que tem predominado na Jurisprudência actual, tais como:
xxxii.-A predominância da Justiça Material sobre a Justiça Formal.
xxxiii.-E ao principio do aproveitamento dos actos processuais.
xxxiv.-Para além disso, a Desembargadora Relatora, nos termos do disposto n.° 3 do art. 639.° do C.P.C., e considerando as conclusões da apelante deficientes, obscuras e/ou complexas, poderia sempre ter convidado a recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetiza-las no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afectada.
xxxv.-Mas a Desembargadora Relatora não o fez, tendo considerado apenas que o recurso não continha Conclusões, tendo rejeitado liminar e singularmente o mesmo.
xxxvi.-A apelante discorda da interpretação elaborada pela Desembargadora Relatora, e como resulta claramente que a mesma a prejudica, e não é de mero expediente.

Propugna, assim,  a apelante, que sobre o despacho da Desembargadora Relatora recaia uma Acórdão, nos termos do n.° 3 do art. 652.° do C.P.C. e como tal se defira o presente recurso de apelação, seguindo o mesmo os seus trâmites normais, sendo proferido o competente Acórdão Final.

Foram colhidos os vistos legais.

II. FUNDAMENTAÇÃO               

Como é sabido, a interposição de um recurso em processo civil sujeita o recorrente a apresentar a sua alegação de recurso, na qual deverá expor de modo circunstanciado as razões de direito e de facto da sua divergência relativamente ao julgado e, finalizar essa peça, com a formulação de conclusões, contendo a indicação resumida dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.

Quanto à exigência de conclusões, dispõe o nº 1 do artigo 639º, do Código de Processo Civil: O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos porque pede a alteração ou anulação da decisão.

(…)

Estabelece-se, portanto, a lei processual civil para o recorrente um ónus que se decompõe:


(i)-na apresentação tempestiva da alegação;
(ii)-na formulação de conclusões.

Extraordinariamente importantes são as conclusões da motivação, devendo as mesmas primar pela concisão, precisão e clareza.

É que, como tem sido orientação jurisprudencial pacífica, o âmbito do recurso define-se precisamente pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.


Como já esclarecia ALBERTO DOS REIS, Código devol. V,359, as conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação. São, portanto, a enunciação resumida e concisa dos fundamentos de facto e de direito do recurso – v. no mesmo sentido, RODRIGUES BASTO, Notas ao Código de Processo Civil, III, 299.

Salientava mesmo ALBERTO DOS REIS, ob. cit., loc. cit. que: “No contexto da alegação o recorrente procura demonstrar esta tese: que o despacho ou sentença deve ser revogado, no todo ou em parte. É claro que a demonstração desta tese implica a produção de razões ou fundamentos. Pois bem: essas razões ou fundamentos são primeiro expostos, explicados e desenvolvidos no curso da alegação; hão-de ser, depois, enunciados e resumidos, sob a forma de conclusão, no final da minuta.”. Mais referindo que: “não valem como conclusões arrazoados longos e confusos, em que se não descriminam com facilidade as questões postas e os fundamentos invocados”. E, mais à frente, conclui que: “As conclusões têm uma vantagem incontestável: forçam o advogado e ser claro e preciso a coordenar e disciplinar as suas razões e fundamentos”.

Como igualmente se salientou no Ac. STJ de 24.04.2008 (Pº 483/08.0TBLNH.L1.S1), acessível em www.dgsi.pt:

1-O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida).

II-Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal superior cumpre solucionar.


Estabelece, por seu turno, o nº 2 do citado artigo 639º do CPC que:

Versando o recurso sobre a matéria de direito, as conclusões devem indicar:

a).-As normas jurídicas violadas;

b).-O sentido com que, no entender do recorrente, as normas constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;

c).-Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.

Nos termos do artigo 641º, nº 2, alínea b) do C.P.C., tanto a falta absoluta de alegações como a falta de conclusões geram o indeferimento do recurso, atenta a sua ineptidão – v. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 115-116.

É certo que estabelece o nº 3 do citado artigo 639º do CPC que: Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras ou complexas ou nelas não se tenha procedido às especificações a que alude o nº2 do artigo 639º, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de não conhecer do recurso, na parte afetada.

Consideram-se conclusões, deficientes sempre que:

§ não retractem todas as questões sugeridas pela motivação (insuficiência);

§ revelem incompatibilidade com o teor da motivação (contradição);

§ não encontrem apoio na motivação (excessivas);

§ não correspondam a proposições logicamente adequadas às premissas (incongruentes), ou

§ quando surjam amalgamadas, sem a necessária discriminação, questões ligadas à matéria de facto e questões de direito.

São obscuras as conclusões formuladas de tal modo que se revelem ininteligíveis, de difícil inteligibilidade ou que razoavelmente não permitam ao recorrido ou ao tribunal percepcionar o trilho seguido pelo recorrente para atingir o resultado que proclama.

As conclusões serão complexas quando não cumpram as exigências de sintetização a que se refere o nº 1 do artigo 639º do CPC (prolixidade) ou quando, a par das verdadeiras questões que interferem na decisão do caso, surjam outras sem qualquer interesse ou que constituam mera repetição de argumentos anteriormente apresentados.

Serão igualmente complexas, as conclusões que nelas se integrem argumentos, referências doutrinais ou jurisprudências apenas propícias ao segmento da motivação, ou quando a cada conclusão não corresponder uma proposição, amalgamando-se na mesma conclusão diversas questões.

Pode, assim, concluir-se que sempre que as conclusões se apresentarem de forma deficiente, obscura ou complexa, justificar-se-á a prolação de despacho convidando a parte a proceder às necessárias correcções. Ao invés, a ausência de conclusões não admite o suprimento dessa falta, gerando o indeferimento do recurso.

No caso vertente, a ré/apelante apresentou alegações, não tendo, contudo, terminado o recurso com a efectuação de proposições sintéticas com os requisitos legalmente previstos, tendo antes verbis para o que designou por “Conclusões”,tudo o tal alegação.

Efectuou, pois, o apelante - tal como vem sucedendo cada vez com mais frequência - aquilo que se pode designar por “copy-past” da motivação do recurso.

Assim, no caso  vertente, na conclusão nº 1, alarga-se ainda mais  o  invocado  no  § 1º  do  corpo  das  alegações;  a  conclusão  nº  2 corresponde ao invocado no § 2º do corpo da alegação; a conclusão nº 3 corresponde ao invocado no § 3 do corpo da alegação; a conclusão nº 4 corresponde ao invocado no § 4 do corpo da alegação; a conclusão nº 5 corresponde ao invocado no § 5 do corpo da alegação; a conclusão nº 6 corresponde ao invocado no § 6 do corpo da alegação; a conclusão nº 7 corresponde ao invocado no § 7 do corpo da alegação; a conclusão nº 8 corresponde ao invocado no § 8 do corpo da alegação; a conclusão nº 9 corresponde ao invocado no § 9 do corpo da alegação; a conclusão nº 10 corresponde ao invocado no § 10 do corpo da alegação e assim sucessivamente até à conclusão 208.

A repetição nas conclusões do que é dito na motivação, cada vez mais usual, reitera-se, traduz-se em falta de conclusões, pois é igual a nada, repetir o que antes se disse na motivação.

A reprodução integral do anteriormente alegado no corpo das alegações, ainda que apelidada pela apelante de “Conclusões”, não pode ser considerada para efeito do cumprimento do dever de apresentação das conclusões do recurso, nem podem ser consideradas deficientes (motivação insuficiente, contraditória, incongruente ou mesmo excessiva), obscuras ou complexas, equivalendo, ao invés, à ausência de conclusões, o que sempre dará lugar à rejeição do recurso, nos termos do artigo 641º, nº 1, alínea b) do CPC.

Este tem sido, de resto, o entendimento jurisprudencial, de que são exemplos, designadamente, os Acs. RL de 15.02.2013 (Pº 827/09.3PDAMD.L1-5), de 21.03.2013 (Pº 14217/02.0TDLSB-AM.L1-9) e de 12.10.2016 (Pº 1607/15.7YRLSB-4), Acs. R.C. de 05.05.2015 (Pº 568/11.6TBCN.C1), de 10.11.2015 (Pº 158/11.3TBSJP.C1), acessíveis em www.dgsi.pt.

E, não se argumente com o que foi decidido no Ac. STJ de 09.07.2015 (Pº 818/07.3TBAMD.L1.S1), no qual se defendeu a prolação de um despacho de aperfeiçoamento, já que a questão aqui retractada não é igual à referida no aludido Acórdão, no qual se refere que nas conclusões se repetiu praticamente tudo o que se alegara na motivação.

In casu, o corpo das alegações está totalmente reproduzido no que o apelante designa de conclusões, para além que, no citado acórdão  do  STJ, o onvite ao aperfeiçoamento  estará justificado por se tratar de um processo instaurado em data anterior a 01.01.2008, encontrando-se a aplicação da lei nova sujeita ao regime do artigo 3º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

A ausência de conclusões – enquanto indicação sintética das questões colocadas pelo recorrente – leva, por conseguinte, a que o recurso não possa ser conhecido por falta de objecto.

É que, se assim se não entender, está encontrada a fórmula - já com significativa reiteração - de subverter as regras processuais atinentes ao prazo processual para interposição de recurso e apresentação da respectiva motivação, implicando uma extensão do prazo legal que a lei não contempla, com manifesta violação do Princípio da Igualdade das Partes. 

Com efeito, não será aceitável que a parte que se e formular conclusões – o que nem sempre se afigura tarefa fácil, como é sabido – dentro do prazo previsto na lei, diligenciando pelo legal cumprimento da norma – assista, com a frequência que vem sucedendo, a ser facultada a outros recorrentes - que nenhuma diligência prosseguiram no sentido de formular conclusões (ainda que extensas ou excessivas), mas tão somente através da utilização de um mero expediente de transcrever textualmente o que antes se havia alegado - a possibilidade de gozarem de um prazo adicional para então poderem elaborar, com as delongas pretendidas, as devidas conclusões.

E não se diga, como agora afirma a recorrente, que o Tribunal ad quem poderia, ao abrigo do nº 3 do artigo 639º do CPC, ter convidado a recorrente a completar, esclarecer ou sintetizas as conclusões da apelante.

É certo que o despacho de aperfeiçoamento traduz um reflexo ou corolário do dever de cooperação, princípio estruturante do processo civil português. Mas esse dever de cooperação impõe a colaboração de todos os intervenientes processuais com vista a alcançar com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio, sendo certo que a lei não quis impasses e tergiversações, impondo no domínio dos ónus a cargo do recorrente um rigor e auto-responsabilidade por parte deste.

É que só teria viabilidade a defesa da prolação de um despacho de aperfeiçoamento, caso estivéssemos perante conclusões deficientes, obscuras ou complexas, o que não ocorre no caso vertente, em que inexistem conclusões, pois como acima se afirmou, repetir textualmente o que antes se disse na motivação, é igual a nada

 Como tem sido, de resto, sobejamente evidenciado pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, quando estejam em causa normas que impõem ónus processuais às partes e em que a li prevê  uma  determinada  cominação  ou  consequência processual para o incumprimento de tal ónus, as exigências decorrentes da garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, não afasta a liberdade de conformação  do  legislador  na  compatível com a imposição de ónus processuais às partes (cf., neste sentido, entre outros, Acórdãos nºs 122/02, acessível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20020122.html  e  Acórdão n.º 46/2005/T. Const - Diário da República n.º 118/2005, Série II de 2005-06-22.

E, como se alertou no recente aresto do Tribunal Constitucional -  Acórdão n.º 462/2016 - Diário da República n.º 197/2016, Série II de 2016-10-13:o convite ao aperfeiçoamento de deficiências formais não pode ser instrumentalizado pelo respetivo destinatário, de forma a permitir-lhe, de modo enviesado, obter um novo prazo para, reformulando substancialmente a pretensão ou impugnação que optou por deduzir, obter um prazo processual adicional para alterar o objeto do pedido ou impugnação deduzida, só então cumprindo os ónus que a lei de processo justificadamente coloca a seu cargo”.

É precisamente semelhante a situação configurada nos autos, embora esteja em causa um caso concreto não inteiramente idêntico.

Não pode, consequentemente, invocar-se o princípio do aproveitamento dos actos processuais – como faz a apelante – que aqui não tem qualquer aplicação.

Não se mostra, portanto, violado qualquer comando legal, pois foi o cumprimento dos normativos legais aplicáveis que foi postergado pela própria recorrente, ao engendrar um mero expediente precisamente para obtenção do direito de poder gozar de um prazo suplementar, direito esse que lhe não assiste.

Confirma-se, assim, em conferência, a decisão reclamada.

III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a reclamação apresentada, confirmando-se a decisão da relatora, razão pela qual, por falta de alegações, se rejeita o recurso interposto pela recorrente, “F..”, condenando-se a mesma nas respectivas custas.

Lisboa, 7 de Dezembro de 2016

 Ondina Carmo Alves - Relatora

 Lúcia Sousa

 Pedro Martins  (vencido)

Voto vencido:

Embora concorde com a ideia de que não há diferença substancial entre um caso em que não há, de todo, conclusões e um caso em que as conclusões são o produto de copy paste do corpo das alegações, considero que a tendência do STJ para a desformalização das questões processuais – que, aplicada ao caso, se concretiza, por exemplo, no ac. do STJ de 09/07/2015 (818/07.3TBAMD.L1.S1) que entende que “a reprodução nas “conclusões” do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões” –, deve levar a que não se rejeite um recurso apenas porque as conclusões são iguais ao corpo das alegações (foi já esta a posição que subscrevi no ac. do TRP de 02/06/2016, proc. 4698/11.6TBGDM.P1).