CUSTAS DE PARTE
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário

–De acordo com o disposto no art. 31º, nº1 da Portaria nº 419-A/2009, de 17 de Abril, as partes que tenham direito a custas de parte devem enviar para o tribunal e para a parte vencida a respetiva nota discriminativa e justificativa.
–Perante a falta de junção aos autos de nota discriminativa e justificativa das custas de parte, dever-se-á considerar que inexiste título executivo.

(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Parcial

Acordam os Juízes, no Tribunal da Relação de Lisboa.


I–Relatório:


A., B e C. instauraram contra D. acção executiva para pagamento da quantia de € 5908,04 ( a título de custas de parte), acrescida de € 98,41, a título de juros vencidos.

O executado deduziu oposição à execução e à penhora, invocando a falta de título executivo, a caducidade do direito das exequentes pedirem o pagamento das custas de parte, a falta de junção aos autos das notas justificativas e a violação das regras de elaboração das notas justificativas.

Foi proferido despacho saneador/sentença.

Pelo Tribunal a quo foram considerados provados os seguintes factos:

1.–Por sentença proferida em 23.04.2012, transitada em julgado em 28.05.2012, no Processo n.º 3311/08.3TVLSB da 8ª Vara Cível de Lisboa, foi homologada transacção entres as partes, as quais ficaram condenadas a observar os seus precisos termos (fls. 10 a 21 da execução).
2.–Na transacção referida em 1, as partes acordaram que as custas ficariam na sua totalidade a cargo do réu, aqui opoente (fls. 13 da oposição).
3.–Na sentença referida em 1. consta, a final, “Sem custas, atento o regime inserto no art.º 5º da Lei 7/1012, de 13.02” (fls. 21 da execução).
4.–Por sentença proferida em 04.05.2012, transitada em julgado em 11.06.2012, no Processo n.º 1596/11.7TVLSB da 12ª Vara Cível de Lisboa foi homologada a desistência do pedido (fls. 22 e 23 da execução).
5.–Na sentença referida em 4. foi decretado que as custas ficariam a cargo do autor, o aqui opoente (fls. 23 da execução).
6.–Em 18.05.2012, o mandatário das exequentes enviou ao mandatário do opoente, por carta registada, as notas discriminativas e justificativas de custas de parte, para pagamento do montante de €734,40 respeitante ao processo referido em 1 e de €5.173,64 respeitante ao processo referido em 4 (fls. 24 a 29 da execução).
7.–As exequentes não juntaram as notas discriminativas de custas de parte aos respectivos processos declarativos (fls. 54 e 65 deste apenso).
Com base nos factos provados acima indicados foi proferida decisão que julgou improcedentes a oposição à execução e à penhora e determinou o prosseguimento da execução.

O executado recorreu  desta decisão e formulou as seguintes conclusões:
1.–As sentenças homologatórias nos processos que correram na 8ª Vara com o nº3311/08.3TVLSB e na 12ª Vara com o nº 1596/11.7TVLSB resultaram do acordo de transacção levado a efeito na 8ª Vara, cujo âmbito abrangeu a desistência do pedido do processo da 12ª Vara, a saber:

1–a).-As A.A. reduziram o pedido para 125.000,00 (cento e vinte e cindo mil euros).
1–b).-O R. aceitou a redução do pedido e naquela data pagou a quantia em causa confessada, através do cheque bancário nº 1000140185 sobre o Banco Santander Totta, à ordem de A., devidamente autorizado, pelas restantes Autoras.
1–c).-As Autoras deram, com a assinatura do presente termo pelo seu Ilustre Mandatário, plena quitação.
1–d).-AA e R. declararam nada ter a exigir mutuamente seja a que titulo for, nomeadamente quanto à loja objecto de litígio nos presentes autos.
1–e).-As partes prescindiram mutuamente de recurso.
1–f).-As AA. entregaram no presente acto ao R. a chave da fracção 18 B e C da Rua Dr. Silva Teles, nº 18, em Lisboa.
1–g).-Naquela mesma data o R., desistiu, por requerimento autónomo, do pedido na acção que movia às AA. E que sob o nº 1596/11.7TVLSB corria termos pela 12ª Vara Cível de Lisboa, 3ª secção.
1–h).-Custas na totalidade a cargo do R.

2–SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE 23.04.2012.
“Homologo por sentença, em virtude de a julgar objetiva e subjetivamente válida, quer por que não versa sobre direitos indisponíveis quer por que foi outorgada por quem para tanto tem legitimidade, além de ter sido observada a forma legal, a transação que antecede. Em consequência, condeno as partes a observarem os seus precisos termos (art.ºs 293.º n.º 2, 294.º, 299.º e 300.º do C.P.C.).
Declaro extinta a presente instância em que são AA … o e R … (art.º 287.º al. d) do CPC).
Sem custas, atento o regime inserto no art.º 5.º da Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro
2.-Foi imediatamente entregue a importância acordada e por esse facto e por questão de segurança e firmeza do negócio as partes mutuamente renunciaram ao recurso.
3.-As sentenças homologatórias não condenaram o Réu nas custas. Isentaram – no.
4.-Por outro lado, o acordo não contemplou as custas de parte. As partes quando negociaram os termos do acordo referiram – se à totalidade das custas (custas finais) seriam por conta do réu.
5.-Nos termos previstos no Regulamento das Custas Judicias, é, pois, no exacto momento da decisão judicial que efectivamente nasce em concreto o direito ao reembolso das custas de parte, obrigação esta a cargo, naturalmente, da parte julgada responsável, quer nos termos do acordo homologado, quer por decisão judicial . Neste exacto sentido, vai também o artº. 447º-D, nº. 1 do CPC. Já se referiu que em termos de acordo nada foi estipulado quanto a custas de parte já pagas
6.-Cumpre aqui reforçar que a condenação em custas pela sentença homologatória constituirá título executivo, e somente ela, nos exactos termos decididos pelo Juiz do processo. É condição essencial a decisão judicial que condene a parte em custas.
7.-Não se confunda a transacção do pedido que está na disponibilidade das partes com a decisão de custas que terá sempre de ser decidida em ultima análise pelo Juiz por aplicação da Lei.
8.-Analisando a sentença homologatória proferida no âmbito do processo 3311/08.3TVLSB, que correu termos pela 8ª Vara Cível de Lisboa, junto ao requerimento executivo sob fls.28/29, cumpre referir o seguinte:
9.-De acordo com a transacção judicial celebrada pelas partes, estas decidiram transigir no pedido, o qual foi integralmente liquidado de imediato, referindo que as custas seriam o cargo do Réu, no entanto, não é a transacção que serve de título executivo relativamente a custas mas a sentença judicial que condene a parte nas mesmas.
10.-De acordo com a sentença homologatória, esta, alheia ao estipulado no acordo, não condenou o réu nas custas: “Sem custas, atento ao regime inserto no artigo 5º da Lei 7/2012, de 13 de Fevereiro.” A decisão homologatória, no que respeita às custas, incluindo-se na mesma medida, as custas de parte, ao contrário do que invocam as exequentes no seu requerimento executivo, não condenou o Réu ao seu pagamento, porque a tal o obrigava a disposição legal prevista no artigo 5º da Lei 7/2012 de 13 de Fevereiro, isentando o seu pagamento. O artigo 5º da Lei nº 7/2012, inclui a totalidade das custas. Inclusive custas de parte.
11.-Quanto a custas já pagas o acordo é absolutamente omisso e tal assunto não foi objecto de discussão ou conversa entre as partes
12.-A sentença homologatória, no que se refere a custas, não condenou o Réu ao seu pagamento.
13.-Podendo as exequentes, se o assim o tivessem entendido, reclamado da referida sentença. O que não fizeram.
14.-As sentenças homologatórias dos Autos não podem constituir títulos executivos quanto às custas de parte, por um lado falta - lhes a condenação, por outro faltam - lhes os pressupostos de título executivo, in Lebre de Freitas “A Acção Executiva Depois da Reforma” pág 29.
15.-Antes de mais, faltam- lhes os pressupostos de certeza, exigibilidade e liquidez e ainda o nascer da obrigação motivada pelo juiz
16.-Carecendo assim as exequentes de título executivo essencial à sua exigência no que respeita às custas de parte do processo que correu termos pela 8ª Vara processo 3311/08.3TVLSB.
17.-Por outro lado, é absolutamente abusiva a conclusão do Tribunal a quo, na afirmação de que as custas de parte seriam a cargo do réu, sem ter qualquer indício, facto ou sinal que lhe pudesse dar tal indicação. (SENTENÇA DE FLS. 5)
18.-Violou a Sentença Recorrida várias disposições legais acima referidas, e ainda a alínea c) e d) do artigo 668º do CPC, tornando-a nula.
19.-Acresce que o Tribunal a quo não só não atendeu à natureza das sentenças e da sua génese, enquanto títulos, como ocultou as próprias omissões da parte quanto ao cumprimento do R.C.J. e à PORTARIA 419-A/2009, ARTS. 31º A 33º. Tendo o aqui Recorrente invocado, no seu articulado de oposição à execução e Penhora, a Excepção Peremptória da CADUCIDADE.
20.-Excepção essa que não foi conhecida pelo Tribunal a quo, tendo este feito uma errada interpretação das supramencionadas disposições legais e violado os artigos 493º do CPC e 298º, nº. 2 do Código Civil, porquanto:
21.-A transacção deixou de ser susceptível de recurso ordinário no dia 25.04.2012, data em que as partes foram pessoalmente notificadas da sentença da 8ª Vara.
22.-O que referimos no processo da 8ª Vara é, de igual modo, de aplicar ao processo da 12ª vara com o nº1596/11.7TVLSB. Aliás os procedimentos das AA foram os mesmos, tendo ainda em conta que, a desistência do pedido neste processo foi englobado no acordo de transacção levado a efeito no processo da 8ª Vara.
23.-Nos termos previstos no RCP, a parte que tenha direito às custas de parte deve assegurar a interpelação da parte que impenda a obrigação de as pagar com o envio da nota discriminativa das custas de parte, no prazo máximo de 5 dias, contados da data do trânsito em julgado da sentença homologatória, e a sua junção em igual prazo, no respectivo processo- artigo 25º do RCP e artigo 31º da portaria nº 419-A/2009, de 17 de Abril
24.-Tal não foi feito.
25.-A omissão dos procedimentos previstos nos artigos 25º, 31º do RCP e da portaria determina a caducidade do direito de haver um tal reembolso, nos termos do artigo 298º, nº. 2 do Código Civil:
26.-A sentença homologatória da desistência do pedido proferida nos processos em análise, foi notificada às partes tendo transitado imediatamente artigos 677º, 678º nº1; 681º, 671º nº1, 300º todos do Código Processo Civil.
27.-Não sendo correcta a indicação de trânsito em julgado na certidão apresentada pelas exequentes, como sendo de 11/06/2012, o que se impugnou em sede de Oposição à Penhora e à execução e a decisão recorrida omitiu-se de pronunciar
28.-A carta do mandatário dos exequentes ao mandatário do executado foi enviada por carta registada, no dia 18 de Maio de 2012 muito para além dos 5 dias estipulados no artigo 25º do RCP.
29.-Os quais terminavam, respectivamente, no dia 30 Abril de 2012 para um dos Processos e 14 de Maio de 2012 para outro.
30.-A Parte incumpriu com a disposição legal prevista, facto que faz caducar o seu direito a exigir do Réu qualquer valor a título de custas de parte.
31.-Mas não foi só a notificação à contraparte o procedimento omitido, com as devidas consequências legais.
32.-As cartas enviadas ao Mandatário do Réu, de fls. 32/40 e 35/40 nunca chegaram ao conhecimento do executado, apesar de tal se presumir por Lei, mesmo que tivessem chegado, a parte ou o seu mandatário não tinham qualquer possibilidade de , sobre elas, exercer o contraditório, tal como lhe permitia o artº 33º da portaria. Daí a sua surpresa quando tomou conhecimento por terceiros das penhoras.
33.-Verificou-se, por parte das Autoras, a falta de cumprimento, por parte das aqui exequentes, dos termos de liquidação previstos no Regulamento das Custas Processuais, e artigo 31º da portaria, designadamente, tal como se constata das certidões juntas ao processo pelo executado, as Autoras não enviaram nem juntaram a nota discriminativa e justificativa das despesas no próprio processo judicial. Ou seja, nos Autos nada consta, relativo a custas de parte.
34.-O Réu ficou sem possibilidade do exercício do contraditório por falta do cumprimento do procedimento do artigo 31º da portaria.
35.-As Autoras, propositadamente ou não, não enviaram a nota justificativa para o Tribunal.
Procedimento esse obrigatório já que se prende directa e necessariamente com o direito do Réu a reclamar ou recorrer do teor da referida Nota, ou seja, o seu Direito a não ser condenado em custas sem ter a oportunidade de manifestar a sua pretensão perante o tribunal e no exercício do contraditório e, por conseguinte, e poder exercer o seu direito de acesso aos Tribunais e à Justiça nos termos dos seguintes preceitos legais:

36.-Ora, a obrigatoriedade de junção aos Autos da nota discriminativa do art. 33º da Portaria 419-A/2009 de 17/04 tem em vista:
1.-A reclamação da nota justificativa, apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo Juiz em igual prazo e notificada às partes.
2.-A reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota.
3.-Da decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC.
4.-Para efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31º do RCP.

37.-Acontece que a parte omitiu esta fase, deixando o réu sem possibilidade do contraditório. A omissão deste procedimento preclude necessariamente o direito da Autora de haver custas de parte ou de lograr sequer o seu pagamento. Caducidade essa invocada pelo Executado, aqui Recorrente, na sua oposição à Execução e Penhora.
38.-O Réu, ao receber inopinadamente a execução, trouxe-lhe diversos problemas e prejuízos causados pelo deficiente procedimento das autoras, afastando ainda que, com alguma dificuldade a ideia de que as autoras tivessem procedido dolosamente na sua conduta ao não enviarem a nota discriminativa para o Tribunal, furtando, assim, a mesma nota à decisão do Mº Juiz, no caso de reclamação.
39.-Pelo menos não teria sido surpreendido se as autoras tivessem enviado ao réu e ao Tribunal, via citius, as suas pretensões, com a remessa das notas discriminativas e justificativas das custas e, após a sua reclamação, se entendesse exercer, o juiz condenasse o réu nas custas.
40.-A importância de a fazer juntar aos Autos prende-se com os direitos do devedor das custas, de poder reclamar das mesmas, junto do Exmº Juiz de Direito, quanto à sua exigibilidade, quantidade, formulação, etc, mas também, como melhor refere o Professor Lebre de Freitas, a este propósito e, em anotação ao artigo 447-D do Código de Processo Civil, in Código de Processo Civil anotado, 2ª edição: “ Em interpretação literal, dir-se-ia que o juiz tem de apreciar os montantes e condenar em conformidade, mas a lei tem de ser interpretada no sentido de que a condenação proferida, na acção declarativa, acarreta a dívida das custas de parte, a liquidar, após o respectivo trânsito e a incluir na conta definitiva de custas (art. 29-4 Reg Custas, “a contrario”) constituindo a certidão da liquidação título executivo (art. 35-1 e 2 Reg Custas)”
51.-É condição sine qua non à sua liquidação e vencimento que a nota seja junta aos Autos, dando-se a possibilidade do devedor e do próprio tribunal se poder pronunciar sobre a mesma.
52.-Ora as exequentes não cumpriram com o procedimento legal obrigatório por Lei, o qual faz caducar o direito ao reembolso.
53.-As sentença não são títulos executivos porque o réu, ora recorrente, ficou privado do direito de reclamação nos termos do ART. 33º, PORTARIA 419-A/2009 DE 17 DE ABRIL na versão actualizada não se considerando, por isso, liquidada.
54.-A exequibilidade da sentença dependeria da decisão que o Mº Juiz, após a reclamação, tomasse quanto à nota discriminativa (omitido).
55.-Para que o referido crédito pudesse ser considerado vencido, líquido e exigível, tal junção é condição essencial e obrigatória por Lei - artº. 25º, nº. 1, artº. 31º, nº. 1 RCP e da Portaria Nº. 419-A/2009, de 17 de Abril que estabelece imperativamente: que "as partes que tenham direito a custas de parte,..., deverão enviar para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa,...".
56.-Mesmo com a sentença homologatória, qualquer valor de custas, sejam de parte sejam outras, tem de estar vencido e exigível de acordo com os procedimentos legais, em vista à liquidação e vencimento do respectivo valor.
57.-Para dar início ao procedimento de liquidação, o credor de custas de parte tem necessariamente que liquidar as quantias através da elaboração da Nota justificativa e discriminativa e enviá-las cumulativamente, quer para a parte, quer para o tribunal, porquanto é por via judicial, através do processo respectivo, que as mesmas se consideram vencidas e líquidas, nos termos melhor indicados no Regulamento das Custas Processuais, expedindo-a ao tribunal da causa, onde ficará a mesma inserta nos autos e, por conseguinte, devidamente documentada.
58.-A Decisão recorrida não apreciou nenhuma destas questões, fez uma aplicação incorrecta do Direito, nomeadamente violando as disposições legais, referidas ao longo das presentes conclusões, inclusivamente julgando de uma forma ligeira títulos executivos as sentenças homologatórias, e outras questões, como omissão de procedimentos obrigatórios, coarctando, assim, inopinadamente, o direito constitucional de acesso ao direito e logicamente à sua defesa.
59.-Em face da factualidade demonstrada nos Autos, da omissão por parte das Autoras do cumprimento das disposições do regulamento das custas judiciais quanto às custas de parte acima referidas, deveria a decisão recorrida ter dado provimento à excepção de Caducidade invocada pelo executado, absolvendo-o do pedido executivo.
60.-Acresce a verificação da inexistência de qualquer obrigação, certa, líquida e exigível prevista em título executivo, pelo que a acção executiva teria de improceder necessariamente nos termos previstos entre outros, nos artigos 677, 802º 681, 685, nº4. A sentença homologatórias não condenou o réu nas custas e as autoras não reclamaram da conta de custas, evidenciando perante o juiz o deficiente cumprimento, se esse fosse o caso
61.-Por fim, na desconsideração que fez das exigências processuais previstas nos artigos 25º e 31º do Regulamento das Custas Judiciais, ao não ter considerado que a sua omissão, nomeadamente da formalidade de junção da Nota de Despesas aos Autos de Processo Declarativo, não acarreta para a parte sobre quem impendia essa obrigação qualquer consequência, o Tribunal a quo legitimou que o Executado não tivesse acesso aos meios jurisdicionais para reclamar, querendo, de tal nota de Despesas, em estrita violação do Direito Constitucional consignado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
62.-O Tribunal Constitucional tem dito, em jurisprudência constante, que a norma contida no artigo 20.º da Constituição (mormente, a resultante do disposto no seu n.º 1) não contém nenhum imperativo de gratuitidade da justiça. Sendo o direito, que aí se consagra, de acesso ao tribunal, um direito pluridimensional - pois que na sua estrutura se incluirá, não apenas uma posição subjectiva de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, mas ainda uma posição subjectiva de índole prestacional, com o correlativo dever do Estado de pôr à disposição das pessoas instituições e procedimentos que garantam a efectividade da tutela jurisdicional - ampla será, também, a liberdade de conformação do legislador ordinário quanto à disciplina das custas que o exercício de tal direito, inevitavelmente, acarretará.
63.-Certo é, no entanto, que essa liberdade terá limites, sempre que se demonstrar que os custos da utilização da máquina judiciária, fixados pelo legislador como correlativo da criação e afectação, por parte do Estado, de importantes meios ao fim de "realização da justiça", são, pela sua dimensão, de tal modo excessivos ou onerosos que acabam por inibir o acesso que o cidadão comum deve ter ao juiz e ao tribunal. Quanto a este ponto, tem também sempre dito o Tribunal que o teste da proporcionalidade se deve fazer tendo em conta a exigência de um "equilíbrio interno ao sistema" que todo o regime de custas, pela sua razão de ser, terá que perfazer. (Assim, vejam-se, entre outros, os Acórdãos n.ºs 552/91, 467/91 e 1182/96).
64.-Nesta medida a inconsequência jurídica por parte de quem incumpre a formalidade prevista no artigo 31º do RCJ, adoptada pela decisão recorrida, faz cair por terra a obrigatoriedade que literalmente decorre do próprio preceito e mais grave impede que a parte possa reclamar da nota de despesas e ter acesso a uma tutela efectiva do seu direito ao contraditório, ficando à mercê dos caprichos, desrazoabilidade ou habilidade da contra-parte.
65.-Sendo este o fim, constitucionalmente legítimo, que é prosseguido pela norma do artigo 31º do RCJ, a partir dele se terá de fazer o juízo de proporcionalidade que a convocação, para o caso, do prescrito pelo artigo 20.º da Constituição inevitavelmente impõe e concluir pela inconstitucionalidade da decisão recorrida na parte que entende que a preterição do artigo 31º não tem por consequência a caducidade do direito de exigir o pagamento de custas de parte.

Terminou, pugnando pela procedência do presente recurso e pela substituição da decisão recorrida por outra que julgue extinta a execução.

As exequentes contra-alegaram, sem formular conclusões, pugnando pela improcedência do recurso.
                             
II–Importa solucionar as seguintes questões:         
- Se a sentença recorrida padece do vício de nulidade;
- Se inexiste título executivo;
- Se procede a excepção de caducidade.
                           
III–Apreciação.
Invoca o recorrente o vício de nulidade da sentença ao abrigo do disposto no art. 668º, nº 1, alíneas c)-contradição entre os fundamentos e a decisão- e d) (omissão de pronúncia) do pretérito Código de Processo Civil.
Refere o recorrente que «é absolutamente abusiva a conclusão do Tribunal a quo, na afirmação de que as custas de parte seriam a cargo do réu, sem ter qualquer indício, facto ou sinal que lhe pudesse dar tal indicação».

O Tribunal a quo fundamentou, nesta parte, a decisão recorrida nos seguintes termos:  
«O opoente alega, quanto ao processo n.º 3311/08.3TVLSB, que a sentença condenatória não condenou em custas mas sim isentou as partes do seu pagamento por força do artigo 5º da Lei n.º 7/2012, de 13.02.
É consabido que a regra é no sentido de que a parte vencida, na proporção em que o for, deve ser condenada no pagamento das custas da ação, do recurso, do procedimento ou do incidente, conforme os casos (artigos 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, e 1º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais), sendo que, em caso de transacção, estipula o artigo 451º, n.º 2 do antigo Código de Processo Civil que as custas são, em regra, pagas a meio, salvo acordo das partes em contrário.
Por outro lado, o conceito de custas processuais em sentido amplo abrange as de parte, a taxa de justiça e os encargos, cfr. artigo 447º, nº 1 do Código de Processo Civil.
No processo n.º 3311/08.3TVLSB, as partes acordaram que as custas ficaram integralmente a cargo do aqui opoente. A sentença, por sua vez, condenou as partes a cumprirem o acordado e isentou-as de custas nos termos do artigo 5º da Lei n.º 7/2012, de 13.02.
Este normativo, sob a epígrafe “Incentivo à extinção da instância”, estabelece:
“1- Nos processos que tenham dado entrada no tribunal até à data de publicação da presente lei, ou que resultem da apresentação à distribuição de providências de injunção requeridas até à mesma data, e venham a terminar por extinção da instância em razão de desistência do pedido, desistência da instância, confissão do pedido ou transacção apresentadas até um ano após a data de entrada em vigor do presente diploma, há dispensa do pagamento das taxas de justiça e dos encargos devidos pela parte ou partes que praticaram o acto que conduziu à extinção da instância, não havendo lugar à restituição do que já tiver sido pago a título de custas nem, salvo motivo justificado, à elaboração da respectiva conta.
2- O disposto no número anterior não prejudica o direito ao pagamento da remuneração devida às entidades que intervenham nos processos ou que coadjuvem em quaisquer diligências e aos agentes de execução a título de despesas e honorários” (…)
A lei é bastante clara quando refere que a dispensa é relativa à taxa de justiça e aos encargos, não integrando, por isso as custas de parte.
Entende-se que se o legislador tivesse querido também dispensar o pagamento das custas de parte, sempre as teria mencionado no texto do artigo como fez com os outros tipos de custas processuais ou simplesmente teria conferido dispensa das
custas em sentido amplo. Mas não o fez, o que revela uma vontade manifesta em não incluir na aludida dispensa as custas de parte. Tal inclusão, aliás, não faria sentido, pois o objectivo da aludida dispensa é, como o título do artigo refere, incentivar a extinção processual por consenso entre as partes, concedendo-lhes o benefício de não pagarem ou pagarem menos despesas processuais. E este benefício só será útil para as partes se realmente resultar numa vantagem económica. Ora se as partes deixassem de poder reclamar as custas de parte com a referida isenção, então a vantagem seria apenas de uma das partes, sendo certo que, tanto pela via do acordo referido no artigo 451º, n.º 2, quer porque as custas de parte estão na disponibilidade da própria parte as requerer, sempre seria possível, numa transacção como a presente, serem as partes a definir quem e em que proporção devem suportar as custas de parte, o que foi neste caso efectivamente acordado e homologado no sentido de que tais custas ficariam integralmente a cargo do aqui opoente.
Assim, a referência que se faz na sentença a que não há custas a pagar por força do artigo 5º da Lei n.º 7/2012, de 13.02 não pode ser interpretada como respeitante às custas de parte porque é a própria sentença que homologa a transacção e condena as partes no seu estrito cumprimento, o que integra também o pagamento pelo ali réu, aqui opoente, das custas processuais. Sendo que as custas processuais em divida, neste caso em concreto, e que o opoente deve pagar, são já só aquelas apresentadas na nota discriminativa de custas de parte das exequentes, pois que o opoente ficou dispensado do pagamento de outras taxas de justiça e encargos mas não destas.
Verifica-se, assim, que as sentenças dadas à execução, juntamente com as respectivas notas discriminativas e justificativas de custas de parte, constituem título suficiente, não estando em falta o título executivo e improcedendo, por isso, nesta parte, a presente oposição.»

Do exposto resulta que não ocorre vício de raciocínio entre as premissas e a conclusão para efeitos da invocada causa de nulidade.

Poder-se-á discordar da decisão, mas tal questão respeita à apreciação do mérito da causa e não integra vício de nulidade.

Vejamos, agora, se a sentença recorrida padece do vício de nulidade por omissão de pronúncia quanto à excepção peremptória de caducidade.

Refere a decisão recorrida :
«O artigo 25º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, dispõe que “Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa”.
O opoente alega que as sentenças homologatórias transitaram em julgado de imediato, a do processo n.º 3311/08.3TVLSB porque as partes renunciaram ao recurso e a do processo n.º 1596/11.7TVLSB porque se tratava de decisão irrecorrível.
No entanto, não assiste razão ao opoente, desde logo porque as certidões das sentenças juntas aos autos reflectem as efectivas datas do trânsito em julgado, o que o opoente não conseguiu contrariar. Note-se que este chegou a protestar juntar novas certidões com as datas do trânsito corrigidas, mas as certidões que veio juntar posteriormente e que constam de fls. 64 e 65 deste apenso em nada contrariam as dadas à execução, apenas acrescentando que as partes foram notificadas das sentenças e que não foi junta aos autos nota de custas de parte. Acrescenta até a certidão emitida no processo n.º 3311/08.3TVLSB que o Digno Magistrado do Ministério Público foi notificado da sentença em 26.04.2012.
Com efeito, mesmo quando as partes renunciam ao direito ao recurso, quando se trata de condenação em custas e alguma das partes fica dispensada do seu pagamento, o Ministério Público tem sempre que ser ouvido, não transitando a sentença senão depois da sua notificação.
Também no que respeita à falta de interesse em recorrer ou à irrecorribilidade da sentença de homologação, sempre se dirá que, mesmo que fosse esse o caso, a sentença pode sempre conter vício susceptível de ser invocado e reparado, nos termos dos artigos 668º e 669º, bem como ser ele próprio fundamento de recurso, de acordo com o n.º 4 do artigo 668º, sendo certo que o caso julgado não ocorre senão depois da sentença deixar de poder ser impugnada por recurso ordinário ou reclamação, por força do artigo 677º, todos do Código de Processo Civil.
Improcede, assim, também este fundamento da oposição.
Da Falta de Junção das Notas Discriminativas aos Processos Declarativos
O opoente invocou que as quantias exequendas não podem ser consideradas vencidas, líquidas nem exigíveis, porquanto as exequentes não juntaram as notas discriminativas das custas de parte aos respectivos processos mas tão só a enviaram para o mandatário do opoente.
Assiste razão ao opoente quanto à omissão de entrega das notas nos processos, tal como se deixou demonstrado.
Porém, e apesar de tal entrega estar prevista no n.º 1 do supra citado artigo 25º do Regulamento das Custas Processuais, não se julga que a sua omissão possa ter a consequência pretendida pelo opoente.
O entendimento jurisprudencial é que “a execução por custas de parte, da parte vencedora contra a parte vencida (art. 36º, nº 3, do Regulamento das Custas Processuais) assenta em título executivo compósito - nota discriminativa de custas de parte enviada pela primeira à segunda mais a própria sentença que condenou em custas” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20-04-2016, processo n.º 2417/07.0TBCBR-C.C1 e no mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07-10-2015, processo n.º 4470/11.3TDLSB.1.L1-3).
No caso vertente, as exequentes remeteram a nota discriminativa de custas de parte à parte vencida, através do seu mandatário, cumprindo a exigência que decorre do artigo 25º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais.
Assim, julga-se serem líquidas, exigíveis e exequíveis as obrigações em execução, improcedendo a oposição nesta parte.»

Da análise da referida decisão resulta que a Exmª juiz a quo apreciou as questões colocadas pelo ora recorrente em sede de oposição, pelo que a sentença recorrida não enferma do vício de nulidade por omissão de pronúncia.       
                          
Importa, agora, apreciar se inexiste título executivo.

Concordamos com a decisão recorrida quando refere:“O entendimento jurisprudencial é que a execução por custas de parte, da parte vencedora contra a parte vencida (…) assenta em título executivo compósito - nota discriminativa de custas de parte enviada pela primeira à segunda mais a própria sentença que condenou em custas”.

A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação ( art. 628º do CPC que corresponde ao art. 677º do pretérito CPC). Mesmo quando as partes renunciam ao direito de recurso, importa considerar a data da notificação do Ministério Público.

Também concordamos com a decisão recorrida, quando refere: «No processo n.º 3311/08.3TVLSB, as partes acordaram que as custas ficaram integralmente a cargo do aqui opoente. A sentença, por sua vez, condenou as partes a cumprirem o acordado e isentou-as de custas nos termos do artigo 5º da Lei n.º7/2012, de 13.02.» Este normativo apenas contempla a dispensa do pagamento das taxas de justiça e dos encargos e não abrange as custas de parte.

Mas discordamos da decisão recorrida na parte que considerou irrelevante a falta de junção aos autos da nota discriminativa e justificativa.

De acordo com o disposto na portaria no art. 31º, nº1 da portaria nº  419-A/2009, de 17 de Abril[1], « as partes que tenham direito a custas de parte devem enviar para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa, nos termos e prazos previstos no artigo 25.º do RCP».

As custas de parte não se incluem na conta de custas ( art. 30º da referida portaria).

E de acordo com disposto no art. 33º do mesmo diploma legal:
«1- A reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes.
2- A reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota.
3- Da decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC.
4- Para efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31.º do RCP.»

Embora o recorrente tenha invocado a caducidade ao aludir à omissão de junção aos autos da nota justificativa, entendemos que a referida omissão implica falta de título executivo.

Conforme refere Salvador da Costa in “ Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado”, pag. 310: « Trata-se, assim, de remessa de nota justificativa bifronte, uma para a parte responsável pelo seu pagamento, e a outra para o tribunal.»

E de acordo com Miguel de Lucena e Leme Côrte-Real in “Custas de Parte” «: Ora, sabido que a interpelação para o pagamento das custas processuais é um acto processual efectivo – não obsta a que assim seja, parece, a circunstância de o mesmo se concretizar através da remessa de interpelação directamente por uma parte à outra parte, a latere dos autos, uma vez que a interpelação é pelo menos noticiada ao processo: até para que, através de uma tal junção, se crie título executivo, o que, de outra forma, não se verifica…»

Consideramos, por isso, que, perante a falta de junção aos autos das notas justificativas e discriminativas, inexiste título executivo.
Procede, desta forma, o recurso de apelação.
                                  
IV–Decisão:

Em face do exposto, o Tribunal acorda em julgar procedente o recurso de apelação e, consequentemente, revoga a decisão recorrida, julgando procedente a oposição à execução e determinando a extinção da execução.
Custas em ambas as instâncias pelas recorridas.
Registe e notifique.   

                       

Lisboa, 27 de Abril de 2017


                                                 
Francisca Mendes
Eduardo Petersen
Maria Manuela Gomes


[1]Alterada  pela portaria nº 284/2013, de 30/08, pela portaria nº 82/2012, de 29/03, pela portaria nº 1/2012, de 02/01, pela portaria nº 200/2011, de 20/05 e pela portaria nº 179/2011, de 02/05.