FALÊNCIA
CITAÇÃO
DEVEDOR
CESSAÇÃO
GERENTE
FALTA DE REGISTO
Sumário

Deve considerar-se regularmente efectuada a citação de sociedade comercial feita na pessoa do seu gerente que, à data da citação, havia cessado funções de gerente dessa sociedade, se só posteriormente à data da citação efectuou o registo da cessação de funções.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães


O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, Delegação de Braga, veio, ao abrigo do disposto no artº 8º do DL nº 132/93, de 23 de Abril, com as alterações introduzidas pelo DL nº 315/98, de 20 de Outubro, requerer no Tribunal Judicial de Braga a declaração de falência da empresa "A", tendo tal requerimento dado entrada em 2 de Set. de 2003.
Por despacho de 3.9.2003, ordenou-se, para além do mais, a citação da devedora e dos credores desta nos termos e para os fins referidos no artº 20º do CPCREF.
Em 25 de Set. 2003 foi lavrada certidão de não citação, na qual o Sr. Funcionário Judicial certifica que não pode levar a efeito a diligência que se propunha – a citação da empresa "A" - em virtude de na morada constante dos autos se encontrar um cartaz com a seguinte inscrição: “Vende-se” e por ter sido informado que a firma a citar já não labora na morada supracitada.
Notificado da não citação da requerida veio o requerente Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social requerer a citação da requerida na pessoa dos seus representantes legais, Eutímio ..., Albino ... e Francisco ....
Ordenada a citação da requerida na pessoa dos seus representantes legais identificados pelo requerente, foram aqueles citados em 20 de Outubro de 2003.
Em 10.11.2003, o Mmº Juiz lavrou o seguinte despacho:
“Da certidão junta aos autos pela requerente da falência consta como gerentes da requerida Francisco ..., Eutímio ... de Melo e Albino ... e daí as citações efectuadas.
Constata-se agora que o gerente da sociedade Eutímio ...o vem juntar certidão da Conservatória onde consta a inscrição no registo da cessação de funções de gerente de Francisco ... por renúncia em 7 de Abril de 1971, pela ap. 15/03 2022, sendo completado o Av. Nº 2 em 27/10/2003 com a cessação de funções do gerente Eutímio ... por renúncia em 7 de Abril de 1971.
Compulsados os autos constata-se que o referido Eutímio ... foi citado na qualidade de gerente da requerida em 20 de Outubro de 2003, isto é antes da inscrição no registo da sua renúncia às funções da gerência.
Nos termos do artigo 3º m) do CRC a cessação de funções é facto sujeito a registo, sendo certo que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo (artº 14º nº 1 do Cód. Reg. Comercial).
Assim, a citação da requerida na pessoa do seu então gerente Eutímio mostra-se regularmente efectuada”.

Inconformado com esta decisão, veio Eutímio ... interpor recurso de agravo, apresentando alegações que culminam com as seguintes conclusões:

»»» O agravante não é sócio, nem é gerente da requerida desde 1971;
»»» Estes factos foram forçosamente registados por trato sucessivo na Inscrição nº 2 de 16/11/1992;
»»» Pelo que oponível a terceiros;
»»» A Cessão de quotas e a renúncia à gerência decorrem do registo de 1992;
»»» A agravada tinha obrigação de conhecer estes factos, dado que toda a documentação constante da Segurança Social esclarece e especifica quem são os sócios e os gerentes da requerida;
»»» Assim, a citação da requerida na pessoa do agravante mostra-se irregularmente efectuada, pois é efectuada depois da data do respectivo registo;
»»» Em todo o caso é certo que as consequências imediatas da declaração de falência, independentemente dessa qualidade, de registo comercial necessário, se encontrar efectivamente registada, não devendo tais medidas ser aplicadas em relação aqueles que, constando do registo não cancelado, já não detêm tal qualidade.
Finaliza, pedindo a revogação do douto despacho recorrido e a sua substituição por outro que declare a citação da requerida irregularmente efectuada na pessoa do agravante.
Contra-alegou o recorrido, pugnando pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, tendo em conta que os factos relevantes são os que constam do relato.
Conforme dispõe o nº 1 do artº 231, do CPC « os incapazes, os incertos, as pessoas colectivas, as sociedades, os patrimónios autónomos e o condomínio são citados ou notificados na pessoa dos seus legais representantes, sem prejuízo do disposto no artigo 13º).
Quando o agravante Eutímio foi citado em 20 de Outubro de 2003, na qualidade de legal representante da empresa "A" já havia cessado funções de gerente dessa empresa, por renúncia efectivada em 7 de Abril de 1971.
Todavia, só em 27 de Outubro de 2003 é que o recorrente efectua o registo da cessação de funções.
Como resulta dos artigos 3º nº1 al. m), 15º,nº1 e 70º, nº1 do Código do Registo Comercial, a cessação de funções, por qualquer motivo que não seja o decurso do tempo, dos membros dos órgãos de administração está sujeita a registo e publicação obrigatórios e, por isso, como preceitua o nº 2 do artigo 14º do mesmo Código, só produz efeitos contra terceiros depois da data de publicação.
Deste modo, não temos dúvidas em considerar como regularmente efectuada a citação da requerida na pessoa do dito Eutímio, uma vez que, aquando desse acto, a sua cessação de funções ainda não estava registada nem publicada. E só após a realização destes actos é que a cessação de funções daquele gerente produziria efeitos perante terceiros.
Assim, o agravante, apesar da renúncia, continuava a ter a posição de representante legal da sociedade, perante terceiros, ao tempo da citação, por não ter sido ainda registada a cessação das suas funções, nem publicado tal registo.
Por isso, deve considerar-se regular a citação da sociedade "A", feita na pessoa do recorrente.
Nestes termos, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo agravante.
Guimarães, 26 de Maio de 2004