INDICAÇÃO DE PROVA
MEIOS DE PROVA
NULIDADE
NULIDADE SANÁVEL
ADIAMENTO
TESTEMUNHA
PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL
Sumário

I - Nos termos do artº 283° do CPPenal (als. d. e f.) a acusação contém, sob pena de nulidade, o rol, com o máximo de vinte testemunhas e a indicação de outras provas a produzir ou a requerer.

II - A nulidade que a lei prevê, porque não prevista no elenco taxativo do art. 119º do CPPenal, depende de arguição cfr. art. 120° do citado código, a qual deverá ser feita cinco dias (aceitando-se que é defensável que o poderá ser no prazo geral de dez dias) após a notificação do despacho que designar dia para julgamento, cfr. art. 120° n° 3 al. b) do CPPenal, o que não aconteceu no presente caso, pois que, efectivamente, no despacho que saneou o processo não e feita qualquer referência à nulidade em causa e posteriormente nada é arguido a esse propósito.

III - Tendo em consideração a regra geral de que as nulidades dependentes de arguição ficam sanadas se não forem arguidas no prazo legal (a este propósito, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 2002, pág. 88) a nulidade de que padecia a acusação em causa foi sanada no decurso do processo pelos motivos acima expostos (não foi invocada por quem tinha legitimidade para o efeito nem foi apreciada aquando do saneamento do processo).

IV - Consequentemente, estando vedado conhecer da dita nulidade na fase do julgamento, maxime porque sanada nos sobreditos termos, é juridicamente inadmissível, nesta fase, com tal fundamento, considerar a acusação manifestamente infundada, de harmonia com o preceituado nos arts. 311° nº 2 al. a) e nº 3 al. c), ambos do CPPenal.

Texto Integral

Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.
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O Magistrado do Mº Pº deduziu acusação, em processo comum e tribunal singular, contra "A" e "B" (ambos idºs no processo) imputando-lhes a prática, em co-autoria material, de um crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público p. e p. pelo art. 355º do CPenal.
O libelo acusatório foi omisso em relação a qualquer tipo de prova (documental ou testemunhal).
A sobredita acusação foi recebida e, consequentemente, foi designado dia para julgamento.
Procedeu-se a julgamento no qual os arguidos declararam não querer prestar declarações e o respectivo mandatário prescindiu do depoimento das testemunhas por si arroladas.
Dada a palavra a Magistrado do Mº Pº e ao mandatário dos arguidos foi designado dia para a leitura da sentença.
No dia designado para a leitura da sentença o Mº Juiz proferiu o seguinte despacho:
“Verifica-se que da douta acusação pública de folhas 90 a 92, não consta qualquer prova que fundamente tal acusação.
Assim sendo, de harmonia com o disposto no artigo 311º nº 2 al. a) e nº 3 al. c) do CPPenal, considero tal acusação manifestamente infundada e, em consequência, determino que os presentes autos sejam remetidos à unidade de apoio junto deste tribunal a fim do Digno Magistrado do Mº Pº porceder ao que tiver por conveniente. Notifique e oportunamente dê a competente baixa dos autos”.
Os arguidos interpuseram recurso do supra referido despacho e apresentaram as seguintes conclusões:
1) O despacho recorrido é nulo nos termos dos artigos 379º, nº 1, al. c) e 374º nºs 2 e 3 do CPP;
2) O despacho recorrido é nulo por violação directa dos arts. 18º nº 1 e 29º nº 5 da CRP;
3) Resulta do texto da decisão recorrida que não se provou qualquer facto da acusação, pelo que deveria ter sido pronunciada sentença que absolvesse o arguido nos termos dos arts. 374º nºs 2 e 3 do CPP;
4) O tribunal de recurso tem todos os elementos no texto da decisão recorrida, de facto e de direito, que lhe permitem declarar nulo o despacho recorrido e proferir douto acórdão que absolva os arguidos.
O Magistrado do Mº Pº pronunciou-se no sentido da procedência do recurso cfr. fls 145 a 147.
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Em suma, a questão que se coloca tem a ver com a circunstância de saber se é técnico - juridicamente admissível, na fase de julgamento, considerar a acusação manifestamente infundada, de harmonia com o preceituado nos arts. 311º nº 2 al. a) e nº 3 al. c ambos do CPPenal, como o fez o Mº Juiz ao proferir o despacho acima transcrito.
As supra citadas disposições legais têm a ver com a fase do saneamento do processo e pressupõem a não existência de instrução.
Neste contexto, recebidos os autos no tribunal o presidente despacha no sentido de rejeitar a acusação quando, nos termos das disposições legais citadas, a considerar manifestamente infundada (é manifestamente infundada quando não indique as provas que a fundamentam, como aconteceu no presente caso).
Pelo exposto, o poder que o Juiz tem de rejeitar a acusação com o fundamento em causa é privativo da fase de saneamento do processo e nenhuma disposição legal lhe atribui esse poder noutra fase processual designadamente na fase do julgamento.
Nos termos do art. 283º do CPPenal (als. d. e f.) a acusação contém, sob pena de nulidade, o rol com o máximo de vinte testemunhas e a indicação de outras provas a produzir ou a requerer.
A nulidade que a lei prevê, porque não prevista no elenco taxativo do art. 119º do CPPenal, depende de arguição cfr. art. 120º do citado código.
A arguição deverá ser feita cinco dias (aceita-se que é defensável que o poderá ser no prazo geral de dez dias) após a notificação do despacho que designar dia para julgamento, cfr. art. 120º nº 3 al. b) do CPPenal, o que não aconteceu no presente caso.
Efectivamente, no despacho que saneou o processo não é feita qualquer referência à nulidade em causa e posteriormente nada é arguido a esse propósito.
Tendo em consideração a regra geral de que as nulidades dependentes de arguição ficam sanadas se não forem arguidas no prazo legal (a este propósito, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 2002, pág. 88) a nulidade de que padecia a acusação em causa foi sanada no decurso do processo pelos motivos acima expostos (não foi invocada por quem tinha legitimidade para o efeito nem foi apreciada aquando do saneamento do processo).
Consequentemente, estava vedado conhecer da dita nulidade na fase do julgamento maxime porque sanada nos sobreditos termos.
Fica prejudicada, assim, a apreciação das demais questões suscitadas nas conclusões do recurso.
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Nestes termos, dá-se provimento ao recurso interposto, revoga-se o despacho recorrido e determina-se que seja substituído por outro que oriente os autos para a prolação da sentença.
Sem tributação.
Guimarães, 11/04/04