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SUBSTÂNCIAS EXPLOSIVAS
DETENÇÃO DE ENGENHO OU MATÉRIA EXPLOSIVA
Sumário
I – A detenção e lançamento de foguetes (engenho de pirotecnia) não equivale à detenção de «substância explosiva», não integrando, pois, o crime previsto no artº 275º, nº 1 do CPenal. II – A detenção, o transporte ou o uso de engenhos pirotécnicos, sem autorização para o efeito, só constitui crime, nos termos dos nºs 1 e 2 da Lei nº 8/97, de 12 de Abril, quando ocorrer em estabelecimento de ensino ou recinto onde ocorra manifestação cívica, política, religiosa, artística, cultural ou desportiva. III – No mais, o lançamento de foguetes, sem se estar munido de licença concedida pela autoridade policial, constitui a contra-ordenação mencionada na sentença recorrida, ou então, integra a contra-ordenação p. p. pelos artºs 22º e 29º, nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 156/2004, de 30 de Junho, se o lançamento ocorrer em «espaço rural», «durante o período crítico».
Texto Integral
Recurso nº 416/2006
Acordam, em audiência, os Juízes da Relação de Guimarães.
No 1º Juízo, do Tribunal Judicial da comarca de Ponte de Lima, procº nº 228/03.1TAPTL, os arguidos J, JV e JC, todos com os demais sinais dos autos, foram submetidos a julgamento, em processo comum e com intervenção do tribunal singular, tendo a final sido proferida sentença, que a todos absolveu da prática do crime p. P. pelo artº 275º, nº 1 do C. Penal. ***
Inconformado com a sentença, interpôs o Ministério Público o presente recurso, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:
“ 1 - O artigo 275º, nº 1 do Código Penal pune “ quem importar, fabricar ou obtiver por transformação, guardar, comprar, vender, ceder ou adquirir a qualquer título ou por qualquer meio, transportar, vender, distribuir, detiver, usar ou trouxer consigo (…) substância explosiva (…), fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente”.
2 - Por seu turno, o artigo 25º do regulamento sobre a fiscalização de produtos explosivos dispõe: “constitui contra-ordenação a violação dos preceitos legais e regulamentares sobre produtos explosivos (…)”
3 - Aparentemente as previsões estabelecidas nestes dois artigos, a punição, reconduzem-se à mesma realidade.
4 - Neste caso, estabelece o artigo 20º do Decreto – Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, Regime Geral das contra-ordenações e coimas, que “ se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, será o agente punido a título de crime.
5 - No entanto os artigos 275º e 25º não se reconduzem à mesma realidade.
6 - O artº 25º pune como contra-ordenação qualquer violação dos preceitos legais e regulamentares sobre produtos explosivos, enquanto o artº 275º, nº 1 do Código Penal, pune apenas a violação de um interesse administrativo que coincida, pela sua importância, e pelo seu relevo para a segurança da colectividade, com o ponto de vista penal, ou seja, que mereça a tutela penal.
7 - A actuação dos arguidos, ao comprar, transportar, deter e lançar os foguetes, violou as condições legais estabelecidas – artº 38º
8 - O interesse administrativo perseguido com o estabelecimento das condições legais referentes à compra, transporte, guarda, detenção, uso e lançamento de foguetes, coincide, pela sua importância, e pelo seu relevo para a segurança da colectividade, com o ponto de vista do direito penal.
9 - A conduta dos arguidos preenche todos os elementos típicos da infracção criminal prevista e punível pelo artº 275º, nº 1 do Código Penal.
10 - Não obstante o tribunal a quo entendeu que os factos praticados pelos arguidos não se subsumem à norma prevista no artº 275º, nº 1 do Código Penal, mas antes à norma do artº 25º do Regulamento sobre a fiscalização de produtos explosivos aprovado pelo Decreto-Lei nº 376/84, de 30 de Novembro, com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 474/88, de 22 de Dezembro.
11 - Decidindo como decidiu, o tribunal violou o disposto nos artigos 275º, nº 1 do código penal e 25º do Regulamento sobre a sobre a fiscalização de produtos explosivos aprovado pelo Decreto-Lei nº 376/84, de 30 de Novembro, com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 474/88, de 22 de Dezembro.” ***
O recurso foi admitido.
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Responderam os arguidos José A... e José R..., opinando ambos no sentido da improcedência do recurso.
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Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer também no sentido do não provimento do recurso.
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Foi cumprido o artº 417º, nº 2 do CPP, não tendo sido apresentada resposta.
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Colhidos os vistos legais, e realizada a audiência de julgamento com observância do legal formalismo, cumpre decidir. Factos provados constantes da sentença recorrida (transcrição): “Os arguidos constituíam a comissão encarregada de organizar, no ano de 2003, as festas de S. Cristóvão, festas a ter como centro a Capela erigida em honra deste, sita no Lugar do mesmo nome Fontão, Ponte de Lima. Em data não concretamente apurada, mas durante o ano de 2003, os arguidos – de acordo com um projecto comum e previamente por eles elaborado como mordomos da comissão de festas – compraram cerca de uma dúzia (12) de artefactos pirotécnicos, feitos à base de pólvora, destinados a provocar estampido sonoro depois de lançados ao ar e vulgarmente conhecidos por foguetes, com o fim de proceder ao seu lançamento na cerimónia de hastear da bandeira, a qual dava início às festividades em honra do S. Cristóvão. Na prossecução dos respectivos intentos e a seu mando, foram aqueles foguetes transportados e depositados – ficando a cargo dos arguidos, pelo menos um dia – nas imediações da referida Capela de S. Cristóvão. Pelas 12.00 horas, do dia 22 de Junho de 2003, os arguidos – dando inicio às festas – ordenaram o lançamento dos foguetes, foguetes que no seguimento desta ordem dada pelos arguidos, e só por causa dela, de acordo com as instruções que dela provinham, foram todos lançados por pessoa cuja identidade não se apurou, tendo todos deflagrado. Fizeram-no sem que para o efeito possuíssem as autorizações administrativas necessárias. Os arguidos conheciam o carácter explosivo dos artefactos pirotécnicos que adquiriram, armazenaram, lançaram e fizeram explodir. Sabiam também que por tal motivo tais condutas estavam dependentes de autorizações das autoridades administrativas, não se coibindo de as levar a cabo. Agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito comum e conjuntamente concretizado de comprarem, transportarem para a festa, aí armazenarem e depois fazerem deflagrar os referidos foguetes. Os arguidos não desconheciam o carácter ilícito e criminalmente censurável das respectivas condutas. O arguido José R... aufere mensalmente a quantia de € 500,00. A mulher trabalha, auferindo a quantia de € 400,00. Tem uma filha estudante a seu cargo. Vive em casa própria. Tem a 4ª classe. Não tem antecedentes criminais. O arguido José V... aufere mensalmente a quantia de € 400,00. A mulher aufere a quantia de € 300,00. Tem dois filhos menores a seu cargo. Vive em casa da mãe. Tem o 2º ano. Não tem antecedentes criminais. O arguido José R... aufere mensalmente a quantia de € 500,00. A mulher aufere a quantia de € 300,00. A filha é menor. Vive em casa da mãe. Não tem antecedentes criminais. Os arguidos são considerados pessoas de bem e trabalhadoras e são respeitadas.”
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Como sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. – cfr. artº 412º, nº 1 do Cód. Proc. Penal. In casu o recurso interposto versa exclusivamente matéria de direito, sendo que a única questão trazida à apreciação desta Relação é a de saber se a factualidade provada integra o crime da previsão do artigo 275º, nº 1, do Cód. Penal, como defende a Digna Magistrada do Ministério Público recorrente.
E a resposta a tal questão só pode ser negativa.
Contrariamente ao que parece entender a recorrente (cfr. conclusão 1ª), não está em causa a detenção de «substância explosiva», mas sim a detenção e lançamento de foguetes (engenho de pirotecnia).
Ora, a detenção, o transporte ou o uso de engenhos pirotécnicos, sem autorização para o efeito, só constitui crime, nos termos dos nºs 1 e 2 da Lei nº 8/97, de 12 de Abril, quando ocorrer em estabelecimento de ensino ou recinto onde ocorra manifestação cívica, política, religiosa, artística, cultural ou desportiva.
No mais, o lançamento de foguetes, sem se estar munido de licença concedida pela autoridade policial, constitui a contra-ordenação mencionada na sentença recorrida, ou então, integra a contra-ordenação p. p. pelos artºs 22º e 29º, nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 156/2004, de 30 de Junho, se o lançamento ocorrer em «espaço rural», «durante o período crítico».
Em suma, nenhum reparo merece a sentença recorrida ao absolver os arguidos do crime previsto e punido no artº 275º, nº 1 do Código Penal que lhes vinha imputado.
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Decisão:
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Sem tributação.