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COMPROPRIEDADE
DIREITO DE RETENÇÃO
Sumário
I – Pertencendo o imóvel (casa de habitação) a várias pessoas, é lícito a qualquer destas usá-lo em seu benefício, mas apenas, e designadamente, quando tal não prive os demais donos do uso a que também têm direito. II – Não podendo a coisa comum (casa de habitação) ser habitada de igual forma por todos os comproprietários, procede o pedido de desocupação formulado contra o comproprietário habitante. III – A habitação exclusiva do imóvel por parte de um comproprietário, privando os demais titulares da propriedade de idêntica habitação, não é lícita, pelo que o habitante não goza do direito de retenção por benfeitorias feitas no prédio.
Texto Integral
Recurso nº 1102/06 Apelação
Tribunal recorrido: 5º Juízo Cível da comarca de Guimarães. Processo nº 3595/04.
** Acordam em conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães:
A e marido, B, e C e mulher, D, intentaram, pelo tribunal da comarca de Guimarães, acção contra E peticionando que se lhes reconhecesse o seu direito de compropriedade sobre o prédio a que aludem, e se condenasse a R. a desocupar esse prédio.
Alegaram para o efeito, em síntese, que os AA. A e C, conjuntamente com a R. e um terceiro, todos irmãos, são donos do prédio urbano que especificam. Sucede que a R. habita tal prédio, sendo que os AA. não estão, nem nunca estiveram, de acordo com tal uso. Os AA. encontram-se privados de usar o prédio, pois que não é possível a qualquer dos comproprietários estabelecer nele a sua morada em regime de independência, privacidade e exclusividade. Considerando que à R., como comproprietária, só seria lícito servir-se do prédio, objecto da compropriedade, desde que não privasse os outros consortes de idêntico uso, segue-se que a mesma R. está obrigada a abster-se de usar o prédio, desocupando-o e deixando-o livre de pessoas e coisas.
Contestou a R., concluindo pela improcedência da acção.
Alegou, em síntese, que ocupa o prédio mediante contrato de comodato que celebrou com os demais comproprietários, de sorte que não tem que abrir mão do mesmo. Acresce que fez obras no prédio, que custeou, pelo que goza do direito de retenção pelo crédito daí emergente. Mais deduziu reconvenção, peticionando a condenação dos AA. no reconhecimento do seu direito de compropriedade sobre o prédio, bem como no reconhecimento do alegado contrato de comodato, sem prejuízo do direito de direito de retenção pelas benfeitorias que realizou no prédio.
A final foi proferida sentença que julgou procedente acção e reconvenção no tocante ao reconhecimento do direito de compropriedade invocado, e improcedentes no mais.
Inconformados com o assim decidido, apelam os AA..
A R. recorreu subordinadamente.
A R. contra-alegou no recurso principal, concluindo pela improcedência do mesmo.
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Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo-se em atenção que é pelo teor das conclusões que se determina o âmbito do conhecimento deste tribunal ad quem.
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Da apelação interposta pelos AA.:
São as seguintes as conclusões que os apelantes extraem da sua alegação:
1ª. O direito que cada consorte tem ao uso da coisa em cuja compropriedade comungam está limitado pelo fim a que ela se destina e pelo direito dos demais a idêntico uso.
2ª. Na impossibilidade de uso autónomo de partes da coisa por cada um dos consortes, na proporção das suas partes, a administração da coisa cabe aos consortes, nos termos do disposto no artigo 1407° do CCiv
3ª. Assim, o direito de um com proprietário a residir numa casa de habitação tipo unifamiliar, só é possível desde que consentido pelos demais consortes ou, pelo menos, pela maioria deles e que representem, no mínimo, metade do valor da casa.
4ª. Nos autos está provado que os AA.. não consentem que a R. utilize o prédio ajuizado como residência dela,
5ª. e não provou a R. qualquer convénio de que pudesse resultar legitimidade para que nele resida.
6ª. A douta sentença recorrida, reconhecendo que não seria fácil que AA. e R. possam viver simultaneamente na casa, faz improceder a acção, com o fundamento de que não foi alegado, e por isso não foi provado, que os AA. tivessem sido impedidos do uso do prédio.
7ª. Tal decisão viola o disposto nos artigos 1406°, 1, última parte, e 1407°, 1, do CCiv.
8ª. Ao considerar legítimo o uso da casa dos autos como residência da R., sem consentimento dos AA., e sem que tenha a falta desse consentimento sido suprida, violou a douta Sentença recorrida o disposto no n° 2 do referido art. 1407°.
9ª. Independentemente do que vem de concluir-se, sempre seria inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 26° n° 1 e 65°, n° 1 da Constituição da República, a interpretação do n° 1 do art. 1406º do CCiv, no sentido de que qualquer com proprietário tem o direito de utilizar casa de habitação unifamiliar como sua residência, pois que isso não impede os demais comproprietários, individualmente ou com os seus núcleos familiares, igualmente aí habitarem, pois tal contraria o direito de todos e cada um à privacidade e intimidade que aquelas normas constitucionais lhes consagram.
Terminam dizendo que deve ser dado provimento à apelação, dando-se procedência à acção, seja por directa aplicação dos citados preceitos do CCivil, seja, o que subsidiariamente requerem, por ocorrer a alegada inconstitucionalidade.
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São os seguintes os factos que a sentença recorrida elenca como provados:
1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães, sob o nº 00393..., freguesia de Candoso (S. Tiago), o prédio Urbano sito no lugar de B..., composto por casa de rés-do-chão e andar, com a área de 200 m2, logradouro com 400 m2 e anexos com 80 m2, inscrito na matriz sob o artigo ....
2. A propriedade de tal prédio encontra-se inscrita em favor de A, C, E e ainda de F, na proporção de 3/32 para cada um e de 20/32 em comum, conforme inscrições G-2, apresentação 15 a 18/950720 e 0-6, apresentação 41/04112003;
3. A ré vive e sempre viveu nesse prédio para habitar;
4. Para além do identificado prédio, a R. não dispõe de qualquer outro para habitar;
5. A ré procedeu à pintura dos muros exteriores do referido prédio;
6. No prédio identificado em 1., e na parte do rés-do-chão, existe, neste momento, um quarto, uma cozinha e uma sala, sendo ainda que os anexos têm acesso independente do interior da casa;
7. No 1 ° andar existem 3 quartos e duas casas de banho sendo que, no anexo, existe também uma cozinha e um quarto;
8. A ré, de todos os filhos, era a que dava mais apoio ao pai, quando este estava na casa descrita em 1., nomeadamente nos últimos meses de vida;
9. Na plantação de relva no jardim da casa a ré despendeu a quantia de 1.113 €.
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Quanto à matéria das conclusões 1ª a 8ª:
Os apelantes contestam aqui o tratamento jurídico-substantivo que, face aos factos provados e supra transcritos, foi dado à sua pretensão na sentença recorrida.
Entendem que a acção devia ter procedido também na parte em que improcedeu.
A nosso ver têm razão.
Mostra-se que AA., R. e um terceiro (F), são contitulares, em igual medida (8/32), do direito de propriedade sobre o prédio em causa. Trata-se de um prédio urbano, em cujo rés-do-chão existem um quarto, uma sala, uma cozinha e um anexo (onde há uma cozinha e um quarto), enquanto que no primeiro andar existem três quartos e duas casas de banho.
A R. habita este prédio, com o seu agregado familiar.
Portanto, a R. faz uso da coisa comum, traduzindo-se este uso justamente, como observam Pires de Lima/Antunes Varela (v. Código Civil Anotado, III, anotação ao artº 1406º), na utilização directa da coisa ou no aproveitamento imediato das aptidões naturais dela.
Rege no caso o artº 1406º, nº 1 do CC.
Deste normativo resulta que relativamente ao uso se admite o princípio da solidariedade: a cada um dos comproprietários, seja qual for a sua quota, é lícito servir-se da coisa, podendo utilizar-se dela na totalidade e não apenas em parte. Mas esta possibilidade de uso integral da coisa (como se o contitular fosse proprietário exclusivo) vale apenas como princípio supletivo. Pois que em primeiro lugar vale o que tiver sido acordado (por consenso unânime ou por deliberação da maioria dos consortes, nos termos em que esta decide sobre a administração da coisa [artº 1407º] pelos interessados). Na falta de acordo, vigora o princípio do uso integral da coisa, mas este princípio está sujeito a duas limitações: a que é imposta pelo fim da coisa e a que resulta da concorrência do direito dos demais consortes. Este segundo limite é ditado pela necessidade de facultar aos outros consortes a possibilidade de igualmente se servirem dela.
Com vista a justificar o uso que faz do prédio, a R. alegou que celebrou com os demais comproprietários contrato de comodato, nos termos do qual lhe ficou consentido habitar o prédio na forma como o faz.
Mas a verdade é que tal matéria factual não se provou, de sorte que não há qualquer acordo a levar em linha de conta em ordem a concluir pela legitimação e licitude do uso em causa.
Sendo inequívoco que os AA., como comproprietários, têm também direito ao uso da coisa, pergunta-se: o uso que a R. dá ao prédio priva os AA. do uso a que igualmente têm direito, sendo por isso ilícito tal uso?
A sentença recorrida, a despeito de expressamente reconhecer que, atentas as características do prédio, “será difícil que os quatro comproprietários possam viver, com as respectivas famílias, e ao mesmo tempo, no prédio”, e que “não poderemos dizer que os quatro comproprietários, por si, possam fazer a sua vida no prédio em causa”, acaba, contraditoriamente, por dar uma resposta negativa a esta questão.
Mas cremos que não pode ser assim.
Da matéria de facto provada só uma resposta se nos antolha à mesma questão, e que é a afirmativa.
Efectivamente, da composição da casa resulta a nosso ver claro que não é possível o uso directo promíscuo ou simultâneo (conforme terminologia de Pires de Lima/Antunes Varela, ob. e loc. cit.) da mesma por parte da R. e dos AA. (a que haverá naturalmente que adicionar o uso a que o quarto comproprietário também tem direito). Pois que vemos que o objecto da compropriedade é uma casa de habitação tipo unifamiliar, não proporcionando (tanto mais que, conforme reconhece a R. na sua contra-alegação ali também passaram a residir o comproprietário Vítor e respectiva companheira) por isso a autonomização, independência e privacidade ou reserva da intimidade da vida familiar, que são direito de quem ali tenha o direito de habitar, na circunstância os AA.. Como ainda observam Pires de Lima/Antunes Varela (ob. e loc. cit.), a nenhum comproprietário pode ser imposto o dever de coabitar com os demais, de sorte que o comproprietário afectado pode opor-se à coabitação com o fundamento de que o uso pretendido ou exercido pelos outros o priva do direito que ele tem a usar também da coisa. Nestes casos, mais adiantam os citados autores, o único recurso a adoptar, na falta de acordo, será o do gozo indirecto, que consistirá em regra na locação da coisa (nada obstando que o locatário seja um dos comproprietários), com a consequente repartição dos proventos dela entre os consortes. Recurso este que, porém, não vem invocado nestes autos por qualquer das partes. Dentro da mesma linha, salienta Carvalho Fernandes (v. Lições de Direitos Reais, 4ª ed., pág. 341) que quando a coisa não permita o uso simultâneo de todos os comproprietários, as alternativas, na falta de acordo, são as de não permitir o uso por parte de qualquer dos comproprietários e a de encontrar uma solução sucedânea da prevista na lei, que poderá ser a de o comproprietário que venha a ter o uso exclusivo compensar os demais pelo valor do uso que exceda a sua quota (efeito este, voltamos a repetir, que não vem feito actuar por qualquer das partes nos presentes autos).
Procedem pois as conclusões em destaque.
O que significa que se impõe compelir a R. a reconhecer o direito de compropriedade dos AA. e a abster-se de usar o prédio como sua habitação, com a consequente obrigação de o desocupar.
Quanto à matéria da conclusão 9ª:
Como resulta da parte final da alegação de recurso, a inconstitucionalidade aludida em tal conclusão é invocada a título (ou como fundamento) meramente subsidiário, isto para o caso de não lograr procedência o recurso por aplicação designadamente do artº 1406º do CC.
Desde que logra procedência o recurso à luz de tal normativo, segue-se que fica prejudicada a aferição da bondade da decisão recorrida à luz da suposta inconstitucionalidade (artºs 660º,nº 2 e 713º nº 2 do CPC), pelo que com esta temática não vamos perder tempo.
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Do recurso subordinado interposto pela R.:
São as seguintes as conclusões que a R. extrai da sua alegação:
1ª.O Tribunal a quo, na sentença, não fundamentou a matéria de facto dada por provada, nem, tão pouco, fez qualquer referência ao exame crítico das provas que lhe incumbia conhecer, conforme estatui o n° 3 do artigo 659° do Código de Processo Civil.
2ª. A fundamentação da sentença é indispensável em caso de recurso para a Recorrente confirmar ou abalar as provas e para o Tribunal da Relação - na reapreciação da causa - aferir dos meios probatórios que imponham decisão diversa da recorrida.
3. A sentença é nula, pois falta, em absoluto, a indicação dos fundamentos dos pontos 6., 7. 8. e 9. dados por provados e o exame crítico das provas, pelo que a decisão em crise violou o disposto nos artigos 659°, nº 3, 668°, nº 1, alínea b) e 158°, todos do Código de Processo Civil.
4. Relativamente aos pontos 6., 7., 8., 9. (FACTOS PROVADOS) e quesitos 5º. 9º. 10º, 17º, FACTOS NÃO PROVADOS), as testemunhas: Maria das D..., Maria E..., Maria L... e Vítor M... foram unânimes ao referir que no prédio em questão foram efectuadas pinturas e arranjos no jardim, maxime a colocação de relva nova.
5ª. Igualmente, as testemunhas Maria das D... e Vítor M... afirmaram que moram na casa duas famílias, a primeira acrescentou que são 6 pessoas e que a habitação apresentava humidade, tendo a testemunha Vítor concretizado as reparações efectuadas.
6ª. Deve, deste modo, ser decidido, diversamente da recorrida, no seguintes termos, atento o depoimento das testemunhas: a) Maria das D... (cassete nº 1 lado A); b) Maria E... (cassete nº 1 lado A); c) Rosa da L... (cassete nº 1 lado B); d) Vítor M... (cassete nº 1 lado B e cassete n. ° 2, lado A), por provado que: Quesito 5° - A pintura dos muros exteriores do prédio identificado em A) encontrava-se degradada. Quesito 8º - As telhas do prédio identificado em A) encontravam-se partidas. Quesito 9º - Os tectos apresentavam humidade. Quesito 10º - Os sanitários estavam entupidos. Quesito 17º de forma restritiva - Nas obras referidas em D) e 12º a ré despendeu uma quantia não determinada.
Sem prescindir,
7ª. Sempre teria a Ré, nos termos do disposto no artigo 754º do Código Civil, direito de retenção sobre o prédio atento o seu crédito relativo às obras.
8ª. Nestas obras a Ré na qualidade de proprietária despendeu uma quantia de dinheiro não apurada, mas superior a € 1.113, pois este apresentava condições de degradação.
Termina dizendo que deve declarar-se a nulidade da sentença, alterar-se a matéria de facto nos termos supra referidos, e caso o recurso dos AA. mereça provimento, declarar-se o direito de retenção da Ré.
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Quanto à matéria das conclusões 1ª a 3ª:
Sustenta aqui a recorrente a nulidade da sentença, por nela se não ter motivado ou procedido ao exame crítico das provas, isto relativamente às respostas dadas a certos quesitos da base instrutória.
Carece de razão a recorrente.
Não é na sentença que compete proceder à motivação do julgamento da matéria de facto inserida na base instrutória e ao exame crítico das provas atinentes aos factos insertos na base instrutória, mas sim no despacho a que alude o artº 653º do CPC. Qualquer ineficiência que se registe quanto à bondade da motivação é colmatada, a requerimento da parte, nos termos do nº 5 do artº 712º do CPC. E quanto à actuação deste normativo nada vem requerido pela apelante.
Certo que o nº 3 do artº 659º do CPC, invocado pela recorrente, manda que na sentença se deve fazer o exame crítico das provas.
Mas há que ver que este exame crítico tem por objecto, como nos ensina Alberto dos Reis (v. Código de Processo Civil Anotado, V, pág. 33), não as provas susceptíveis de livre apreciação do juiz, mas unicamente a prova dotada de força probatória legal plena: a prova por documentos que possuam tal força probatória, o acordo das partes e a confissão reduzida a escrito, produzidos subsequentemente ao momento da “especificação”. Ora, in casu nenhuma prova deste tipo foi produzida subsequentemente ao despacho onde se elaborou a “especificação”, pelo que é óbvio que nenhum exame crítico podia a propósito dessa prova inexistente ser feito.
Errada vem também a invocação do artº 668º, nº 1 b) do CPC. É que os fundamentos de facto que aí são referidos consistem apenas na discriminação ou enumeração dos factos provados, e não na fundamentação (motivação) das respostas dadas aos pontos da base instrutória. De resto, expressamente nos ensina Antunes Varela (v. Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 698) que a falta do exame crítico das provas nunca dá azo à nulidade do artº 668º, nº 1 b).
Mas, sem embargo do que fica dito, julgamos que o tribunal a quo fundamentou suficientemente o julgamento da matéria de facto, como resulta do despacho de fls 118. Se acaso essa fundamentação não surge a contento da recorrente, isso obviamente que não representa qualquer falta de fundamentação ou de exame crítico das provas.
Improcedem pois as conclusões em destaque.
Quanto à matéria das conclusões 4ª a 6ª.
Impugna-se aqui o julgamento da matéria de facto inserida nos quesitos 5º, 8º, 9º, 10º e 17º.
Convoca a recorrente para o efeito de alcançar tal modificação o mérito dos depoimentos das testemunhas Maria das D..., Maria E...., Rosa da L... e Vítor M.... Segundo ela, dos depoimentos destas testemunhas teria resultado a prova da realidade dos factos a que se referem tais quesitos.
Nada impede que esta Relação escrutine o julgamento da matéria de facto em causa, pois que os depoimentos se mostram gravados (artº 712º, nº 1 a) do CPC).
Revisitada para o efeito a prova testemunhal aludida pela recorrente, temos a dizer que consideramos manifesta a sua falta de razão.
Com tais quesitos procurou-se saber se o prédio necessitava de certas reparações e pinturas e se a R. as custeou.
Ora, a testemunha D... declarou não ter conhecimento da realização pela R. de quaisquer obras. Tudo o que sabe é que a R. procedeu ao “ajeitar” do jardim e relva e que ouviu dizer (mas não se sabe a quem) que o marido da R. teria procedido à pintura dos muros.
A testemunha E... declarou que da última vez que entrou na casa a mesma aparentava precisar de “manutenção”. Nada disse em concreto quanto à feitura das obras em causa.
A testemunha Rosa declarou nada saber sobre obras feitas, até porque não é propriamente frequentadora da casa.
A testemunha Vítor (comproprietário e irmão das partes) declarou que foram feitas as reparações e pintura aludidas nos quesitos. Mas, como bem fez o tribunal a quo, não há que dar valor decisivo a este testemunho, na medida em que parte de pessoa que tem manifesto interesse pessoal na causa (vive conjuntamente com a R. no prédio em questão, como expressamente declarou, e é reconhecido pela R. na sua contra-alegação à apelação interposta pelos AA.). De resto, a testemunha revelou não estar de boas relações com os AA. (disse que não se cumprimentaram aquando da audiência de julgamento, e que só falava com a R.), o que obriga a sopesar com redobradas cautelas o seu depoimento. Na falta de outros elementos probatórios que, cruzados, abonem a bondade deste depoimento, não há senão que lhe opor as maiores reservas, não lhe dando crédito.
Perante este cenário probatório, julgamos que bem andou o tribunal a quo ao ter respondido aos quesitos em causa da forma como respondeu, por isso que não foi apresentada prova minimamente consistente e credível da realidade dos factos neles insertos.
Improcedem pois as conclusões em destaque.
Quanto à matéria das conclusões 7ª e 8ª:
Pretende a apelante que goza do direito de retenção sobre o prédio para garantia do crédito emergente de benfeitorizações feitas no mesmo.
Inicialmente (na reconvenção) sustentou juridicamente esta sua pretensão no artº 755º, nº 1 e) do CC; agora, na alegação de recurso, invoca o artº 754º.
Não se prova que a R. venha usando o prédio como comodatária, pelo que não lhe aproveita, como aliás está tacitamente admitido na alegação, aquele primeiro normativo.
Mas aproveita-lhe o artº 754º?
Sabe-se que a R. procedeu à pintura dos muros exteriores e plantou relva no jardim (não se provou que tenha feito as demais obras que disse ter feito). Podemos dar de barato que daqui emerge um direito de crédito para a R..
Mas como a própria recorrente mostra saber (v. ponto 3 da sua alegação), para que exista direito de retenção nos termos do artº 754º do CC é necessário que o respectivo titular detenha licitamente a coisa.
Ora, não é o que se passa in casu. Pois que já vimos que a ocupação (detenção) que a R. faz do prédio não é lícita. E é justamente por não ser lícita, que procede a pretensão dos AA..
Donde, não goza a apelante do falado direito de retenção.
Improcedem pois estas conclusões.
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Decisão:
Pelo exposto, acordam os juízes nesta Relação em:
a) Julgar procedente a apelação interposta pelos AA., e, em consequência, revogando correspectivamente a sentença recorrida, condenam a R. a reconhecer o direito de compropriedade dos AA. e a desocupar o prédio;
b) Julgar improcedente o recurso subordinado, confirmando correspectivamente a sentença recorrida.
Regime de Custas:
Custas de recurso e de 1ª instância pela Ré, que nelas é condenada.