MEIOS PROCESSUAIS COMUNS
ARTIGO 119
Nº 4 DO CÓDIGO DE REGISTO PREDIAL
ACÇÃO PAULIANA
REGISTO DA PENHORA
REGISTO PROVISÓRIO
REGISTO DEFINITIVO
Sumário


I – Os “meios processuais comuns” a que se refere o artigo 119º, n.º 4 do Código de Registo Predial são as acções em que se discute a titularidade do bem inscrito em nome de pessoa diversa do executado e não a acção de impugnação pauliana. II – A procedência desta confere ao exequente o direito de executar o bem sobre que incidiu o acto impugnado no património do adquirente, entretanto chamado a intervir na execução pendente. III – O registo da penhora efectuada nessas circunstâncias deve ser lavrado como definitivo e não, à semelhança do primitivo, entretanto caducado, como provisório por natureza, apesar de subsistir a inscrição a favor do adquirente, vencido na acção pauliana.

Texto Integral



Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO:

No processo de execução para pagamento de quantia certa que “Carnes – F. C. & Filhos, Lda” instaurou contra J. C. e mulher, M. C., foi exarado, com data de 12 de Maio de 2010, o seguinte despacho:
Dispõe o art.º 92,2,a) CRPredial (Provisoriedade por natureza) que - Além das previstas no número anterior, são ainda provisórias por natureza: a) As inscrições de penhora, de declaração de insolvência e de arresto, se existir sobre os bens registo de aquisição ou reconhecimento do direito de propriedade ou de mera posse a favor de pessoa diversa do executado, do insolvente ou do requerido.
Não implica, no entanto tal preceito, que nestes autos se tenha que cumprir o disposto no art.º 119, 1 CRPredial.
E isto porque a acção pauliana, de onde provém o direito do exequente, se não trata de acção de nulidade. Os bens continuam em poder e na propriedade do terceiro, mas o impugnante pode, além de praticar os actos de conservação da sua garantia, executar os bens alienados no património de terceiro onde se encontram, como se eles não tivessem saído do património do devedor, na medida do necessário para satisfação do seu crédito, sem sofrer a competição dos credores do adquirente ou do devedor, uma vez que a procedência da pauliana só ao impugnante aproveita – 616º, nº 4 CC.
Com a pauliana não visa a lei atacar a validade do acto mas antes garantir o credor; por isso deixa intacto o acto na medida excedente ao necessário à satisfação do credor requerente.
Trata-se, portanto, de uma acção pessoal com escopo indemnizatório - e não de uma acção de declaração de nulidade ou de anulação, ou de uma acção resolutória ou rescisória dos negócios realizados pelo devedor.
O STJ tirou AUJ no sentido de que a pauliana não está sujeita a registo - AUJ nº 6/2004, no DR IA de 14.7.2004.
O art. 3º, n.º 1, al. a) do CRP (redacção dada pelo Dec-Lei n.º 116/2005, de 4 de Julho), estabelece que a acção pauliana está sujeita a registo, embora, na al. b) do n.º 1 do art. 8º-A excepcione esta acção da obrigatoriedade do registo.
Assim, e em resumo, nada obsta ao prosseguimento da presente acção executiva, devendo entender-se o art.º 838,4 CPC no espírito do sistema, conjugando-o com a lei civil, quando cria uma acção tão específica como a pauliana.
Quanto à questão do registo da venda a efectuar, pode-se desde já adiantar que o mesmo não acarretará problemas, considerando o disposto no art.º 824,2 CC.
Cumpra-se o disposto no art.º 864 CPC. Notifique”.
Inconformada, M. M. interpôs recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões:
A) Na acção pauliana decidiu-se declarar o direito de 1/12 do prédio aqui em questão, que foi penhorado à ordem dos presentes autos, e do qual o executado era titular, restituído material e juridicamente, ao património do mesmo alienante e devedor;
B) Entendeu a sentença em questão que a escritura pública, celebrada em 13/03/01, entre o executado e sua mulher e M. M. e marido, A. A., constituía um acto que envolvia a diminuição da garantia patrimonial do crédito da exequente;
C) Ou seja, no âmbito deste processo o acto posto em causa consistiu no negócio escriturado pelos réus, conforme aliás decorre da página 9, 2º parágrafo, da sentença;
D) Sucede que, para além desta escritura, em 26/04/00 foi elaborado um termo de transacção no inventário que correu termos no 3º Juízo Cível deste Tribunal (processo 17/05) através do qual as partes declararam adjudicar a verba n.º 8 (o prédio aqui em causa) à interessada M. M., incluindo 1/12 de cada um dos outros interessados (entre eles o aqui executado), adjudicados no inventário por morte da mãe, Z. C.;
E) Essa transacção foi homologada (a fls. 409) através de sentença, já transitada em julgado. Ou seja, contrariamente ao que sucedeu com a escritura pública, celebrada em 13/03/01, a sentença referida no artigo anterior nunca foi posta em causa, nem pela exequente nem por qualquer outra pessoa, pelo que se mantém válida até aos dias de hoje, nos seus precisos termos;
F) Aliás, a totalidade do prédio encontra-se validamente registada a favor da referida M. M.. Deste modo, não pode a exequente querer penhorar um bem que é propriedade daquela M. M. para pagar uma divida do executado!
G) Face ao exposto, não pode a impugnação pauliana afectar o prédio da recorrente;
H) Por outro lado, segundo o art.º 818º CC, conjugado com o então art.º 56° n.º 2 CPC (actual art.º 54° NCPC) "o direito de execução pode incidir sobre bens de terceiros, quando estejam vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado";
I) Acrescenta o artigo 616º, n.º 1 CC que, julgada procedente a impugnação pauliana, o credor tem direito à restituição dos bens, na medida do seu interesse, assim como à execução deles no património do terceiro adquirente - ou seja, o credor pode instaurar execução directamente contra o adquirente dos bens. Se já estiver pendente a execução, o meio processual adequado será fazer intervir o terceiro através do incidente de intervenção;
J) Neste sentido, vide Joel Timóteo Ramos Pereira, in Prontuário de Formulários e Trâmites, volume IV, pag.ª 168, e 384 e segs, de acordo com o qual no caso de procedência da acção pauliana, esta, embora torne o acto ineficaz em relação ao credor, não o atinge na sua validade, é obrigatória a intervenção do terceiro na acção executiva;
K) O exequente não requereu a intervenção do terceiro na acção executiva, pelo que também por este motivo não pode a execução prosseguir.
L) Finalmente, independentemente de o registo da acção pauliana ser ou não obrigatório, tal facto não pode significar que na execução do crédito exequendo não se tenham de seguir as regras previstas para a execução, nomeadamente no que diz respeito à obrigatoriedade do registo da penhora sobre 1/12 do imóvel;
M) Conforme referiu o Ac. RL de 28/05/13 (Proc. 2094/08.1TBCSe-B.L1-7), disponível em www.dgsi.pt "o título obtido na impugnação não vale, só por si, para efeito de execução do crédito, devendo o título executivo, se o credor não dispuser ainda de documento com essa eficácia, ser obtido em acção declarativa de condenação, intentada contra o devedor. Para, a final, se concluir que os efeitos da impugnação pauliana apenas poderão ser atendidos na fase da execução, depois de o autor obter o título executivo do seu crédito."
N) No caso concreto, a sentença respeitante à acção pauliana decidiu declarar o direito de 1/12 do prédio aqui em questão, que foi penhorado à ordem dos presentes autos, e do qual o executado J. C. era titular, restituído material e juridicamente, ao património do mesmo alienante e devedor.
O) Consequentemente, a sentença não constituiu título executivo, sendo este as quatro letras de câmbio dadas à execução, pelo que esta terá de seguir a tramitação prevista no CPC, designadamente no que respeita à obrigatoriedade do registo da penhora;
P) Ora, como resulta dos autos, a exequente pretende penhorar 1/12 de um imóvel, concretamente de um prédio urbano descrito na CRP sob o n.º 801;
Q) Segundo o art.º 755º NCPC (anterior art.º 838° CPC) a penhora de bens imóveis faz-se por comunicação à conservatória do registo predial com o valor de apresentação registal (ver artigos 41º,48º n." 1 e 60º CRP);
R) Por sua vez, refere o n.º 4 do citado art.º 755º NCPC (à semelhança do que referia o anterior art.º 838º n.º 3 CPC) que "O registo provisório da penhora não obsta a que a execução prossiga, não se fazendo a adjudicação dos bens penhorados (...) podendo o juiz da execução, ponderados os motivos da provisoriedade, decidir que a execução não prossiga, se perante ele a questão for suscitada";
S) Mesmo considerando que em causa está um direito a bens indivisos, ainda assim a obrigatoriedade do registo se mantém. De facto, como refere o autor acima referido (na página citada e ainda na página 251) "A comunicação à conservatória é também o meio de efectuar a penhora de ( ... ) direito a bem indiviso sujeito a registo (art.º 862º n." 1)";
T) No caso concreto, não existe qualquer registo de penhora, pois o que existia caducou;
U) Consequentemente não pode a execução prosseguir sem o referido registo.
Não houve contra-alegações.
A Senhora Juiz a quo sustentou o despacho recorrido.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO:

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do NCPC).
No caso vertente, as questões a decidir que ressaltam das conclusões recursórias são as seguintes:
- saber se, para além da transmissão impugnada, a recorrente dispõe de outro título de aquisição do imóvel a que diz respeito o direito penhorado e que não foi apreciado na acção de impugnação pauliana e se tal inviabiliza o prosseguimento da execução contra ela;
- saber se, transitada em julgado a sentença que julgou procedente a impugnação pauliana deduzida contra a aludida transmissão, a recorrente devia ter sido chamada a intervir na execução pendente;
- saber se o prosseguimento da execução implica novo registo da penhora, por entretanto ter caducado o registo provisório lavrado.
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III. FUNDAMENTOS:

Os factos
Com interesse para a decisão há a considerar o seguinte circunstancialismo fáctico:
1 - Por apresentação datada de 6/11/2000, mostra-se inscrita a favor da ora recorrente e dos seus irmãos, V. C. e J. C., a aquisição, por sucessão na herança aberta por óbito de Z. C., de uma quota equivalente a ¼ do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …;
2 - Por apresentação datada de 14/3/2001, mostra-se inscrita a aquisição a favor da recorrente, por compra, da quota que, por virtude da partilha referida em 1), coubera no dito imóvel aos seus irmãos (1/12 para cada um, perfazendo as de ambos 1/6);
3 - Os restantes ¾ do mesmo imóvel foram adjudicados à recorrente por sucessão deferida em partilha extrajudicial e a correspondente aquisição mostra-se definitivamente inscrita no registo por apresentação datada de 14.3.2001;
4 - Após a instauração de execução cambiária para pagamento de quantia certa contra J. C. e mulher, que correu termos pelo extinto 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão sob o n.º 1473/05.0TJVNF, a exequente, “Carnes – F. C. & Filhos, Lda”, intentou acção de impugnação pauliana do negócio por via do qual aqueles transmitiram a favor da ora recorrente a quota de 1/12 que coubera ao executado marido na partilha da herança aberta por óbito de Z. C.;
5 - Transitada em julgado a sentença que julgou procedente essa acção, a exequente, por requerimento apresentado em 18 de Dezembro de 2009, promoveu o prosseguimento da execução pendente, mediante a venda do direito objecto do acto impugnado e que fora penhorado em 7 de Maio de 2001;
6 - Por apresentação datada de 12.2.2010 foi inscrita no registo a penhora de tal direito;
7 - Essa inscrição foi lavrada como provisória por natureza, nos termos do artigo 92º, n.º 2, alínea a), do Código de Registo Predial (o direito de propriedade sobre o imóvel, incluindo o direito penhorado, encontrava-se inscrito em nome de pessoa diversa do executado, concretamente a ora recorrente).
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O direito
Como se adiantou em sede de delimitação do objecto do recurso, a recorrente sustenta que a acção executiva não pode prosseguir, além do mais, porque, para além da transmissão impugnada, dispõe de outro título de aquisição da totalidade do imóvel a que diz respeito o direito penhorado e que não foi apreciado na acção de impugnação pauliana e bem assim porque, transitada em julgado a sentença que julgou procedente esta última acção, devia ter sido suscitada a sua intervenção principal naqueloutra.
Trata-se, manifestamente, de questões novas.
Com efeito, o despacho recorrido não apreciou nenhuma delas e, admitindo que tenham sido suscitadas por ocasião do exercício do contraditório relativamente ao requerimento certificado a fls. 62, desiderato que não releva das peças processuais que instruem o agravo, tal omissão integraria nulidade, subsumível à previsão do artigo 668º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil pregresso (cuja disciplina coincide com a vertida no artigo 615º, n.º 1, alínea d), do Novo Código de Processo Civil) e que dependia de arguição nos termos do n.º 4 do mesmo preceito, não sendo do conhecimento oficioso do tribunal.
Ora, como é sabido, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais através dos quais se visa permitir a modificação destas, corrigindo eventuais erros, pelo que não se destinam a criar decisões sobre matéria nova, não apreciada pelo tribunal de categoria inferior.
Como refere Miguel Teixeira de Sousa, em “Estudos Sobre o Processo Civil”, 2ª Edição, páginas 395 e seguintes, vigora, no âmbito do processo civil, “um modelo de reponderação que visa o controlo da decisão recorrida e não um modelo de reexame que permita a repetição da instância no Tribunal de recurso”.
Sublinhando a mesma ideia, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 17 de Novembro de 2016, disponível em www.dgsi.p, sentenciou que “os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que antes não foram submetidas ao contraditório e decididas pelo Tribunal recorrido”, acrescentando que “em sede recursória o que se põe em causa e se pretende alterar é o teor da decisão recorrida e os fundamentos desta. A sua reapreciação e julgamento terão de ser feitos no seio do mesmo quadro fáctico e condicionalismo do qual emergiu a sentença proferida e posta em crise” e bem assim que “devem circunscrever-se às questões que já tenham sido submetidas ao Tribunal de categoria inferior e aos fundamentos em que a sentença se alicerçou e que resultaram da prova produzida e carreada para os autos, salvo, naturalmente, as questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos imprescindíveis ao seu conhecimento”.
Daí que esteja vedado a esta Relação conhecer das sobreditas questões, sem prejuízo de se dizer que o direito penhorado é precisamente aquele que foi objecto do negócio impugnado (o contrato de compra e venda celebrado entre a recorrente e o executado J. C., seu irmão), inexistindo qualquer outro negócio que o tenha tido por objecto e que não tenha sido apreciado na acção de impugnação pauliana.
Com efeito, a quota do imóvel que coube ao executado na partilha aberta por óbito da mãe, entretanto adquirida pela recorrente através do negócio contra o qual foi deduzida, procedentemente, a impugnação pauliana, não foi, nem poderia ter sido, contemplada na partilha subsequente, por via da qual foram adjudicados à recorrente os restantes ¾ do mesmo imóvel, nem se concebe que o tivesse sido em acto anterior, aliás desmentido pelo registo daquelas aquisições, relevado no teor da descrição predial certificada a fls. 64 a 66, e do qual não foi junta a competente prova documental, ao arrepio do preceituado no artigo 743º, n.º 3 do Código de Processo Civil pregresso.
Importa ainda salientar que a própria recorrente se apresenta como executada e que, a ter sido preterido o seu chamamento para intervenção principal(1), não resulta dos elementos que instruem o recurso que essa putativa falta tenha sido suscitada aquando da sua primeira intervenção no processo (2), pelo que tem de se considerar sanada, por aplicação da regra contida no artigo 190º do NCPC.
Resta apreciar a derradeira questão suscitada, essa sim, apreciada no despacho sob censura.
Trata-se de saber se o prosseguimento da execução pressupõe novo registo (agora definitivo) da penhora, por entretanto ter caducado o registo provisório lavrado.
Vejamos.
Preliminarmente, importa sublinhar que, aquando da sua propositura, a acção pauliana não estava sujeita a registo (AUJ 6/2004, publicado no Diário da República, Série I-A, de 14.7.2004) e que, como constitui jurisprudência unânime, não é essa a acção tida em vista pelo legislador no artigo 119º, n.º 4 do Código de Registo Predial, pelo que, ainda que fosse registada, a sua procedência jamais permitiria a conversão em definitivo do registo da penhora, lavrado como provisório por natureza, ao abrigo do mecanismo previsto nos números seguintes desse normativo (3).
Daí que, verificada, na pendência da acção pauliana, a caducidade do registo provisório da penhora inicialmente efectuada, o prosseguimento da execução mediante a venda do bem penhorado na sequência da procedência de tal acção implicava a feitura de novo registo.
Foi isso precisamente o que aconteceu.
Com efeito, respiga-se dos factos acima elencados que, no dia 12 de Fevereiro de 2010, ou seja, já depois de a exequente, munida da sentença proferida na acção de impugnação pauliana, ter promovido o prosseguimento da execução, foi efectuado novo registo da penhora.
É certo que também este foi lavrado como provisório por natureza, por (continuar a) existir sobre o direito registo de aquisição a favor de pessoa diversa do executado, mas ainda se encontrava em vigor aquando da prolação do despacho recorrido e até da interposição do recurso e apresentação das respectivas alegações.
Não ocorrera, por conseguinte, a sua caducidade, pelo que nada obstava ao prosseguimento da execução, atenta a disciplina constante da primeira parte do n.º 4 do artigo 838º do Código de Processo Civil pregresso, transposta para o n.º 4 do artigo 755º do Novo Código de Processo Civil.
Mas, ponderando os motivos da provisoriedade, deveria a Senhora Juiz a quo ter optado por determinar, como a recorrente pretendia, que a execução não prosseguisse, ao abrigo da parte final do mesmo inciso legal?
Entendemos que não.
É que já então existia uma sentença transitada, proferida na acção de impugnação pauliana, por via da qual o direito inscrito podia ser executado no património da obrigada à restituição, entretanto investida na posição de executada, nos termos do artigo 616º do Código Civil (4).
Logo, o registo devia ter sido lavrado como definitivo e não como provisório por natureza, não havendo motivos para crer que o erro cometido não pudesse ser corrigido antes de concretizada a venda, até porque o procedimento adoptado contraria o preconizado pelo próprio Instituto dos Registos e do Notariado.
Com efeito, debruçando-se sobre uma situação idêntica (a conversão em definitivo de um registo provisório de arresto mercê da procedência da acção de impugnação pauliana entretanto intentada contra o negócio por via do qual o bem arrestado fora transmitido a favor do titular inscrito), esse Instituto, no Parecer n.º 116/2009 SJC-CT, disponível no Google, decidiu que “Se a natureza da impugnação pauliana não permite ao credor ver arrestado o bem no património do devedor, ele tem forçosamente que lhe conferir, sob pena de incongruência da previsão legal, uma outra forma de retirar eficácia da respectiva decisão judicial – que assim terá que considerar-se adequada à sua natureza – que não pode deixar de ser o permitir-lhe arrestar o bem no património do obrigado à restituição (…) o que, obviamente, implica que esse obrigado esteja (seja) constituído em sujeito passivo da providência cautelar, não cabendo no âmbito do princípio da legalidade (…) averiguar do fundamento ou título dessa posição, mas apenas confrontá-la com a situação registral, para efeito de cumprimento do princípio do trato sucessivo”.
Em suma, cremos que o despacho recorrido não merece censura, pelo que o agravo deve improceder, sem prejuízo de, tendo entretanto ocorrido, mercê da demora na subida do recurso, a caducidade do registo provisório efectuado, a fase da venda não se poder iniciar sem que se mostre lavrado o registo definitivo da penhora.
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IV. DECISÃO:

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso e, em consequência, confirmar o despacho recorrido.
Custas pela recorrente.
Guimarães, 21 de Setembro de 2017


Relator
1º Adjunto
2º Adjunto

1. No sentido de que o terceiro adquirente, vencido na acção de impugnação pauliana, deve ser chamado a intervir na execução pendente decidiu-se no acórdão desta Relação de 25.9.2012, relatado por Maria de Purificação Carvalho e disponível em www.dgsi.pt.
2. Pelo contrário, deduz-se do requerimento de interposição de recurso, certificado a fls. 7 e 8, que essa questão não terá sido suscitada em momento anterior, designadamente no requerimento apresentado em 19 de Fevereiro de 2010.
3. Como se defendeu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.3.2002, igualmente consultado no sítio da DGSI, os “meios processuais comuns” a que o indicado preceito se refere são as acções em que se discute a titularidade do bem penhorado, já que a acção pauliana, pressupondo a validade do negócio impugnado, visa apenas obter um título que permita executar o bem no património do obrigado à restituição e até onde for necessário para satisfação do crédito do impugnante.
4. No sentido de que à situação do adquirente dos bens após procedência de acção pauliana é aplicável analogicamente o regime previsto no artigo 54º, n.º 2 do Código de Processo Civil ver Lebre de Freitas, em A Acção Executiva, 6ª edição, página 146.