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HABILITAÇÃO DE HERDEIROS
ACEITAÇÃO DA HERANÇA
INEXISTÊNCIA DO ÓNUS DE ALEGAR
Sumário
I - Para a dedução do incidente de habilitação basta a alegação da qualidade de sucessores, haja ou não bens na herança e tenha ou não sido indicada prova testemunhal para prova de que os nomeados são os únicos herdeiros. II - A questão da aceitação ou melhor da falta de aceitação é matéria de excepção e não da causa de pedir no incidente de habilitação. III – Em caso algum é necessário alegar que os sucessores requeridos aceitaram a herança.
Texto Integral
Acordam em Conferência os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
Recorrente:
Margarida ………………
Recorridos:
Maria …………… e outras.
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Por apenso à Acção Especial de Restituição de Posse, com Proc. n.º268/2001- do 2° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de ……….., veio Margarida ………………., autora no referido processo, instaurado contra Maria Eugénia…………….e marido …………, deduzir a habilitação dos sucessores do Réu, José Alfredo …………..
O incidente foi deduzido contra as partes sobrevivas e bem assim contra os herdeiros do falecido e respectivos cônjuges.
O sr. Juiz no despacho liminar convidou a requerente a articular factos donde resultasse que os habilitandos tinham aceite a herança. A requerente apesar de ter apresentado novo requerimento nada articulou naquele sentido.
De seguida o Sr. Juiz lavrou despacho onde afirmou que a requerente, «ao não alegar qualquer factualidade relativa ao fenómeno da aceitação - e seria através desta, sublinhe-se, que os herdeiros ingressariam na titularidade das relações jurídicas do falecido entre as quais o presente litígio - a petição inicial do incidente é deficiente. Vale por dizer: ainda que não fosse contestada a matéria ali alegada sempre a mesma seria necessariamente insuficiente para o preenchimento dos efeitos pretendidos com o presente incidente de habilitação de herdeiros»- sic. Em consequência decidiu indeferir liminarmente o requerimento inicial.
Inconformada veio a requerente interpor recurso de agravo, tendo rematado as suas alegações com as seguintes
CONCLUSÕES:
«I- Na constância do processo que, com o n° 268/2001, corre termos pelo 2° juízo do Tribunal Judicial da comarca de…….., em que é autora Margarida ………….. - a ora agravante -, II- e em que figuram como réus : Maria Eugénia ………… e marido, José Alfredo……………., III- ocorreu o passamento deste. IV- A a./agravante deduziu, então, o competente incidente de habilitação, indicando como habilitandos, aquela ré e mais três filhos do casal. V- em sede do despacho liminar de fls .... Dos autos, o mmo. Juíz da primeira instância determinou que, a requerente/agravante, aperfeiçoando o seu requerimento, alegasse e provasse a aceitação da herança pelos mesmos habilitandos. VI- A recorrente não alterou, neste particular, a sua p.i., embora apresentasse uma nova, com alterações a outro nível. VII- Em consequência, o mesmo senhor juiz, decidiu indeferir liminarmente o requerimento de habilitação. VIII- Não lhe assiste, no ver da agravante, qualquer razão. IX- É que, para além de se tratar de uma prova diabólica, fora do alcance da recorrente, visto a maioria dos casos de aceitação de herança ser tácita, X- a verdade é que, em local algum o legislador exige que, neste tipo de habilitação, se faça prova da aceitação, como condição da admissão do incidente ou, sequer, como condição para a sua decisão de fundo. XI- Se assim não fosse . Se a lei exigisse que o habilitante tivesse que, em sede de habilitação incidental, fazer prova da aceitação da herança por parte do habilitando, como justificar, por exemplo, o ac. Do stj de 2/6/64 ( in bmj 138/298) e a sua fundamentação? XII- Como julgar um caso em que, a habilitação sobreviesse na constância de uma acção que tivesse por objecto principal, mediato ou imediato, a determinação da qualidade de herdeiro ( acção de anulação de testamento, acção de petição de herança) ? XIII - E como decidir uma habilitação incidental num processo de partilha em que se pressuponha a qualidade de herdeiro ( inventário em que se discuta essa qualidade) ? XIV- seja como for, nada justifica o indeferimento liminar já que, sempre o habilitando dispunha da contestação para dizer de sua justiça! XV- Devem, por isso, v. Exas., mmos. Juízes desembargadores, anular o despacho sub judicio, XVI- e substitui-lo por outro que determine a prossecução do incidente. »
Não houve contra-alegações e o Sr. Juiz sustentou e manteve o despacho recorrido.
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Os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [1] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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A única questão a decidir consiste em saber se para a procedência do incidente de habilitação de herdeiros será necessário alegar e provar que houve aceitação da herança.
Em acórdão deste Tribunal, proferido no Proc.º N.º 1046/04-3, relatado pelo relator destes autos e subscrito pelos mesmo adjuntos, foi decidida questão exactamente idêntica à que é objecto do presente recurso, tendo-se entendido que na dedução do incidente de habilitação, não é necessário alegar que os sucessores requeridos aceitaram a herança. Aí se escreveu a propósito uma passagem dum acórdão do STJ tirado no recurso n.º 2922/04, onde o Exmº Juiz Conselheiro Relator teve o cuidado de chamar a atenção para a insensatez da exigência da alegação de factos relativos à aceitação da herança par efeitos de procedência do incidente de habilitação. Afinal, como se diz no referido acórdão, «o incidente de habilitação tem por escopo assegurar a permanência da legitimidade processual, e não a partilha. O fenómeno sucessório, em toda a sua complexidade, passa-lhe ao lado [2] .»
Na verdade é jurisprudência pacífica que para a dedução do incidente de habilitação basta a alegação da qualidade de sucessores [3] , haja ou não bens na herança [4] e tenha ou não sido indicada prova testemunhal para prova de que os nomeados são os únicos herdeiros [5] . A questão da aceitação ou melhor da falta de aceitação é matéria de excepção e não da causa de pedir no incidente de habilitação [6] .
As conclusões dos recorrentes merecem pois, todo o acolhimento, pelo que é óbvio e imperioso revogar o despacho recorrido, já que a exigência da alegação e prova da aceitação da herança e que constituiu o fundamento do indeferimento do requerimento inicial é manifestamente ilegal, porquanto exorbita a previsão legal e é alheia ao escopo do incidente, que, como se disse, não visa a partilha mas sim o assegurar da legitimidade processual no âmbito dum concreto processo judicial (art.º 372º n.º 1 e 374º n.º 1 e 2 do CPC) e para assegurar esta finalidade é irrelevante a alegação da aceitação da herança. Se tiver havido repúdio o repudiante tem o ónus da sua alegação e prova, sob pena de ser considerado herdeiro para os efeitos do prosseguimento da lide.
Deste modo e pelo exposto concede-se provimento ao agravo e revoga-se o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que admita o incidente e ordene o prosseguimento dos autos.
Custas a cargo do vencido ou vencidos a final, na proporção do decaimento.
Registe e notifique.
Évora, em 9 de Junho de 2005.
[1] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56. [2] Ac. do STJ, de 26/10/04, in proc. n.º 2922/04. [3] Ac. do STJ de 2/7/96, in www.dgsi.pt, proc. n.º 088074 [4] Ac. da RP de in cj tomo 4, ano XXVII, pg.188 e www.dgsi.pt, proc. n.º 0231078. [5] Ac. da RP de 11/5/00, in www.dgsi.pt , proc. n.º 0030541. [6] Ac. da RP de 11/5/00, in www.dgsi.pt , proc. n.º 0030541 e A. do STJ de 8/7/75 in www.dgsi.pt, pro. Nº 065465.