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IMPUGNAÇÃO
ARQUIVAMENTO DOS AUTOS
DISPENSA DE PENA
Sumário
1- É sindicável o despacho em que o juiz de instrução declare a sua discordância de arquivamento do processo, nos termos do artigo 230º do CPP. 2- A efectiva reparação do dano é conditio sine qua non da aplicação do instituto da dispensa de pena.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na Relação de Évora
I- Nos autos de inquérito com o nº … da comarca de …, o Ministério Público recorreu do despacho de fls 97 e 98 do Ex.mo Juiz de Instrução, concluindo:
1ª - Os autos indicam suficientemente a prática, por L (nascido a 10-12-1990), em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143°, n. 1 do Código Penal e embora não haja queixa, o mesmo é penalmente inimputável em razão da idade.
2ª - Os autos indiciam a prática, pelo arguido J, em autoria imediata, de um crime de ofensa à integridade física, consumado, previsto e punido pelo artigo 143º, n. 1 do Código Penal (com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa).
3ª - O ofendido sofreu lesões físicas constituídas por quatro arranhões de cerca de 5 cms da face externa superior do pescoço e um de cerca de 15 cms que desce do pescoço para a metade superior esquerda do t6rax, as quais demandaram, directa e necessariamente, 5 dias de doença com o primeiro deles afectando gravemente a capacidade de trabalhar
4ª - O arguido J afirma ter sido agredido em primeiro lugar, (pelo menor , L), assim como admite ter exercido retorsão contra o agressor.
5ª - Aquele arguido confessa os factos, tem 75 anos de idade, vive com a mulher em casa própria; é sócio do Clube …, onde efectua pequenas tarefas, a título gratuito; está reformado e não tem antecedentes criminais.
6ª - O arguido cometeu o aludido crime, mas o tribunal pode dispensá-lo de pena, visto que o «agente unicamente exerceu retorsão contra o agressor » art. 143° ns 1 e 3 al. b) do Código Penal, e o prejuízo ou o dano, não constituindo elemento objectivo do ilícito criminal, constitui o seu escopo legal, quer no que tange à censura quer à prevenção.
7ª - Atento o princípio constitucional de presunção de inocência do arguido, o Ministério Público considera suficientemente indiciada a prática do dito crime (ofensas simples) pelo arguido, mas deverá, na dúvida, prevalecer a sua versão dos factos, atenta a confissão dos mesmos, ou seja, que o menor L o molestou (agrediu-o a soco) em primeiro lugar e com intenção de retaliar ou exercer retorsão, aquele arranhou-o no pescoço, molestando-o na sua integridade física.
8ª - No processo investigou-se a prática de crime relativamente ao qual se encontra prevista na lei penal a possibilidade de dispensa da pena, como corolário do princípio da oportunidade e no convencimento de atingir, desta forma, a pacificação social, o Ministério Público propôs o arquivamento dos autos, ao abrigo do ano 280º do CPP conjugado com o artº 143° ns. 1 e 3 al. b) do Código Penal, por se verificarem os pressupostos daquela dispensa.
9ª - Entendido o ordenamento penal como um todo (tendencialmente) harmonioso, não pode deixar-se de considerar que o artº 74° C. Penal com o seu conteúdo vinculado se limitou a prever o regime geral da dispensa de pena, sendo que o ano 143°, n. 3 do mesmo Código consagra o regime especial, em face do conteúdo generalista do seu próprio tipo legal (n. 1 desse preceito), tendo em vista a opção clara de política criminal em compensar, em duas específicas circunstâncias (alíneas a) e b) do nº3) os comportamentos decorrer já uma diminuição sensível da culpa do agente.
10ª - A norma especial prevista no n. 3 do art. 143° do C. Penal deverá prevalecer sobre a norma geral consagrada nos ns. 1 e 3 do artigo 74° do mesmo diploma legal, não sendo, no caso, necessária a verificação cumulativa dos requisitos que noutras circunstâncias seriam exigíveis.
11ª - O Ex.mo Juiz de Instrução ao decidir como decidiu, no aludido despacho e perante a discordância com o arquivamento do Inquérito, fez incorrecta (porque desajustada às realidades processuais) interpretação do normativo vertido no n. 1 do art. 280º e dos arts. 143°, ns. 1 e 3, e 74º, n. 1, ambos do Código Penal, assim como violou os princípios da legalidade e Igualdade dos cidadãos perante a lei geral e abstracta; e,
12ª - Consequentemente, deverá ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro que concorde com o arquivamento do processo nos termos propostos pelo Ministério Público, considerando-se procedente o presente recurso.
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II- Inexistiu resposta à motivação.
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III- Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto Parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso, assinalando nomeadamente:
“A discordância limita-se ao facto de o Ex.mo Juiz de Instrução entender que a possibilidade de dispensa de pena se concretiza quando, cumulativamente se verifiquem os requisitos previstos no artigo 74, n° 3 e 1, als a) b) e c) e os requisitos previstos no n° 3 als. a) e b) do artigo 143 , ambos os artigos do Código Penal, enquanto a Ex.ma Procuradora-adjunta entende que a possibilidade de dispensa de pena se basta com a concretização dos requisitos previstos nas alíneas do n° 3 do artigo 143 citado código.
Nada nos permite concluir que a referência à previsão na "lei penal" da possibilidade de dispensa de pena se faça apenas para a norma que na parte especial do Código Penal prevê o tipo de crime, antes nos parece que essa referência se faz para o sistema penal e, portanto também para a norma que, na parte geral do Código Penal, estabelece o quadro base de dispensa de pena. É que, em concreto, a dispensa de pena não pode acontecer se, para além da verificação dos requisitos previstos no tipo de crime, ou seja, no caso concreto, haver lesões recíprocas e se não tiver provado qual dos contentores agrediu primeiro ou tiver o agente unicamente exercido retorsão sobre o agressor, também se não verificar, cumulativamente, a diminuta ilicitude do facto e da culpa do agente, a reparação do dano e se não oponham razões de prevenção.
Sendo o crime imputado ao arguido de ofensa à integridade física e sendo a integridade fisica o interesse primeiramente protegido também estão em causa os danos não patrimoniais, como a dor e o sofrimento e mesmo patrimoniais, como o dano resultante do estrago provocado na T-shirt que o ofendido trazia vestida, que da ofensa resultaram e que devem ser ressarcidos.
Com o arquivamento do processo não podem ser postergados os direitos da vítima, nem da sociedade e esses direitos são defendidos pela exigência da reparação do dano e ausência de razões de prevenção que têm de estar presentes e resolvidas em cada situação de arquivamento.
Como conclusão do que acabamos de expor somos de parecer que assiste razão ao Ex.mo Juiz de Instrução e que o arquivamento do processo não deve acontecer, com fundamento no artigo 280 do código de processo penal, enquanto não for conseguido o ressarcimento dos prejuízos causados ao ofendido ou este declare que prescinde de qualquer indemnização,(...).
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IV- Cumpriu-se o disposto no artigo 417º nº 2 do CPP,
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V- Foi o processo a vistos dos Exmos Adjuntos, após o que cumpre apreciar e decidir.
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Considerou o Ministério Público na proposta de arquivamento
“(...)
Indícios recolhidos:
Em suma, o arguido assume que arranhou o menor , L e diz que também foi agredido a soco pelo mesmo, facto que este último (apesar de menor de idade) também assume ter cometido.
O menor L e o arguido J têm versões controvertidas acerca do modo e das circunstâncias em que a acção decorreu, sendo certo que qualquer deles argumenta ter sido agredido em primeiro lugar .
Mesmo na versão do arguido J também afirma ter sido agredido em primeiro lugar (pelo menor), porém admite exercido retorsão contra o agressor .
J também sofreu dores e vexame em público, tanto mais que o menor ter-se-á vangloriando-se no café das … por «ter dado dois murros no velho».
O menor L e o seu pai, A não são s6cios ou membros dos órgãos sociais do clube ….
O arguido confessa os factos, tem 75 anos de idade, vive com a mulher em casa própria; é sócio do Clube …, onde efectua pequenas tarefas, a título gratuito; está reformado e não tem antecedentes criminais.
Proposta de Arquivamento dos autos, ao abrigo do art. 280º do CPP .
Indicia-se a prática, pelo arguido J, em autoria material, de um crime de ofensa à Integridade física simples, previsto pelo art. 143°, n.o 1 do C6digo Penal, ao qual corresponde, em abstracto, pena de prisão até 3 anos ou pena de multa. Afigura-se-nos que, no caso concreto e atendendo às duas versões em confronto, a conduta do arguido integra uma de duas das possibilidades consagradas na lei, a saber:
O arguido cometeu o aludido crime, mas o tribunal pode dispensá-lo de pena quando «tiver havido les6es reciprocas e não se tiver provado qual dos dois contendores. agrediu primeiro» . ano 143º, nos 1 e 3 al. a) do Código Penal; ou,
O arguido cometeu o aludido crime, mas o tribunal pode dispensá-lo de pena, visto que o «agente unicamente exerceu retorsão sobre o agressor» -art. 143° nºS 1 e 3 ai. b) do Código Penal.
Atento o principio constitucional de presunção de inocência do arguido, o Ministério Público considera suficientemente indiciada a prática do sobredito crime (ofensas simples ) pelo arguido, mas deverá, na dúvida, prevalecer a sua versão dos factos, atenta a confissão dos mesmos, ou seja, que o menor L o molestou (agrediu-o a soco) em primeiro lugar e com intenção de retaliar ou exercer retorsão, aquele arranhou-o no pescoço, molestando-o na sua integridade física.
Por outras palavras, a conduta do arguido integra aquele tipo legal de crime, mas o tribunal pode dispensá-lo de pena visto que o mesmo exerceu unicamente retorsão sobre o agressor.
Ademais, sempre diremos que um jovem, de 15 anos de idade, deve ter discernimento suficiente para pedir autorização à Direcção do Clube … para, sempre que possível, jogar futebol no momento próprio para o efeito.
Mais, a conduta de L merece censura pelo facto de ter molestado física e verbalmente um homem septuagenário (75) e contra alguém com idade para ser seu avô. Os progenitores têm o poder-dever de educar os filhos.
Aliás, segundo os padrões generalizados da cultura europeia (e não só), uma das regras basilares da educação é o respeito pelas pessoas idosas, o que no caso não aconteceu.
No caso concreto, afigura-se-nos que a conduta de L não é um "modelo" a seguir, porquanto a sua educação e formação moral/cívica deixa muito a desejar, merecendo também censura social e penal (apesar de não punível) a conduta deste jovem.
Por outro lado, os mais idosos nem sempre compreendem a "irreverência- própria da juventude (mas no caso, não se trata de irreverência, mas antes, má educação e incivilidade), a sua vontade de afirmação e a necessidade de impor a sua vontade ou os seus modelos comportamentais.
A conduta do arguido merece, igualmente, censura social e penal (punida como crime), até porque não exerce as funções de vigilante ou guarda do recinto desportivo do Clube … e, a qualidade de sócio, não lhe confere o direito ou a prerrogativa de molestar fisicamente qualquer indivíduo que entre no aludido recinto desportivo sem autorização da direcção do clube.
Todavia, e porque em nosso entender , no processo se investiga crime relativamente ao qual se encontra expressamente prevista na lei penal a possibilidade de dispensa da pena, como corolário do princípio da oportunidade e no convencimento de atingir, desta forma, a pacificação social, o Ministério Público propõe o arquivamento dos autos, ao abrigo do artº 280º do CPP conjugado com o ano 143° nºs 1 e 3 al. b) do Código Penal, por se verificarem os pressupostos daquela dispensa.”
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É o seguinte o despacho recorrido:
“Nos presentes autos, o Digno Magistrado do Ministério Público, entendendo estarem reunidos os pressupostos para o arquivamento do processo em caso de dispensa de pena, veio submeter a sua posição à apreciação deste Tribunal, para os efeitos previstos no art. 280°, n° 1, do Cód. P. Penal.
No caso, o procedimento criminal respeita à prática de factos susceptíveis de integrar o cometimento do crime de ofensa à integridade física p. e p. pelo art. 143°, n° I, do Cód. Penal.
Ora dispõe o art. 280°, n° 1 do Cód. P. Penal, que:
"1- Se o processo for por crime relativamente ao qual se encontre expressamente prevista na lei penal a possibilidade de dispensa da pena, o Ministério Público, com a concordância do juiz de instrução, pode decidir-se pelo arquivamento do processo, se se verificarem os pressupostos daquela dispensa.”
O procedimento pelo crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143° n° 1 do Cód. Penal, é, precisamente, um desses casos em que se encontra prevista a possibilidade de dispensa de pena, desde que esteja verificada uma das circunstâncias que, em alternativa, se mostram estabelecidas nas duas alíneas do n° 3 desse artigo, a saber, a ocorrência de lesões recíprocas sem prova da identidade do primeiro actuante, ou o caso em que o agente tiver exercido unicamente retorsão sobre o agressor .
Todavia, como resulta do disposto no n° 3 do art. 74° do Cód. Penal, atenta a moldura abstracta aplicável ao crime em apreço, a possibilidade de dispensa de pena só poderá ser considerada se se encontrarem também verificados os requisitos estabelecidos nas três alíneas do n° 1 desse mesmo art. 74°, ou seja, se a ilicitude do facto e a culpa do agente forem diminutas, se o dano tiver sido reparado e à dispensa de pena se não opuserem razões de prevenção.
Estes três requisitos são cumulativos, pelo que basta não estar preenchido um deles para ficar afastada a possibilidade de dispensa de pena.
E tais requisitos, a nosso ver, hão-de estar reunidos não apenas quando haja que apreciar a eventual aplicação do instituto da dispensa de pena na fase de julgamento, mas, também, para efeitos do arquivamento em caso de dispensa de pena, não fazendo sentido qualquer distinção.
Ora, no caso, e independentemente da verificação dos demais requisitos, o certo é que, compulsados os autos, não se detecta que os danos, que se indicia, produzidos pelo arguido, hajam sido reparados, o mesmo será dizer que falece um dos requisitos para o arquivamento do processo nos termos propostos pelo digno magistrado do Ministério Público.
A verdade é que o crime indiciariamente imputado ao arguido constitui um crime material e de dano, abrangendo um determinado resultado (ofensas no corpo ou na saúde), que se indicia ter ocorrido na esfera do ofendido.
Aliás, no que concerne aos danos, indicia-se, ainda, a conduta do arguido terá conduzido também à necessidade de prestação de assistência ao ofendido, no Centro de Saúde, com custos, portanto, e dela terão resultado, da mesma forma, estragos no vestuário do ofendido.
Tratam-se de danos que, pelo que decorre até ao momento dos autos, não foram reparados, e nem resulta do processo que o arguido tenha diligenciado pela sua reparação.
E não se diga que, não tendo sido deduzido até ao momento pedido de indemnização cível, não há que considerar aquele requisito, quando é certo que a lei faculta a sua dedução em momento posterior, sendo também irrelevante que o lesado tenha manifestado ou não a intenção de o deduzir no processo.
No instituto de dispensa de pena, na apreciação da verificação ou não das razões de prevenção a que alude o n° 1 do art. 74°, do Cód. Penal, certamente que não será alheio o comportamento do agente no sentido de reparar o dano que causou com a sua conduta e, mais que isso, proceder a tal reparação, o que no caso não se verifica.
Assim, entendendo-se, no actual estado dos autos, não verificado o requisito estabelecido na al. b) do n° 1 do art. 74° do Cód. Penal, decide-se pela não concordância com o arquivamento do processo.
Notifique.”
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Analisando:
O caso dos autos poderá configurar um caso de dispensa de pena, nos termos do disposto nos artigos 143º nº 3 do C.Penal, uma vez que no crime de ofensa à integridade física simples, o tribunal pode dispensar de pena quando:
a) Tiver havido lesões recíprocas e se não tiver provado qual dos contendores agrediu primeiro; ou
b) O agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor.
Por sua vez , o artigo 280º do CPP, refere que se o arquivamento for por crime relativamente ao qual se encontre expressamente prevista na lei penal a possibilidade de dispensa da pena, o Ministério Público, com a concordância do juiz de instrução, pode decidir-se pelo arquivamento do processo, se se verificarem os pressupostos daquela dispensa.
À primeira vista poderia questionar-se se será recorrível o despacho de não concordância do juiz de instrução, uma vez que não há uma obrigatoriedade de concordância e, esta, porque não arbitrária, sempre será discricionária.
Mas, embora discricionária, encontra-se vinculada a critérios de objectividade, pelo que sempre será sindicável o juízo decisório, face a interesses conflituantes, com o titular da acção penal (o MºPº), em caso de não concordância.
A solução da questão sub judicio está em saber se se verificam os pressupostos de dispensa da pena como propõe o MºPº, ou se, pelo contrário, não estão garantidos para já tais pressupostos, pelo que se justifica a discordância do juiz de instrução.
“Os casos de dispensa de pena são casos de culpa muito diminuta, em que se não justifica a aplicação de qualquer reacção criminal.” Maia Gonçalves in Código de Processo Penal anotado e comentado, 12ª edição, p. 557.
Mas a não aplicação de qualquer reacção criminal, obviamente que assenta em fundamentação, juridicamente relevante que a justifique, o que significa a existência de factores justificativos da não submissão do agente a pena, não por dela estar isento, mas por dela ficar dispensado.
A verificação das condições de oportunidade legal permitidas para a dispensa da pena nos termos do artigo 143º nº 3 do C.Penal, não excluem os pressupostos gerais da dispensa de pena.
Na verdade, como se sabe, o instituto da dispensa de pena é contemplado e regulado no artigo 74º do C.Penal que o admite quando o crime for punível com pena de prisão não superior a 6 meses, ou só com pena de multa não superior a 120 dias.
O tribunal pode declarar o arguido (certamente por lapso, o CP chama-lhe ainda réu), culpado mas não aplicar qualquer pena se:
a) A ilicitude do facto e a culpa do agente forem diminutas;
b) O dano tiver sido reparado; e
c) À dispensa de pena se não opuserem razões de prevenção.
Por outro lado, conforme nº 3 do artº 74º : Quando uma outra norma admitir, como carácter facultativo, a dispensa de pena, esta só tem lugar se no caso se verificarem os requisitos contidos nas alíneas do nº 1.
Nesta ordem de ideias, a reparação do dano é conditio sine qua non da aplicação do instituto da dispensa de pena.
Reparação essa que não é potencial, mas efectiva, concretizada.
Por isso, se compreende o nº 2 do mesmo artigo 74º quando estabelece: se o juiz tiver razões para crer que a reparação do dano está em vias de se verificar, pode adiar a sentença para reapreciação do caso dentro de um ano, em dia que logo marcará.
Ora voltando ao caso concreto, e como bem assinala o despacho recorrido:
“ compulsados os autos, não se detecta que os danos, que se indicia, produzidos pelo arguido, hajam sido reparados, o mesmo será dizer que falece um dos requisitos para o arquivamento do processo nos termos propostos pelo digno magistrado do Ministério Público.
A verdade é que o crime indiciariamente imputado ao arguido constitui um crime material e de dano, abrangendo um determinado resultado (ofensas no corpo ou na saúde), que se indicia ter ocorrido na esfera do ofendido.
Aliás, no que concerne aos danos, indicia-se, ainda, a conduta do arguido terá conduzido também à necessidade de prestação de assistência ao ofendido, no Centro de Saúde, com custos, portanto, e dela terão resultado, da mesma forma, estragos no vestuário do ofendido.
Tratam-se de danos que, pelo que decorre até ao momento dos autos, não foram reparados, e nem resulta do processo que o arguido tenha diligenciado pela sua reparação.”
Também o Exmo Magistrado do MºPº nesta Relação, em seu douto Parecer refere que:
“Sendo o crime imputado ao arguido de ofensa à integridade física e sendo a integridade física o interesse primeiramente protegido também estão em causa os danos não patrimoniais, como a dor e o sofrimento e mesmo patrimoniais, como o dano resultante do estrago provocado na T-shirt que o ofendido trazia vestida, que da ofensa resultaram e que devem ser ressarcidos.
Com o arquivamento do processo não podem ser postergados os direitos da vítima, nem da sociedade e esses direitos são defendidos pela exigência da reparação do dano e ausência de razões de prevenção que têm de estar presentes e resolvidas em cada situação de arquivamento.”
Inexistem, por conseguinte, pressupostos legais de dispensa de pena, nesta fase do processo, que conduzissem o Exmo Juiz de instrução à concordância com o arquivamento proposto pelo Ministério Público
Donde, o recurso não merecer provimento.
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VI- Termos em que
Negam provimento ao recurso e, confirmam o despacho recorrido.
Sem custas.
ÉVORA, 11 de Julho de 2006
Elaborado e revisto pelo relator.
Pires da Graça
Rui Maurício
Orlando Afonso.