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RESTITUIÇÃO PROVISÓRIA DE POSSE
ESBULHO
VIOLÊNCIA
Sumário
I – São pressupostos de facto da providência de restituição provisória da posse, nos termos do disposto no artº 393º do Código de Processo Civil, a demonstração da posse do requerente, a sua perda por esbulho e a violência no desapossamento. II – O desapossamento violento ou a posse violenta é , como decorre do disposto no n.º 2 do art.º 1261 do CC , a que é obtida com uso de coacção física, ou de coacção moral nos termos do artigo 255º. III - A violência, para efeitos de restituição provisória da posse, tanto pode incidir sobre as pessoas como sobre as coisas Mas se apenas incidir sobre coisas, só releva em termos de restituição provisória de posse, se tiver reflexos sobre as pessoas como forma de intimidação ainda que indirecta.
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
Proc.º N.º 2757/06-2
Agravo
Tribunal Judicial da Comarca de Faro - 1º Juízo Cível- proc. n.º 2665/06
Invest………………, Lda, pessoa colectiva…………….., em Quarteira instaurou o presente procedimento cautelar de restituição provisória da posse contra Assis…………………. Para tanto, alegou que:
- adquiriu o prédio composto de talhão de terreno para construção urbana onde se encontrava já implantado um edifício de 8 pisos, em construção, sito na Rua Sotto Mayor………………………., concelho de Faro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o nº 1556;
- a aquisição foi efectuada no âmbito de processo de execução administrativo e livre de quaisquer ónus ou encargos;
- a requerente foi investida na posse do dito prédio pela aludida escritura de compra e venda;
- recebeu as chaves da porta principal e de cada uma da 16 divisões susceptíveis de arrendamento em separado;
- estando o edifício totalmente devoluto de pessoas e bens;
- a requerente preparava-se para efectuar as obras de acabamento no edifício, para posterior venda, tendo já mandato agências imobiliárias para o efeito;
- no dia 17 de Outubro de 2006, pelas 14h00, na ausência do requerente, os requeridos arrombaram as fechaduras da porta de entrada do prédio e a fechadura da porta do apartamento ou divisão correspondente ao segundo andar, do lado esquerdo, virado a poente e sul;
- colocaram novas fechaduras das quais só eles possuem a chave;
- a PSP deslocou-se ao local e não os conseguiu demover dos seus intentos de permanecerem na divisão;
- neste momento a requerente está impedida de entrar no prédio para proceder aos acabamentos;
- por isso, não consegue vender as fracções e receber o preço;
- sendo que suporta elevados custos decorrentes de empréstimo que necessitou de contrair para aquisição do imóvel;
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Perante esta factualidade o Sr. Juiz, proferiu despacho de indeferimento liminar, que fundamentou nos seguintes termos: « Dispõe o artº 393º do C.P.C. que, “no caso de esbulho violento, pode o possuidor pedir que seja restituído provisoriamente à sua posse, alegando os factos que constituem a posse, o esbulho e a violência”. São pois três os pressupostos de que depende o decretamento da providência: a) posse do requerente; b) esbulho da coisa possuída pelo requerente; c) ter havido violência no esbulho. É assim necessário, para a procedência da providência que o requerente alegue (e demonstre - cfr. artº 394º do C.P.C.) factos que permitam ao tribunal concluir pela existência cumulativa dos três apontados pressupostos legais. Importa verificar se a factualidade alegada pelo requerente é susceptível preencher os três apontados pressupostos. No que respeita à posse, segundo a definição legal constante do artº 1251º do Código Civil, a mesma consiste no “poder de facto que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real”. No caso concreto foram alegados factos que nos permitem concluir pela existência de posse, já que após a escritura pública de compra e venda, foram-lhe entregues a chaves do prédio, tendo este chegado a iniciar trabalhos, com vista a concluir a obra. “O esbulho caracteriza-se pela privação parcial ou total do poder do possuidor no exercício dos actos correspondentes ao direito real que se traduzem na retenção, fruição do objecto da coisa ou da possibilidade de o continuar a exercer” – cfr. Joel Timóteo Ramos Pereira, in “Prontuário de Formulários e Trâmites”, volume II, pág. 513. Ora, na petição inicial são alegados factos que claramente configuram uma situação de esbulho. Com efeito, é alegado que após o arrombamento da fechadura da porta de entrada e do apartamento por parte dos requeridos, estes mudaram as fechaduras, impedindo o requerente de entrar, vender e executar as obras planeadas. Perante esta alegação é notório que o requerente está privado de utilizar o bem. No entanto, desde já se avança que, a factualidade alegada pelo requerente é insusceptível de integrar o conceito de violência no esbulho, já que, para efectivar esse esbulho, ou melhor para ocuparem o prédio não utilizaram de violência directamente sobre o requerente ou outras pessoas. A violência está hoje definido no artigo 1261.º n. 2 do Código Civil como o uso de coação física ou de coacção moral nos termos do artigo 255.º. Ora, a violência quer sobre a forma de coacção física quer sobre a forma de coacção moral, tem, em ultima análise de ser dirigida contra as pessoas (Cf. Dias Marques, Prescrição Aquisitiva, I, pagina 277). Com efeito, a violência relevante é aquela exercida sobre as pessoas. Neste sentido Ac. da RL de 13/3/1981, in CJ, tomo II, pág. 172, “O esbulho a considerar na providência cautelar de restituição provisória de posse, é apenas aquele que resulta de violências ou ameaça contra as pessoa que defendem a posse” Não constitui violência contra as pessoas se estas se encontram ausentes e o individuo muda a fechadura duma casa, arromba uma porta ou destrói parte de um muro porque o proprietário não pode sentir a intimidação, a coacção física, e tais actos se destinam a facilitar a ocupação (Cf. Dias Marques, ob. cit., pagina 278).[1] No mesmo sentido se pronunciou o Ac. do STJ de 20/9/2003, proc. 084128, www.dgsi.pt – “ Se uma pessoa não está presente quando mudam a fechadura da porta de acesso ao local que lhe foi arrendado, sem o seu conhecimento ou autorização, não há constrangimento ou ameaça física, pelo que, no caso, inexiste esbulho violento do locado, o que inviabiliza a restituição provisória da posse do mesmo (…) Na verdade, o conceito comum de violência define-se como o constrangimento exercido sobre uma pessoa para a obrigar a fazer ou deixar de fazer um acto qualquer. Portanto e de acordo com o exposto, se uma pessoa não está presente quando mudam a fechadura da porta de acesso ao local que lhe foi arrendado, sem o seu conhecimento ou autorização, não pode dizer-se que ela esteja a ser constrangida ou ameaçada fisicamente. Mesmo de forma indirecta não pode considerar-se que se processa qualquer coacção física contra o desapossado. Tanto assim é que este para defender a sua posse ou recuperá-la, pode tornar a mudar a fechadura, sem chegar a haver confronto físico com o esbulhador. O que se força a ideia de que consumada a ocupação, sem estar presente o esbulhado, termina a coacção física sobre as coisas, se ela foi necessária.” A coacção física pressupõe completa ausência de vontade por parte daquele a quem a posse foi usurpada e a sua verificação reporta-se ao momento de desapossamento (Moitinho de Almeida, Restituição de Posse, paginas 83 a 98). No caso dos autos, foi alegado que “ Aproveitando-se do facto de a Requerente se encontrar ausente”, “ No dia 17 de Outubro de 2006, pelas 14h00, os Requeridos arrombaram as fechaduras do prédio”, Designadamente, arrombaram a fechadura da porta de entrada do prédio”,” E a fechadura da porta do apartamento ou divisão correspondente ao segundo andar, do lado esquerdo, virado a poente e sul”, “Colocando novas fechaduras das quais só eles requeridos possuem as chaves”. Ora, estes factos alegados demonstram que os requeridos lograram penetrar no prédio dos requerentes através de arrombamento, mas os requerentes não se encontravam presentes, pelo que no momento do esbulho estes não sentiram intimidação, ou ficaram constrangidos. Por isso, inexiste violência. É certo que posteriormente o requerente deparou-se com as fechaduras mudadas e, por outro lado, um dos requeridos referiu ter uma arma de caça, o que provoca receio nos requerentes. No entanto, todas estas circunstâncias ocorreram posteriormente à efectivação do esbulho. Como foi referido a violência relevante para efeitos de posse é toda aquela exercida no momento em que ocorre o esbulho e não posteriormente. Por tudo isto, forçoso é concluir que os factos alegados não integram os pressupostos da restituição provisória da posse, mormente o da violência. Termos em que se indefere liminarmente a pretensão do requerente».
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Inconformado, veio o requerente interpor recurso de agravo.
Apresentou alegações e o Sr. Juíz manteve o despacho.
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Já neste Tribunal a recorrente, porque o não fizera, foi convidada a formular as conclusões, o que fez nos seguintes termos:
CONCLUSÕES
70. A Autora é a legitima proprietária e possuidora do prédio urbano composto de edifício de 8 pisos, em construção, edificado na R. Sotto Mayor, ………………….., freguesia da Sé, concelho de Faro, descrito na conservatória do registo predial de faro sob o n.º 1556. 71. Edifício que recebeu totalmente devoluto de pessoas e bens. 72. Tendo a Autora visto afectada a sua posse pelos requeridos, que no dia 17 de Outubro de 2006, pelas 14.00h, na ausência dos legais representantes da A., arrombaram as fechaduras da porta de entrada do prédio e a fechadura da porta do apartamento ou divisão correspondente ao 2° andar, do lado Esquerdo, virado a poente e sul. 73. Tendo para o efeito ameaçado o funcionário da A. ali presente e que os tentou demover os requeridos dos seus intentos, o que não logrou alcançar por recear pela sua integridade física. 74. Sentindo-se o dito funcionário ameaçado e desde logo tendo informado os A. das intenções dos requeridos e tendo a A. chamado ao local a PSP, que não logrou demover os Requeridos dos seus intentos de permanecerem na divisão. 75. Tendo o Requerido varão afirmado que possuía uma arma de caça e sugerido que a utilizaria quando o tentassem colocar para fora. 76. É manifesto que os requeridos não possuem qualquer direito a ocupar o local e que a sua conduta causa inevitáveis prejuízos à Requerente que desse modo se encontra privada da posse do local e de proceder á conclusão da obra e venda das fracções. 77. Não ignorando os requeridos que a A. é legitima proprietária do prédio em causa, sentindo-se os legais representantes da A. ameaçados e conhecendo os requeridos que o sua conduta lhes está vedada e não se coibindo de pressupor o uso da força, dessa forma ameaçando a requerente, estão reunidos os pressupostos da presente providencia cautelar já que os requeridos violaram e violam o direito de propriedade da A. 78. Comportando a Autora elevados custos decorrentes do empréstimo que contraiu para aquisição do mencionado imóvel e não podendo aliená-lo sofre um prejuízo monetário, pelo que o presente procedimento o único meio de devolver à A. a posse do imóvel que adquiriu de forma legítima e cuja propriedade lhe foi retirada de forma violenta, arrombando as fechaduras da porta principal do prédio e do apartamento em questão. 79. Por outro lado, do decretamento da presente providência não decorre qualquer prejuízo para os Requeridos que nenhum direito têm sobre o imóvel em causa. 80. Portanto, considera a A. que os pressupostos da restituição provisória da posse estão preenchidos, devendo a sentença que indeferiu o presente pedido de restituição provisória da posse ser revogada, tendo - se em conta tudo o ora alegado, e ordenada a inquirição de testemunhas com a dispensa da inquirição dos requeridos. 81. Ainda que, por mera hipótese de raciocínio, se não considerassem preenchidos os pressupostos da restituição provisória da posse, deveria como deverá o requerimento prosseguir como providência cautelar inominada, assim se aproveitando o requerimento inicial. Normas Jurídicas que entende violadas: Normas jurídicas que deveriam ter sido interpretadas em sentido diverso: Art. 393.0 do C. P. C. Sentido em que deveria ter sido interpretada a norma: Considera-se existir esbulho violento quando, ainda que por vindicta directa sobre os bens, o esbulhador actue de forma violenta (contrario de forma pacífica) por forma a conseguir os seus intentos, forma violenta essa que faz pressupor que o esbulhado não consentiu nem haveria de consentir no esbulho e, por outro lado, sempre que, ainda que o esbulho ocorra de forma não violenta, o esbulhador faça uso ou menção do uso da força para negar a devolução do bem ao esbulhado e legitimo possuidor. Quando a lei exige que o esbulho seja violento pretende apenas afastar da previsão da norma as situações em que o esbulho ocorreu de forma pacifica, já que aqui o esbulhado consentiu no esbulho. Se alguém se intromete em bem imóvel, com recurso ao arrombamento das portas, que se encontravam fechadas e trancadas, intrometendo-se em lugar vedado ao público, fazendo para isso uso da força, ainda que sobre o bem, é por demais evidente que o esbulho se terá que considerar violento e que ao esbulhado assiste o direito de requerer a imediata restituição da posse, ainda que a titulo provisório. O contrario é perverter o sentido da norma e beneficiar o esbulhador que, dessa forma, permanece no bem até à decisão final do processo principal, ficando o esbulhado desapossado do bem. Ora, parece inacreditável e insustentável o argumento de que apenas e só porque o esbulhado não estava em casa quando o esbulhador arrombou as portas e se intrometeu na casa daquele, este tenha que ficar na rua enquanto o infractor fica com o direito (legitimado pela douta decisão recorrida) de possuir o bem até à decisão final.»
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Na perspectiva da delimitação pelo recorrente [2] , os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [3] , salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Das conclusões acima transcritas resulta que as questões colocada à apreciação deste Tribunal consistem em saber.
1.ª- se a factualidade alegada é suficiente para consubstanciar o requisito do esbulho violento;
2.ª- e se, não o sendo, o Tribunal deveria ter ordenado o prosseguimento dos autos como providência comum inominada, ao invés de ter indeferido liminarmente a providência requerida.
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Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir, sendo que a factualidade relevante é a que se deixou descrita supra.
Quanto à primeira questão, desde já diremos que o recurso não tem qualquer fundamento!
Com efeito, como muito bem se demonstra no despacho recorrido, são pressupostos de facto da providência de restituição provisória da posse, nos termos do disposto no artº 393º do Código de Processo Civil, a demonstração da posse do requerente, a sua perda por esbulho e a violência no desapossamento. O requerente tem pois o ónus de alegar os factos pertinentes à posse, ao esbulho e à violência do desapossamento. No caso em sub judice foi entendido pelo tribunal “a quo” que o requerente não alegou factos donde decorresse a existência de violência, entendida esta no sentido que decorre do disposto no n.º 2 do art.º 1261 do CC. Nos termos deste preceito, entende-se por violenta a posse que é obtida com uso de coacção física, ou de coacção moral nos termos do artigo 255º.
A coacção física é aquela em que, através do recurso à força física, se anula e exclui a possibilidade de execução da vontade real da pessoa coagida, conduzindo à completa ausência de vontade do mesmo e colocando-o numa situação de impossibilidade material de agir -Artº 246º do Cód. Civil e Ac. do STJ de 13/11/1984 (Relator: Cons. Moreira da Silva); de 12/06/1991 (Relator: Cons. Tato Marinho) e de 25/11/1998 (Relator: Cons. Silva Graça), in www.dgsi.pt/jstj.
«A coacção moral é a conseguida mediante ameaça provocadora de inibição da capacidade de reacção do coagido, através de um processo psicológico obstrutivo, levando-o a deixar o campo livre à actuação do agente, por receio de que algum mal, que poderá incidir sobre a pessoa, a honra ou a fazenda do próprio ou de terceiro, lhe seja infligido [Artº 255º do Cód. Civil e Acórdãos do STJ de 12/06/1991 e de 25/11/1998, já citados.]. A violência, para efeitos de restituição provisória da posse, tanto pode incidir sobre as pessoas como sobre as coisas [Acórdãos do STJ de 20/05/1997 (Relator: Cons. Lopes Pinto), 10/07/1997 (Relator: Cons. Sousa Inês), 26/05/1998 (Relator: Cons. Martins da Costa), 25/06/1998 (Relator: Cons. Herculano Namora) e 25/11/1998 (Relator: Cons. Silva Graça), in www.dgsi.pt/jstj.]. Mas, como bem se refere na decisão sob recurso, a violência sobre as coisas, para relevar em termos de restituição provisória de posse, terá de ter reflexos, ainda que indirectos, como forma de intimidação, sobre as pessoas [Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, págs. 73/74.]» [4] . Ora no requerimento inicial, nada na é referido a tal respeito e nenhum facto é alegado que indicie ter havido intimidação de pessoas, pelo que bem concluiu o sr. Juiz ao decidir não terem sido alegados facto com virtualidades para demonstrarem a existência do requisito da violência. O recorrente, pretendendo emendar o erro, veio nas alegações de recurso dizer que tinha havido intimidação de um segurança do prédio…! Mas esta alegação é tardia e deslocada (deveria ter sido feita no requerimento inicial …) e por isso não foi nem podia ter sido apreciada no despacho recorrido. Consequentemente está vedado a este Tribunal, como Tribunal de recurso que é, a sua apreciação [5] ...
Improcede pois a primeira questão.
Quanto à segunda questão, concordamos com o recorrente quando afirma que actualmente, face às alterações introduzidas pela reforma de 1995, no regime processual dos procedimentos cautelares, é possível ao Tribunal fazer o aproveitamento do requerimento de um procedimento cautelar especificado e ordenar a sua tramitação como procedimento comum.
A jurisprudência dos Tribunais superiores assim tem entendido designadamente em casos, como o dos autos, de procedimento de restituição provisória de posse, mas em que faltam os facto relativos ao requisito da «violência». Na verdade e de harmonia com o que dispõe o art.º 395º do CPC, ao possuidor que seja esbulhado ou perturbado no exercício do seu direito, sem que ocorram as circunstâncias previstas no artigo 393.°, é facultado, nos termos gerais, o procedimento cautelar comum [6] . Além disso, nos termos do artº 392º, nº 3, o Tribunal não está adstrito à providência concretamente requerida. Por outro lado a situação pode ser configurada como um erro na forma de processo e o regime desta nulidade impõe o aproveitamento dos actos que for possível (art.º 199º n.º 1 e 202º do CPC), pelo que nada obstaria a que, constando do requerimento inicial os factos que consubstanciam os requisitos exigidos para o procedimento cautelar comum, se ordenasse o prosseguimento dos autos como procedimento comum, com respeito pela respectiva disciplina. Ora vistos os autos, verifica-se que o requerimento inicial, embora invocando a existência de lesão grave do direito, é parco na alegação de factos donde decorra a existência de prejuízo dificilmente reparável, sendo que este é um dos requisitos do procedimento comum.
Assim e em bom rigor, por padecer de vício idêntico ao que determinou o despacho recorrido (insuficiência de factos consubstanciadores dum requisito do procedimento) e merecer idêntico tratamento, não poderia aproveitar-se o requerimento inicial da restituição provisória de posse, para prosseguimento como procedimento cautelar comum..!!!.
Concluindo
Deste modo e pelo exposto, acorda-se em negar provimento ao agravo e confirma-se o despacho recorrido.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
Évora, em 22 de Março de 2007.
[1] Ac do STJ, 13/11/1984, BMJ, 341, pág. 401, Ac. da RP, de 17/11/1998, BMJ, 481, pág. 546 [2] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs. [3] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56. [4] Ac. da RC de 7/2/06, proc. n.º 4151/05, in www.dgsi.pt/jstj. [5] …Os recursos visam modificar decisões e não criar decisões sobre matéria nova, não sendo lícito invocar nos mesmos questões que as partes não tenham suscitado perante o tribunal recorrido – sublinhado nosso- (cfr. entre outros, acórdãos de 16.5.72, 13.3.73, 5.2.74, 29.10.74, 7.1.75, 25.11.75 e de 12.6.91, publicados no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 217, pág. 103; 225, pág. 202; 234, pág.267; 240, pág. 223; 243, pág. 194, 251, pág. 122 e n.º 408, pág. 521, respectivamente)" [6] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, pág. 83 e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV, págs. 52/54.