REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
Sumário


Na fixação de alimentos a prestar a um filho menor, há que atentar que estão a isso obrigados ambos os progenitores, em função dos respectivos rendimentos, após descontar as despesas e às carências do filho.

Texto Integral

PROCESSO Nº 2624/06- 3

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
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“A”, divorciado, soldador, residente na Rua …, nº …, em … - …, instaurou a presente regulação do poder paternal, contra
“B”, divorciada, residente na Rua …, nº …, em … - …, alegando:
O Requerente não se opõe a que a menor fique à guarda e aos cuidados da mãe, tal como já está decidido.
Não concorda, todavia, com a pensão de alimentos fixada, de 165 € mensais.
O Requerente não tem trabalho fixo e, quando o encontra é sempre por períodos muito curtos, sem garantia de estabilidade
Se se atentar nos recibos dos salários auferidos, bem como nas despesas que comprova, por vezes estas são superiores àqueles.
Pretende que a prestação alimentícia à filha seja reduzida para 100 € mensais, actualizável, em Janeiro, conforme o aumento que se verificar para a função pública.
Pretende, ainda, que fique estipulado poder o Requerente ter consigo a filha aos fins-de-semana.

Citada, alegou a Requerida não concordar com as propostas do Requerente.

Seguiram-se os demais termos processuais e procedeu-se a audiência de discussão e julgamento.
Na Primeira Instância foram dados como provados os seguintes factos:
1) “C” nasceu a 13//1/1995 e é filha de “A” e de “B”.
2) Os pais da “C” divorciaram-se por mútuo consentimento em 27/11/2001, no âmbito do processo 161/00 deste Tribunal e Juízo.
3) Na sequência dos acordos celebrados nesse processo, ficou estabelecido que o pai pagaria à menor uma pensão alimentícia mensal de 20.000$00 (100 E).
4) Mais ficou acordado que tal montante seria actualizado em 10 % no início de cada ano e que o pai suportaria ainda metade “das despesas consideradas extraordinárias com a saúde da menor, desde que não sejam cobertas pelo Serviço Nacional de Saúde ou Seguro de Saúde de que os progenitores disponham ".
5) O pai da menor, a partir do ano de 2004, tem pago a favor da sua filha uma pensão mensal de 165 €.
6) A mãe da menor reside com esta.
7) É assistente administrativa no “Banco …", em …, auferindo um vencimento mensal de 620 €.
8) Paga 360 € mensais a título de amortização de empréstimos bancários contraídos para aquisição de um veículo e para realização de obras na habitação.
9) Tem 50 € mensais de consumos domésticos.
10) É ela quem tem suportado o pagamento das despesas escolares e de saúde da menor.
11) Tem o apoio dos pais, avós maternos da menor, no que a despesas com alimentação diz respeito.
12) O pai da menor vive há cerca de um ano e meio com “D”, numa casa a esta pertencente.
13) O pai da menor é soldador de profissão, trabalhando em empresas de trabalho temporário.
14) Tem mantido alguma irregularidade nos períodos laborais, chegando a trabalhar alguns períodos em Portugal e outros no estrangeiro.
15) Quando tem trabalho aufere um vencimento base entre os 400 € e os 500 €.
16) A sua companheira trabalha como escriturária de uma companhia de seguros.
17) O pai da menor gasta 38 € por mês no pagamento de seguros de vida e de acidentes pessoais.
18) Paga 209 € de prestação mensal do veículo automóvel.
19) Paga 175 € de prestação mensal de uma motorizada.
20) O pai da menor fez, a favor desta, um seguro de saúde na Companhia de Seguros …, estando garantidas as despesas de saúde na rede de médicos convencionada e o pagamento de 55 % da despesa em médicos e clínicas não incluídos no acordo, tudo mediante a contrapartida mensal de 27,05 €.
21) A menor é uma criança saudável, com um desenvolvimento normal para a sua idade.
22) Frequenta o 5º ano de escolaridade.
23) Tem uma boa relação com a mãe.
24) Tem uma boa relação com o pai.
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Com base em tal factualidade, na Primeira Instância foi decidido:
A - Fixar a pensão alimentícia em 125 € mensais;
B - A pensão será actualizada anualmente, procedendo-se à primeira em Janeiro de 2007, de acordo com o índice de inflação;
C - O pai suportará o valor de um seguro de saúde a favor da filha.
D - O pai contribuirá com 50% das despesas escolares da menor, mediante
a apresentação de recibo.
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Com tal decisão não concordou a Requerida, tendo interposto o respectivo recurso, onde formulou as seguintes CONCLUSÕES:
A - O Tribunal «a quo», por decisão que ora se recorre, reduziu a prestação de alimentos que o pai da menor se encontrava a pagar no montante de € 165,00 para o montante de € 125,00.
B) A decisão do Tribunal fundamentou-se nos factos dados como provados quanto à situação laboral e económica do pai da menor, ora Recorrido;
C) O tribunal "a quo" considerou provado que o pai da menor, ora recorrido, trabalha de forma irregular, auferindo, quando tal acontece, um vencimento mensal na ordem dos 400,00 € a 500,00 €, e bem assim que tem como despesas fixas mensais o montante global de € 449,05;
D) As despesas fixas mensais dadas como provadas, e consideradas aceitáveis pelo Tribunal "a quo”, são referentes à aquisição de uma mota e de uma viatura automóvel.
E) Nos autos foi proferido parecer do Instituto de Reinserção Social, no qual os técnicos concluem que: " (…) julgamos que não se justifica a redução no seu valor (seja na quantia global mensalmente prestada ou na percentagem anual de actualização), uma vez que as razões invocadas pelo progenitor subestimam, aparentemente, as necessidades da filha, centrando-se sobretudo nas suas próprias necessidades, num contexto em que se verifica que o Requerido canaliza alguns dos seus recursos económicas, apesar de os percepcionar como limitados, para a aquisição/manutenção de bens materiais pessoais que não parecem ser de primeira necessidade."
F) É do conhecimento generalizado que as empresas de trabalho temporário apenas declaram que os seus funcionários auferem rendimentos mínimos.
G) O valor de despesas fixas tidas pelo progenitor e dadas como provadas, não se coaduna com os parcos rendimentos que se considerou provado que o mesmo tem.
H) Devem assim, e neste casos ser tidos em consideração os sinais exteriores de riqueza. O que no caso sub judice, como consta em sede de alegações, é flagrante.
I) A prestação que o progenitor se encontrava a pagar, 165 €: mostrava-se minimamente adequada à satisfação das despesas da menor e tinha sido fixada por acordo entre os progenitores, em face da falta de actualização da mesma durante anos.
J) Pelo que não deveria a mesma ter sido reduzida.
K) Assim, se conclui que a decisão proferida é atentatória dos interesses básicos da menor, pelo que deve a mesma ser revogada, mantendo-se o regime que se encontrava a vigorar até à sua alteração, e bem assim manter-se o montante da prestação de alimentos que o progenitor, ora Recorrido se encontrava a pagar, no valor actual de 165 € (Cento e Sessenta e Cinco Euros).
L) Pois ao decidir como decidiu o Tribunal "a quo ", violou, em nosso entender, os mais elementares princípios e a legislação em vigor, relativa à Regulação do Poder Paternal, designadamente o disposto na Declaração dos Direitos da Criança, invocada em sede de alegações, e o disposto nos artigos 1878º, 1885º, 2003° e 2004° do Código Civil.

Deve a decisão ser revogada e mantida a prestação que antes se encontrava a pagar.
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O Recorrido e o Exmº Ministério Público contra-alegaram concluindo pela improcedência do recurso.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir .
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Considerando que as conclusões de recurso limitam o objecto do mesmo ­artigos 684°, nº 3 e 690°, nº 1, do Código de Processo Civil, uma única questão nos é colocada: qual montante da prestação alimentícia a prestar pelo pai a sua filha “C”?
Tal como resulta da sentença, o Apelado “A” não tem um trabalho fixo, embora o procure quer em território nacional, quer no estrangeiro. E, quando trabalha, aufere um rendimento entre 400 e 500 € mensais.
E tendo sido estes os montantes dados como provados, não poderá infirmar-se que o seu rendimento é superior, tal como alega a Apelante, quando refere, na sua conclusão 7° que “É do conhecimento generalizado que as empresas de trabalho temporário apenas declaram que os seus funcionários auferem rendimentos mínimos”. Não se trata dum facto notório nos termos e para os efeitos do artigo 514°, do Código de Processo Civil.
Não valerá a pena explanarmos quanto à obrigação dos pais prestarem alimentos aos filhos de acordo com as suas possibilidades. Iríamos repetir as considerações descritas na sentença, bem como os normativos legais aplicáveis. Alongaríamos as páginas deste Acórdão, sem qualquer necessidade. Para a sentença, pois, remetemos em todos os preceitos nela referenciados.
Tem o pai contribuído para o sustento da filha até com uma prestação superior àquela que era devida, o que patenteia que não tem regateado esforços para que a “C” beneficie dum status porventura superior àquele que teria acaso os pais continuassem a coabitar.
Não terá tão-somente o pai que contribuir. Igual encargo recairá sobre a Apelante. E esta tem um emprego fixo e aufere um rendimento mensal superior, pelo que a sua responsabilidade de contribuição terá que ser, necessariamente maior.
Há, porém um facto novo que ainda não se verificava na altura do julgamento e que poderá equipará-los.
Ocorreu a audiência em 21 de Março de 2006. Quando fixou a matéria de facto, o Exmo Juiz deu como provado que o pai de “C” tinha uma despesa de 175 € mensais com a prestação de uma motorizada. Ora, ela hoje não existe, pois como o Apelado confessou no número 15 das suas contra-alegações, em finais de Março vendeu-a.
O tribunal reduziu a pensão que Paulo Jorge pagava de 165 € para 125 €.
Foi fixada ao pai a pensão de 125 €, ao que acrescerá o seguro de saúde de 27,05 €. Equivale à totalidade de 152,05 €. Quanto a despesas escolares, pagará o pai ainda 50%.
Eis, em conclusão:
Cada um dos pais pagará metade das despesas com os estudos;
Os pais contribuirão para as outras despesas da filha com 304,10 € (152,05 € X 2). Isto é, a “C”, com 12 anos, beneficiará de um rendimento inferior a menos 100 € que o pai aufere nos meses com salário mais reduzido (mesmo que se queira diminuir à prestação monetária da mãe uma parte para o trabalho que tem com os indispensáveis cuidados maternais ... serão de contabilizar).

DECISÃO
Atentando em tudo quanto se procurou deixar esclarecido e sem necessidade de outras considerações, julga-se nesta Relação improcedente o recurso e mantém-se a douta sentença proferida na 1ª Instância.
Custas pela Apelante.
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Évora, 24.05.2007