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ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
AQUISIÇÃO DERIVADA
MÁ FÉ
Sumário
I – A acção de reivindicação obriga a que o seu autor formule dois pedidos (cumulação aparente): o de reconhecimento do direito de propriedade, por um lado, e o da restituição da coisa, por outro. II - Nessa acção compete ao autor a prova de que é proprietário da coisa e de que esta se encontra na posse ou na detenção dos demandados. III – Invocando o A. uma aquisição derivada, baseada em doação, impõe-se que se demonstre, ainda que com base em presunção registral, que a parcela “doada” integrava prédio pertencente ao doador e como tal registado. Assim o exige o principio “nemo plus juris ad alium transferre potest, quam ipse habet”. IV – Litiga de má-fé e como tal deve ser sancionado, o R. que nega factos que não pode deixar de conhecer e alega outros consabidamente falsos.
Texto Integral
Proc. N.º 659/07-2
Apelação
Tribunal Judicial da Comarca de ..... (2º Juízo Cível) - Proc. N.º 246/2001
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I. A........................, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra M........................ e J........................ (vide rectificação de fls. 338/342) e mulher C........................, peticionando:
- se declare serem a autora e o 1º réu, M........................, os únicos proprietários do prédio urbano de um pavimento composto por sala comum, cozinha, dois quartos, casa de banho, corredor, despensa, sótão, terraço, garagem e logradouro, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ......................... sob o art.º 2865º, implantado no terreno que lhes foi doado pelos 2º réus;
- se condenem os réus a reconhecer esse direito de propriedade da autora e a restituírem-lhe o aludido prédio;
- se declare nula, ou se assim se não entender anulada, a declaração Modelo 129 apresentada em 8-11-1989 na Repartição de Finanças de .... e referida em 34º da p.i.;
- se mande oficiar à aludida Repartição para averbar em nome da autora e de M........................ o prédio urbano em causa e para rectificar a área descoberta do prédio para 170,64 m2;
- se ordene o cancelamento dos averbamentos números 2, 3 e 4 que foram feitos à descrição do prédio na C.R.P. de .... sob o n.º 29210, através das apresentações nº 30 de 15/06/1983, nº 6 de 19/10/90 e nº 46 de 31/10/2000, respectivamente, efectuados posteriormente à data da doação referida nos arts. 4º e 5º da p.i.;
- se ordene que seja desanexado o terreno para construção urbana com a área de 280 m2 objecto da doação referida nos arts. 4º e 5º da p.i., de modo a permitir a descrição autónoma do prédio urbano em referência e a sua inscrição predial a favor da autora e do réu M........................
Alegou, em síntese, que casou com o réu M........................ em 24/03/1969; que em 5 de Março de 1979 os réus J........................ e mulher, sogros da autora, doaram ao filho e nora, pelas forças da quota disponível dos seus bens, um terreno para construção urbana localizado no ................, freguesia de ....................., com a área de 280 m2, com vista a construção de uma futura casa, para habitação própria dos donatários; que tal prédio era parte a desanexar do descrito na CRP de .....sob o n.º 29210; que nunca foi efectuado na CRP o registo dessa desanexação; que a autora e o então seu marido construíram uma moradia nesse terreno, a qual ficou concluída em 31de Setembro de 1979; que a autora e o 1º réu habitaram nesse imóvel até sensivelmente Fevereiro de 1981, data em que se separaram; que a autora e o réu M........................ divorciaram-se, por mútuo consentimento, por sentença proferida dia 28-02-1983, a qual transitou em julgado; que na relação de bens do casal apresentada nos autos de divórcio foi descrito sob a verba n.º 8, o aludido prédio urbano; que, aproveitando-se do facto do prédio se encontrar omisso na matriz, os réus, em conluio e no intuito de prejudicar a autora, apresentaram na Repartição de Finanças de ...... no dia 8-11-89 declaração modelo 129 no nome de J........................, tendo este declarado falsamente que o prédio urbano que foi edificado na parcela doada a desanexar tinha a superfície coberta de 109,36 m2 e um logradouro com a área de 490,64 m2, quando na realidade tem de logradouro a área de 170,64 m2, dando tal declaração origem à inscrição matricial do prédio no nome de J........................ e sob o art. 2865; que através da apresentação nº 6 de 19 de Outubro de 1990 a ré requereu o registo do averbamento da construção do prédio em discussão; e que as declarações constantes da declaração Mod. 129 e os registos efectuados são nulas.
Citados para contestar, os réus deduziram oposição, defendendo-se por excepção, invocando ineptidão da p.i., e por impugnação, alegando que nunca a autora e o réu M........................ construíram no lote de terreno doado qualquer habitação.
Concluem pela sua absolvição da instância e, caso assim se não entenda, pela improcedência da acção.
A ré replicou, tendo alterado o pedido, peticionando agora que apenas os 2ºs réus sejam condenados a reconhecer o direito de propriedade da autora e do 1º réu sobre o prédio em apreço e a restituir-lhes o mesmo.
Face ao óbito da ré foi suspensa a instância, tendo posteriormente sido declarado habilitados os herdeiros desta, os demais réus e S.....................
Na audiência preliminar os réus declararam dever considerar-se suprida a excepção da ineptidão invocada na contestação, atenta a réplica apresentada.
Após foram fixados os factos assentes e foi elaborada a base instrutória.
Pelo requerimento de fls. 376 a autora requereu a condenação dos réus como litigantes de má fé, em multa e indemnização, correspondente aos honorários ao seu advogado, no montante de €2500,00, a que acresce IVA à taxa legal.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual se julgou a acção procedente e se decidiu:
“a) Declarar-se a A. e M........................ como os únicos proprietários do prédio urbano que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana de ..................... sob o n.º 2865, implantado em terreno que fora doado pelos RR, J........................ e mulher, C..............................
b) Condena-se os RR J........................ e mulher, C............................. a reconhecerem tal direito de propriedade e na restituição do prédio à A. e a M........................;
c) Ordena-se o cancelamento dos averbamentos 2, 3 e 4 da descrição do prédio pelas apresentações 3, 6 e 46;
d) Declara-se nula a declaração mod. 129 apresentada a 8 Nov89 na R.F. .....;
e) Condenam-se M........................ e J........................ por litigância de má-fé, respectivamente em 750 (setecentos e cinquenta) Euros e de 500 (quinhentos) Euros de multa e ambos, solidariamente no pagamento de indemnização à A., correspondente ao valor dos honorários do Il. Mandatário da A., no valor de 2500 (dois mil e quinhentos) Euros”.
Inconformado, veio o réu M........................ interpor o presente recurso de apelação, cujas alegações terminou com a formulação das seguintes conclusões:
1. O recorrente M........................ e a recorrida foram casados.
2. Na pendência do matrimónio foi-lhes doado um lote de terreno para construção urbana com a área de 280 m2, sito no sitio da ......., freguesia de ....................., a confrontar Norte e Nascente e Poente com J........................, sul com caminho, omisso na respectiva matriz.
3. O lote de terreno supra referido era a desanexar do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de .....sob o número 29210, a fls. 182 v do livro B-73.
4. A doação desse lote de terreno tinha em vista a construção de uma futura casa para os então cônjuges.
5. A parcela de terreno foi participada pelo réu M........................ à competente repartição de Finanças em 16/03/1979.
6. Em 07 de Maio de 1979, M........................, 1° Réu, requereu junto da Câmara Municipal de .... que lhe fosse passada licença de construção de urna moradia no sítio da ......., pelo prazo de 210 dias;
7. Em 26 de Junho de 1979 foi concedida pela Câmara Municipal de .... a licença n.o 534 para construção de um edifício de dois pisos, rés-do-chão e primeiro andar a M........................;
8. Tal licença foi solicitada para proceder á construção da referida casa no terreno que lhes havia sido doado pelos 2°s réus.
9. A autora intentou a acção de divórcio litigioso que posteriormente foi convertida em mutuo consentimento, divórcio este que veio a ser decretado em 28/02/1983, por sentença transitada em julgado.
10. Na respectiva acção de divórcio, aquando da sua conversão para mutuo foi apresentada urna relação de bens comuns, na qual figurava "lote de terreno para construção urbana com a área de 280 m2, no sítio da ......., freguesia de ....................., concelho de ...., a confrontar do Norte Nascente e Poente com J........................ e Sul com caminho, omisso na respectiva matriz. ";
11. Tal relação de bens foi assinada pelo 1° réu, sua mandatária e Advogado da Autora.
12. Em 08/11/89 J........................ participou na Repartição de Finanças de .... um prédio urbano composto por sala comum, cozinha, dois quartos, casa de banho, corredor, um terraço, urna varanda, urna garagem e um logradouro, a confrontar do Norte e Nascente com J........................, Sul caminho e Poente com A..............
13. Esta inscrição deu origem ao artigo 2865, da freguesia de ......................
14. O prédio matriciado sob o artigo 2865 supra, confronta a Norte e Nascente com J........................, Sul caminho e Poente com ............... e tem a área coberta de 109,36 m2 e descoberta de 490, 64 m2, perfazendo um total de 600 m2.
15. O prédio urbano supra faz parte do descrito na Conservatória do Registo Predial de .... sob o número 29210, fls.182 v do livro B-73.
16. Por sentença ora recorrida o Tribunal Ad quo declarou a A. e o 1° réu como os únicos proprietários do prédio urbano que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana de ...................... sob o número 2865, implantado em terreno que lhes fora doado pelos Réus J........................ e mulher ...........................
17. Da matéria de facto considerada assente pelo douto tribunal ad quo, não poderia este chegar a esta conclusão. Senão vejamos:
18. O lote de terreno doado pelos 2.ºs Réus ao 1° réu e à autora, tem a área de 280 m2 e as seguintes confrontações, norte, nascente e poente J........................ e sul caminho.
19. Não foi provado que as confrontações do lote de terreno doado tivessem sido alteradas.
20. O prédio urbano matriciado sob o artigo 2865 confronta a norte e nascente com J........................, poente com A............ e sul com caminho e tem a área de 600 m2.
21. Tendo em conta a matéria assente e dada como provada, nomeadamente que:
.:. em data não concretamente apurada, a autora e o 1 ° réu iniciaram de raiz a construção de uma casa (ponto 27 da fundamentação de facto da sentença ora recorrida );
.:. esta casa foi edificada numa parcela com área concretamente não apurada a desanexar do prédio descrito sob o número 29210 (ponto 28);
.:. com a apresentação do modelo 129, pelo menos, o réu, J........................, pretendeu e conseguiu inscrever o prédio doado e construção nele edificado com área coberta de 109,36 m2 (ponto 34 );
nunca poderia o douto tribunal recorrido ter decidido como decidiu, ou seja, declarar a autora e M........................ como os únicos proprietários do prédio urbano que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana de ....................., sob o número 2865, implantado em terreno que lhes fora doado pelos Réus, J........................ e C.........................
22. Isto porque, o prédio matriciado sob o artigo 2865, por um lado, não tem apenas a área coberta de 109,36 m2, tem também a área descoberta de 490,64 m2 e, por outro lado, a confrontação poente do prédio matriciado sob o artigo 2865, não coincide com a confrontação poente do lote de terreno doado, (veja-se alínea r) e s) dos factos assentes ).E,
23. Não resulta provado que os 2°s réus tivessem doado ao 1° réu e á autora outra qualquer parcela de terreno que não o lote de terreno com a área de 280 m2 supra referido.
24. Acresce que, o Meritíssimo juiz do tribunal ad quo considerou como facto assente, que em 12/04/1982 foi apresentado no processo de divórcio inicialmente litigioso e então já convertido em mutuo consentimento, uma relação especificada dos bens do casal, assinado pelo I ° réu e sua mandatária e pelo advogado da autora, na qual, figurava um imóvel, com a seguinte descrição " lote de terreno para construção urbana com a área de 280 m2, no sitio da ......., freguesia de ....................., concelho de ...., a confrontar do Norte, Nascente e Poente com J........................ e sul com caminho, omisso na respectiva matriz ". Ora,
25. Corno é que com tal facto assente, valorou positivamente o Meritíssimo juiz ad quo o depoimento das testemunhas pela autora arroladas que disseram em tribunal que a casa aquando do divórcio já estava construída. Assim sendo,
26. Se a casa já estava construída porque é a autora através do seu mandatário em 12 de Abril de 1982, na relação de bens comuns do casal e supra referida relacionou um lote de terreno para construção urbana.
27. Corno resulta do art.º 20 da sua P.I. a Autora alegou ter habitado a casa até Fevereiro de 1981, data em que abandonou o lar conjugal, indo viver para .......
28. Do supra exposto, nomeadamente, dos factos assentes resulta existir urna manifesta contradição entre estes e a decisão do tribunal ad quo.
29. Na verdade, a autora não fez prova do direito de propriedade de que se arrogava, relativamente à propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 2865, da freguesia de ......................
30. O prédio urbano matriciado sob o artigo supra referido encontra-se descrito na conservatória do Registo Predial de .... sob o n.o 29210, fIs. 182 v, do livro B73, no qual, se mostra inscrito a favor dos réus J........................ e C........................ pela a inscrição 21.242.
31. Decidindo corno decidiu o douto tribunal ad quo, decidiu em violação do disposto no n.º 1 do artigo 342° conjugado com o n.º 1 do art. 344°, todos do Código Civil.
32. Assim, em face da prova existente no processo, deverão V. Ex. as, Venerandos Juízes Desembargadores alterar a decisão ora recorrida, declarando que a autora não é proprietária do prédio urbano matriciado sob o artigo 2865, da freguesia de ......................
33. A condenação do réu M........................ e J........................ como litigantes de má fé constitui uma decisão errada proferida pelo Meritíssimo Juiz ad quo. Dado que,
34. Tendo em conta o supra alegado, não deduziram os réus oposição cuja falta de fundamento não devessem ignorar, nem alteraram as verdade dos factos, assim como, não omitiram factos relevantes para a boa decisão da causa, bem como, não praticaram omissão grave do dever de cooperação nem utilizaram os autos com fim manifestamente reprovável.
35. Os réus limitaram-se a defender aquilo que julgavam e julgam serem os seus direitos.
Termina pedindo a revogação da sentença recorrida, proferindo-se outra que absolva os réus de todos os pedidos formulados pela autora.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II. Em 1ª instância, foi dada como provada a seguinte matéria factual:
1. A Autora e o 1º Réu, M........................ casaram entre si, civilmente e sem convenção antenupcial no dia 24 de Março de 1969 (Doc. n.º 1), tendo sido decretado o seu divórcio no dia 28 de Fevereiro de 1983, por Sentença transitada em julgado.
2. Após o casamento referido em 1, Autora e 1º Réu permaneceram a viver em ......, na cidade de ....., onde tiveram o seu lar conjugal até Outubro de 1978.
3. Em Outubro de 1978 Autora e 1º Réu regressaram a Portugal para o ................, freguesia de ....................., concelho de ...., instalando-se na casa dos ascendentes do 1º Réu, os aqui 2º Réus.
4. Por escritura pública foi celebrado um acordo no essencial com o seguinte teor:
“Nº 161 Doação
No dia cinco de março de mil novecentos setenta e nove, (...) compareceram:
Em primeiro lugar J........................ e mulher C..................., declararam ser casados sob o regime da comunhão geral, (...)
Em segundo lugar M........................ e mulher A........................, declararam ser casados sob o regime da comunhão de adquiridos, (...)
Pelos primeiros foi dito:
Que são donos de um prédio rústico, no sitio da .........., freguesia de ..........................., concelho de ....., que consta de terreno para construção urbana com a área de duzentos e oitenta metros quadrados, a confrontar do norte, nascente e poente com J........................ e sul com caminho, omisso na matriz, dada a sua natureza (...)
Que o citado prédio é parte a desanexar do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ..... sob o número vinte nove mil duzentos e dez, a folhas cento oitenta e duas verso, do livro – 13 – setenta e três.
Que pela presente escritura doam aos segundos outorgantes, seu filho e nora o prédio atrás descrito.
Que esta doação na parte respeitante ao filho é também feita por conta da quota disponível dos doadores.
(...)
Pelos segundos foi dito:
Que aceitam a presente doação.
(...)”.-
5. O 1º Réu, M........................ requereu à CM.. o pedido de desanexação da parcela de terreno doada, tendo nessa sequência sido passada certidão camarária (Doc. fls. 15 a 17).
6. O 1º Réu e a Autora, nunca chegaram a efectuar na Conservatória do Registo Predial de ..... o registo da desanexação referida em 4.
7. No dia de 16 de Março de 1979 o 1º Réu, M........................, participou a doação referida em 4. junto da Repartição de Finanças de ....., o qual teve o n.º 13.429, tendo juntado a certidão da escritura de doação e a relação de bens (Doc. fls. 22 a 29 ).
8. A doação do terreno referido em 4. tinha em vista a construção de uma casa pelos cônjuges, para sua própria habitação.
9. Em 7 de Maio de 1979, o 1º Réu M........................, requereu junto da Câmara Municipal de ..... que lhe fosse passada licença para construção de uma moradia no ..................., pelo prazo de 210 dias (Doc. fls. 30 a 40).
10. Para efeitos de instrução do pedido referido em 9., o 1º Réu M........................, juntou, entre outros, ao seu requerimento os documentos seguintes:
Escritura de Doação (fls. 31 a 33);
Planta de Localização (fls. 34);
E memória descritiva (fls. 39);
Plantas dos cortes e alçadas da moradia (fls. 161 e seguintes);
- Termo de Responsabilidade do Engenheiro Técnico Civil (fls. 35).
11. Por requerimento datado de 15 de Junho de 1979, o Réu, M........................, tendo tomado conhecimento da aprovação do projecto de arquitectura que submetera à apreciação da Câmara Municipal de ....., veio juntar ao respectivo Processo de Licenciamento para construção, que teve o n.º 1168/79, os cálculos de estabilidade (Doc. fls. 37 ).
12. Em 26 de Junho de 1979 foi concedida pela Câmara Municipal de ..... a Licença n.º 534 para construção de um edifício de dois pisos, rés-do-chão e primeiro andar a M........................ (Doc. fls. 40).
13. Em 22 de Outubro de 1981 a Autora instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de ..... Acção de Divórcio Litigioso contra M........................, a qual ficou registada com o n.º 131/81 da 2.ª Secção do 1.º Juízo (fls. 41 a 59).
14. O divórcio referido em 13. veio a ser convertido em mútuo consentimento.
15. Em 15 de Junho de 1982, no processo referido em 13., foi apresentada a relação de todos os bens do casal, assinada pelo 1º Réu e pelo seu advogado, tendo M........................ relacionado na verba n.º 8 da sua relação de bens o seguinte:
“PRÉDIO URBANO em construção a ser edificado no lote de terreno doado, sito no Sitio da .........., freguesia de ..........................., concelho de ....., sem inscrição matricial” (Doc. fls. 56).
16. O prédio doado referido em 4, inexistente fiscalmente nos nomes de Mateus de Fonseca Cheles e A........................ (Doc. fls. 63).
17. Em 16 de Fevereiro de 2001 não se encontravam inscritos quaisquer prédios na área do concelho de ..... no nome de M.................... (Doc. fls. 63).
18. No dia 8 de Novembro de 1989, o Réu J........................ apresentou a declaração para inscrição de um prédio urbano na matriz (modelo 129) com a seguinte descrição:
“Uma habitação unifamiliar com dois quartos, uma casa de banho, um corredor, uma despensa, um terraço, uma varanda, uma garagem e logradouro (...) coberta 109,36; descoberta 233,33; confrontações, Norte – J........................, Sul – Caminho, Nascente – J........................ e Poente – A.............”.
19. A declaração referida em 18. deu origem à inscrição matricial do prédio no nome de J........................, sob o artigo 2865 da freguesia de ..........................., sendo que à data de 16 de fevereiro de 2001 o prédio tinha 490,64 m2 de área descoberta e 109,36 de área coberta (Doc. fls. 73).
20. Após a inscrição matricial referida em 19., a Ré, C..................., através da Apresentação 6 de 19 de Outubro de 1990, requereu junto da Conservatória do Registo Predial de ..... o registo do averbamento de construção do prédio inscrito na matriz sob o nº2865 (urbano) a seu favor e de seu marido, J........................ (Cfr. fls. 74 a 77 e 18 a 21).
21. A Ré C................... munindo-se das cadernetas prediais actualizadas, respectivamente, em 15/10/1990 e 19/10/1990, respeitantes ao artigo rústico 63 da Secção AJ e ao artigo urbano 2865 e ainda de um duplicado do pedido de rectificação de área efectuado junto da Repartição das Finanças de ..... em 19/10/1990, deu entrada na C.R.P. de ..... do registo de averbamento de construção do prédio 2865 (Doc. fls. 74 a 77 ).
22. Na Conservatória do Registo Predial de ..... encontra-se descrito sob o nº 29210 a folhas 182 v do Livro B-73 o seguinte:
“- Nº 29.210
Rústico, no sítio da .........., freguesia de ...................... Consta de terras de semear, de areia, com árvores, confrontando do nascente com J............... e outro, poente com J...................... e outro, norte com J.............. sul com caminho – Valor Venal:- 7.309$50.- Inscrito na respectiva matriz predial sob os artigos 166 e 168 (...) nº3, a fls. 91-nº 8.100 .-(...)
Apresentação nº1 ------------- 7 – Março – 1972
-----------
Nº1 – É de quinze contos o valor venal deste prédio – nº 29.210.-(...)--------------------------------ap. nº30 – 15 Junho 1983 -----------------------------
Nº2 – Ao prédio supra nº 29210, foram anexados os descritos sob os nº26__9, 26240, a fls. 50 e 50 v do livro B-66, e 22514, a fls.147 do livro B-56, em virtude de formarem um só prédio misto, composto de terra de semear com árvores, pomar, estufa e vinha e casas de morada de um pavimento com vários compartimentos, confrontando a norte com J............................, sul caminho e C.............., nascente J...................... e poente caminho e C...............e outros. Rendimento colectável: 70.753$00. Artigos matriciais: 918 rústico e 2276 urbano. Requerimento declarações de hoje e 2 documentos referenciados no requerimento.
Av. 03 – ap. 06/901019 – misto – horta, pomar de citrinos, vinha, 1 amendoeira e 2 casas de morada de um pavimento e logradouro, tendo uma , 2 quartos, corredor, sala de jantar, casa de banho e cozinha e outra, sala comum, cozinha, 2 quartos, casa de banho, corredor, despensa, sótão, terraço e garagem – 21120 m2 – Sul, caminho e A............ e poente caminho e A.............. – artigos: 63, secção AJ, rústico e 2276 e 2865, urbanos - V.P. 3.624.362$00.
Av.04 – ap.46/20001031 – Horta, pomar de citrinos, vinha, amendoeiras e três edifícios, sendo um de um pavimento composto por sala, cozinha, dois quartos, casa de banho, corredor, despensa, sótão, terraço, garagem e logradouro; outra de um pavimento, composto por quarto, corredor, casa de banho, cozinha e logradouro; e outro de um pavimento, composto por armazém com duas casas de banho, escritório, arrecadação e logradouro – artigos 63 secção AJ rústico e 2276, 2865 e 4056 urbanos – V.P. 13124502$00.
Apresentação nº 1 –--------- 7-Março-1972.- -------------------------------------Número da inscrição: 21.242.
Natureza.
Sujeito activo: J........................, casado segundo o regime da comunhão geral de bens com C........................, residente no sítio da .........., freguesia de ............................
Sujeitos passivos: A................. e sua mulher R....................
Facto inscrito: aquisição.
Causa: compra.
Valor: 15 contos.
Documentos: Fotocópia de 28 de Fevereiro de 1962, da escritura lavrada a fls. 98 v. do livro B-1, do 1º Cartório da secretaria notarial de ..... e 2 documentos referenciados no requerimento -“ (Doc. fls. 123 e 124).
23. Em 12 de Abril de 1982 foi apresentado no processo referido em 13. um requerimento assinado pelo 1º Réu e Advogado da Autora com o seguinte teor:-
“M........................ e mulher A........................, requerentes nos autos de divórcio por mútuo consentimento, vêm juntar aos mesmos os elementos necessários ao prosseguimento dos acima referidos autos.-
(...)
Junta-se: Relação dos bens comuns do casal, certidão de repartição de Finanças de ..... e acordo quanto aos menores.”
24. Junto com o requerimento referido em 23. foi apresentado um documento assinado pelo 1º Réu, sua Mandatária e Advogado da Autora com o seguinte teor:- “Relação especificada dos bens do casalM........................ e mulher A........................ I IMÓVEL Lote de terreno para construção urbana com a área de 280 m2, no Sítio da .........., freguesia de ..........................., concelho de ....., a confrontar do Norte, Nascente e Poente com J........................ e Sul com caminho, omisso na respectiva matriz.”-
25. Em 12 de Abril de 1982 foi apresentado no processo referido em 13. um documento assinado pelo Advogado do 1º Réu com o seguinte teor:
“(...)
Lote de terreno para construção urbana com a área de duzentos e oitenta metros quadrados, no Sítio da .........., freguesia de ....................., deste concelho, a confrontar do Norte, Nascente e Poente com J........................ e Sul com caminho.-
E.D.
....., 15 de Janeiro de 1982
(...).”
26. No processo referido em 12 consta uma acta com o seguinte teor:
“Acta de Conferência – Artº.1.420º do C.P. Civil-
No ano de mil novecentos oitenta e dois aos dezoito dias do mês de Maio, nesta cidade de ..... no Tribunal Judicial, onde se encontrava o Excelentíssimo Juiz (...)à hora marcada (...) ordenou (...) que interpelasse as pessoas convocadas nestes autos de acção de divórcio em que são requerentes A........................, e M........................, o que o dito oficial cumpriu, verificando estarem presentes o requerente M........................, acompanhado do seu mandatário, Sr. Dr. A...................... e bem assim o Sr. Dr. J.............., que apresentou procuração da requerente, com poderes especiais, a qual depois de ter sido rubricada foi mandada juntar aos autos.-
(...)
Exposto aos presentes os fins da diligência, pelo requerente M........................, foi dito que requeria a suspensão da presente diligência, por tempo não inferior a 30 dias, com vista a ser convenientemente esclarecido sobre o local onde se encontram presentemente os filhos menores e bem assim com vista a relacionar os bens móveis do casal e um automóvel propriedade de ambos.-
(...)
Seguidamente ele senhor Juiz proferiu o seguinte despacho:-
Defiro ao requerido (...), suspendo por 30 dias a presente conferência, dado haver fundados motivos para crer que a suspensão facilitará (...), permitir o relacionamento dos restantes bens do casal.
(...).”-
27. Em data não concretamente apurada M........................ e A........................ iniciaram de raiz a construção de uma casa.
28. Esta casa foi edificada numa parcela com área não concretamente apurada a desanexar do prédio descrito sob o nº 29210.
29. A referida edificação tinha área coberta e logradouro.
30. A declaração para a inscrição da edificação referida em 27 a 29. na matriz urbana nunca chegou a ser feita na Repartição de Finanças.
31. O 1º Réu e a Autora ocuparam a edificação referida em 27 a 29., habitando-a em comunhão de leito, mesa e habitação, até data não concretamente apurada em que divergências geradas no seio do casal levou a Autora a abandonar o lar conjugal, indo viver para .......
32. Após a separação, a autora abordou diversas vezes o 1º R., com vista ao divórcio e à divisão da casa, sem que contudo, houvesse cedência por parte deste para o pretendido.
33. Após o divórcio, a autora abordou diversas vezes o 1º réu no sentido da partilha dos bens, nunca tendo conseguido obter qualquer tipo de acordo.
34. Com a apresentação da declaração do modelo 129, pelo menos o réu J........................ pretendeu e conseguiu inscrever o prédio doado e construção nele edificado com área coberta de 109,36 m2 em seu nome.
35. Era intenção da A. e do 1º réu M........................ construir no lote de terreno doado um prédio urbano para habitação de ambos.
36. E foi sendo construído ao longo dos anos.
37. O 1º R. trabalhou na dita construção.
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III. Nos termos dos art.ºs 684º, n.º 3, e 690º, n.º 1, do C.P.Civil, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n.º 2 do art.º 660º do mesmo Código.
As questões a decidir resumem-se a saber:
- se a autora fez prova da identidade da parcela doada e do prédio reivindicado;
- se existe contradição entre o facto de se ter dado como provado que em 12/04/1982 foi apresentado no processo de divórcio uma relação especificada dos bens do casal, na qual, foi relacionado um imóvel como se tratando de um lote para construção e o facto de se ter dado como assente que aquando do divórcio a casa já estava construída;
- se está provado que a coisa reivindicada se encontra na posse ou na detenção dos demandados;
– se foi violado o disposto no n.º 1 do artigo 342° conjugado com o n.º 1 do art. 344°, todos do Código Civil;
- se os réus M........................ e J........................ litigaram de má fé.
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IV. Da questão de mérito:
No caso encontramo-nos em presença de uma acção de reivindicação.
Tal acção, como está configurada no art. 1311º do C. Civil, obriga a que o seu autor formule dois pedidos (cumulação aparente): o de reconhecimento do direito de propriedade, por um lado, e o da restituição da coisa, por outro.
Nessa acção compete ao autor a prova de que é proprietário da coisa e de que esta se encontra na posse ou na detenção dos demandados – cfr. Ac STJ 27-09-2005, Cons. Fernandes Magalhães, in www.dgsi.pt.
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Na p.i. a autora invocou uma forma de aquisição derivada do direito de propriedade (doação a si e ao seu ex-marido, o réu M........................, de um terreno, com a área de 280m2 a desanexar do prédio descrito na CRP de ..... sob o n.º 29.210).
Porém, a doação não se pode considerar constitutiva do direito de propriedade, mas apenas translativa desse direito, pelo que, nestes casos, é preciso provar que o direito já existia no transmitente, de acordo com o princípio “nemo plus juris ad alium transferre potest, quam ipse habet”– cfr. Pires de Lima e A. Varela, C. Civil Anotado, volume III, 2ª edição revista e actualizada, pag. 115.
Para o efeito, o reivindicante pode socorrer-se da presunção do direito estabelecida no art. 7º do Código do Registo Predial.
Ora, no caso, apurou-se que a parcela de terreno reivindicada integra o prédio descrito na CRP de ..... sob o n.º 29210, o qual à data da doação se encontrava inscrito a favor dos transmitentes, os réus J........................ e mulher, esta entretanto falecida.
Assim sendo, não necessita a autora de produzir afirmações acerca da aquisição pelos transmitentes desse direito, nem de provar essas afirmações, pois que a lei presume a existência do direito na esfera jurídica e patrimonial dos doadores (art. 7º do CRP), não sendo exigível nestes casos a prova da cadeia ininterrupta de transmissões do imóvel até se encontrar um título de aquisição originária – cfr. Ac. STJ de 21-11-1996, relatado pelo Cons. Sousa Inês, in BMJ 461, pag. 406; A. Varela, RLJ, ano 120, pag. 221.
Deste modo, é fora de dúvida que a autora, juntamente com M........................ (1º réu) são proprietários da aludida parcela, podendo reivindicar a mesma (art. 1405º, n.º 2, do C. C.).
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Porém, o que está verdadeiramente em causa no recurso é a questão de saber se a autora fez prova da identidade da parcela doada e do prédio reivindicado.
Ora, nesta matéria apurou-se:
- que em data não concretamente apurada M........................ e A........................ iniciaram de raiz a construção de uma casa;
- que no dia 8 de Novembro de 1989, o réu J........................ apresentou a declaração para inscrição de um prédio urbano na matriz (modelo 129) com a seguinte descrição: “Uma habitação unifamiliar com dois quartos, uma casa de banho, um corredor, uma despensa, um terraço, uma varanda, uma garagem e logradouro (...) coberta 109,36; descoberta 233,33; confrontações, Norte – J........................, Sul – Caminho, Nascente – J........................ e Poente – A..............”;
- que a declaração modelo 129 deu origem à inscrição matricial do prédio no nome de J........................, sob o artigo 2865 da freguesia de ..........................., sendo que à data de 16 de Fevereiro de 2001 o prédio tinha 490,64 m2 de área descoberta e 109,36 de área coberta (Doc. fls. 73);
- que com a apresentação da declaração do modelo 129, pelo menos o réu J........................ pretendeu e conseguiu inscrever o prédio doadoe construção nele edificado com área coberta de 109,36 m2 em seu nome.
Deste enunciado deriva que a parcela de terreno doada, com a área de 280 m2 (sendo 109,36m2 de área coberta) integra a realidade predial que se encontra matriciada na Repartição de Finanças de ....., sob o artigo urbano 2865 da freguesia de Santa Bárbara, se bem que esta última seja mais abrangente (enquanto a parcela doada tem a área de 280 m2 e confronta a norte, nascente e poente com J........................ e sul com caminho, a realidade predial matriciada sob o artigo urbano 2865 tem a área de 600m2 e confronta do norte e nascente com J........................, sul com caminho e poente com A..............).
A esta conclusão não obsta a circunstância de na acção de divórcio por mútuo consentimento a autora e o seu (à data) marido, o réu M........................, terem relacionado como bem comum um lote de terreno para construção urbana com a área de 280 m2, no Sítio da .........., freguesia de ..........................., concelho de ....., a confrontar do Norte, Nascente e Poente com J........................ e Sul com caminho, omisso na respectiva matriz.
Na verdade, tal relacionamento não obstava que o tribunal a quo pudesse dar como provado que a casa já estava construída, pois que pode ter havido um relacionamento incorrecto nos autos de divórcio (motivado pelo facto da casa não possuir no 1º piso os dois quartos e casa de banho previstos no projecto ou por o terreno estar omisso na matriz ou por qualquer outra razão).
Ademais, o documento que corporiza tal relacionamento foi apenas um dos elementos probatórios de que o tribunal a quo dispôs para valorar a prova produzida e os apelantes não impugnaram a decisão proferida sobre a matéria de facto, nos moldes definidos no art. 690º-A do CPC.
Não se tendo provado a correspondência entre o relacionamento efectuado na acção de divórcio e a realidade dos factos, improcede a conclusão formulada pelos apelantes, não se verificando assim qualquer contradição entre os dois factos provados.
Deste modo, em face da factualidade provada, é indiscutível que a autora e o seu ex-marido são comproprietários da parcela doada e não de toda a realidade predial matriciada sob o art. 2865.
Haverá, por isso, que precisar a parte dispositiva da sentença recorrida, de forma a evitar dúvidas sobre o decidido, pois que o prédio reivindicado não é todo o que se encontra matriciado sob aquele artigo, como aparentemente poderia derivar da leitura do decidido sob a alínea a), mas tão-só o terreno que foi doado pelos réus J........................ e mulher, com a área de 280m2 e que inclui a edificação aí construída.
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Por outro lado, como já frisámos, a procedência da acção de reivindicação depende da prova de que a coisa se encontra na posse ou na detenção dos demandados.
A este propósito, na p.i. (arts. 48º e 52º) a autora alegou que os réus se arrogam donos e possuidores do prédio em causa nos autos, pretendendo subtrair-lhe a casa nele edificada, e formulou o correspondente pedido de restituição.
De sua vez os réus na contestação alegaram que a casa edificada no prédio matriciado sob o art. 2865 foi construída pelos réus J........................ e mulher, e não pela autora e seu ex-marido, tendo-se oposto à sua restituição.
Deste modo, de forma implícita, os segundos réus reconhecem que a edificação se encontra sob a sua detenção.
Assim sendo, considera-se admitido por acordo esse facto – art. 490º, n.º 2, do CPC.
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Estando assente nos autos tal factualidade e que a autora é, juntamente com o seu ex-marido, comproprietária do terreno reivindicado (vide art. 1722º, n.º 1, al. b) do C. Civil), é manifesto que procede o pedido de reconhecimento do direito de propriedade da autora e de M........................ sobre tal terreno.
Porém, tendo o pedido de restituição sido apenas formulada por uma das comproprietárias (a autora), não haverá que condenar os réus J........................ e herdeiros da mulher deste na restituição da parcela de terreno em referência ao réu M........................, porquanto este não deduziu nos autos tal pretensão.
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Por outra via, como se salienta na decisão recorrida, a declaração modelo 129 que deu origem ao artigo matricial 2865, em nome do réu J........................, não corresponde à realidade dos factos, no que tange à titularidade da parcela de terreno e edificação nela construída.
Essa desconformidade não importa, porém, a nulidade da declaração, mas apenas que a mesma não produza qualquer efeito, pois que não nos encontramos em presença de um fenómeno que se prenda com a falta ou vícios da vontade ou com o objecto negocial, mas sim com a eficácia da declaração para efeitos de inscrição matricial - vide sobre os efeitos da falsidade, Lebre de Freitas, A Falsidade no Direito Probatório, pag. 154/156.
Assim, haverá que declarar sem efeito tal declaração.
Procede, assim, em parte, a apelação interposta pelos réus.
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Quanto à condenação como litigantes de má fé:
Na sentença os réus Mateus da Fonseca e J........................ foram condenados como litigantes de má-fé por:
- terem deduzido pretensão para a qual sabiam não ter fundamento legal;
- por terem alterado a verdade dos factos, pois que negaram factos que se provaram: ter a autora e o seu ex-marido construído uma casa na parcela doada e ter o réu J........................, com a apresentação da declaração modelo 129, pretendido e conseguido inscrever o prédio doado e construção nele edificada em seu nome.
Contra tal condenação insurgem-se os apelantes.
Porém, sem razão.
Com efeito os réus deduziram oposição cuja falta de fundamento não deviam ignorar e negaram os factos acima referidos (em especial ter a autora e o seu ex-marido construído no terreno doado uma casa para habitação de ambos), que se vieram a provar, chegando ao ponto de alegarem que aquela casa foi construída pelos réus J........................ e mulher e que não se encontra implantada no terreno doado.
Ora, os factos supra descritos não poderiam, naturalmente, ser desconhecidos daqueles réus, os quais não poderiam deixar de estar conscientes do infundado da sua oposição (saliente-se que na p.i. e na réplica a autora, verdadeiramente, apenas peticiona o reconhecimento da propriedade sobre o terreno doado e não sobre a totalidade do prédio matriciado sob o art. 2865).
É, por isso, manifesto terem os réus M........................ e J........................ litigado de má-fé – art. 456º, n.º 1 e 2, als. a) e b) do CPC.
No que tange ao montante das multas e da indemnização fixadas – o qual não foi directamente questionado neste recurso -, mostra-se equilibrado o valor encontrado em 1ª instância.
Bem andou, pois, o Sr. Juiz ao condenar aqueles réus em multa e em indemnização.
Improcede assim, nesta parte, as conclusões dos apelantes.
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V. Decisão:
Pelo acima exposto, decide-se:
I - julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se, em parte, o decidido nas alíneas a), b) e d) da parte dispositiva da sentença e, em consequência:
- declara-se que a autora é, juntamente com o seu ex-marido, M........................ (1º réu), proprietária de uma parcela de terreno a desanexar do prédio descrito na CRP de ..... sob o n.º 29.210, com a área de 280m2, que lhes foi doada através da escritura outorgada dia 5-03-1979, sendo 109,36m2 de área coberta e o restante de logradouro, encontrando-se edificada na mesma uma casa de um pavimento composto por sala comum, cozinha, dois quartos, casa de banho, corredor, despensa, sótão, terraço e garagem, parcela essa que faz parte do prédio que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ........................... sob o art.º 2865º (e não de todo o prédio matriciado sob esse artigo);
- condenam-se os réus J........................ e herdeiros habilitados de C............................. a reconhecerem tal direito de propriedade e a restituírem a aludida parcela à autora;
- Declara-se sem efeito a declaração modelo 129 apresentada dia 8 de Novembro de 1989 na Repartição de Finanças de ..... pelo réu J........................;
II - No mais, confirma-se a sentença recorrida.
III - Custas nesta Relação e em 1ª instância pelos apelantes e apelada, na proporção de 7/8 e 1/8, respectivamente.
IV - Notifique.