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COMODATO
Sumário
I – O contrato de comodato, embora seja um contrato real, tem eficácia puramente obrigacional, apenas vinculando os intervenientes e não erga omnes.
II – Para que o contrato de comodato esteja perfeito não basta o mero acordo das partes, mas também a entrega da coisa.
III – Na falta de estipulação de qualquer prazo, o comodatário pode exigir do subcomodatário a restituição da coisa a todo o tempo.
Texto Integral
* PROCESSO Nº 1613/07 – 2
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
*
“A” intentou, em 30.05.2005, acção declarativa sumária contra “B”, “C”, “D” e “E”, pedindo que os réus sejam condenados:
- a entregarem ao autor uma cópia da chave da porta de entrada da casa referida na petição inicial;
- a pagarem ao autor a quantia de € 2.400,00, a título de danos patrimoniais padecidos até à presente data, com juros à taxa legal a contar da citação;
- a pagarem ao autor a quantia de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais;
- e a pagarem a quantia que se vier a liquidar em momento oportuno, a título de indemnização pelas despesas consequentes de alojamento e alimentação que, a partir da propositura da presente acção, o autor venha a suportar nos fins de semana em que se desloque à reserva para a prática da caça e pesca.
Alegou para tanto e em resumo o seguinte:
Enquanto sócios de um clube de caça e pesca, o autor e os réus praticavam caça e pesca em determinada herdade, na qual existia uma casa de habitação com anexos em mau estado.
Autorizados pelos proprietários da herdade e tendo em vista a sua cedência gratuita, o autor, os réus e outros associados procederam à reconstrução dessa casa, tendo entre os associados sido acordado que de futuro só seriam admitidos novos associados na casa desde que pagassem uma jóia no montante de 350.000$00, ficando cada associado obrigado ao pagamento de determinada quantia destinada a suportar os gastos relativos à utilização da casa, ficando cada associado com uma chave da porta de entrada.
O autor utilizou a casa durante mais de 10 anos até que, em Outubro passado, os réus, de comum acordo e sem a autorização dos outros membros do grupo de utentes, mudaram o canhão da fechadura da porta de entrada, não entregando cópia da chave ao autor e restantes associados, tendo chegado, em reunião havida, a comunicar ao autor que se deveria considerar expulso da casa.
O autor está impedido de utilizar a casa, tendo, por isso, despendido já € 2.400,00 (€ 160,00 em cada fim de semana que vai caçar ou pescar).
Com a atitude dos réus, o autor sentiu-se vexado e desrespeitado.
Configurando a cedência da casa um contrato de comodato, tinha o direito de se servir da casa em comunhão de direitos com os restantes comodatários, sendo que a mudança de fechadura e a expulsão da casa integram uma conduta violadora dos seus direitos, emergentes do contrato de comodato, como também dos interesses do acordo celebrado entre todos os associados.
Citados, contestaram os réus, defendendo-se por impugnação, alegando em resumo que os proprietários da herdade cederam algumas divisões existentes na herdade em 1982 mas apenas aos réus “B” e “C”, tendo estes efectuados ali diversos melhoramentos, que foram comparticipadas por todos os utilizadores, que não o autor.
Mais alegaram que, tendo aqueles réus permitido a entrada de novos elementos, o autor passou a utilizar as instalações em 1994, tendo então pago a quantia de 350.000$00, destinada a comparticipar nas despesas efectuadas, mas que só em 2002, e a título excepcional, lhe foi entregue uma chave, tendo então sido aprovado o regulamento de utilização da casa.
Mais alegaram ainda que só se procedeu à mudança do canhão de fechadura pelo facto de o réu “B” ter perdido a chave, tendo ficado apenas com chave este réu, os proprietários da herdade e ao Sr. “F”, que abria a porta sempre que previamente avisado, sendo que o autor sempre continuou a utilizar a casa.
Mais alegaram, por último, que a proibição de o autor utilizar as instalações, aprovada por todos os membros do grupo, se deveu ao facto de, após ter sido advertido de que não andava a cumprir as normas aprovadas (levando pessoas estranhas, utilizando as camas e roupas dos outros, utilizando linguagem grosseira e não respeitando as normas de higiene) se ter recusado a cumprir o regulamento, concluindo no sentido da improcedência da acção.
Foi proferido despacho saneador, tendo sido elaborados os factos assentes e a base instrutória, após o que, instruído o processo, teve lugar a audiência de julgamento.
Seguidamente foi proferida sentença, nos termos da qual a acção foi julgada inteiramente improcedente, sendo os réus absolvidos dos pedidos.
Inconformado, interpôs o autor o presente recurso de apelação, em cujas alegações apresentou as seguintes conclusões:
1ª - A declaração negocial com vista à formação do contrato pode ser expressa ou tácita - art. 217° do C. Civil.
2a - Os factos provados nos autos revelam clara e inequivocamente que os proprietários da casa a cederam também ao autor e a outros elementos do grupo de caçadores, para que estes nela pernoitassem, tomassem as suas refeições nos dias em que se deslocassem à herdade para a prática de caça e pesca.
3a - O facto de a casa ter sido cedida primeiramente aos réus “B” e “C” não incompatibiliza nem exclui que também tenha sido cedida ao autor e demais elementos do grupo de caça. Sem prescindir;
4a - A pessoa a quem o comodatário, com autorização do comodante, tenha, nos termos do art. 1135°, al. f) do C. Civil, proporcionado o uso da coisa comodatada, adquire a qualidade de comodatário (sub comodatário) com os direitos daí decorrentes. Pelo que;
5a - Caso se considere que entre o autor e os proprietários da casa não foi celebrado qualquer contrato de comodato, como em primeira linha se defende, sempre o autor e os demais elementos adquiriram a qualidade de comodatários (subcomodatários) por força da cedência autorizada da casa.
6a - Por uma ou outra razão, sempre o autor, na sua qualidade de comodatário (ou subcomodatário), tinha o direito de usar da casa nos termos convencionados. Sem prescindir e por mera cautela;
7a - Do acordo (contrato) celebrado entre os réus, o autor e os demais elementos do grupo de caça, nos termos do qual estes passavam a usar a casa para nela pernoitar e tomar as suas refeições, mediante o pagamento de uma jóia de 350.000$00 e comparticipação nas despesas de manutenção e obras de conservação e beneficiação, decorre a constituição na esfera jurídica do autor do direito de usar a casa;
8ª - Quer o direito do autor proceda de uma relação comodatícia quer proceda do acordo mencionado na conclusão anterior, sempre os réus tinham o dever jurídico de se absterem da prática de factos que o lesassem.
9a - Violando culposamente o direito do autor, terão os réus de ser responsabilizados pelos prejuízos causados.
10ª - Foi violado o disposto nos arts. 217°, 406°, 408º e 1135°, al. f) do C. Civil e art. 664° do CPC.
Contra-alegaram os réus, pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir: Em face do conteúdo das conclusões das alegações do apelante, enquanto delimitadoras do objecto do recurso (arts. 684°, n° 3 e 690°, n° 1 do CPC, são as seguintes as questões de que cumpre conhecer:
- existência de contrato de comodato;
- existência de contrato de subcomodato;
- direito do autor ao uso ou utilização da casa, em resultado da existência de contrato de comodato, do contrato de subcomodato ou do acordo celebrado entre os réus e o autor e demais elementos do grupo de caça;
- direito à indemnização pelos prejuízos causados ao autor, por parte dos réus, em virtude da violação culposa daquele direito.
Matéria de facto assente, dada por provada na 1ª instância:
1) Autor e réus são sócios do “G”.
2) Na qualidade de sócios do referido clube praticam caça e pesca na Herdade "…", sita em …, ….
3) O autor pagou anualmente os montantes acordados para fazer face às despesas correntes relativas aos serviços de limpeza, consumos de energia eléctrica e gás e aprovisionamento da despensa com produtos alimentares.
4) O autor entregou aos réus a quantia de 350.000$00, a título de comparticipação nos trabalhos de melhoramentos já realizados.
5) O autor participou em trabalhos de melhoramento tendo, com empregados seus, procedido à construção de uma casa de banho, de uma despensa e de um fogão de sala.
6) Os empregados do autor procederam ao assentamento de parte da tijoleira no piso da casa.
7) O autor participou em parte igual com os réus e os outros associados na aquisição de um bilhar (snocker) e instalação do ar condicionado.
8) Os réus comunicaram ao autor que se pretendesse servir-se da casa, teria de pedir a um ex-guarda da herdade, de nome “f”, para lhe abrir a porta.
9) O ex-guarda da herdade recebeu ordens dos réus no sentido de não entregar a chave ao autor, devendo apenas abrir-lhe a porta.
10) Sempre que o autor chegava à reserva ou regressava a casa depois de um dia de caça, tinha de se deslocar à residência do referido ex-guarda, a cerca de 8 quilómetros para que este lhe viesse abrir a porta.
11) Na Herdade "…", sita em …, …, existia uma casa degradada com anexos.
12) Os proprietários da Herdade "…" permitiram aos réus “B” e “C” a realização de trabalhos de reconstrução da casa, de modo a conferir-lhe condições de habitabilidade.
13) Os proprietários da Herdade "…" cederam gratuitamente a casa aos réus “B” e “C” para ali pernoitarem e tomarem as suas refeições, nos dias em que se deslocassem à herdade para a prática de pesca e caça.
14) Os réus “B” e “C” iniciaram os trabalhos de construção.
15) O autor participou em parte igual com os réus e os outros associados na aquisição de uma arca frigorífica, um frigorífico, uma televisão e diverso mobiliário.
16) A casa foi cedida gratuitamente aos réus “B” e “C”.
17) Entre os associados, foi celebrado o seguinte acordo:
- "De futuro, só seriam admitidos novos associados na casa desde que houvesse acordo unânime dos membros do grupo e mediante o pagamento de uma jóia no montante de 350.000$00;
- Anualmente, cada associado obrigava-se a pagar uma quantia pecuniária para despesas decorrentes de serviço de limpeza, consumo de energia eléctrica, gás e compra de produtos alimentares para a despensa ".
18) Nas condições referidas no número anterior, o autor, os réus e os restantes associados habitavam a casa, ali pernoitando e tomando as suas refeições.
19) Alguns membros do grupo tinham a chave da porta da entrada da casa para quando ali se deslocassem para a prática da pesca ou da caça.
20) Há mais de dez anos que, nas condições referidas em 17), o autor passou a pernoitar e a tomar as suas refeições na casa referida em 11), utilizando a chave que possuía.
21) Em Outubro de 2004, os réus “C”, “B” e “E”, de comum acordo e sem autorização dos outros membros do grupo de utentes, mudaram o canhão da fechadura da porta de entrada da casa.
22) Os réus não entregaram qualquer cópia da chave ao autor e aos restantes associados.
23) Quando o autor chegou à casa de habitação referida em 11) não conseguiu entrar.
24) Em princípios do ano de 2005, o autor foi contactado para comparecer a uma reunião nas instalações fabris do réu “E”.
25) Na reunião referida no n° anterior, os réus comunicaram ao autor que a partir daquela data deveria considerar-se expulso da casa referida em 11).
26) O autor sempre que se desloca à Herdade "…" para a prática da caça ou da pesca, tem de pernoitar em hotel e tomar as suas refeições fora.
27) Desde Outubro de 2004 até Maio de 2005 o autor deslocou-se à reserva para caçar e pescar cerca de quinze fins-de-semana.
28) Desde 15 de Agosto de um ano até finais de Fevereiro do ano seguinte, período em que decorre a época de pesca e caça, o autor desloca-se à reserva, cerca de três fins-de-semana por cada mês.
29) O autor sentiu-se vexado e desrespeitado com a atitude dos réus, o que lhe causou desgosto.
30) Em 1982, os proprietários da Herdade "…", “H” e família, cederam gratuitamente uma parte da mesma aos réus “B” e “C”.
31) Havia um compromisso verbal entre os proprietários da herdade e os réus “B” e “C”, no sentido de que logo que aqueles necessitassem da parte ocupada por estes, que todo o grupo teria que entregar aquele espaço.
32) Ficou acordado que as comunicações entre os proprietários da herdade e os utilizadores do espaço cedido seriam sempre realizadas com os réus “B” e “C”.
33) A casa cedida era uma antiga queijaria.
34) Os réus “B” e “C” solicitaram autorização aos proprietários da Herdade "…" para efectuarem trabalhos de melhoramento na casa, com a condição dos mesmos ficarem a fazer parte da Herdade.
35) Os trabalhos de melhoramento realizados em 1982 consistiram na adaptação desse espaço a um dormitório, uma casa de banho, uma cozinha e uma sala de refeições.
36) Durante cerca de dez anos, os réus “B” e “C” realizaram outros trabalhos de melhoramento na parte cedida pelos proprietários da Herdade "…", como a cobertura, instalação eléctrica, janelas entre outros.
37) As instalações referidas em 33) serviram, inicialmente, para os réus “B” e “C” se instalarem durante a época da caça, aí pernoitando e tomando as suas refeições.
38) Os proprietários da herdade nunca exigiram que os utentes das instalações cedidas aos réus “B” e “C” tivessem que ser sócios do ”G”.
39) Com o decorrer dos anos, os réus “B” e “C” permitiram a entrada de novos elementos no grupo, passando os mesmos a utilizar as instalações referidas em 33) fora da época da caça.
40) A admissão de novo elemento no grupo para utilizar a casa na herdade "…" estava condicionada aos seguintes pontos:
a) ser proposto por um membro do grupo que já utilizava as instalações;
b) merecer a aprovação dos réus “B” e “C”;
c) merecer a aprovação de todos os membros do grupo;
d) entrega de uma quantia em dinheiro variável em função dos melhoramentos já efectuados nas instalações;
e) aceitação pelo novo membro das normas vigentes no grupo;
f) comparticipação nas despesas.
41) O autor foi admitido como membro do grupo em 1994, passando a utilizar as instalações referidas em 33).
42) O réu “B” procedeu à substituição do canhão da fechadura da porta da casa.
43) Foi entregues uma chave ao Sr. “F”, outra aos proprietários da Herdade "…" e outra ficou na posse dos réus.
44) O Sr. “F” ficou incumbido de abrir a porta das instalações a qualquer membro do grupo.
45) Em Janeiro de 2005, foi realizada uma reunião entre o autor, “I” e os réus “B” e “C”.
46) O autor foi convocado para uma reunião, com a presença de alguns membros do grupo de utilizadores da casa.
47) Confrontado com as acusações de levar pessoas estranhas aos membros do grupo, sem autorização dos réus “B” e “C”, deixando restos de comida e louça suja na casa, o autor repetiu que "fazia o que queria" e que não era obrigado a cumprir o regulamento, nem o iria fazer.
48) Os réus, “J” e “K”, também membros do grupo, aprovaram proibir o autor de continuar a utilizar a casa.
1) Quanto ao contrato de comodato:
Conforme se refere na sentença e resulta do relatório supra, o autor alicerçou a causa de pedir na existência de um contrato de comodato, no qual ele e os demais utilizadores da casa assumiam, em conjunto, a posição de comodatários.
Segundo a sentença, da factualidade dada como provada apenas resulta a existência de um contrato de comodato celebrado entre os proprietários da casa e os réus “B” e “C”, contrato esse alheio ao autor ora apelante.
Conforme ressalta das conclusões do recurso, embora discordando de tal entendimento, o apelante acaba por admitir a razoabilidade do mesmo.
Daí que, subsidiariamente, acabe por defender a existência de um contrato de subcomodato, cujo incumprimento ou violação constituiria os réus na obrigação de o indemnizar (defendendo ainda, caso também assim se não entenda, que a obrigação de indemnizar resulta do incumprimento do acordo de utilização celebrado entre o autor, os réus e os demais elementos do grupo de caça).
Desde já se diga que se nos afigura inteiramente correcto o entendimento seguido na sentença, quanto à questão da inexistência de contrato de comodato em relação ao autor (e aos proprietários da herdade).
Com efeito, da factualidade provada, o que resulta é que a cedência das instalações em causa, existentes na Herdade "…", por parte dos respectivos proprietários, apenas foi feita aos réus “B” e “C”.
Com efeito nesse sentido o que resultou provado foi que:
- Em 1982 os proprietários da Herdade "…", “H” Torres e família, cederam gratuitamente uma parte da mesma aos réus “B” e “C” (nº 30 da matéria de facto);
- Os proprietários da Herdade "…” permitiram aos réus “B” e “C” a realização de trabalhos de reconstrução da casa, de modo a conferir-lhe condições de habitabilidade (n° 12);
- Os proprietários da Herdade "…" cederam gratuitamente a casa aos réus “B” e “C” para ali pernoitarem e tomarem as suas refeições, nos dias em que se deslocassem à herdade para a prática de pesca e caça (n° 13);
- Os réus “B”e “C” iniciaram os trabalhos de construção (nº 14);
- A casa foi cedida gratuitamente aos réus “B” e “C” (nº 16);
- As instalações referidas em 33) serviram, inicialmente, para os réus “B” e “C” se instalarem durante a época da caça, ai pernoitando e tomando as suas refeições (n. 37).
Mais resultou ainda provado que, tendo os réus “B” e “C” solicitado "autorização aos proprietários ... para efectuarem trabalhos de melhoramento na casa, com a condição de os mesmos ficarem a fazer parte da Herdade", trabalhos esses que "realizados em 1982, consistiram na adaptação desse espaço a dormitório ... ", foram estes réus que durante cerca de 10 anos (ou seja, até por volta de 1982, sendo certo que o autor apelante apenas foi admitido como membro do grupo utilizador das instalações em 1994 - vide n° 41) "realizaram outros trabalhos de melhoramento ... " (vide nºs 34 a 36).
É certo que, conforme resulta da factualidade provada, com o decorrer dos anos, os réus “B” e “C” permitiram a entrada de novos elementos no grupo de utilizadores das instalações (n° 39), entre os quais o autor, e que os proprietários da herdade tiveram conhecimento e aceitaram (desconhecendo-se em que data tal aconteceu) que as instalações em causa passaram também a ser utilizadas por outros elementos ligados à caça e pesca (que não, propriamente, conforme alegado pelo autor, os sócios do “G”, bem pelo contrário - vide nº 38).
Todavia, não resulta minimamente provado que os proprietários da herdade, tenham acordado, directa e pessoalmente com quem quer que fosse, designadamente com o autor, de forma expressa ou tácita, a cedência das instalações - para além dos réus “B” e “C”.
Ademais, para além de os réus “B” e “C” só terem permitido a entrada de novos elementos anos mais tarde (em relação a 1982), tendo o autor alegado, conforme já acima referido, que a cedência das instalações foi feita a si, aos réus e demais elementos do “G”, até resultou provado que "os proprietários da herdade nunca exigiram que os utentes das instalações cedidas aos réus “B” e “C” tivessem que ser sócios do “G” (nº 38).
O que resulta inequívoco da factualidade provada (e apenas isso) é que, no âmbito do contrato de comodato celebrado com os réus “B” e “C”, os proprietários da herdade, vieram a aceitar ou autorizar que aqueles permitissem a utilização das instalações por parte de outros elementos (entre os quais, obviamente, o autor), tendo sido nesse âmbito que, em dado momento, entre os associados ou utilizadores da casa, foi celebrado o acordo de utilização referido em 17) e 40) da matéria de facto.
Com efeito, neste âmbito (e sem esquecermos que, conforme acima referido, foi apenas aos réus “B” e “C”, que, em 1982, os proprietários cederam as instalações em causa), apenas se provou que:
- Havia um compromisso verbal entre os proprietários da herdade e os réus “B” e “C”, no sentido de que logo que aqueles necessitassem da parte ocupada por estes, que todo o grupo teria que entregar aquele espaço" (n° 31);
- Ficou acordado que as comunicações entre os proprietários da herdade e os utilizadores do espaço cedido seriam sempre realizadas com os réus “B” e “C” (nº 32).
É assim inequívoco que o compromisso verbal (enquanto elemento integrador do contrato de comodato) de restituição das instalações a todo o tempo (quando delas os donos necessitassem e por parte de todos os utilizadores) não foi celebrado entre estes e os donos da herdade mas sim apenas entre estes últimos e os réus “B” e “C”.
E é assim igualmente inequívoco que, relativamente à cedência das instalações (enquanto elemento igualmente integrador do contrato de comodato), não só os proprietários da herdade não acordaram ou negociaram o que quer que fosse com outros indivíduos (entre os quais o autor), que não fossem os réus “B” e “C”, como ainda é certo que, tendo conhecimento da utilização do espaço por outros indivíduos, entre os quais o autor, os proprietários não aceitaram qualquer tipo de relacionamento ou contacto com eles.
Conforme se considerou no acórdão da Relação do Porto de 07.04.2005 (em que é relator o Sr. Desembargador José Ferraz, in www.dgsi.pt). apesar de se tratar de um contrato real (quoad constitutionem), o comodato tem eficácia puramente obrigacional e não erga omnes, apenas vinculando as partes que nele intervieram.
E, conforme se refere no mesmo aresto, sendo o comodato, na definição legal (art. 1129° do CC) o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa móvel ou imóvel, para que dela se sirva, com a obrigação de a restituir, trata-se de um contrato a cuja perfeição não basta o acordo das partes, mas também a entrega da coisa, como elemento constitutivo do negócio.
Ora, para além de os proprietários da herdade apenas terem negociado ou acordado a entrega gratuita das instalações com os réus “B” e “C”, o certo é que foi apenas a estes que foi feita a entrega das instalações em causa.
Nestes termos, no que se refere ao contrato de comodato, celebrado pelos proprietários da herdade (enquanto comodantes), havermos de concluir, conforme bem se considerou na sentença recorrida, no sentido de o mesmo apenas ter sido celebrado com os réus “B” e “C”, sendo assim o autor apelante alheio ao mesmo.
E, assim sendo, contrariamente ao invocado pelo autor, a existir, o invocado direito à utilização das instalações em causa não emerge de tal contrato.
Improcedem, desta forma, nesta parte, as conclusões do recurso.
2) Quanto ao contrato de subcomodato:
Nos termos do disposto no art. 1135°, al. f) do C. Civil, constitui, para além do mais, obrigação do comodatário "Não proporcionar a terceiro o uso da coisa, excepto se o comodante o autorizar".
Conforme referem P. Lima e A. Varela (in C. Civil Anotado, vol. II, 2a ed. revista e actualizada, em anotação ao art. 1135°), proíbem-se assim, dessa forma,
quando não autorizadas, a cessão da posição contratual, quer a título oneroso, quer gratuito, o subcomodato e a locação da coisa.
Isto tendo-se em conta que, conforme referem ainda os mesmos autores, o uso da coisa, pela própria natureza do contrato, deve pertencer, continuadamente, ao comodatário, pois é em atenção a ele que o negócio é celebrado, sendo que a autorização prevista na referida al. f) pode ser dada no momento da celebração do contrato ou posteriormente, não exigindo a lei que a autorização seja expressa.
Assim, desde que devidamente autorizado pelo comodante, pode o comodatário, proporcionar a terceiro o uso da coisa, cedendo a este a sua posição contratual ou celebrando com ele contrato de locação ou de subcomodato (sem que isso importe violação das obrigações decorrentes do contrato de comodato).
Pelo que já acima referimos, haveremos de concluir desde já (e sem necessidade de outros considerandos) no sentido de que, ao proporcionar ao autor e demais utilizadores o uso das instalações em questão, os réus “B” e “C” agiram devidamente autorizados pelos comodantes, os proprietários da herdade.
Importa assim, perante as circunstâncias em que foi feita a cedência, proceder à respectiva qualificação jurídica.
Não está em causa uma situação de cessão da posição contratual, na medida em que os comodatários (réus “B” e “C”) continuaram a usufruir das instalações, não transmitindo a sua posição (continuaram a ser comodatários), sendo certo que a cessão da posição contratual se distingue do sub-contrato pelo facto de o cedente se desligar da sua posição contratual, entrando o cessionário para o seu lugar (ac. da RL de 09.07.92, in CJ 92, IV, 136).
No caso da cessão da posição contratual continua a haver um único contrato (com substituição de uma das partes), enquanto que no sub-contrato (locação ou sobcomodato), passarão a coexistir dois contratos diferenciados, sendo uma das partes (o comodatário) comum a ambos os contratos.
E, neste âmbito, nada impede que no sub-contrato, o comodatário apenas ceda a co-utilização (continuando ele também a utilizar a coisa) ou a utilização parcial da coisa objecto do comodato.
Por outro lado, a haver cessão da posição contratual, necessário se tornava, nos termos do disposto no art. 424° do C. Civil, o consentimento dos comodantes, ou seja, dos proprietários da herdade.
Ora, conforme resulta da factualidade provada, a que já acima nos referimos, estes, ao acordarem com os réus “B” e “C” que as comunicações entre eles proprietários e os utilizadores do espaço cedido seriam sempre realizadas com os réus “B” e “C” (vide nºs 31 e 32 da matéria de facto), estavam a exigir que estes réus continuassem a assumir a sua posição de comodatários (de utilizadores da casa), manifestando-se assim contra a eventual cedência da posição contratual destes.
Posto isto, e estando igualmente fora de causa uma situação de locação das instalações em causa ao autor (e demais utilizadores), por parte dos réus comodatários, “B” e “C”, uma vez que, pressupondo a locação o acordo sobre o pagamento de uma renda ou aluguer, conforme se trate de imóvel ou de móvel, se verifica que no caso nenhuma renda foi acordada, afigura-se-nos que, no caso dos autos, no que se refere à utilização das instalações por parte autor apelante (e bem assim dos demais utilizadores), estamos efectivamente, conforme é defendido pelo mesmo (ainda que subsidiariamente), perante uma situação de subcomodato.
Com efeito, sendo essenciais à caracterização de um contrato como comodato, a sua gratuitidade, a temporalidade e o dever de restituição da coisa entregue, o mesmo distingue-se da locação pelo facto de ser gratuito (vide acs. da RP de 14.02.2000 relator Fonseca Santos, e da RL de 19.11.87 - relator Ricardo da Velha, ambos in www.dgsi.pt).
Conforme resulta da factualidade provada, tendo os réus “B” e “C”, com o decorrer dos anos, permitido a entrada de novos elementos no grupo, passando os mesmos a utilizar as instalações (nº 39), foi o autor admitido como membro do grupo em 1994 (nº 41), passando ali a pernoitar e a tomar as suas refeições, juntamente com os outros associados (nºs 18, 20), tendo pago a título de jóia (nos termos acordados entre os associados - n° 17), ou seja a título de comparticipação nos trabalhos e melhoramentos realizados, a quantia de 350.000$00 (n° 4), tendo ainda participado nos melhoramentos da casa (vide nºs 5, 6, 7, 15) e tendo pago anualmente os montantes acordados para fazer face às despesas correntes, relativas à limpeza, energia eléctrica, etc. (nº 3).
Foi assim cedido pelos comodatários ao autor o co-uso (conjuntamente com eles e outros) das instalações que lhes haviam sido cedidas pelos proprietários, sem que tivesse sido acordado o pagamento de qualquer retribuição, a título de renda.
Na verdade, os pagamentos e encargos suportados jóia, melhoramentos, despesas correntes), não podem ser entendidos como pagamento de renda, ou seja como retribuição na medida em que, conforme tem sido entendido na jurisprudência, o facto de o comodatário (ou subcomodatário) passar a suportar os custos relativos ao consumo de energia, água, gás, telefone, impostos, taxas, despesas de conservação, etc., não afasta o requisito da gratuitidade, próprio do comodato (vide, entre outros, os acs. da RP de 29.04.97 - relator Pires Rodrigues, da RL de 19.11.87 - relator Ricardo da Velha, e de 10.05.94 - relator Pais do Amaral, todos in www.dgsi.pt).
Todavia, apenas se sabendo que a co-cedência das instalações ao autor visava permitir que este ali pernoitasse e comesse aquando das idas à Herdade para a caça e pesca, não se mostra provado que entre os réus “B” e “C” e o autor tenha sido estabelecido qualquer acordo no que respeita ao término dessa utilização, ou seja, à restituição das instalações por parte do autor.
A propósito, apenas se mostra provado que "havia um compromisso verbal entre os proprietários da herdade e os réus “B” e “C” no sentido de que logo que aqueles necessitassem da parte ocupada por estes, que todo o grupo teria que entregar aquele espaço".
Trata-se de um acordo ou cláusula contratual que, a priori, apenas faz parte integrante do contrato de comodato (porque apenas acordado pelos proprietários e pelos réus “B” e “C”).
Assim, não só porque a extinção do comodato implicaria a extinção do subcomodato, como também pelo facto de tal cláusula ter sido direccionada na perspectiva da realização do subcomodato (que, assim, seria autorizado apenas nessa condição), haveremos de concluir no sentido de que a delimitação temporal traduzida na exigência da restituição da casa por parte dos proprietários, quando dela necessitassem, se entenderia necessariamente ao subcomodato, ou seja ao próprio autor (e demais utilizadores).
Todavia, o certo é que, para além disso, da factualidade dada por provada nada resulta no sentido da existência de qualquer acordo de delimitação temporal no âmbito do subcomodato, ou seja entre os réus comodatários (“B” e “C”) e o autor.
Apenas sabemos que a cedência gratuita subjacente ao subcomodato tinha em vista a possibilidade de o autor pernoitar e tomar as suas refeições na casa quando se deslocasse à herdade, para o exercício da caça e da pesca e não só (vide nºs 20, 37, 39 e 41).
Mas isso não obsta a que considere como não verificado o requisito da temporalidade e, consequentemente, a existência do contrato de subcomodato.
É certo que, conforme se considerou no ac. do STJ de 18.12.2002 (relator Silva Salazar, in www.dgsi.pt). tendo o contrato de comodato, por definição, natureza temporária, a determinação do uso a que se refere o n° 1 do art. 11370 do C. Civil envolve a delimitação da necessidade temporal que o comodato visa satisfazer, não podendo considerar-se como determinado o uso de certa coisa quando, implicando este a prática de actos genéricos de execução continuada, não for concedido por tempo determinado ou, pelo menos, determinável - como é o caso dos autos.
Todavia, conforme se defende ainda no mesmo aresto, não se estipulando prazo nem se delimitando a necessidade temporal que o comodante tem direito a exigir, tem este o direito a exigir, em qualquer momento a restituição da coisa.
É, aliás, o que resulta do n° 2 do citado artigo 1137° do C. Civil.
Ora, em face do que acabámos de expor, na ausência de delimitação temporal determinada ou determinável, afigura-se-nos que os réus “B” e “C” tinham o direito de exigir do autor a restituição da casa, ou seja, o direito de exigir que o autor deixasse de co-utilizar a casa, a todo o tempo.
É certo que entre os associados ou elementos utilizadores da casa foi estabelecido determinado acordo relativo à admissão e novos associados (vide nºs 17 e 40): acordo de todos os membros do grupo, pagamento de uma jóia de 350.000$00, pagamento anual de uma quantia pecuniária para as despesas, etc.
E, nesse âmbito, não deixa de ser curioso (o que aponta no sentido das posições que acabámos de assumir relativamente ao comodato e ao subcomodato) que, para além do mais, se tenha acordado, que a admissão de novos elementos tivesse que "merecer a aprovação dos réus “B” e “C” (40), al. b) da matéria de facto).
Todavia, o certo é que tal acordo nada envolve no que toca à tal delimitação temporal da utilização da casa, apenas respeitando, conforme já referido, aos requisitos para a admissão de novos associados - requisitos esses que vão além da mera vontade dos réus “B” e “C” (respeitando também à vontade dos demais utilizadores), sendo certo que, apesar de se tratar de um contrato gratuito ou seja de um contrato bilateral imperfeito, o contrato de comodato não deixa de envolver obrigações não só para o comodatário como também para o comodante (ac. da RP de 08.10.99 - relator Mário Fernandes, in www.dgsi.pt).
E, neste âmbito, nada impedia, que, com base no princípio da liberdade contratual estabelecido no art. 405° do C. Civil, os subcomodantes (réus “B” e “C”) se vinculassem a determinadas limitações relativas à admissão de novos utilizadores, ou seja à celebração de novos contratos de subcomodato.
Nestes termos, e em concordância com a posição defendida (ainda que subsidiariamente) pelo autor apelante, havermos de concluir no sentido da existência de um contrato de subcomodato, celebrado entre os réus “B” e “C” (na qualidade de subcomodantes) e o autor (na qualidade de sub comodatário).
Procedem assim, nesta parte e nesta conformidade, as conclusões do recurso.
3) Quanto ao direito do autor apelante de usar ou utilizar a casa ou instalações em Questão:
Em face do que acabámos de expor, relativamente ao contrato de subcomodato, e como consequência directa do mesmo, uma coisa havemos de ter por assente:
Enquanto os réus “B” e “C” (subcomodantes) não exigissem do autor a restituição da casa (ou que a deixasse de utilizar), sempre este teria o direito de fazer uso da mesma, nos termos e para os fins acordados, sendo certo que, nos termos do disposto no nº 1 do art. 1133º do C. Civil "o comodante deve abster-se de actos que impeçam ou restrinjam o uso da coisa pelo comodatário .. "
Todavia, o certo é que essa exigência de restituição acabou por ser efectivada em princípios de 2005 quando, em reunião para que foi convocado, ao autor foi comunicado pelos réus B” e “C” (e bem assim pelos outros) que se deveria considerar expulso (vide nas 25 e 45 a 48 da matéria de facto).
Daí que se deva considerar que o autor apelante apenas teve direito a utilizar as instalações em causa no período compreendido entre 1994 (altura em que foi admitido - vide n° 41) e princípios de 2005 (altura em que foi expulso).
4) Quanto ao direito à indemnização:
Segundo o autor, por via da substituição da fechadura e da sua expulsão da casa, os réus violaram o seu direito à utilização da mesma, impedindo-o de dela usufruir e daí que tenham incorrido na obrigação de o indemnizar pelos prejuízos resultantes dessa violação - pedindo indemnização por danos patrimoniais, passados e futuros, e por danos não patrimoniais (referentes ao vexame e desrespeito por si sofridos).
Todavia, pelo que acabámos de considerar, a haver obrigação de indemnizar resultante de violação do direito do autor, a mesma apenas poderá incidir sobre os danos relativos ao impedimento de utilização da casa, decorrente da mudança da fechadura e ocorridos até Janeiro de 2005.
Resultou efectivamente provado que "em Outubro de 2004, os réus “C”, “B” e “E”, de comum acordo e sem autorização dos outros membros do grupo de utentes, mudaram o canhão da fechadura da porta de entrada da casa" (na 21), e que "os réus não entregaram qualquer cópia da chave ao autor e aos restantes associados" (nº 22), acontecendo que, "quando o autor chegou à casa de habitação referida em 11) não conseguiu entrar" (nº 23).
Tal conduta aponta, à primeira vista, no sentido de o autor ter ficado impedido de utilizar a casa, havendo nessa perspectiva, violação do direito do autor, por parte dos réus.
Todavia, o certo é que também resultou provado que "os réus comunicaram ao autor que se pretendesse servir-se da casa, teria de pedir a um ex-guarda da herdade, de nome “F”, para lhe abrir a porta" (na 8) e que "o ex-guarda da herdade recebeu ordens dos réus no sentido de não entregar a chave ao autor, devendo apenas abrir-lhe a porta" - o que significa claramente que o autor não ficou privado da utilização da casa.
Assim (e tendo-se em conta que resultou ainda provado que "sempre que o autor chegava à reserva ou regressava a casa depois de um dia de caça, tinha de se deslocar à residência do referido ex-guarda, a cerca de 8 quilómetros para que este lhe viesse abrir a porta" (nº 10), a conduta dos réus (com a mudança do canhão da fechadura sem entregarem ao autor a nova chave) apenas determinou uma maior dificuldade e onerosidade na utilização da casa por parte do autor.
Desta forma, a indemnização a peticionar pelo autor teria que respeitar a essa dificuldade e onerosidade na utilização (o que, sem prejuízo do que respeita aos invocados danos não patrimoniais, o autor não fez) e não ao impedimento na utilização (o que foi feito pelo autor).
Todavia, estando em causa uma situação de co-utilização da casa (designadamente pelos réus subcomodantes), perante a factualidade dada por provada, não resulta a nosso ver provada a obrigatoriedade de ao autor ser entregue a chave da porta da casa.
É certo que resultou provado que "há mais de 10 anos que, nas condições referidas em 17, o autor passou a pernoitar e a tomar as suas refeições na casa referida em 11), utilizando a chave que possuía" (n020)
Todavia, não resultou provado que tivesse sido acordado (designadamente entre o autor e os réus “B” e “C”) que ao autor tivesse que ser disponibilizada uma chave.
Aliás, para além de tal não resultar do acordo celebrado entre os associados ou utilizadores da casa (referido em 17) e 40) da matéria de facto), qualquer cláusula relativa à entrega da chave da casa, ainda resultou provado que apenas "alguns membros do grupo tinham a chave da porta da entrada da casa para quando ali se deslocassem para a prática da pesca ou da caça" (na 19).
Por outro lado desconhecendo-se as razões concretas que levaram à substituição da fechadura (o que até pode ter acontecido por razões que nada tenham a ver com o autor), o certo é que, pelo menos em relação à não entrega da chave ao autor (e sem esquecermos que estava em causa uma utilização da casa por diversas pessoas) a factualidade dada como provada aponta no sentido da existência de razões justificativas dessa atitude.
Isto tendo-se em conta que resultou provado que, em reunião, com a presença de alguns membros do grupo de utilizados, "confrontado com as acusações de levar pessoas estranhas aos membros do grupo, sem autorização dos réus “B” e “C”, deixando restos de comida e louça suja na casa, o autor repetiu que "fazia o que queria" e que não era obrigado a cumprir o regulamento, nem o iria fazer" (nºs 46 e 47).
Embora daí não resulte, directa ou expressamente, que se deva considerar como provado que o autor levava pessoas estranhas aos membros do grupo sem autorização dos réus “B” e “C” (estes, enquanto subcomodatários e sem esquecermos que, conforme já atrás expendemos, nos termos do art. 1135°, al. f) do CC, o comodatário - e bem assim o subcomodatário - não pode proporcionar o uso da coisa a terceiro a terceiro sem autorização do comodante) e que deixava restos de comida e louça suja, o certo é que está expressamente provado que "o autor repetiu que "fazia o que queria" e que não era obrigado a cumprir o regulamento, nem o iria fazer ".
Ora perante este facto, afigura-se-nos que, por via presuntiva (art. 349° do C. Civil), face à posição do autor, havermos de dar como provados aqueles factos (factos esses violadores das obrigações do autor, enquanto subcomodatário, e do respeito pelos demais co-utilizadores da casa).
Estando em causa uma utilização conjunta da casa, por parte de diversas pessoas, sempre seria exigível que cada um deles agisse com os cuidados e comportamentos adequados a esse tipo de utilização, com respeito sem causar prejuízos aos direitos dos demais utilizadores.
Assim, face ao exposto, havermos de concluir no sentido da inexistência de violação do direito do autor à utilização da casa em questão e, consequentemente, no sentido da ilicitude da conduta dos réus.
E, assim sendo, havermos igualmente de concluir no sentido da inexistência da obrigação de indemnizar.
Improcedem assim, nesta conformidade, as demais conclusões do recurso.
Termos em que se acorda em negar provimento à apelação, assim se confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Évora, 08 de Novembro de 2007