PROCEDIMENTO CAUTELAR
ARTICULADO SUPERVENIENTE
CUMULAÇÃO SUCESSIVA DE PEDIDOS
Sumário


1 - O carácter urgente dos procedimentos cautelares e o seu formalismo processual célere não se compadece com o formalismo próprio de uma acção normal, não comportando, nem admitindo, por tal, articulado superveniente, nos termos consagrados no artº 506º do Cód. Proc. Civil, nem ampliação ou aditamento do pedido ou da causa de pedir.
2 - Embora a lei permita implicitamente a cumulação de providências (artº 392º n.º 3 do CPC), essa cumulação tem de ser inicial, não se apresentando como lícita a cumulação sucessiva e subsequente alicerçada em factos novos.

Texto Integral

ACORDAM 0S JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA



Vítor.........., residente em Lisboa, intentou no Tribunal Judicial de Setúbal (4º Juízo Cível) providência cautelar comum, com cumulação de pedidos, contra António........ e Maria..........., residentes em Paço D’Arcos, articulando factos tendentes a peticionar:
“1. Ser ordenada a restituição/manutenção de posse do Requerente sobre o identificado prédio “Bacelo da Cadela” como se descreve acima e a “tira” ou faixa de terreno com 1 metro de largura para Nascente do marco antigo (Doc. 12) e a toda a extensão da estrema daquele com a “Courela da Rainha”, ordenando-se a remoção das estacas, prumos e cordéis colocados pelo Requerido e constantes das fotografias docs. 19 a 24, 28 e 40 a 43 e, bem assim, notificar-se os Requeridos de que devem abster-se de toda e qualquer conduta que impeça ou dificulte a posse e livre fruição, pelo Requerente, da totalidade do seu identificado prédio, aí incluída a faixa ou “tira” de terra descrita;
2. Ser deferida a ratificação do embargo extrajudicial feito pelo Requerente, dando-se cumprimento ao artigo 418° do CPC, e notificando-se, do mesmo, os Requeridos, com a advertência de que não devem construir nem implantar rede, arames, sebe, parede ou qualquer outra forma de vedação e tapamento, nem demarcação ou delimitação, no local por eles sinalizado (sob pena de serem os mesmos demolidos se o Requerido os tiver, entretanto, construído e instalado); e, bem assim, advertidos de que não podem construí-Ia em local sito para Poente da linha definida pelo ponto sito a 1 metro para Nascente do marco antigo (Fotografia doc. 12) existente no alto da colina, nem para Poente da linha definida, na encosta e no sentido da vala ou linha de água aludida (sentido Norte/Sul), pelo ponto a 1 metro a Nascente do dito marco e a primeira estaca/marco (Doc. 12); pela segunda estaca/marco que dista 19,80 metros daquele primeiro marco (Doc. 20); e, continuando na direcção descendente, pela terceira estaca/marco (Fotografia doc. 22) que dista 19 metros daquela segunda estaca/marco; e dai até à quarta estaca/marco (Fotografias docs. 24, 25, 35 e 36) que dista 19,70 metros da terceira estaca/marco; e, finalmente, daquela até à estaca junto à vala/linha de água (fotos docs. 10 e 11) e desta até à Ribeira do Alcube.”
Posteriormente, após ter sido ordenada a citação dos requeridos, veio o requerente apresentar um novo articulado, “superveniente”, articulando novos factos e cumulando novos pedidos, concluindo por peticionar:
“Nestes termos se requer sejam admitidos os factos alegados como supervenientes, assim como a cumulação de novos pedidos por forma a que, deferida a providência, seja ordenada a demolição das estacas colocadas pelos Requeridos, paralelamente à linha de cedros, do lado esquerdo da entrada a partir do portão e até à ribeira do Alcube e o pilar do portão, concluindo-se no mais omisso, como na petição, quanto à ratificação do presente embargo extrajudicial e da restituição/manutenção de posse sobre esta parcela de terreno que faz parte integrante da propriedade do Requerente, denominada de “Bacelo da Cadela”, isto é, que seja ordenada a restituição/manutenção de posse, na parcela de terreno, da ribeira ao portão dos Requeridos, demolição de estacas/prumos e pilar do portão, ratificando-se o embargo, com as cominações mencionadas nos pedidos da providência.”
Por despacho de 17/06/2008 veio a ser indeferida liminarmente a cumulação de pedidos pretendida pelo requerente através da apresentação do “articulado superveniente”.
**
Não se conformando com esta decisão, veio o requerente interpor o presente recurso e apresentar as respectivas alegações, terminando por formular as seguintes “conclusões” [1] que se transcrevem:
1ª O despacho sob recurso, que não admitiu o articulado de cumulação de novos pedidos, apresentado por fax e registo postal em 12 de Junho, é ilegal e traduz errada apreciação dos factos alegados e incorrecto enquadramento legal, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que receba o articulado e permita a cumulação requerida.
2ª O Apelante intentou um procedimento cautelar comum, com cumulação de pedidos nos termos conjugados dos arts 31°, n° 2, 392° n° 3°, 393°, 395°, 412°, 273°, n° 2 e 265°-A do CPC, com os pedidos de manutenção/restituição provisória de posse (além do mais por esbulho da parte dos Requeridos) e de ratificação de embargo extrajudicial de obra nova.
3ª No despacho impugnado nada se refere no sentido da não aplicabilidade das disposições legais invocadas como fundamentos pelo Apelante e que justifique o afastamento do regime legal por ele invocado, sendo certo que a sua pretensão assenta expressamente no preceituado nos arts 392° n° 3° e 265°-A do CPC, além dos demais preceitos legais citados.
4ª Os factos invocados pelo Apelante no novo seu articulado - e que aqui se dão por reproduzidos, por facilidade de exposição - são o desenvolvimento dos pedidos primitivos da providência em face do prosseguimento dos trabalhos de construção e implantação da vedação pelo Requerido.
5ª O Tribunal “não está adstrito à providência concretamente requerida, sendo aplicável a cumulação das providências cautelares a que caibam formas de procedimento diversas o preceituado nos n°s 2 e 3 do art° 31°- n° 3 do 392° do CPC. E,
6ª “Quando a tramitação processual prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz, oficiosamente, ouvidas as partes, determinar a prática de actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações” - art 265°-A do CPC, consagração do princípio da adequação formal, norma inovadora da recente reforma processual.
Mas,
7ª Mas, até existe norma específica que prevê e regulamenta a questão dos autos, quer quanto à cumulação de providências, quer quanto à ampliação do pedido, requerendo-se a restituição provisória de posse em vez da manutenção de posse primitivamente pedida em face da situação de facto então existente (o que nada tem que ver com alteração ou dedução de nova causa de pedir, como erradamente entendido e aludido no despacho impugnado). Não houve alteração de causa de pedir.
8ª Segundo o despacho recorrido a superveniência da alegação de novos factos não é admitida e cita, a esse respeito, Abrantes Geraldes.
Mas uma melhor ponderação e procura na doutrina deste autor deve levar-nos a concluir por posição oposta - que é a que o Recorrente perfilha e, aliás, concordante com a do Prof. Lebre de Freiras, igualmente citado no despacho impugnado, isto é, da necessidade (do dever) de neste processo serem resolvidas todas as questões ou pedidos de procedimentos cautelares, com cumulação de pedidos e, desde logo, com a dedução de novo pedido (de restituição provisória de posse).
9ª A melhor doutrina impõe ao Juiz da causa o dever de aferir da apreciação conjunta das pretensões e da sua relevância ou indispensabilidade para a justa composição do litígio, ponto no qual convergem os autores citados, no despacho recorrido, pela Mtª Juíza a qua, sobre a questão processual suscitada no despacho.
10ª Os factos alegados são supervenientes, são de interesse relevante e indispensáveis para a adequada e justa composição do Litígio, pelo que se deve ter por constatada a existência de interesse relevante nesse sentido.
11ª Dado que foi decidido ouvir os Requeridos, nada impedia que a Mma Juíza, ao abrigo do poder/dever imposto pelos preceitos citados e na esteira da melhor doutrina citada, ordenasse a audição dos Requeridos para tomarem posição sobre os factos de ocorrência posterior e que supervenientemente foram alegados, e fundamento do novo pedido de ratificação de embargo de obra nova e de dedução do novo pedido de restituição provisória de posse.
12ª O despacho em recurso determina ainda que “caso o requerente assim o requeira, seja devolvido ao mesmo o articulado apresentado” (sic) mas é absurda tal proposição.
13ª O Recorrente procedeu desde logo - e como se lhe impunha por razões de simplicidade e de economia processual - à cumulação de pedidos aproveitando para, no prazo mais curto da ratificação do embargo extrajudicial (5 dias), cumular a restituição provisória de posse da parcela, cujo apossamento o Requerido marido e seu filho anunciaram no dia do primeiro embargo extrajudicial, apossamento que, como se vê, vieram depois a consumar.
14ª No articulado superveniente, chamemos-lhe assim, veio pedir, além do que já antes pedira, que:
a) seja ordenada a demolição das estacas colocadas pelos Requeridos, paralelamente à linha de cedros, do lado esquerdo, da entrada a partir do portão e até à ribeira do Alcube e o pilar do portão;
b) Seja ratificado o novo embargo extrajudicial, concluindo no mais como na petição e com as cominações mencionadas nos pedidos da providência.
15. Daqui resulta que:
1. O novo pedido formulado de restituição provisória da posse é uma ampliação/cumulação (face à anteriormente pedida manutenção da posse), e é consequência dos novos factos praticados pelos Apelados, nomeadamente a consumação do esbulho ou apossamento de que o Recorrido já antes praticara alguns actos (colocação de estacas e demarcação, por cordel, do futuro trajecto da vedação);
2. A causa de pedir mantém-se, é a mesma: por um Lado, o direito de propriedade e a posse do Requerente sobre o imóvel; e, por outro, o esbulho e/ou o apossamento indevido e ilícito de parte do imóvel pelo Requerido e a construção, por este, de nova fase da obra nova que já antes fora embargada e impeditiva da fruição do prédio pelo seu dono e possuidor.
16ª A proposta ou sugestão feita no despacho recorrido - de desentranhamento do novo articulado e de restituição ao Recorrente para este instaurar um novo procedimento - não faz, portanto, qualquer sentido. Admitindo, sem conceder, em tese, tal solução, seguramente sucederia que o juiz do novo processo ordenaria a apensação dos procedimentos.
17ª - Os Requeridos actuaram à margem da lei e em violação reiterada do direito de propriedade invocado pelo Requerente e da posse deste ao colocarem a vedação em parcela de terreno que faz parte integrante do “Bacelo da Cadela”, tal qual consta do registo predial e matricial, juntos aos autos. Nada mais lógico que os factos posteriores, fundamento dos pedidos supervenientes, sejam apreciados e julgados no mesmo procedimento cautelar, pois os novos actos do Recorrido não são mais do que o desenvolvimento e consumação da conduta que já dera origem e causa à necessidade da instauração da providência cautelar.
18ª Ao Juiz da causa incumbe, repete-se, o dever de adequar a tramitação processual para “o perfeito entendimento dos termos do litígio e sua dirimição de forma justa e adequada”.
19ª No rigor das coisas não há uma dedução de novas causas de pedir: a causa de pedir é a mesma: é o complexo constituído pelo direito subjectivo do Requerente de propriedade e de posse sobre o imóvel, por um lado; e, por outro Lado, a conduta, continuada e desenvolvida num processo ao longo do tempo pelo Requerido, que visa desapossar o Requerente e impedir-lhe o efectivo gozo dos seus direitos;
Em todo o caso,
20ª A dedução destas novas causas de pedir - se assim forem de caracterizar - também não resulta nem implica diferença no tipo ou espécie de providência cautelar nem do processamento e tramitação da mesma. E também, manifestamente, não trazem aos autos a discussão de nenhuma outra ou nova relação jurídica.
21ª Mas quando, como entende a Sra Juíza, não se possam aditar novas causas de pedir - mesmo em sede de procedimentos cautelares - sempre e em todo o caso o juiz da causa “conhecerá do pedido correspondente à situação realmente verificada (...) se tiver sido requerida a manutenção em lugar da restituição de posse” (artigo 661° n° 3 do CPC).
Ou seja: se o processo se tiver iniciado com o pedido de manutenção da posse, então o juiz não poderá deixar convolar, corrigindo ou adequando o decreto ou remédio do Tribunal por modo a restituir a posse ao Requerente, se este, entretanto, dela foi privado.
22ª E se é assim na acção de fundo ou principal, por maioria de razão o é nas providências cautelares possessórias.
23ª A decisão recorrida violou ou interpretou erroneamente as normas dos artigos 31°, n° 2, 273°, n° 2, 265°-A do CPC, 392° n° 3°, 393°, 395°, 412° e 661° n° 3 do CPC e deve ser revogada e substituída por outra que admita e aprecie os novos factos e defira os novos pedidos, com o que se fará justiça.
**
Não foram apresentadas alegações por parte dos recorridos.
Apreciando e decidindo

Como se sabe o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, tendo por base as disposições combinadas dos artºs 660º n.º 2, 661º, 664º, 684º n.º 3 e 685º-A todos do Cód. Proc. Civil.
Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar se é admissível, no âmbito do procedimento cautelar instaurado, a apresentação de articulado superveniente com articulação de novos factos com vista à ampliação e cumulação de pedidos.
**
Vejamos então!
O requerente instaurou a providencia cautelar tendo em vista:
- o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre uma faixa de terreno com um metro de largura ao longo da extrema do seu prédio Bacelo da Cadela, o qual confina com o prédio dos requeridos, desde o Alto da Colina à Ribeira do Alcube, faixa esta que estes pretendem fazer sua, como evidencia a colocação de “estacas” e de um “cordel de sinalização” tendo em vista o início da “construção de uma vedação, em rede metálica, com prévia colocação de postes de suporte da mesma”;
- a ratificação do embargo de tal obra efectuado extrajudicialmente no dia 17/05/2008.
Com a apresentação do “articulado superveniente” pretende:
- o reconhecimento do direito de propriedade sobre uma parcela de terreno que vai “da ribeira ao portão dos requeridos,” que faz parte do prédio Bacelo da Cadela e que estes pretendem fazer sua, conforme resulta das obras que tinham em curso (modificação e alargamento do portão de acesso ao seu prédio Courela da Rainha, erigindo “um pilar em cimento armado sobre terreno do requerente” e procedendo à colocação de estacas desde esse local até à Ribeira do Alcude;
- a ratificação do embargo de tal obra efectuado extrajudicialmente no dia 07/06/2008.
O Julgador a quo ao indeferir liminarmente a pretensão do requerente invocou, por um lado a inadmissibilidade de articulados supervenientes em sede de procedimentos cautelares e, por outro, que a pretensão para além de consubstanciar um cumulação de pedidos, consubstancia, também, “aditamento de uma nova causa de pedir, o que não é admissível.”
Desde já, diremos que estamos com aqueles que perfilham da opinião que em sede de procedimentos cautelares não é admissível a apresentação de “articulado superveniente” [2] atenta a estrutura processual bastante simplificada dos procedimentos, do seu ritualismo próprio, adequado às necessidades e exigências da celeridade imposta pelo legislador.
Nas alterações de 1995 (Dec. Lei 329-A/95) à Lei processual, o legislador acentuou a “urgência” do procedimento cautelar, consagrando expressamente “um prazo máximo para a sua decisão em 1ª instância, determinando--se, consequentemente, uma gestão do andamento do processo, quer para as partes quer para o tribunal, compatível com o respeito por tal prazo máximo”. [3]
Em face destes intuitos do legislador, com a imposição de prazos determinados a cumprir, não parece razoável, a aplicação das regras supletivas previstas na Lei processual, para a acção com processo ordinário, nomeadamente o consagrado no artº 506º do CPC, aliás, como, já se vinha, jurisprudencialmente, entendendo, [4] e se continua a entender, [5] até porque o legislador ao disciplinar o formalismo e a tramitação dos procedimentos com normas específicas indicou expressamente no n.º 3 do artº 384º do CPC as que, também, se lhe aplicavam subsidiariamente, como normas gerais, remetendo para os artº 302 a 304º do CPC que são as normas relativas às disposições gerais no âmbito dos Incidentes da instância e que, também, têm regime simplificado.
Assim, não se apresentava como lícito ao recorrente socorrer-se de articulado superveniente para articular novos factos e cumular novos pedidos, isto não obstante o princípio da adequação formal consignado no artº 392º n.º 3 do Cód. Proc. Civil conceder ao juiz a possibilidade de adequar e compatibilizar a tramitação processual de modo a poder decretar as providências cautelares que tiver por adequadas, sem estar adstrito à que lhe tiver sido requerida, irrelevando, assim, o princípio do pedido.
Pois, a actuação do Julgador de acordo com o princípio da adequação formal, tem sempre como alicerce os factos e pretensões expostos nos respectivos articulados previstos na tramitação do procedimento, que podem ser melhor clarificados em sede de produção de prova, mas não outros, que se pretendam “enxertar” no decorrer da tramitação processual.
Parece-nos claro que “a liberdade de adequação da providência está limitada à relação jurídica invocada e representada pelo conjunto de factos alegados pelas partes nos articulados, pelos factos essenciais que resultem da instrução e discussão e cujo aproveitamento seja requerido, por serem complementares ou concretizadores de outros alegados (artº 264º n.º 3) e ainda pelos factos instrumentais também resultantes da instrução da causa e oficiosamente recolhidos pelo juiz para fundar a sua decisão (artº 264º, n.º 2).” [6]
Mas mesmo que perfilhássemos da opinião de que em sede de procedimento cautelar era legalmente admissível a apresentação de articulado superveniente, temos para nós, que alteração, em termos ampliativos ou de aditamento, quer do pedido quer da causa de pedir, também não se mostra compatível com aos princípios informadores dos procedimentos cautelares (concentração, simplificação e celeridade). [7]
Muito embora o recorrente venha defender que os factos “novos” por si articulados são “o desenvolvimento dos pedidos primitivos da providência em face do prosseguimento dos trabalhos” tal para nós, não se evidencia.
Aliás, se a actuação dos requeridos consubstanciasse actos inovatórios relativamente à mesma realidade em termos de localização e obra a realizar, com que o requerente se deparou em 17/05/2008, mostrava-se sem interesse carrear para os autos com a urgência declarada os factos “novos”, atendendo a que sempre podia requer a destruição da parte inovada da obra, a partir do momento em que procedeu à notificação verbal através do embargo extrajudicial, [8] se tal embargo viesse a ser ratificado judicialmente como requer (artº 420º do CPC). Ou seja, a continuação da obra pelos requeridos após a notificação verbal constituirá acto ilícito, assistindo, por isso, direito ao requerente, enquanto embargante, de requerer a destruição da parte da obra inovada tendo como referência o estado dos trabalhos no dia 17/05/2008.
O que se evidencia do teor do “articulado superveniente” é que o requerente vê o seu direito de propriedade ameaçado, embora referente à mesma propriedade, mas noutro local, sendo a actuação do ameaçador autónoma da inicialmente invocada, merecendo, certamente, por isso, nova notificação do requerente, com vista ao seu embargo, pois de outro modo não se justificava reiterar uma notificação que já lhe havia sido feita estando a tramitação para a sua ratificação judicial a decorrer.
Daqui resulta que sendo a causa de pedir o facto donde emerge a pretensão temos para nós que o requerente não pretendeu alterar a causa de pedir [9] nem o pedido no sentido da sua ampliação, [10] mas sim através de um novo articulado “superveniente” adicionar à(s) causa(s) de pedir e ao(s) pedido(s) inicialmente formulado(s) uma(s) nova(s) causa(s) de pedir e consequente(s) novo(s) pedido(s) a fim de serem apreciadas e decididas em conjunto todas as pretensões por si formuladas, quando se impunha que se socorresse da instauração e outro ou outros procedimentos cautelares.
Ao permitir-se o solicitado pelo requerente estar-se-ia a aceitar a cumulação sucessiva, subsequente, de pretensões no âmbito da tramitação processual do mesmo procedimento cautelar, quando a lei, tão só, prevê a possibilidade da cumulação inicial de pretensões, mesmo que lhes corresponda forma procedimental diferente, mas que não se mostre manifestamente incompatível, certamente por razões de economia processual.
Impõe-se, assim, a improcedência do recurso face à irrelevância das conclusões, não se mostrando violadas as normas legais invocadas pelo recorrente.
Para efeitos do n.º 7 do artº 713º do Cód. Processo Civil, em conclusão:
1 - O carácter urgente dos procedimentos cautelares e o seu formalismo processual célere não se compadece com o formalismo próprio de uma acção normal, não comportando, nem admitindo, por tal, articulado superveniente, nos termos consagrados no artº 506º do Cód. Proc. Civil, nem ampliação ou aditamento do pedido ou da causa de pedir.
2 - Embora a lei permita implicitamente a cumulação de providências (artº 392º n.º 3 do CPC), essa cumulação tem de ser inicial, não se apresentando como lícita a cumulação sucessiva e subsequente alicerçada em factos novos.
***
DECISÂO
Pelo exposto, nos termos supra referidos, decide-se julgar improcedente a apelação e, consequentemente, manter a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.

Évora, 21/10/2008


_______________________________________________________
Mata Ribeiro


________________________________________________________
Sílvio Teixeira de Sousa


________________________________________________________
Rui Machado e Moura




______________________________

[1] - Escrevemos conclusões entre aspas, porque o recorrente limita-se a fazer o resumo, em vinte e três artigos, da matéria explanada nas alegações (trinta e três artigos), sem apresentar umas verdadeiras conclusões tal como a lei prevê, as quais devem ser sintéticas, concisas, claras e precisas – v. Ac. STJ de 06/04/2000 in Sumários, 40º, 25 e Cardona Ferreira in Guia de Recursos em Processo Civil, Coimbra Editora, 3ª edição, 73.
[2] - v. Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, 230; M. dos Prazeres Beleza in Direito e Justiça, vol XI, 1997, tomo 1, 343; Abrantes Geraldes in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3ª edição, 132.
[3] - cfr. Preâmbulo do citado Dec. Lei.
[4] V. entre outros, Ac Relação Porto de 11/10/1993 in Col. Jur. tomo 4º, 222; Ac. Relação Lisboa de 23/02/1995 e Ac. Relação Porto de 25/01/1996, in www.dgsi.pt, respectivamente nos processos n.ºs 0077662 e 9531040.
[5] - v. entre outros, Ac. Relação Lisboa de 11/03/1999 e de 18/06/2004 in www.dgsi.pt, nos processos, respectivamente, n.ºs 0006696 e 5482/2004-7.
[6] - Abrantes Geraldes in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3ª edição, 335 e 336.
[7] - Abrantes Geraldes in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3ª edição, 134.
[8] - v. J. Alberto do Reis in Código de Processo Civil, anotado, vol. II, 96 e 97; Ac. STJ de 30/01/1997 in BMJ, 463º, 519.
[9] - A alteração da causa de pedir através da invocação de factos novos só ocorre quando se abandone o facto ou factos inicialmente invocado(s) e se passe a apoiar a pretensão em acto ou facto diverso.
[10] - A ampliação do pedido pressupõe que a pretensão primitiva se modifique para mais, mas sempre alicerçada na mesma causa de pedir.