1. O prazo de caducidade da aprovação do alcoolímetro conta-se da data da publicação no DR dessa aprovação técnica pelo Instituto Português de Qualidade.
2. Depois da caducidade da aprovação do alcoolímetro Drager Alcotest, 7110 MKIII P, o resultado da medição levada a efeito em tal aparelho não vale como meio de prova.
XIII- Conforme resulta do auto de notícia e matéria de facto provada, o aparelho utilizado para a pesquisa da taxa de álcool foi o Drager, modelo 7 110 NIKIII P.
XIV- O referido aparelho foi aprovado pelo IPQ através do despacho nº 211.06.96.3.30 publicado em Diário da República no dia 25 de Setembro de 1996.
XV- O prazo de validade da aprovação do IPQ era de 10 anos a contar da publicação no Diário da República.
XVI- Este aparelho foi aprovado pela DGV, para ser utilizado na fiscalização do trânsito, em 6 de Agosto de 1998.
XVII- Em 26 de, Setembro de 2006 caducou o despacho de aprovação do referido aparelho publicado pelo IPQ (Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, Processo n°1117/08, a fis.12, em que foi relator o Venerando Desembargador Carlos Coelho).
XVIII- A fiscalização ao arguido foi realizada no dia 19 de Janeiro de 2007.
XIX- Na data da fiscalização o referido aparelho não estava devidamente aprovado como obrigava a lei no art.912 do Decreto Regulamentar n224/98, de 30 de Outubro e a Portaria nº 748/94, de 13 de Agosto.
XX- Por tal razão o resultado obtido não é válido.
XXI- Se assim não se, entender, sempre se dirá que em 6 de Junho de 2007 foi aprovado pelo IPQ um novo aparelho para fiscalização da taxa de álcool no sangue, com a mesma designação comercial mas com características diferentes de funcionamento.
XXII- O referido aparelho não foi aprovado pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária nem pela Direcção Geral de Viação.
XXIII- O aparelho Drager, modelo Alcotest 7110 X1M1 P de 1996 e o aparelho Drager, modelo Alcotest 7110 XIKIII P de 2007 são modelos diferentes que por isso tem dois despachos de aprovação do modelo emitidos pelo IPQ.
XXIV- O aparelho aprovado pelo IPQ em 1996, através do despacho M211.06.96.3.30, e pela DGV em 1998, tem como características mais salientes que funciona entre os 15º e os 35° centígrados, tendo um tempo de aquecimento de 10 minutos.
XXV- O aparelho aprovado pelo IPQ em 2007, através do despacho nQ211.06.07.3.06, funciona numa temperatura que varia entre os 0º e os 40 graus Centígrados, tendo um tempo de aquecimento, após a ligação, a uma temperatura de 20°, de doze minutos.
XXVI- A temperatura de funcionamento segundo o regulamento Legal do Controlo Metrológico, aprovado pela Portaria nº 962/90, de 9 de Outubro, mantida em vigor pelo art.º19 do DL nº 192/2006, de 26/09, é um elemento essencial na realização de um exame de fiscalização da taxa de álcool.
XXVII- Por esse facto é importante que a ANSR aprove o seu uso na fiscalização da taxa de álcool no sangue.
XXIX- Os modelos Alcotest 7110 MK 111 (P) de 1996 e Alcotest 7110 MK 111 P de 2007 são aparelhos com características diferentes, da mesma marca, com a mesma designação comercial que requerem, por isso, diferentes despachos de aprovação pelo IPQ e ANSR/DGV.
XXIX- A simples aprovação pelo IPQ não é suficiente para que o aparelho possa ser utilizado na fiscalização da taxa de álcool no sangue, porquanto esta entidade apenas certifica o aparelho mas não aprova a sua utilização para esse fim.
XXX- O entendimento contrário permitia que as autoridades pudessem utilizar aparelhos aprovados pelo IPQ sem passar pelo crivo da autoridade administrativa que autoriza a sua utilização na fiscalização (ANSR), bastando, para tal, manter-se, ao longo de décadas, a mesma designação comercial apesar do aparelho puder ter características de funcionamento diferentes.
XXXI- Decorre do Decreto-Lei n977/2007, de 29 de Março, conjugado com o disposto na alínea q) do n°1 do art.º2 da Portaria nº 340/2007, de 30 de Março que a aprovação do uso do equipamento é da competência da ANSR tal como era da DGV.
XXXII- Estipula a lei que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só pode ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamento e cuja utilização seja aprovada pelas entidades competentes.
XXXIII- Tendo o teste de pesquisa de álcool no sangue sido realizado em aparelho não aprovado pelas entidades competentes, por força da caducidade da aprovação anterior e a não aprovação do novo aparelho pela ANSR, não se encontram reunidas as condições legais para se considerar o teste realizado como credível violando-se, assim o disposto no art.°12 Do Decreto Regulamentar 24/98 de 30 de Outubro, artigo 153, n°1 do Código da Estrada e artº 125 do CPP.
XXXIV- Caso assim não se entenda, sempre se dirá que a valorização do resultado da contra-prova em detrimento do resultado da prova que era mais favorável ao arguido, ao abrigo do disposto no art.º 153, nº 6 do Código da Estrada, constitui uma violação do art.°32 da Constituição da República Portuguesa.
XXXV- Violação do art.°3, nº 1 do Decreto Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro e art.º153, nº3 e nº4 o C.E aprovado pelo Decreto-Lei nº 44/05, de 3 Fevereiro.
XXXVI- O exame de contraprova deveria ter sido realizado num aparelho diferente do aparelho utilizado para a realização do exame de prova como impunha a Lei e não nos termos descritos pelo Tribunal a quo, a fls.11 da sentença.
XXXVII- A epígrafe do art.º nº1 do Decreto Regulamentar nº 24/98 de 30 de Outubro, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, refere-se, expressamente ao exame, de contraprova.
XXXVIII- Tendo o exame de contraprova sido realizado no mesmo aparelho a prova obtida não é válida.
Termos em que deve o presente recurso ser recebido, considerado procedente e, em consequência, ser a sentença recorrida revogada e substituída por outra que alterando a matéria de facto, ora em crise, a declare como não provada e, consequentemente, absolva o arguido, ou caso assim não se entenda, que considere que o teste de pesquisa de álcool no sangue não foi realizado em aparelho aprovado e, consequentemente, declare inválida a prova recolhida, devendo absolver-se o arguido, ou caso assina não se entenda, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que considere inconstitucional o artº 153º, nº 6 do Código da Estrada, na interpretação de que se deve valorizar o exame de contraprova mesmo que este seja desfavorável ao arguido, bem como se deverá considerar inválido, por força do artº 3º do Decreto Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro, o exame de contraprova realizado ao arguido no mesmo aparelho, absolvendo o arguido».
Nesta instância, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta pugnou pela posição assumida na contra-alegação.
II- Questões a decidir:
***
B) Da violação do disposto no artº 12º, do Decreto Regulamentar, nº 24/98, de 30/10, do artº 153º/1, do CE, e do artº 125º do CPP:
O recorrente invoca, em resumo, que o alcoolímetro através do qual foi feita a pesquisa ao álcool no seu sangue não estava em condições de ser utilizado, porque se encontrava caducado o prazo de validade do modelo e ainda não tinha sido aprovado o novo aparelho com a mesma denominação, com nº 211.06.07.3.06, a que se refere o Despacho nº 11037/2007, de 6/06/2007.
Nos termos do disposto no art.153º, nº.1, do Código da Estrada, «O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito». De acordo com o artº 12º do Decreto Regulamentar nº 24/98, de 30/10, vigente à data dos factos (foi revogado pela Lei 18/2007, de 17/05, com efeitos a partir de 2007-08-15), «1-Só podem ser utilizados nos testes quantitativos de álcool no ar expirado analisadores que obedeçam às características fixadas em portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna, da Justiça e da Saúde e que sejam aprovados por despacho do director geral de Viação» aprovação essa (nº2) «precedida de aprovação da marca e modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros». Por sua vez, do ponto 8 do anexo à Portaria nº 748/94, de 13/08, que constitui o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, consta que «A aprovação do modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação». Esta Portaria só foi revogada pela Portaria nº.1556/2007, de 10/12.
Nos termos do art. 5°, n.° 5 do DL n.° 44/05, de 23/2, que aprovou a versão em vigor, à data dos factos, do Código da Estrada, cabe à D.G.V. aprovar os aparelhos utilizados na fiscalização do trânsito, a qual deve ser precedida pela aprovação do modelo no âmbito do regime geral do controlo metrológico: «5 - Cabe ainda à Direcção-Geral de Viação aprovar, para uso na fiscalização do trânsito, os aparelhos ou instrumentos que registem os elementos de prova previstos no n.° 4 do artigo 170.° do Código da Estrada, aprovação que deve ser precedida, quando tal for legalmente exigível, pela aprovação de modelo, no âmbito do regime geral do controlo metrológico». Apesar da sucessão da ANSR nas atribuições da DGV, determinada pelo Dec. Lei nº.77/2007, de 29.03 (com entrada em vigor em 01/04/2007), decorre do art.10º da Portaria nº.1556/2007 que as anteriores aprovações de modelos e autorização de utilização não ficaram inutilizadas, desde que efectuadas em conformidade com a legislação anterior.
A inspecção levada a efeito pela autoridade policial, no caso em apreço, ocorreu em 19/01/2007, e foi feita através do aparelho de marca Drager, modelo, 7110 MKIII P, com o nº de série ARRA-0004. Este modelo de aparelho foi aprovado por despacho do IPQ de 27.06.1996, publicado no D.R. III Série nº.223, de 25/09/1996, tendo-lhe sido então atribuído o nº.211.06.96.3.30. Tinha sido aprovado para utilização, pela DGV, por despacho nº.001/DGV/alc.98, de 06/08/1998, tendo sido publicitada posteriormente a aprovação deste e doutros modelos, como decorre dos despachos do Director Geral de Viação que a seguir se indicam:
- Despacho n.º 8036/2003, de 07/02, publicado no D.R. 2ª.série, nº.98, de 28/04/2003;
- Despacho nº.12594/2007, de 16/03, publicado no D.R. 2ª.série, nº.118, de 21/06/2007, neste identificando-o como sendo o modelo “Alcotest 7110 MKIII” e com o nº.211.06.96.3.30;
- Despacho DGV nº.20/2007, também de 16/03, não publicado no D.R..
A esta aprovação do modelo sucedeu a feita pelo IPQ com o nº.11037/2007, de 24.04, publicado no D.R 2ª.série nº.109, de 06/06/2007, correspondendo-lhe o nº.211.06.07.3.06, aí se estabelecendo, também, o prazo de validade de 10 anos.
A questão que se coloca, é a de saber se a aprovação publicada em 25/09/1996 tinha ou não caducado, quando da fiscalização em apreço, sendo certo que não estava em vigor o aparelho aprovado pela publicação de 06/06/2007.
No ac. RL, de 17/03/2009, no proc. 178/2009-5, entendeu-se que: «Sendo a questão a de saber se o prazo de validade da aprovação deste tipo de aparelho se conta a partir da publicação em DR do despacho de aprovação do IPQ, ou do despacho da DGV que aprovou a sua utilização, atendendo ao referido dispositivo legal – art.5°, n° 5 do DL n° 44/05, que atribui a competência à DGV para autorizar a sua utilização nas operações de fiscalização, esse prazo deve ser contado a partir do despacho desta entidade. Como o mesmo foi publicado em 06/08/98, os 10 anos perfizeram-se em 5/08/2008. Assim a validade do modelo aprovado pelo IPQ e cuja autorização pela DGV para o seu uso caducou a 5 de Agosto de 2008, independentemente do alcoolímetro em concreto ter menos de 10 anos ou do seu estado. Com efeito, o aparelho até pode ser novo ou estar em bom estado de conservação, mas se for daquele cujo prazo de validade da aprovação se encontra caducado pelo decurso do tempo, esse aparelho não apresentará um requisito formal à função a que se destina».
Neste sentido ver também o Acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, de 31.10.2007, no Recurso n.° 7087/07-3.a Secção.
Não concordamos, no entanto, com a argumentação, pela simples razão de que a norma que prevê o prazo de caducidade de 10 anos não se refere à aprovação do aparelho de fiscalização pela DGV mas sim à aprovação técnica, pelo IPQ, como aliás resulta de toda a estrutura do anexo à Portaria nº 748/94, de 13/08. É o IPQ quem atesta a conformidade dos instrumento de medição do álcool, da sua fiabilidade e bom funcionamento, ou seja, das condições que permitem atribuir aos resultados da medição a força probatória. Assim sendo, os 10 anos só podem ser contados desde a data da publicação dessa aprovação técnica, o que no caso nos leva a concluir que a aprovação do aparelho que foi utilizado para pesquisa de álcool no sangue do recorrente tinha caducado em 25/09/2006.
Porque a certificação técnica já havia caducado, o resultado da medição feita não vale como meio de prova. E a esta invalidade nada acrescenta a discussão, que o requerente promove, sobre se o aparelho certificado em 1996 é ou não igual ao certificado em 2007. É irrelevante à sorte dos autos tudo aquilo que se refere ao aparelho certificado em 2007, porque não foi o utilizado na medição em apreço.
Não sendo admissível o resultado da prova obtida através da medição feita pelo alcoolímetro, por proibida (artº 125º/CPP), não se pode considerar o facto referido no ponto 3) da matéria de facto como relevante para a aplicação do direito ao caso dos autos, porquanto o mesmo foi obtido apenas através da referida medição, conforme resulta da fundamentação da matéria de facto.
Resta, na conformidade, a absolvição do recorrente, por não se provar que este conduzisse, no momento e circunstâncias referidas nos autos, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l.
Perante a procedência do recurso, face à questão agora apreciada, fica prejudicado o conhecimento das das demais questões colocadas pelo recorrente, por resultarem na prática de actos inúteis.
***
VI- Decisão:
Acorda-se, pois, concedendo provimento ao recurso, em revogar totalmente a decisão recorrida, absolvendo o arguido do crime pelo qual foi pronunciado nestes autos.
Sem custas.
Texto processado e integralmente revisto pela relatora.
Évora, 17/06/2010
(Maria da Graça dos Santos Silva)
(António Alves Duarte)
[2] Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271.
[3] Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995.
[4] Cf. Simas Santos e Leal Henriques, em «Recursos em Processo Penal» 7ª edição, actualizada e aumentada, 2008, 105.
[5] Cf. Ac. do TC n 59/206, de 18/01/2006, no proc. 199/2005, em www.tribunalconstitucional.pt, e Acs. dos STJ de 27/01/2009, e de 20/11/2008, tirados respectivamente nos procs. 08P3978 e 08P3269, em www.dgsi.pt, e de 17/05/2007, na CJSTJ, 2007, II, 197.