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ROUBO
ARMA
Sumário
I. Uma réplica em plástico de um revólver é apta a determinar aquele a quem é exibida a entregar coisa móvel, receando pela sua vida ou integridade física. E, por isso, é – ou pode ser – meio idóneo à prática do crime de roubo previsto no artº 210º, nº 1 do Cod. Penal.
II. A agravação da pena pressupõe, porém, um acréscimo de perigo para a vítima, decorrente do porte de arma; e esse acréscimo há-de ser efectivo, objectivo, real, não apenas subjectivo, decorrente da mera impressão ou sensação do visado”. [1]
Texto Integral
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES QUE COMPÕEM A 2ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:
I. No Proc. Comum Colectivo que com o nº 1161/10.6PCSTB corre termos na Vara Mista de Setúbal, o arguido Rui, com os demais sinais dos autos, foi julgado e a final absolvido de cinco crimes de roubo qualificado, p.p. pelo artº 210º, nºs 1 e 2, al. b), com referência ao artº 204º, nºs 1, al. h) e 2, al. f), todos do Código Penal, por cuja autoria vinha acusado; bem assim, foi condenado pela prática de cinco crimes de roubo simples, p.p. pelo artº 210º, nº 1 do Cod. Penal, nas penas de 1 ano e 6 meses de prisão, cada um; pela prática de um crime de roubo qualificado, p.p. pelo artº 210º, nºs 1 e 2, al. b), com referência ao artº 204º, nº 2, al. f) do Cod. Penal, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão; pela prática de um crime de condução ilegal, p.p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2 do DL 2/98, de 3/1, na pena de 8 meses de prisão; em cúmulo jurídico dessas penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob regime de prova.
Inconformado, o Digno Magistrado do MºPº interpôs recurso, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões (transcritas):
«1ª- O presente recurso é restrito à matéria de direito na parte em que o douto acórdão recorrido afastou a existência da circunstância qualificativa do crime de roubo relacionada com a utilização da arma referida nos autos, bem como relativamente às penas parcelares aplicadas quanto aos crimes de roubo cometidos pelo arguido;
2ª- O doutoacórdão seguiu uma das orientações existentes relativamente à forma como deve ser interpretada a circunstância qualificativa prevista art. 204º, nº 2, al. f) do Código Penal (aplicável por via do art. 210º, nº 1, al. b) do Código Penal), defendendo que aquilo que está na sua base é o perigo objectivo da utilização para a vítima, ao mesmo tempo que permite que o agente se sinta mais confiante e audaz, e para que isso aconteça é necessário que esteja munido de uma arma eficaz;
3ª- No entanto entende-se, ao invés, que aquilo que esteve na base da consagração desta agravação é a utilização pelo agente de arma que tenha a virtualidade do homem médio ou comum pensar que o agente da infracção está na posse de uma verdadeira arma, causando-lhe um justo receio de poder vir a ser atingido e lesado corporalmente;
4ª- Esta interpretação é a que melhor se adequa aos valores que a existência da referida agravante pressupõem, os quais se relacionam com a eficaz tutela dos interesses dos ofendidos, estando na sua base o “acréscimo de fragilidade na defesa … que pode ser desencadeada, justamente, pela percepção de um objecto que é tido, pelo comum e normal dos cidadãos, como instrumento capaz de ferir ou de matar” (cfr. Comentário Conimbricense, t. II, p. 81);
5ª- Nestes termos, arguido deveria ter sido condenado por mais três crimes de roubo qualificados, relativamente aos factos provados referidos nos nºs 8 a 16, já que relativamente aos factos provados nos nºs 1 a 7 (dois crimes de roubo) ocorre desqualificação por via do valor em causa ser inferior a uma UC, já que se apoderou de 70 e 100 euros (cfr. arts. 210º, nº 2, al. b), parte final e 204º, nº 4 do Código Penal);
6ª- Por outro lado, no caso em análise, há um conjunto de aspectos que não permitem a aplicação de penas parcelares tão baixas, como aquelas que foram fixadas na douta decisão; 7ª- Estes aspectos são os seguintes: a gravidade dos factos praticados; a existência de dolo directo; o facto do agente não ter atenuado as consequências da sua actividade criminosa; o facto de não ter antecedentes criminais; e as prementes necessidades de prevenção geral nestes casos que impõem algum rigor punitivo;
8ª- Termos em que se entende, nos termos do disposto no art. 71º, nº 1 do Código Penal, que as penas parcelares a aplicar quanto aos crimes de roubo em questão deverão ser fixadas, da seguinte forma: - crimes de roubo simples: 2 anos de prisão; crimes de roubo qualificados: 4 anos de prisão; mantendo-se a pena quanto ao crime de condução ilegal;
9ª- O relevo dado ao facto do arguido ter praticado os factos num clima de perturbação não pode ter o valor atenuativo atribuído no douto acórdão, atenta a forma reiterada como os factos foram praticados no período compreendido entre 12.9.2010 e 4.10.2010, renovando o seu desígnio criminoso com o intuito de obter as quantias monetárias de que se apoderava, através do recurso à força e intimidação;
10ª- Assim sendo, em face dos critérios legais, considera-se ser justa e adequada a aplicação das seguintes penas únicas ao arguido: a) no caso de procedência do recurso quanto à questão do enquadramento dos factos no crime de roubo qualificado: pena de 7 anos e 6 meses de prisão; b) no caso de improcedência do recurso: pena de 6 anos de prisão;
11ª- O douto acórdão recorrido violou o disposto no art. 204º, nº 2, al. f) do Código Penal, por via do art. 210º, nº 2, al. b) do Código Penal;
12ª- O douto acórdão interpretou o disposto nesta norma no sentido de que a mesma não se aplicava aos casos em que o arguido utilizou a arma referida, quando tal norma deveria ser interpretada no sentido de estar verifica a sua aplicação perante os factos provados;
13ª- O douto acórdão recorrido violou ainda o disposto no art. 71º, nº 1 do Código Penal, ao aplicar as penas parcelares em questão, entendendo-se que não foram respeitados os critérios legais aí fixados».
E termina, pedindo que com a procedência do recurso, seja revogado o acórdão na parte em que afastou a existência do crime de roubo qualificado do art. 204º, nº 2, al. f) do Código Penal e sejam alteradas as penas parcelares e única aplicadas.
Respondeu o arguido, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida, extraindo da sua resposta as seguintes conclusões (igualmente transcritas):
«1. Quanto à qualificativa prevista na alínea f) do nº 2 do art. 204º, o douto tribunal a quo considerou que “estamos apenas perante um objecto que tentava reproduzir uma arma de fogo, perante uma simples imitação num material tipo plástico, unicamente aparentando ser uma arma, mas sem capacidade de deflagração, ( ... ) ou seja um brinquedo imitando uma arma de fogo”.
2. Considerou ainda que “tem sido decidido na Vara de Setúbal, na sequência do que maioritariamente tem defendido a nossa jurisprudência (designadamente do STJ) que o conceito de arma aparente ou oculta não abrange a aparência de arma, isto é o objecto que aparentando ser uma arma o não é”.
3. O Ac do STJ de 17/01/2002, refere que se o agente, munido de uma pistola simulada, fictícia ou de simples alarme lograr, pelo medo com que tal pseudo-arma provoque na vítima, a apropriação ilícita de coisa móvel alheia, está ele incurso no crime de roubo previsto e punido pelo art. 210, n º 1 do CP, mas não incorre na punição mais severa do nº 2 do mesmo preceito.
4. Isto porque defende a jurisprudência do tribunal superior, o que está na base da agravação prevista na al. f) do nº 2 do artº 204 do C.P é o perigo objectivo da utilização da arma, determinando uma maior dificuldade de defesa e maior perigo para a vítima, ao mesmo tempo que permite que o agente se sinta mais confiante e audaz, e para que isso aconteça é necessário que esteja munido de uma arma eficaz.
5. No caso em apreciação, o objecto que o arguido empunhou era um simples brinquedo, uma imitação em plástico de um revólver sem capacidade para efectuar qualquer disparo.
6. O tribunal a quo concluiu que o facto do arguido empunhar um objecto que não é uma arma, aparentando simplesmente sê-lo, não permite a qualificação dos 5 crimes de roubo, ocorridos nos dias 12, 13, 26 e 30 de Setembro, nos termos do citado artigo 210, nº 2 alínea b) do C.P. 7. Ac. do STJ de 19.12.2007: “O STJ tem vindo a decidir que a circunstância qualificativa da al. f) do nº 2 do art. 204º do Código Penal pressupõe um perigo objectivo emergente das características da arma como instrumento de agressão, sendo irrelevante que tenha sido ou não criado qualquer receio à pessoa lesada com o crime. (...) Em sede de roubo agravado, a qualificativa da al. f) do nº 2 do art. 204º do CP só deverá operar quando o instrumento usado constituir um perigo objectivo (daí decorrendo ser a qualificativa também de ordem objectiva): quando o agente tiver usado uma arma e não um mero simulacro de arma, ou uma arma de alarme (…)”.
8. Nesta conformidade, considera-se o tribunal a quo aplicou a jurisprudência que se mostra mais adequada e predominante.
9. Pelo que, deve se manter a qualificação jurídica do douto acórdão recorrido.
10. Salvo do devido respeito, mas não concordamos com a posição do recorrente que considera ser justa e adequada a aplicação da pena de 7 anos e 6 meses de prisão (em caso de procedência do recurso) ou 6 anos (em caso de improcedência do recurso).
11. A douta decisão do tribunal a quo foi justa, adequada e respeitou todos os critérios legais.
12. O tribunal a quo considerou o seguinte:
-“os antecedentes criminais do arguido relacionam -se com crimes diferentes dos roubos, não envolvendo violência contra as pessoas, e não atingindo o património dos particulares”. - “a confissão integral e sem reservas e a colaboração que prestou no decurso do inquérito no sentido do apuramento dos factos, o que demonstra arrependimento”. - “o facto de ser uma pessoa integrada socialmente” - “A circunstância de os crimes em causa terem sido praticados num clima de perturbação, com prévia e simultânea ingestão de álcool e comprimidos para tratamento de depressão, tendo o arguido em Julho de 2010 sido vítima de uma agressão, situação que se repercutiu em diversas sequelas físicas, neurológicas e psicológicas, e após aquela agressão, passou a apresentar sinais significativos de alteração comportamental e emocional, designadamente dificuldade de controlo dos impulsos e emoções, instabilidade emocional e agressividade (...)” - “As consequências dos crimes não foram particularmente gravosas, não existindo qualquer ofensa física, resumindo-se à perda de quantias não particularmente elevadas”. - “adequada à culpa do arguido e necessária para responder à necessidade de ressocialização” (...) a pena única de 5 anos de prisão. - “as circunstâncias que rodearam a prática dos crimes de roubo se relacionam com o já referido período de descontrolo emocional” - “resultou provado que o arguido tem vindo a ser acompanhado e medicado na consulta externa de psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal, mantendo um quadro pessoal de aparente estabilidade que lhe permite um comportamento globalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado”
- Suspendeu a execução da pena pelo período de 5 anos sujeita a regime de prova.
13. No caso, as finalidades da punição são adequadamente realizadas pela simples censura do facto e ameaça da punição, uma vez que o arguido está integrado socialmente, praticou os factos num período de descontrolo emocional, encontra-se arrependido, está a ser acompanhado e medicado na consulta externa de psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal, mantendo um quadro pessoal de aparente estabilidade, permitindo formular um juízo de prognose favorável, e a simples ameaça da prisão assegura, de forma adequada e suficiente, as exigências fortes de prevenção geral.
14. Pelo exposto, a decisão recorrida não violou qualquer disposição legal do C.P.
15. O tribunal a quo, fez uma correcta aplicação das disposiç5es legais aplicáveis ao caso em apreço.
16. Nesta conformidade, deve manter-se o douto acórdão recorrido, bem como a qualificação jurídica, as penas parcelares aplicadas e a pena única de 5 anos, suspensa na sua execução por um período de 5 anos».
Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. Cumprido o disposto no artº 417º, nº 2 do CPP, não houve resposta.
Realizado exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre decidir.
II. Sabido que são as conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação que delimitam o âmbito do recurso - artºs 403º e 412º, nº 1 do CPP [2] - cumpre dizer que em discussão nos presentes autos está o saber:
a) um roubo praticado com recurso a uma reprodução em plástico de uma arma de fogo, apenas apta a disparar pequenas esferas de plástico, há-de ter-se por qualificado, nos termos do artº 210º, nºs 1 e 2, al. b), por referência ao artº 204º, nº 2, al. f), ambos do Cod. Penal?
b) Devem ser agravadas as penas parcelares (relativas aos crimes de roubo simples e qualificado) e única aplicadas ao arguido?
O tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:
1. No dia 12 de Setembro de 2010, pelas 7h00, Rui dirigiu-se às instalações da área de Serviço da B.P., sitas na Estrada dos Ciprestes, em Setúbal.
2. Aí chegado, dirigiu-se à funcionária dessas Bombas de Combustível, Fernanda, e exibindo um objecto que aparentava ser uma pistola de cor cinzenta, exigiu que lhe entregassem todo o dinheiro existente na caixa registadora.
3. Essa arma de fogo é uma mera réplica de um revólver Smith & Wesson, tem a inscrição “Made in China Smith & Wesson TCP 8286” e um carregador sendo apto para disparar pequenas esferas de plástico.
4. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 70,00 €, que o arguido levou consigo quando abandonou esse local.
5. No dia 23 de Setembro de 2010, pelas 4h45m, o arguido dirigiu-se às instalações da área de serviço da Galp, sitas na Av. do Infante D. Henrique, em Setúbal.
6. Aí chegado, dirigiu-se à funcionária dessas Bombas de Combustível, Vanessa, e exibindo referida “pistola” de cor cinzenta, exigiu que aquela lhe entregasse todo o dinheiro existente na caixa registadora.
7. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 100,00 €, que o arguido levou consigo quando abandonou esse local.
8. No dia 23 de Setembro de 2010, pelas 22h40m, o arguido dirigiu-se às instalações da área de serviço da Repsol, sitas na Av. da Europa em Setúbal.
9. Aí chegado, dirigiu-se à funcionária dessas Bombas de Combustível, Elizabete, e exibindo referida “pistola” de cor cinzenta, exigiu que lhe entregasse todo o dinheiro existente na caixa registadora.
10. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 150,00 €, que o arguido levou consigo quando abandonou esse local.
11. No dia 26 de Setembro de 2010, pelas 22h32, Rui dirigiu-se às instalações da área de Serviço da B.P., sitas na Estrada de Algeruz, em Setúbal.
12. Aí chegado, dirigiu-se a funcionária das Bombas de Combustível, Cláudia, e, exibindo a pistola de cor cinzenta, exigiu que lhe entregasse todo o dinheiro existente na caixa registadora.
13. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 370,00 € que o arguido levou consigo quando abandonou esse local.
14. No dia 30 de Setembro de 2010, pelas 20h05m, o arguido dirigiu-se às instalações da área de serviço da Galp, sitas em Cabanas, Palmela, onde abasteceu o veículo automóvel marca Fiat modelo Punto, com a matrícula ---e tomou um café.
15. A dado momento, dirigiu-se à funcionária dessa bomba de combustível de nome Antonieta e, exibindo uma pistola de cor cinzenta, exigiu que lhe entregasse todo o dinheiro existente na caixa registadora.
16. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 200,00 € que o arguido levou consigo, quando abandonou o local.
17. No dia 4 de Outubro de 2010, pelas 7h15m, Rui dirigiu-se às instalações da área de Serviço da Galp sitas na Av. Infante D. Henrique, em Setúbal.
18. Aí chegado, dirigiu-se à funcionária dessas Bombas de Combustível, Isaura, e, exibindo uma faca de cozinha com 22 cm de lâmina, exigiu que esta lhe entregasse todo o dinheiro existente na caixa registadora.
19. Com receio de ser agredida, essa funcionária entregou-lhe a quantia de 150,00 €, que o arguido levou consigo quando abandonou esse local
20. O arguido não tinha carta de condução nacional, nem é portador de outra habilitação legal para conduzir veículos automóveis.
21. Nas diversas ocasiões descritas supra, o arguido apresentou-se sempre de cara destapada, e tinha anteriormente ingerido bebidas alcoólicas e comprimidos, estes para debelar uma depressão que então sofria, em parte com origem numa agressão de que foi vítima em Julho de 2010.
22. Ao apropriar-se dos valores descritos (dinheiro) nas seis estações de serviço, levando-o em seu poder, o arguido teve o propósito de os integrar no seu património, fazendo-os coisa sua, bem sabendo que estes não lhe pertenciam e que actuava, sem qualquer autorização, contra a vontade e em prejuízo dos seus legítimos donos.
23. O arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e deliberada, não desconhecendo a reprovabilidade do seu comportamento.
24. O relatório social elaborado pela DGRS refere que o arguido Rui cresceu num agregado composto pelos pais e cinco irmãos, sofrendo o pai de stress pós-traumático de guerra, sendo alcoólico, e mantendo, ao longo do tempo, atitudes de agressividade para com os seus coabitantes.
25. O arguido manteve um percurso escolar mediano, tendo apenas concluído o 7° ano tendo já na fase adulta frequentado um processo de reconhecimento, validação e certificação de competências, adquirindo então habilitações equivalentes ao 9º ano.
26. Rui manteve um percurso laboral consistente, com desempenho adequado, durante cerca de 18/19 anos, exercendo sobretudo as funções de padeiro e de vigilante/segurança. Após a última actividade, da qual saiu por razões que lhe são externas, seguiu-se uma fase de trabalho contratualmente precário, estando inscrito como desempregado desde Janeiro de 2010, usufruindo de uma prestação de subsídio de desemprego.
27. O arguido, após um primeiro casamento que apenas durou cerca de seis meses, manteve posteriormente uma relação conjugal de nove anos, no decurso da qual nasceu o seu único filho, actualmente com 6 anos.
28. Após a ruptura da segunda relação, há cerca de 2 anos, o arguido reintegrou o agregado de origem, composto pelos pais.
29. O arguido em Julho de 2010 foi vítima de uma agressão, situação que se repercutiu em diversas sequelas físicas, neurológicas e psicológicas.
30. O arguido após aquela agressão, passou a apresentar sinais significativos de alteração comportamental e emocional, designadamente dificuldade de controlo dos impulsos e emoções, instabilidade emocional e agressividade, que originaram o seu atendimento num episódio de urgência hospitalar.
31. Durante a medida de coacção de prisão preventiva, no âmbito do presente processo, o arguido foi acompanhado pelo corpo clínico do estabelecimento prisional, o que permitiu um controlo da toma da medicação psiquiátrica e aparentemente possibilitou a inversão da sua instabilidade comportamental e emocional, permitindo-lhe ser capaz de gerir impulsos e emoções.
32. No decurso da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica, o arguido tem vindo a ser acompanhado e medicado na consulta externa de psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal, mantendo um quadro pessoal de aparente estabilidade que lhe permite um comportamento globalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado, embora com registo de algumas anomalias associadas, sobretudo, às ausências excepcionais da habitação.
33. O mesmo relatório social refere que o arguido revelou razoáveis capacidades de auto-censura, descentração e pensamento consequencial, permitindo perceber que detém noção do interdito e que reconhece o valor das regras sócio-jurídicas.
34. O arguido foi condenado pela prática em 20-7-2007 de um crime de condução sem habilitação na pena de 490,00 € de multa, pela prática em 14-9-2008 de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 1000,00 € de multa, e ainda pela prática em 7-3-2009 do mesmo crime de crime de condução sem habilitação legal na pena de 1440,00 € de multa, estando actualmente a tirar licença de condução.
E o tribunal colectivo considerou não provada a seguinte factualidade:
“Não se provou - quanto aos factos ocorridos no dia 26 de Setembro - , que o arguido tenha retirado a quantia de 500,00 €, mas apenas de 370,00 €.
Não se provou - quanto aos factos relativos ao dia 30 de Setembro - que o arguido tenha retirado a quantia de 465,00 €, mas apenas de 200,00 €”.
Desta forma fundamentou o tribunal recorrido a sua convicção:
«1. O tribunal atendeu, antes de mais, à confissão do arguido, que admitiu a quase totalidade dos factos descritos na acusação, com excepção dos valores subtraídos, dizendo que no dia 26 de Setembro de 2010 retirou apenas a quantia de 150 a 160 € (e não 500,00 €) e no dia 30 de Setembro retirou a quantia de 100,00 € (e não 465,00 €).
Face a essas discrepâncias, foi inquirida a testemunha Cláudia, (posto de Aljeruz, assaltado no dia 26-9) que referiu que efectivamente a quantia subtraída ascendia a cerca de 370, 380 € (e não 500,00 € como consta da acusação).
A testemunha Antonieta - ofendida do assalto que ocorreu em 30 de Setembro - , apontou para um valor a rondar de 200,00 € em notas, o que se considerou nos factos provados.
António, chefe da BP (posto de Aljeruz, assaltado no dia 26-9), confirmou que o prejuízo rondava os 380,00 €, tendo sido a testemunha a fazer o levantamento das quantias desaparecidas, sendo esse valor concordante com o já referido pela testemunha Cláudia.
O tribunal atendeu ainda aos fotogramas de fls. 8 a 12 (4-10-2010), fotografia de fls. 23 (reproduzindo arma branca), auto de exame directo de fls. 29 (mesma arma branca), fotos de fls. 127 e 132 (pistola), fls. 130 (auto de exame directo à pistola), fotogramas de fls. 179 a 186 (assalto à BP), fls. 187 a 192 (assalto à Galp, dia 23-9), fotogramas de fls. 198 e 199 (assalto à Repsol, dia 23-9).
Foi considerado o relatório social de fls. 812 e s.., ao documento médico de fls. E ao C.R.C. de fls. 787 e ss.».
Posto isto:
a) um roubo praticado com recurso a uma reprodução em plástico de uma arma de fogo, apenas apta a disparar pequenas esferas de plástico, há-de ter-se por qualificado, nos termos do artº 210º, nºs 1 e 2, al. b), por referência ao artº 204º, nº 2, al. f), ambos do Cod. Penal?
Estatui-se no artº 210º, nº 1 do Cod. Penal que “quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de um a oito anos”. E acrescenta-se no nº 2 desse dispositivo que a pena é de prisão de três a quinze anos se (al. b)) “se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos nºs 1 e 2 do artigo 204º, sendo correspondentemente aplicável o disposto no nº 4 do mesmo artigo”.
Ora, nos termos do artº 204º, nº 2, al. f) do Cod. Penal, é qualificado o crime de furto pelo facto de o agente trazer “no momento do crime, arma aparente ou oculta”.
A questão suscitada no presente recurso não é nova, como se sabe.
Para uma corrente jurisprudencial, que temos por minoritária, “arma, para os fins dos referidos artigos (204º -2 - f) e 210º) é todo o objecto que tenha a virtualidade de provocar nas pessoas ofendidas ou nos circunstantes, um justo receio de virem a ser lesadas, através da respectiva utilização, na sua integridade física, mesmo que, de facto, e sem que elas o saibam, não possa cumprir cabalmente tal função, designadamente por falta de partes componentes que, nas armas de fogo ou suas imitações, sejam susceptíveis de provocar o disparo” – Ac. STJ de 27/6/1996, CJ (ASTJ) 1996, t. 2º, 201.
É entendimento que merece o aplauso do José de Faria Costa, que nele vê um afloramento da doutrina da impressão - “Comentário Conimbricense do Código Penal”, t. II, 81.
A jurisprudência maioritária do STJ aponta, contudo, em sentido diverso. E com razão, em nosso modesto entendimento.
No artº 4º do DL 48/95, de 15/3 (diploma que procedeu à revisão do Código Penal aprovado pelo DL 400/82, de 23/9) estatui-se que “para efeito do disposto no Código Penal, considera-se arma qualquer instrumento, ainda que de aplicação definida, que seja utilizado como meio de agressão ou que possa ser utilizado para tal fim”.
Ora, como elucidativamente se afirma no Ac. STJ de 27/10/2010 (rel. Cons. Armindo Monteiro), www.dgsi.pt, “numa visão sistémica e integrada do entrelaçado de normas de que a requalificação pretendida não prescinde (…) o legislador (…) ao referir-se ao uso de arma, de forma visível ou encoberta, a esse elemento da acção típica do crime de roubo qualificado pela remissão operada para o art. 204.º, n.º 2, al. f), do CP, fá-lo em sentido técnico, enquanto instrumento com a aptidão e a virtualidade que ressalta do art. 4.º da Lei 48/95, de 15-03, para ferir ou agredir. A qualificativa assenta na maior vulnerabilidade do visado ao agente, que, ao usar da arma, coloca a vítima numa situação de maior indefesa, de maior perigo, denotando ousadia e audácia para consumação do crime, reclamando, por isso mesmo, face a um “plus” de culpa e ilicitude, uma punição agravada, quando comparativamente com o roubo simples”. Ora, justificando-se a agravação punitiva com a “maior perigosidade que para a vítima representa o porte de arma no momento do crime, importa que se trate de instrumento efectivamente produtor daquele risco, o que não sucede quando o agente usa de uma réplica de arma de fogo, de um revólver, porque em tal caso o que transparece da sua posse não é o propósito de atentar contra a vida ou integridade física de outrem. De um ponto de vista do destinatário, subjectivo, o uso desse instrumento, pode gerar-lhe, e gera normalmente, a impressão de que aqueles valores são colocados em perigo, porque desconhece a natureza do instrumento, ligando-lhe, sem reservas, os efeitos, que, como é usual e natural, ao homem médio, dele derivam, não sendo razoável, proporcionado ou justo que, para protecção de interesses pessoais e em nome da prevenção geral, se exigisse mais do que a aparência de arma. Mas se atentarmos que a agravação radica numa maior culpa e ilicitude do agente do crime, e que, em caso algum, a culpa pode ser ultrapassada por necessidades de prevenção – art. 40.º, n.º 2, do CP –, as coisas deverão ser analisadas à luz de outro enquadramento, que descendo do conceito irrestrito de arma o cinja, ao invés, a instrumento que, de acordo com a sua normal destinação, à luz de critérios objectivos, produz, de acordo com a sua aptidão normal, efeitos lesivos à vida e integridade física alheias”.
Quer dizer:
Uma réplica em plástico de um revólver é apta a determinar aquele a quem é exibida a entregar coisa móvel, receando pela sua vida ou integridade física. E, por isso, é – ou pode ser – meio idóneo à prática do crime de roubo previsto no artº 210º, nº 1 do Cod. Penal. A agravação da pena pressupõe, porém, um acréscimo de perigo para a vítima, decorrente do porte de arma; e esse acréscimo há-de ser efectivo, objectivo, real, não apenas subjectivo, decorrente da mera impressão ou sensação do visado.
É neste sentido que, nos últimos 15 anos, vem decidindo de forma largamente maioritária o STJ [3].
Desta forma decidiu igualmente o tribunal colectivo, no acórdão recorrido. E porque assim é, não nos merece qualquer censura.
b) Devem ser agravadas as penas parcelares (relativas aos crimes de roubo simples e qualificado) e única aplicadas ao arguido?
O crime de roubo simples é punido com prisão de 1 a 8 anos. O crime de roubo qualificado é punido com prisão de 3 a 15 anos.
O tribunal colectivo condenou o arguido, pela prática de cada um dos 5 crimes de roubo simples, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão (cada um); pela prática de um crime de roubo qualificado (perpetrado em 4/10/2010, com utilização de uma faca), na pena de 3 anos e 2 meses de prisão. Em cúmulo jurídico dessas penas (e, ainda, da pena de 8 meses de prisão, relativa ao crime de condução ilegal, cujo quantum não vem questionado neste recurso), o arguido foi condenado na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada a regime de prova.
Desta forma justificou o tribunal colectivo as penas aplicadas:
«A medida concreta da pena apura-se, de acordo com o preceituado no artigo 71º “.(…) em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, atendendo “a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele”.
A ilicitude dos factos é grave, visto o modo de execução e especialmente a idade das vítimas (entre 10 e 15 anos de idade) [4], ainda que atenuada pelo valor baixo dos objectos.
A culpa é intensa por força do dolo directo.
Passemos, então, à ponderação dos factores relevantes para a determinação da medida concreta das penas de prisão, à luz dos normativos citados.
Os antecedentes criminais do arguido relacionam-se com crimes diferentes dos roubos, não envolvendo violência contra as pessoas, e não atingindo o património de particulares (as condenações em causa não são particularmente graves, merecendo aliás como sanção apenas a pena de multa e são por condução ilegal, pelo que as mesmas serão essencialmente valoradas em sede fixação da pena a aplicar pela prática daquele crime, infra).
A favor do arguido:
A confissão integral e sem reservas e a colaboração que prestou no decurso do inquérito no sentido do apuramento dos factos, o que demonstra arrependimento;
O facto de ser pessoa integrada socialmente;
A circunstância de os crimes em causa terem sido praticados num clima de perturbação, com prévia e simultânea ingestão de álcool e comprimidos para tratamento de depressão, tendo o arguido em Julho de 2010 sido vítima de uma agressão, situação que se repercutiu em diversas sequelas físicas, neurológicas e psicológicas, e após aquela agressão, passou a apresentar sinais significativos de alteração comportamental e emocional, designadamente dificuldade de controlo dos impulsos e emoções, instabilidade emocional e agressividade. Sinal disso mesmo, na nossa óptica, é o facto de o arguido se ter apresentado sempre de cara destapada no momento dos assaltos, demonstrando assim indiferença relativamente à forte possibilidade de ser identificado e consequentemente punido (até porque as bombas de gasolina têm na generalidade câmaras de vídeo-vigilância, o que é publicitado nesses estabelecimentos por imposição legal). A prática reiterada de crimes num curto espaço temporal, nessas circunstâncias (isto é, com desprezo e indiferença relativamente ao resultado da sua prática) aparenta ser – na óptica do tribunal – quase como que um pedido para ser detido, o que evidentemente veio a acontecer;
As consequências dos crimes não foram particularmente gravosas, não tendo existido qualquer ofensa física, resumindo-se à perda de quantias não particularmente elevadas, principalmente se tivermos em consideração que as entidades prejudicadas patrimonialmente eram empresas de comércio de combustível, para as quais a perda desses montantes não assume o mesmo relevo que constituiria para a generalidade das pessoas.
Em sede de prevenção geral de integração, importa assinalar o alarme social que no seio da comunidade tem causado a sucessiva vaga de assaltos a postos de abastecimento de combustível, com repercussões negativas em sede de prevenção geral de integração, traduzidas na necessidade de uma efectiva punição de forma a restabelecer a confiança geral na validade da norma violada.
Face ao atrás exposto, considera-se adequada à culpa do arguido e necessária para responder à necessidade de ressocialização, bem como à necessidade de reafirmação da confiança geral na validade da norma violada, a pena de 1 ano e meio de prisão, pela prática de cada um dos cinco crimes de roubo praticados pelo arguido (moldura de 1 ano a 8 anos de prisão).
Relativamente ao crime de roubo qualificado, considerando a moldura penal em causa (3 a 5 [5] anos de prisão), e ainda as circunstâncias do crime (designadamente apresentando-se o arguido no momento da sua prática de cara descoberta, sem que tivesse por exemplo encostado a faca à ofendida, e principalmente por o valor subtraído com recurso á ameaça de violência ser relativamente baixo (150,00 €, logo no limiar do valor que permitiria desqualificar o roubo – artigos 202º alínea c), 204º nº 4 e 210º nº 2 alínea b) do Cód. Penal), consideramos justa e adequada a pena de 3 anos e 2 meses de prisão.
(…) Da relação de concurso entre os crimes
Encontrando-se os crimes acima descritos numa relação de concurso, importa proceder ao cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, tendo por limite máximo a soma das penas aplicadas (isto é, 9 anos e 10 meses) e como limite mínimo a mais elevada das penas aplicadas (no caso 3 anos e 2 meses) - artigo 77º do Cód. Penal.
Tendo em conta, em conjunto os factos e a personalidade do arguido, ao facto de os 5 roubos terem sido praticados num período temporal muito curto (um mês), sempre da mesma forma já assinalada (cara descoberta, sem particular violência, para além da já contida no respectivo tipo), em circunstâncias que se relacionaram com um momento de descontrole emocional do arguido, consideramos que deve o mesmo ser condenado, na pena única de 5 anos de prisão.
Da suspensão da execução da pena
Nos termos do artigo 50º do Cód. Penal, na redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º59/2007, de 4-IX “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Tendo conta as circunstâncias do facto, considerando, ainda, que a personalidade do arguido será reactiva à sanção ora imposta, que o mesmo é um indivíduo integrado socialmente, que os antecedentes criminais se relacionam com crimes de menor gravidade, entende-se que a ameaça do facto ainda realiza, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, de “protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade” - cfr . artigo 40º do Cód. Penal.
Considera o tribunal a circunstâncias que rodearam a prática dos crimes de roubo se relacionam com o já referido período de descontrole emocional.
E tendo em atenção que resultou provado que o arguido tem vindo a ser acompanhado e medicado na consulta externa de psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal, mantendo um quadro pessoal de aparente estabilidade que lhe permite um comportamento globalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado, o regime de prova que necessariamente acompanhará a suspensão da execução da pena (nº 3 do artigo 53º), incluirá a subordinação a alguns deveres e regras de conduta que abaixo se enunciam, que se relacionam com a manutenção desses tratamentos e acompanhamento médico.
Não possuindo o tribunal os elementos para a organização completa do plano de reinserção social a que se refere o artigo 494º Cód. Proc. Penal, decidimos solicitar aos serviços de Reintegração Social a sua elaboração de acordo com a personalidade, condições familiares e sociais do arguido, que deverá obrigatoriamente conter, entre outras condições que se julguem necessárias à reinserção social do arguido, os seguintes aspectos:
- acompanhamento médico, designadamente na vertente psiquiátrica, aceitando o arguido tomar a medicação que for recomendada ou outra prescrição médica que a cada passo for considerada como adequada à manutenção do seu equilíbrio psicológico, comparecendo ainda pontualmente às consultas médicas ou exames que forem marcados;
- abstinência de consumo de estupefacientes e de álcool por parte do arguido, com sujeição periódica a exames para controlo dessa mesma abstinência;
- aceitação de oportunidades de ocupação profissional que lhe sejam facultadas, com comparência em cursos de formação profissional sempre que exista essa possibilidade;
- comparência do arguido sempre que convocado pelo tribunal ou pelos técnicos da Direcção de Reinserção Social, colaborando e aceitando o arguido as directrizes que lhe forem sendo apontadas, recebendo visitas, colocando à disposição daquelas entidades documentos ou informações relativas aos seus meios de subsistência;
- informar os serviços Reinserção Social sobre quaisquer alterações na residência ou trabalho, justificando-as».
Ora, presentes os critérios de determinação da medida concreta das penas enunciados no artº 71º do Cod. Penal, não vemos como não acompanhar o raciocínio efectuado pelo tribunal colectivo: se é elevado o grau de ilicitude dos factos e é intenso o grau de culpa, certo é igualmente que não assumem particular significado as consequências da infracção e que o arguido, maugrado não ser primário, apenas possui antecedentes em matéria de condução de veículo motorizado, sem a necessária habilitação legal. De outro lado, a confissão integral e sem reservas do arguido e a colaboração que prestou no decurso do inquérito no sentido do apuramento dos factos denotam efectivo arrependimento e vontade de “arrepiar caminho”. Trata-se de indivíduo com integração social e, como apurado ficou, praticou os factos dos autos num período relativamente curto (3 semanas), num clima de perturbação, com prévia e simultânea ingestão de álcool e comprimidos para tratamento de depressão, posto que o arguido, em Julho de 2010, foi vítima de uma agressão e, após a mesma, passou a apresentar sinais significativos de alteração comportamental e emocional, designadamente dificuldade de controlo dos impulsos e emoções, instabilidade emocional e agressividade.
Face a tal circunstancialismo, as penas (parcelares e única) encontradas pelo colectivo afiguram-se-nos justas e adequadas e, como tal, são de manter.
Em boa verdade, o Digno recorrente insurge-se contra a excessiva brandura das penas aplicadas (“junto dos limites mínimos das penas em questão”) mas propõe, ele próprio, penas concretas também elas muito próximas desses limites mínimos (2 anos de prisão para os crimes de roubo simples, numa moldura de 1 a 8 anos, 4 anos de prisão para o crime de roubo qualificado, numa moldura de 3 a 15 anos). Mais parece, verdadeiramente, que aquilo que impressiona o Digno recorrente é, não o quantum das penas parcelares e única, antes a suspensão da execução desta última (e daí que, propondo uma pena única de 6 anos de prisão, eliminada fique a possibilidade da sua suspensão). Mas se foi assim, melhor seria que tivesse questionado essa suspensão, que não o quantum das penas aplicadas.
Certo é, de qualquer dos modos, que também a suspensão da execução da pena única de 5 anos de prisão decretada pelo tribunal recorrido se mostra, no caso, pertinente e adequada: o arguido tem inserção social, os seus antecedentes criminais resumem-se a condenações por condução ilegal e, mais importante do que tudo o mais, a confissão que fez dos factos apurados e a colaboração que prestou para a descoberta da verdade dos factos, denunciando um arrependimento activo, justificam o juízo de prognose favorável a que se chegou no acórdão sob censura que, por isso e também nessa parte, é de manter.
IV. São termos em que, sem necessidade de mais considerações, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso confirmando integralmente o douto acórdão recorrido.
Sem tributação.
Évora, 21 de Junho de 2011 (processado e revisto pelo relator)
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Sénio Manuel dos Reis Alves)
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Fernando Ribeiro Cardoso
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[1] - Sumariado pelo relator
[2] Obviamente, sem prejuízo das questões que oficiosamente importa conhecer, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do STJ, de 19/10/1995, DR 1ª Série, de 28/12/1995).
[3] A título meramente exemplificativo:
- Ac. STJ de 19/12/2007 (rel. Cons. Soreto de Barros), www.dgsi.pt: “(…) não importa para o efeito de preenchimento da apontada qualificativa a circunstância de o arguido ter utilizado “um objecto com forma, cor e aspecto de uma arma de fogo verdadeira”, embora, no caso, a exibição do referido instrumento pelo arguido tivesse sido decisiva para o desencadear do medo que levou os ofendidos a não oferecerem resistência à subtracção dos objectos de que foram desapossados. Mas tal releva tão-somente no âmbito do n.º 1 do art. 210.º do Código Penal, como forma de violência contra os ofendidos» – Ac. de 18-05-2006, Proc. n.º 1170/06; em sentido idêntico, a título de exemplo, Acs. de 25-10-2006, Proc. n.º 3042/06, e de 20-09-07, Proc. n.º 4544/07. Assim, em sede de roubo agravado, a qualificativa da al. f) do n.º 2 do art. 204.º do CP só deverá operar quando o instrumento usado constituir um perigo objectivo (daí decorrendo ser a qualificativa também de ordem objectiva): quando o agente tiver usada uma arma e não um mero simulacro de arma, ou uma arma de alarme”.
- Ac. STJ de 20/9/2007 (rel. Cons. Souto de Moura), www.dgsi.pt: “Em sede de roubo agravado, a qualificativa da al. f) do n.º 2 do art. 204.º do CP só deverá operar se se tiver usado mesmo uma arma e não um mero simulacro de arma. O instrumento usado terá então que constituir um perigo objectivo, daí decorrendo ser a qualificativa também de ordem objectiva.
Tal posição é defendida em face, por um lado, do conceito de arma, que reclama uma aptidão real do objecto usado – cf. art. 4.º do DL 48/95, de 15-03 – e, por outro lado, porque o medo ou a intimidação sentida pela vítima podem ser considerados no elemento “violência” típico do roubo. Em consequência, “uma réplica de arma de fogo tipo Walther P 99” ou “uma pistola em plástico de cor preta”, sendo objectivamente inofensivas não podem agravar o roubo”.
- Ac. STJ de 25/10/2007 (rel. Cons. Simas Santos), www.dgsi.pt: “Se o agente, munido de uma pistola simulada, fictícia ou de simples alarme, lograr, pelo medo com que tal pseudo-arma provoque na vítima, a apropriação ilícita de coisa móvel alheia, está ele incurso no crime de roubo previsto e punido pelo art. 210.º, n.º 1, do C. Penal; mas não incorre na punição mais severa do n.º 2 do mesmo preceito, pois o que está na base da agravação prevista na al. f) do n.º 2 do art. 204.º do C. Penal é o perigo objectivo da utilização da arma, determinando uma maior dificuldade de defesa e maior perigo para a vítima, do mesmo passo que permite que o agente se sinta mais confiante e audaz e para que isto aconteça é necessário que esteja munido de uma arma eficaz”.
[4] A referência à idade das vítimas resulta de lapso evidente, como nos parece claro (eventualmente provocado pela utilização informática de parte de um texto anterior, sem que posteriormente se tivesse feito a revisão final que se impunha…).
[5] Mero lapso: queria escrever-se, naturalmente, “15”.