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INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
CONTRADIÇÃO ENTRE O PEDIDO E A CAUSA DE PEDIR
Sumário
(i) A contradição entre o pedido e a causa de pedir que conduz à ineptidão da petição inicial pressupõe que não é perceptível nem ao Réu nem o tribunal ao que deve ater-se: trata-se de uma contradição intrínseca e insanável, que implica que se torne de todo incompreensível o articulado de petição inicial; (ii) Tal não se verifica se a Autora alega que tinha um contrato de trabalho sem termo com a Ré, foi por esta despedida verbalmente e embora não pretenda discutir a ilicitude do despedimento, pretende contudo receber uma indemnização de antiguidade e por falta de aviso prévio; (iii) A contradição entre o pedido e a causa de pedir não se confunde com a insuficiência de factos para o reconhecimento do direito da Autora, ou até com a manifesta improcedência da sua pretensão.
Sumário do relator
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório S…, intentou, na Comarca do Alentejo Litoral Sines – Juízo de Trabalho e Família e Menores, acção emergente de contrato individual de trabalho, contra T…, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 3.395,00, «relativa a créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação, acrescida de juros legais desde o vencimento até integral pagamento, com as legais consequências quanto a custas procuradoria e demais encargos».
Alegou para o efeito, em síntese:
- Em 3 de Abril de 2007, celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo, pelo prazo de 8 meses, com fundamento no disposto no artigo 129.º, n.º 2, alínea f), do Código do Trabalho;
- Permaneceu ao serviço da Ré desde essa data até 31 de Janeiro de 2010, convertendo-se o referido contrato em contrato sem termo;
- No final de Janeiro de 2010, o administrador (gerente?) da Ré comunicou-lhe verbalmente que deixava de trabalhar para esta, em razão do que em 1 de Fevereiro de 2010 passou a trabalhar para outra entidade;
- O contrato com a Ré cessou sem que a Autora tenha dado o seu acordo, se tenha demitido e/ou recebido alguma comunicação de pré-aviso, ou tenha sido despedida;
- A Autora não discutiu o despedimento ilícito de que foi vítima, no entanto pretende receber (através da presente acção) a indemnização de antiguidade e o «pré-aviso de 60 dias, que não foi cumprido», ancorando-se, para tanto, no disposto nos artigos 338.º e seguintes, 341.º e 381.º do Código do Trabalho.
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Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, por excepção e por impugnação: (i) por excepção, sustentando que caducou o direito da Autora à acção, uma vez que o prazo de oposição ao despedimento é de 60 dias, e tal prazo não foi cumprido; (ii) por impugnação, afirmando, muito em resumo, que foi a Autora que denunciou (verbalmente) o contrato de trabalho que mantinha com a Ré, não tendo sido objecto de despedimento, pelo que não tem direito a qualquer indemnização de antiguidade fundamentada no despedimento, assim como por falta de aviso prévio de denúncia do contrato de trabalho.
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Respondeu a Autora, a reafirmar que não pretende discutir a ilicitude do despedimento, reclamando as quantias «que convictamente pensa ter direito», referentes à indemnização por antiguidade e ao pré-aviso não observado.
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Seguidamente, foi proferida sentença que, considerando a existência de uma contradição substancial entre o pedido e a causa de pedir, não suprível, declarou a ineptidão da petição inicial e absolveu a Ré da instância.
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Inconformada com o assim decidido, a Autor interpôs recurso para este tribunal, tendo nas respectivas alegações formulado as seguintes conclusões: «1º. A sentença em crise absolveu a R da instância, declarando haver “contradição substancial entre pedido e causa de pedir não suprível que inviabilizou a defesa do R. 2º. Com o devido respeito não assiste razão ao Julgador, enfermando a sentença de vício, por violação dos artigos 508.6, 508.2, 265 e 265-A todos do Código do Processo Civil. 3º. A A recorrente intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho, sob a forma de processo comum, alegando, em síntese, que a) A e R celebraram em 2 de Abril de 2007 um contrato de trabalho a termo certo, b) O contrato foi celebrado pelo prazo inicial de 8 meses, em virtude de "um acréscimo excepcional da actividade da empresa, ditado pela existência de um contrato anual adjudicado pelo cliente Millennium BCP que caduca em 31 de Dezembro de cada ano civil", c) A A permaneceu, todavia, ao serviço da R, trabalhando por conta desta e sob a sua direcção e fiscalização desde 2 de Abril até 31 de Janeiro de 2010, d) Logo o contrato sub-judice (por via das sucessivas renovações que se operaram (1) 2/12/07; (2) 2/8/08; (3) 2/4/09; (4) 2/12/09; (5) 2/8110,) converteu-se num contrato de trabalho celebrado por tempo indeterminado (art°. 147.2.b) do C.T), e) Em 30 de Dezembro de 2010, a R tomou a iniciativa de por termo a este contrato, t) O que configura um despedimento, ilícito, por omissão de procedimento prévio adequado, g) Em consequência do que a A ora recorrente deve ser indemnizada, em quantia nunca inferior a três meses de retribuição base. 4º. Nos termos da Lei, quando o Trabalhador e a Entidade Patronal querem fazer cessar o contrato de trabalho por mútuo acordo devem redigir a escrito esse acordo. 5°. Tal acordo nunca foi redigido exactamente porque o contrato não cessou por mútuo acordo. 6°. Essa ruptura é única e exclusivamente imputável á R. 7°. Ou seja, se não houve acordo entre as partes, se a A não resolveu o contrato de trabalho nem o denunciou, se a Entidade Patronal não instaurou processo disciplinar e, todavia, houve ruptura da relação laboral, foi porque a Entidade Patronal despediu a A. 8°. Se a A foi despedida e tal despedimento não foi precedido de processo disciplinar, o despedimento é ilícito. (art°. 381 alínea c) do CT) 9°. E, se tal procedimento é ilícito a Entidade Patronal deve, naturalmente, indemnizar o Trabalhador nos termos da lei. 10°. Neste contexto, a A pretende ser indemnizada em consequência da conduta ilícita da R. 11º. Essa indemnização não pode ser inferior a três meses de retribuição base - art°. 391 do C.T. 12°. Sendo nisto em que consiste o pedido da A. 13°. Logo, a petição inicial nada tem de inepta, sendo, ao contrário totalmente perceptível, 14°. Tanto assim é que, ao contrário do que consta na douta sentença proferida e ora em crise, o teor da contestação apresentada evidencia á saciedade a inteligibilidade do pedido e da causa de pedir. 15°. Mesmo que a petição inicial fosse ambígua ou de difícil percepção, o Tribunal deveria ter ordenado o seu aperfeiçoamento, tal qual consagrado no artº. 508.6 do C.P.C. 16°. Ao optar por declarar a petição inepta a douta sentença em crise violou os artigos 508°.6; 508°.2; 265° e 265-A do Código do Processo Civil. Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e a douta sentença proferida revogada por outra que ordene o aperfeiçoamento da petição inicial ou o normal andamento do processo, assim se fazendo Justiça!».
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Respondeu a Ré, tendo nas contra-alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões: «A) Apesar de fundamentar a sua pretensão indemnizatória num alegado despedimento ilícito, na parte final do art. 11º da p.i., a recte. confessou que a recda. não a despediu, assentando assim a sua pretensão indemnizatória num despedimento ilícito que simultaneamente afirma não ter ocorrido, o que é manifestamente contraditório. B) Não obstante a recte., em sede de resposta à contestação, ter afirmado não pretender discutir o despedimento mas apenas um possível direito indemnizatório que lhe caberia em consequência dessa ilicitude, a disposição expressamente citada como base legal, ou seja, o art. 391º do cód. de trab, exige necessariamente o prévio julgamento da ilicitude do despedimento para que haja lugar a indemnização. C) Tal como se deixou exposto nos art.1º a 5º da contestação, o prazo de caducidade para a recte. se opor ao despedimento e assim discutir a licitude do mesmo, já se encontrava esgotado à data da apresentação da p.i., o que obsta a que a questão da indemnização possa ser discutida na presente acção. D) Se i) não ocorreu qualquer despedimento e se ii), mesmo que tivesse existido, já não poderia ser analisada a sua suposta ilicitude, não assiste à recte. qualquer direito a compensação pecuniária resultante da cessação do contrato de trabalho que manteve com a recda. baseado no art. 391º do cód. do trab.. E) Não existe norma legal, muito menos o expressamente citado art. 391º do cód. De trab., nem qualquer apoio jurisprudencial ou doutrinário que estabeleça como consequência da ilicitude do despedimento do contrato sem termo a indemnização por falta de aviso prévio de 60 dias peticionada pela recte., cominação que apenas está prevista para casos de caducidade do contrato de trabalho a termo incerto, o que configura outra total contradição entre a causa de pedir e o pedido. F) A recte. fundamenta a sua causa de pedir somente na cessação do contrato de trabalho, mas afirma que o valor concreto da sua indemnização (€ 3.395,00) decorre de “créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação”, o que consubstancia outra manifesta contradição entre pedido e causa de pedir. G) As contradições entre pedido e causa de pedir que se consideram existir, nos termos do al. b) do nº2 do art.193º do cód. proc. civ., tornam inepta a p.i., o que conduz, nos termos do nº 1 do mesmo artigo, à nulidade de todo o processo que corresponde a uma excepção dilatória nominada nos termos da al. b) do art. 494º do cód. proc. civ., de conhecimento oficioso, nos termos do art. 495º e do art. 202ºdo cód. proc. civ., nulidade essa que obsta ao conhecimento do mérito da causa pelo tribunal e dá lugar à absolvição da instância (cfr. nº 2 do art. 493º, al. a) do art. 287º, al. e) do nº 1 do art. 288º todos do cód. proc. civ.). H) Trata-se aqui de uma nulidade insanável nos termos do art. 193º do cód. proc. civ. E por isso não susceptível de ser corrigida nos termos da a) do nº 1 do art. 508º e do nº 2 do artigo 265º do cód. proc. civ., como de facto é expressamente invocado na decisão, não fazendo menor sentido que o Juiz fosse obrigado a providenciar pele suprimento do que não é suprível. I) Também a hipótese de aperfeiçoamento do articulado, contrariamente ao que pretende a recte. não tem aqui a menor sustentação legal, pois o convite que o Juiz pode fazer às partes nesse sentido está limitado, nos termos do nº 2 do art. 508º do cód. proc. civ., aos casos de falta de requisitos legais ou de falta de documentos essenciais, o que manifestamente não é o caso. J) A conveniente interpretação da p.i. por parte do réu na contestação apenas importa para a sanação da ineptidão daquela “quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir” e não presente caso de contradição do pedido com a causa de pedir, nos termos do al. a) do nº 2 e do nº 3 do art. 193º do cod. proc. civil. K) A ineptidão da p.i., por não ser suprível, não obriga o juiz a solicitar a supressão do vício nem o seu aperfeiçoamento, tendo como consequência a nulidade de todo o processo e a absolvição da r. da instância. Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências a quanto alegado, não deve ser dado provimento ao recurso, devendo ser integralmente mantida a decisão recorrida».
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O recurso foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata, nos autos, e efeito meramente devolutivo.
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Neste tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, no qual se pronuncia que seja concedido provimento ao recurso, ordenando-se a revogação da decisão e a notificação da Autora para, querendo, corrigir a petição inicial.
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A Autora respondeu ao parecer, a manifestar a sua concordância com o mesmo e, por consequência, que «seja proferida decisão nessa conformidade».
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Objecto do recurso
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, como resulta do disposto nos artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Assim, tendo em conta as conclusões da recorrente, a única questão a decidir centra-se em saber se existe(iu) contradição entre o pedido e a causa de pedir, não suprível, que inviabilizou a defesa da Ré, e que conduz à ineptidão da petição inicial.
A matéria de facto a atender para a resolução da questão é a que consta do relatório supra, que aqui se dá por reproduzida.
Refira-se que dos autos resultam implícitas outras questões, como sejam a eventual caducidade do direito da Autora/apelante, ou até a (manifesta) improcedência da acção.
Todavia, como se afirmou, tendo em conta o âmbito do recurso, não cumpre, aqui e agora, conhecer de tais questões.
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III. Fundamentação Como decorre do relatório supra, a Autora peticionou o pagamento de determinada quantia a título de créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho: indemnização de antiguidade e indemnização por falta de pré-aviso.
Para tanto alegou que a Ré lhe comunicou, verbalmente, a cessação do contrato de trabalho, que era sem termo, e que embora não pretendendo discutir a ilicitude do despedimento, pretende receber da Ré as quantias peticionadas e a que alega ter direito.
A Ré na contestação afirmou, no que ora releva, não ter despedido a Autora, tendo, ao invés, sido esta que denunciou, verbalmente, o contrato, pelo que não existe qualquer fundamento para a peticionada indemnização, seja por antiguidade, seja por falta de aviso prévio, sendo que em relação a esta nem sequer existe a figura da simples denúncia por parte do empregador.
Na decisão recorrida, que julgou a petição inepta, por contradição entre pedidos e causa de pedir, afirmou-se, designadamente: «Ora, alegando a Autora que trabalhava para a Ré ao abrigo de um contrato sem termo, e que foi alvo de um despedimento verbal, não pode a mesma, ao mesmo tempo, dizer que não está em causa o despedimento e peticionar indemnizações decorrentes da caducidade de um contrato a termo, muito menos de um contrato a termo incerto (já que mesmo o contrato inicial era um contrato a termo certo). Também não pode a Autora peticionar a quantia de €3.395,00, alegando que é relativa a “créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação”, quando, em sede de causa de pedir, concretiza que esse valor é a soma de indemnizações decorrentes única e exclusivamente da cessação do contrato, e não da sua execução. Verifica-se assim uma contradição substancial entre pedidos e causa de pedir, não suprível, que inviabilizou a defesa da Ré, e que conduz à ineptidão da petição inicial e, consequentemente, à nulidade do processado, nulidade essa que constitui excepção dilatória de conhecimento oficioso, devendo a Ré ser absolvida da instância (cfr. artigos 193.º, n.º 1, e n.º 2, al. b), 287.º, al. a), 288.º, n.º 1, al. b), 493.º, n.º 2, 494.º, al. b), e 495.º, todos do Código de Processo Civil, ex vi artigo 61.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho)».
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Cumpre decidir.
Como decorre do disposto no artigo 193.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13-10), é inepta a petição quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir.
No dizer de Manuel de Andrade (Noções elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 127), o pedido é a pretensão do Autor, «(…) o direito que ele solicita ou requer a tutela judicial e o modo por que intenta obter essa tutela (…). Já a causa de pedir, «[é] o acto ou facto jurídico (simples ou complexo, mas sempre concreto) donde emerge o direito que o Autor invoca e pretende valer (art. 498.º, n.º 4). Esse direito não pode ter existência (e por vezes não pode identificar-se) sem um acto ou facto jurídico que seja legalmente idóneo para o condicionar ou produzir». Ou, como afirma Antunes Varela (et alii, Manuel de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 245), o pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo Autor, e a causa de pedir é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido.
E, sobre a necessidade de consentaneidade entre o pedido e causa de pedir, ensina Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. II, Coimbra Editora, 1945, pág. 362): «(…) a causa de pedir deve estar para com o pedido na mesma relação lógica em que, na sentença, os fundamentos hão-de estar para a decisão, o valor e significado duma conclusão; a causa de pedir, do mesmo modo que os fundamentos de facto da sentença, é a base, o ponto de apoio, uma das premissas em que assenta a conclusão. Isto basta para mostrar que entre a causa de pedir e o pedido deve existir o mesmo nexo lógico que entre as premissas dum silogismo e a sua conclusão».
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Ora, regressando ao caso em apreciação, o que se constata é que a Autora formula determinado pedido indemnizatório; e para formular o pedido indemnizatório ancora-se, em suma, na existência de um contrato de trabalho que tinha com a Ré e no despedimento (ilícito) promovido por esta.
Ou seja, e dito de outro modo, a Autora alega: tinha um contrato de trabalho sem termo com a Ré, fui despedida por esta verbalmente, em razão da cessação do contrato tenho direito a uma indemnização de antiguidade e por falta de aviso prévio.
Entende-se, salvo o devido respeito por diferente entendimento, que não existe contrariedade entre a pretensão formulada e os factos concretos que servem de fundamento à mesma.
Aliás, tanto assim que a Ré interpretou devidamente o pedido e a causa de pedir, ao afirmar não ter despedido a Autora – antes ter sido esta que denunciou o contrato de trabalho – e não ter a mesma direito à indemnização por despedimento, assim como não tem direito à indemnização por incumprimento dos 60 dias de pré-aviso por que a entidade empregadora (Ré) não estava obrigada a realizar um aviso prévio de denúncia, que não existe no ordenamento português para as entidades empregadoras.
Como também assinala Alberto dos Reis (obra citada, pág. 372), importa «(…) não confundir petição inepta com petição simplesmente deficiente: claro que a deficiência pode implicar a ineptidão: é o caso da petição ser omissa quanto ao pedido ou à causa de pedir; mas à parte esta espécie, daí para cima são figuras distintas a ineptidão e a insuficiência da petição: Quando a petição, sendo clara e suficiente quanto ao pedido e à causa de pedir, omite factos ou circunstâncias necessários para o reconhecimento do direito do autor, não pode taxar-se de inepta; o que então sucede é que a acção naufraga». A contradição entre o pedido e a causa de pedir pressupõe, ao fim e ao resto, que não é perceptível nem ao Réu nem o tribunal quanto ao que devem ater-se, pois um contradiz o outro: trata-se de uma contradição intrínseca e insanável, que implica que se torne de todo incompreensível o articulado de petição inicial.
Ora, no caso, segundo se entende, tal não se verifica.
É certo que a Autora alega, por um lado, não pretender “discutir” o despedimento ilícito de que diz ter sido vítima e, por outro, pede as consequências pela cessação do contrato, com invocação de normas referentes ao despedimento ilícito, designadamente tendo em vista a indemnização de antiguidade.
Tal situação justifica que face ao que estatuem os artigos 508.º, n.º 3, 265.º e 265.ºA, do Código de Processo Civil se convide a parte a corrigir a petição inicial, de modo a melhor explicitar o fundamento da sua pretensão.
De resto, não se podem olvidar os poderes inquisitórios acrescidos do juiz em processo laboral, tanto assim que a lei lhe impõe o dever (oficioso) de convidar as partes a completar e corrigir os articulados quando no decurso do processo deixaram de ser articulados factos que interessam à decisão da causa (artigo 27.º, b) do Código de Processo do Trabalho) ou até a mandar intervir na acção qualquer pessoa e determinar a realização dos actos necessários ao suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação (alínea a) do mesmo artigo).
Procedem, por consequência, as conclusões das alegações de recurso, pelo que deverá ser revogada a decisão recorrida, a fim de ser substituída por outra que convide a parte a melhor explicitar e completar os fundamentos da sua pretensão.
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V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora, em julgar procedente o recurso interposto por S… e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, a fim de ser substituída por outra que convide a Autora a melhor explicitar e completar os fundamentos da sua pretensão.
As custas do recurso serão suportadas pela parte vencida a final.
Évora, 27 de Setembro de 2011 (João Luís Nunes) (Acácio André Proença) (Joaquim Manuel Correia Pinto)